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oO: . é e ‘capa de Guilherme Lopes Alves ‘Reservados todos 0s direitos ‘pela legislagso em vigor Empresa de Publicldeds Seara Nova SARL OCB oe tie Lisbor POETAS DO SECULO XVII Seleccio, prefacio e notas de Rodrigues Lapa 38 edigdo SEARA NOVA 1967 1, PEDRO ANTONIO CORREIA GARGAO—Nasceu em Lisbon, em 1724, filho de pais abastados. Seu pai desde ferianga ineulcoulhé 9 leitura de Vieira, 0 que pode expll- cor o set fuluzo purismo e a clegancla da sua frase. Cursou Direito em Coimbra, mas era fraco de constituiczo © parece nndo ter eoneluide 6 curso. Casou e fisou-se num empreso pitbtico, Vivia entio uma vide contente ¢ pactfica na sun quinta da Fonte Santa, nos arredores de Lisboa, dediendo 2 poesia e & pintura, Em 1756, tts Juristes, Cruz e Silva, Gomes de Carvalho e Esteves Negrdo fundaram a Aredia Lusifana, Garcio entrou logo para els, com o nome de Gérldon Eximanteu, ¢ durante algum tempo fol o chefe dos noves poetas ¢ o principal estimuledor ca nova Aca- fdemfa. Em sua casa reunianse os seus companhelzos de letras, palesirando ¢ tomcndo cha, aos quals se juntavam algun’ ofieliais ingleses, residentes) em Portugal. Contudo, como algumas das suas relagGes nfo fostem do agrado do primelroministro (era amigo do conde de S. Lourenco ¢ visita das meninas Alomss, no mostelro de Chelas), com preende-se que este ndo mdstrasse fervorosa slmpatla pelo poeta nem protegessa grandemente a Areddia. O certo 6 que em 1771, por motives ainda obscuros, fol enearcerado no Limoelro.” Quando, em 10 de Novembro de 1772, Ihe fot dada ordem de soltura, encontraram-no morto na, prisio. ‘© qe distinge 9 obra’ da Gargia én extrema purer da sua linguagem, a nobreza dos seus ideats de homem © artista: um delicado epieurismo funto a um estoleismo Lem- perado a9 modo elissico, e wn sélldo bomrsenso © apu- rado gosto, que o ndo deika resvalar na imnitaggio servil dos antlgos. Por toda obra uma, preocupacio da cor, visivel sobretudo na sun grande composicao A cantata de Dido. eadign (idodaber & will 5 N ee posed da Ghokune- 2 Guwdects Kies ESS ee da luster oy Ls ! pda. kes do vuke branes | Gl Bastualsts de Foseiearune come oS de quate foetes vaur cal 1 Yoke Sdtira sobre a imitagéo dos antigos nfo poste, amivel Conde, susetar-me CHIE Rn. A que as cegas se imitem os antigos; _ quero dizer, aqueles portugueses “TT a que hoje chamamos quinhentistes, —__ tf 5 © bom Sa, bom Ferreira, o bom Bernerdes, foram grandes poetas; qualquer deles fol discreto ¢ foi sibio; enfim, as Musas . ihe embalaram o bereo e Ihe cobriram i com murta e com lourelro a sepultura; v 10 mas nem por isso os pobres eseaparam _ 8 culpa original: tem suas faltas, 1, Esta sitira ¢ dedicada ao conde de S. Lourenso, D, Joso José Ansberto de Noronha, curioso tipo de fidalgo protector de poetas, perseguido, como Gargio, pelo Marques de Pombal, que o teve preso no Forte da. Junqueira durante, jezassete dnos. Nelo se revela 0 que caractetiza 0 génio d Garcio: equiifbrio, elegincia e graga comedids. Pare Gar- eGo a imitagio dos cléssicos, preconizada pela dreddia, nio 50 devia fazer as cogas, serviimente; essa operagio delieada exigia gosto, bom-senso e sentido da, aclualidade. 7, discreio = entendido, eloquente, sentencioso, tem seus altos e ba‘xos, tem sedelros, onde da c’os focinhos um pedante. Que va por onde for, ha-de segul-los, ‘que hé-de furtar-ihe tudo quanto dizem, 5 e seja bom ou mau, isso que importa? 