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A Verdade Sufocada 3? edigao ampliada - indice onomastico Zw a Carlos Alberto Brihante Us- tra, coronel reformado do Exército Brasileiro, apresenta nas paginas do vibrante "A Verdade Sufocada” fa saga de um homem simples, que ndo pediu para ser herdi, mas 0 foi, como outros que rece- beram a dura missao de defender © Brasil de homens fanatizados por uma crenca e que por ela se Jangaram na loucura de uma luta armada fratricida. ‘Coragem fisica e moral foram apanagio desse homem, nos dfi- eis momentos em que combateu © tarrorismo de uma esquerda re- voluclondiria. Orguiho-me de privar do sua amizade @ nao tenho pejo ‘om revelar que ele, entre outros, {ol exemplo para as minhas lides rmiltaros, em anos mutt mais ‘amenos, quando a luta sangrenta ja oatava em seu final "A Veidade Sutocada’, sem nonhuma divida, @ quase uma ‘obra biogrifica, que carrega con- ‘sigo um valor inestimavel, pois Fongata a verdade de um momen- to istérico totalmente distorcido por aquoles que hoje encobrem ‘08 80U8 reais designios de trans- formar o Brasil em um satélite do ‘eomuinismo internacional, com a faldcia da que lutaram contra uma ditadura militar para promover a Nbardade a Democracia © proprio Ustra fol vitiina anny farsa dessa gente, por tor sotride na pele a torpeza de uma acusa: G40 rocambolesca, que ole dos roi, ponto-por-ponto, em, deter minadas paginas deste trabalho, como jé 0 fizera em seu anterior “Rompendo 0 Siléncio". Em linguagem coloquial, "A Verdade Sufocada” prende 0 lel: for em narrativas ricas em ago, pormenorizando 0 entrechoque entre o8 drgaos de seguranga = a chamada repressdo - @ as orga- nizagdes comuno-terroristas, hole mitificadas por uma parcela da midia ainda rentente em abragar uma causa ultrapassada. Ustra, com muita clareza @ propriedade, apresenta provas it- Tefutéveis que permitem ao leitor um verdadeito juizo de valor sobre @ realidade dos fatos daqueles ‘anos conturbados. A contundéncia do seu lvro é de extrema valia para ‘08 que nao vivenciaram aqueles momentos @ que hoje sao bombar- deados por versdes enviesadas de uma esquerda revanchista. Ustra @ a sua Joseita nao mediram esforgos num diligente trabalho de pesquisa, que em- presta a maior credibilidade @ profundidade as narrativas con- tidas nesta obra. ‘Acompanhei, pari passu, to- das as etapas da feitura de “A Verdade Sufocada’ e, com muito orgulho, integro 0 elenco de seus colaboradores. Passemos, pois, a0 destilar de uma época, sob 0 testemunho de um de seus melhores prota- gonistas. Paulo Carvalho Espindola, Coronel Feformado. Comandei 0 DOVCODII Exército, de 29/09/1970 a 23/01/1974, periodo ‘em que as organizagdes terroristas peep atuaram com maior intensidade. Neste livro conto como os Orgaos de Seguranca as derrotaram. Na luta armada, lamentavelmente, tivemos cerca de 500 vitimas, de ambos os fados, um numero bastante reduzido se o compararmos com os demais paises da América Latina que. tam- bém, enfrantaram o terrorismo. ‘Além dos relatos, procuro desfazer mitos, farsas e mentiras divulgadas para manipular a opiniao publica e para desacreditar e desmoralizar aqueles que as venceram. ati 8-85.86062-60-7 | | Aa a iii MM Ha quarenta anos, em 25/07/1966, a organizacao terrorista ‘Agao Popular (AP) realizou um atentado no Aeroporto de Guararapes - Recife/PE - que ocasionou duas mortes e treze feridos graves, entre os quais uma crianga de seis anos, Esse atentado é considerado o marco inicial da luta armada no Brasil << rrr Bitton mos sempre soligitrios com fe allies na hore fit agressite 2 fo ofversifinge, cumpriram ofuro fever fe 3¢ oporem aagilaiores eferrorigias. fe armas mo mis, pura que Magis nis fosse Tevaka ‘a anarguid. Gen Ex WALTER PIRES eee Minisire O general Walter Pires de Carvalho e Albuquerque foi ministro do Exército durante o governo Joao Figueiredo pe Homenagem aos companheiros do Projeto Orvil Quando as dltimas organizagoes terroristas foram derrotadas, a esquerda revanchista passou a escrever e a mostrar, da forma que lhe convinha, a luta armada no Brasil. E o fez de maneira capciosa, invertendo, criando e deturpando fatos, enaltecendo terroristas, falseando a historia, achincalhando as Forgas Armadas e expondo a execracao publica aqueles que, cumprindo com o dever, lutaram contra a subversao e o terrorismo em defesa da Nagao e do Estado, Nesse incansavel e inteligente trabalho, porém desonesto ¢ antiético, os revanchistas acusavam os civis e militares que os enfrentaram ¢ derrotaram, de atuarem por conta propria como paramilitares desvinculados de suas organiza- ¢6es, em estruturas paralelas. Predominava no Pais a versio dos derrotados que agiam livremente, sem qualquer contestagao. As Forgas Armadas, disciplinadas, se manti- nham caladas. Aos poucos, a farsa dos revanchistas comegou a ser aceita como “ver- dade” pelos que nao viveram a época da luta armada e do terrorismo e que passaram a acreditar na verso que lhes era imposta pelos meios de comu- nicacao social, No segundo semestre de 1985, a Segao de Informagées do Centro de Informacées do Exército - atual Divisdo de Inteligéncia do Centro de Inteli- géncia do Exército - recebeu a missao de empregar os seus analistas, além de suas fungdes e encargos normais, na realizacgao de uma pesquisa historica considerando o periodo que abarcasse os antecedentes imediatos da Con- tra-Revolugao de 31 de marco de 1964 até a derrota e o desmantelamento das organizacées e partidos que utilizaram a luta armada como instrumento de tomada do poder. Foi um trabalho minucioso, em que processos, inquéritos e documentos foram estudados e¢ analisados. As pesquisas realizadas em 1985, sob a orientagao ¢ a coordenagao do chefe da Segio de Informagdes, mostraram que o trabalho a ser realizado ultrapassaria, no tempo ¢ no espago, o planejamento inicialmente estabelecido. Assim, decidiu-se retroagir a Marx e Engels, passando por 1922, ano da criagao do Partido Comunista Brasileiro - Segao Brasileira da Internaci- onal Comunista - primeira organizagao comunista no Brasil, sob a orienta- cdo da Internacional Comunista, e prolongando-se até a primeira metade da década de 1980. Definiu-se, também, que 0 projeto seria conduzido, em tempo integral, poruma equipe de trés oficiais, apoiados, quando necessario, pelos demais. Visando a resguardar o carater confidencial da pesquisa e a elaboracao da 1, foi designada uma palavra-cédigo para se referir ao projeto - Orvil -, livro escrito de tras para frente. Em fins de 1987, 0 texto de aproximadamente mil paginas estava pronto. A obra recebeu a denominagao de Tentativas de Tomada do Poder. Apresentada ao ministro LeGnidas Pires Gongalves, este nado autorizou a sua publicagao - que seria a palavra oficial do Exército -, sob a alegacao de que a conjuntura politica nao era oportuna. 