0 ponto esté que o diga algum daqueles que Craesbeeck imprimiu: ha mator telmat ‘As G¥acas sio muchachas, sio risonhas, slo faiceis, sio suaves; eles querem 10 forga por-Ihe brancas e higodes, e niio Ihos sabem por. Que é 0 que eu digo?: imitam o pior; mas nfo imitam 05 versos mals cancros e correntes, a sisuda dicgio, a frase pura, 15 aquele atico sai, que nio eonhece quem nunea viu o portico de Atenas sequer em caixas 6pticas pintado, isto ¢, Anacreonte traduzido, Arlstéfanes, S6focies e Sato, 20 sem que fique de fora o bom Homero, e outros, em quem poder no teve a morte, Para imitares tu, senhor, os feltos 1, sedeiro, x4 um pedaeo de tabua com pregos que serve para assedar 0 linho. Dar com as ventas mum sedetro € expresséo popular que significa: «ser mal sucedido em qual- quer coisa». 4, furtar-Ihe =furtar-lhes. 7. Craesbeeck ¢ v nome uma’ faunflia de Impressores estabelecidos em Portugal durante os séculos xvr e xvir Pedro, Paulo © Lourengo Crnesbeeck imprimiram as obras dos clissicos Si de Miranda, Antonio Ferreira, Diogo Bernardes e Camoes. 8, muchachas = raparigas. Castelhonismo, 8 ¢ segs. EN- tenda-se: cos mous poetas queriam enobrecer as suas poesias, dando-thes 0 ar antiquado do quinhentismoy. Por isso faln muito proprlamente em «por brancas e bigodes». 14, sisuda = sentenciosa. 18-20. Gargio com Anacreonte, Aristéfanes, Séfocles, Safe e Homero procura representar respectivamente @ poesia lirica, @ comeédia, a tragédin ¢ a epopeia. de teus claros majores, necessitas _ de calgas e gib’io? Se hoje saisses com jaquete e golilha, quem seria tio sério e to sisudo, que pudesse 5 conter o riso? Nada te valera responder-Ihe, gritando, «que imitavas 0s distintos avds, que dos Noronhas a prosépia exaltaram generosa nos steulos passadoss, Todos sabem 10 que o valor ndo consiste nos vestidos, antes seguem as modas; a virtude assiste com sossego inalterdivel nos grandes coracées. Ora esta regra corre a nivel daltura do Parnaso. 15 Imite-se a pureza dos antigos, mas sem eseravidio, com gosto livre, com polida diego, com frase nova, que a fez, ou adopto a nossa idade, Ao tempo esto sujeitas as palavras: 20. umas se fazem velhas, outras naseem; assim vemos a fértil Primavera. encher de folhas 20 robusto tronco, a quem despiu o Inverno desabrido. Mudam-se os tempos, mudam-se os costumes: 25. CamBes dizia imigo, eu inimigo; © ponto esti que ambos expliquemos aquilo que pensamos. A energia do discurso € da frase nfo consiste 11, antes = mas estes (os vestidos). 13, esta regra, © merito nfo esti em imitar o trajo dos antigos, mas sim sua alma, a sua virtude. 14, a nivel Galturc = & mesma altura, Tato é esta regra de conduta moral também se aplica & poesia. % possivel que a palavra nitel ainda no tempo de Garpio fosse aguda, como fol no petiodo elissico Mivel). 23, quem. No estilo ckissico 6 frequente achar auem veferido nfo 26 a pessoas mas a colsas, Aqui refere- se a fronco. no feltlo das vozes, mas na forga, salvo conforme aos gérrulos trovistas, que nio te chamam ou 3, A Fonte Santa, junto onde ¢ hoje © cemitério dos Prazeres, era entio fora, da eldnde. All se rouniam seus ‘amigos, ‘os dxeades Cruz e Silya, Reis Quita, Tranclsco José Ftelre, ete. Como se vé do interessante quidio que <2 segue, Carpio evitava ir a cidade e mio gostava da sua balbirdia © das suas imundicies. 18, a suja caldeirade, Os despejos eram atirados i rua, motivo por que Lisbon era uma cldade porquissima ainda ‘nos finals do séetlo xvmn. n Desta sorte nio posso, caro amigo, novidades contar-te ci da corte. Pols que te contarei? Eu sei somente que entram naus pela barra, ¢ sem naus 5 com as velas inchadas; sel que coire para o cérulo mar o louro Tejo; de Lisboa e das cortes estrangeiras néo saberel dizer-te couse alguma, que © tempo todo gasto em ler Virgflio 10 no meu pobre, mas certo domicilio. Obras Poéticas, Lisboa, 1778, pp. 154151. 2 cbrte, Assim se chamava a Lisboa, capital do reino. © poeta, imitando 0 precelto horaciane da mediania dow- rada, vivia, arredado das intrigas da cidade, todo entregue a let o cen Virgilio, 12

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