4 Assim, a instituigdo permaneceu muda e a farsa dos revanchistas continuou, livre e solta, a inundar o Pais. Recentemente, varios grupos, inconformados de ouvir somente um lado dessa historia, resolveram se organizar e lutar para o restabelecimento da verdade. Paralelamente, alguns livros, contestando a versao revanchista, fo- ram editados, o que levou o quadro amplamente desfavoravel a mudar, em- bora lentamente, comegando a esquerda a ser desmascarada. , : Em fins de 1995, recebi 0 texto final do trabalho, em xérox, pois ele nao foi editado. Esse texto foi o farol que me iluminou na redagao de inimeras partes deste meu novo livro, me tirou dividas, me esclareceu fatos e me deu a certeza de datas e de outros dados relevantes. A esses an6nimos militares da Inteligéncia do nosso Exército, a minha ho- menagem e a certeza de que vocés, também, sao autores deste livro. Agradecimentos Nao poderia escrever este livro sem expressar 0s meus agradecimentos: - Ao general Raymundo M. Negrao Torres, recentemente falecido, meu comandante da Artilharia Divisionaria, quando comandei 0 16°GAC, em Sao Leopoldo/RS, um incentivador de todos os momentos, um amigo, um escritor em cujas obras muito pesquisei. - Ao general Aloisio Rodrigues dos Santos, meu capitao no 16°GAC, ami- go ao longo de todos estes anos, que leu os originais, sugeriu mudangas ¢ pres- tou-me valorosos esclarecimentos. ~ Ao coronel Aluisio Madruga de Moura e Souza, companheiro de luta, combatente da Guerrilha do Araguaia, pelo muito que me orientou e auxiliou, inclusive digitando textos. ~ Ao coronel Paulo Carvalho Espindola, que, com seu conhecimento do assunto e dominio da Lingua Portuguesa, me auxiliou revisando textos, su- gerindo idéias e acompanhando desde as primeiras linhas 0 desenrolar des- te trabalho, - Desejo expressar um agradecimento especial a quem prestou grande aju- da na divulgagao do livro: o Dr. David dos Santos Araitjo, delegado da Policia Civil de Sao Paulo, que, com sua coragem e determina¢ao, sempre congregou ‘os companheiros que com ele lutaram no combate a0 terrorismo. ~ Ao senhor Luiz Carlos Almeida Prado grande colaborador da difusao desta obra. ~ Ao senhor Moacir Nunes Pinto pelo apoio dado quando do langamento do livro na cidade de Sao Paulo. - Também nao poderia deixar de agradecer aos que escreveram artigos € livros e mantém sifes onde esclareci algumas de minhas dividas: General Agnaldo Del Nero Augusto; Escritor F. Dumont; Historiador Carlos Hitch Santos Azambuja; Coronel José Augusto Silveira de Andrade Netto; Coronel José Luiz Savio Costa; Coronel-Aviador Juarez de Deus Gomes da Silva; Coronel Carlos Claudio Miguez; Coronel Erildo Simedo Camargo Lemos; Coronel Jayme Henrique Antunes Lameira; Capitao Félix Maier; Advogado Severino Mariz Filho; Advogado Marco Pollo Giordani; Fildsofo Olavo de Carvalho; Jornalista Marcelo Godoy: Jornalista Paulo Martins; € Jomnalista Sandro Guidalli. ~ Nao posso deixar de destacar a boa vontade e inigualavel contribuigao de P.D.F., que me facilitou 0 acesso a processos arquivados no Superior Tribunal Militar (STM). - Agradego, também, a professora Wania de Aragdo-Costa, Doutora em Lingua Portuguesa, professora da Universidade de Brasilia, que revisou parte do meu trabalho. - Ao Doutor Plinio, por iniciar e manter nossos encontros anuais com anti- gos companheiros de uta. ~Aos amigos que me incentivaram e cobraram a elaboragao deste livro e ao meu genro Eder Wagner Dantas de Medeiros ¢ minha filha Patricia, que me auxiliaram dando suporte técnico na parte de computagao. - Nés vencemos, apesar do boicote da midia, de editoras e de livrarias. Ao que parece, o livro incomodou. O siléncio da imprensa foi revelador. Mas, assim mesmo, nds vencemos! A primeira edigao de seis mil exemplares esgotou-se em quatro meses e che- gamos a 3° lugar entre os mais vendidos no Brasil, segundo o Jornal do Brasil. Devemos isso a amigos, internet e a jornalistas imparciais, democra- tas, comprometidos com a noticia e nao com a ideologia, que nos ajuda- ram a difundir 0 livro. Queremos agradecer aos amigos general Torres de Melo, coroneis Mayrseu Cople Bahia, Luiz Carlos Avelar Coutinho e ao tenente R2 Luiz Mergulhao; aos jornalistas Rogério Mendelski, Flavio Pereira. José Mitchell, Ari Cunha, Clatidio Humberto, Denise Rothenburg, Aristételes Drummond, Themistocles Castro e Silva, Alvaro Costa, Clotilde Gama, Paulo Monteiro e Guilherme Pévoas. Ao Xupacabra, nosso orientador, defensor das boas causas na internet, 0 nosso especial agradecimento. Dedicatoria Dedico este livro ao meu Exército e aos meus chefes, principalmente aque- les que me designaram para, sob suas ordens, combater a guerrilha urbana eo terror comunista. Meus chefes sempre me apoiaram e me distinguiram, conce- dendo-me a Medalha do Pacificador com Palma, maior condecoragao que um militar do Exército pode receber em tempo de paz. Dedico-o, também, aos meus companheiros do Exército, da Marinha, da Forga Aérea e das Policias Civis e Militares que, em todo o Brasil, luta- ram com denodo, bravura e abnegacao no combate a subversao e ao terro- rismo. Fago-o, especialmente aos meus comandados no DOI/CODI/II Exér- cito, abnegados que atenderam ao chamado da Patria e arriscaram a vida com coragem, lutando com honra e dignidade para extirpar 0 terrorismo de esquerda que ameagava a paz e a tranqiiilidade do Brasil. Minha admiracao a vocés que enfrentaram, em luta armada e¢ traigocira, irmaos brasilciros fanatizados. Dedico-o, com emogao, aos familiares e amigos que perderam seus entes queridos nessa guerra fratricida. Desse modo, homenageio as vitimas do terrorismo vermelho que, desde 1935, vinha tentando tomar o poder pelas armas. Estendo aos familiares desses martires 0 meu profundo respei- to. Dedico este livro, como ja 0 fiz em 1987 em Rompendo o Siléncio, aos jovens que nao viveram aquela época e que somente conhecem a historia distorcida pelos perdedores de ontem, muitos dos quais ocupam cargos em universidades, jomais, emissoras de radio e televisao e posigdes relevantes em Orgaos publicos. Dedico-o a eles que sao 0 futuro do novo Brasil. Sao puros de espirito e de intengGes e vejo-os, muitas vezes, explorados em sua boa fé. No negro periodo revolucionario da guerrilha urbana e rural, muitos foram usados, manipulados e fanatizados. Puseram-lhes armas nas maos, os instruiram, orientaram e doutri- naram, levando-os a violéncia inutil. Hoje, reescrevem a historia e a transmitem distorcida as novas geragées. Oferego este livro aos jovens, para que possam buscar a verdade, com liber- dade para procura-la, liberdade legada a eles por nossa luta. Entretanto, hoje prevalecem as “meias-verdades” que, no seu reverso, sao mentiras completas. Preocupo-me em vé-los influenciados por panfletos que tomam ares de historia contemporanea ¢ lhes sao apresentados como a verdade definitiva. Nao é sobre amentira que se alicerga o futuro de um pais. Confio que os jovens, na sua sede de justiga, saberao encontrar a ver- dade e saberio ser livres, nao permitindo que ideologias ultrapassadas, de novo amortegam os seus sentimentos, oferecendo a violéncia no lugar da paz, a mentira no lugar da verdade e a disc6rdia no lugar da solidariedade. Assim, com 0 espirito limpo, construirao 0 Pais que pacificamos com san- gue e lagrimas de muitos brasileiros. ‘A todos os que repudiam a violéncia, amam a paz e a verdade, levo o meu testemunho e apresento o resumo de minha vida nesses anos conturbados. Somos livres e devemos fazer da liberdade a razdo maior da cons- tante vigilancia, uma vez que os derrotados nao desistiram de intentar contra o Brasil. , Sumario A guisa de prefacio. Introduga Lupes Ustra: minha primeira motivagio ideolégica. Partido Comunista Brasileiro .. De Getilio a Juscelino .... Luis Carlos Prestes e Olga Benario.. Intentona Comunista © Tribunal Vermelho e os “justigamentos” do PCB Governo Janio Quadros .. Governo Joao Goulart Ligas Camponesas.. Onda esquerdista A imprensa e a Contra-Revolugio Agitagao nos quartéis Minas, rastilho da Contra-Revolu Encontro de irmaos de armas - ligdo de amor ao Brasil O 31 de margo no 19° RI - Sao Leopoldo/RS Golpe ou contra-revolugao De norte a sul vivas 4 Contra-Revolugaio A Contra-Revolugio e os Estados Unidos .. Governo Castello Branco... Influéncia e ajuda de Cuba a luta armada na América Latina .. Influéncia e ajuda de Cuba 4 luta armada no Brasil O caudilho contra-ataca .... As sete bombas que abalaram Recife . Governo Costa e Silva Carlos Marighella, 0 idedlogo do terror Sonho de uma guerrilha rural ... Recrutamento dos jovens .. Movimento estudantil .. Assalto ao Hospital Militar Atentado ao QG do II Exército Tribunal Revolucionario e novas sentengas (major alemio e capitéo americano). Lamarca rouba armas que a Nagio Ihe confiou 2* Companhia de Polfcia - a pioneira no combate ao terrorismo .. O Movimento Armado Revoluciondrio (MAR) ¢ “os meninos” de Flavio Tavares .. Operagao Bandeirante (OBAN) Seqiiestro do embaixador americano Governo Médici ¢ 0 milagre brasileiro .. Em Sao Paulo... Seqiiestro do cénsul do Japiio em Sao Paulo Um dia é do cagador, outro da caga .... Operagdes no Vale da Ribeira e massacre do tenente Alberto Mendes Jinior.. Seqiiestro do embaixador da Alemanha .. Partido Comunista Brasileiro Revoluciondrio (PCBR) Uma estrutura se arma contra o terror... Quando 0 espirito de corpo é imprescindivel .. Ao DOI/CODIMI Exército uma estrutura dindmica Segao de Contra-Informagées Setor de Operagdes de Informagées Seco de Investigacée: Segiio de Informagées e Andlise Segiio de Busca ¢ Apreensa O interrogatério ......... Para combater 0 terrorismo, leis especiais .. Quando € mais facil criticar Seqiiestro do embaixador suigo “Tribunal Revoluciondrio” condena mais um (Boilesen). 326 ALN abandona companheiro ferido. 335 Agado Libertadora Nacional (ALN) 341 Batismo de sangue.... “Tribunal Revolucionario” em sessdo permanente «0... A Dissidéncia da ALN e 0 Movimento de Libertagio Popular (Molipo) Morte do major José Jiilio Toja Martinez Filho A melhor defesa € © ataqu Um combate... A espera do filho de José Milton. Rajada mortal - Morte do cabo Sylas Bispo Feche Nao interessa o cadaver, mas o impacto - David A. Cuthberg Mais um combate na rua Nossa vida em continua tensao Assassinato do Dr. Octévio Gongalves Moreira Jinior.... Vanguarda Armada Revoluciondria Palmares (Var-Palmares A VAR-Palmares e os jovens... 433 435 fm Brasilia Governo Ernesto Geise! Um final feliz No 16° Grupo de Artilhari Governo Joao Figueiredo .. “Julgamento da Revolugio” Brasilia - Uruguai - Brasilia . De credo a Itamar Franco A vala do Cemitério de Perus Governo Fernando Henrique Cardoso Mais que “perseguidos politicos” revanchistas Lei dos Desaparecidos Politicos... Morte no QG da 5* Zona Aérea, Canoas/RS Suicidio no 19° RI - Sio Leopoldo/RS .... Lei dos Perseguidos Politicos Vitimas do terrorismo no Brasi Governo Luiz Inacio Lula da Silva Os sem-terra sem limites Indenizagoes... até quando?. A vinganga dos derrotado: Foro de Sao Paulo. Rumo ao socialismo . Para meditar Palavras finais ... Indice onomistico . BIBLIOGRAFIA... de Campanha A guisa de prefacio Pede-me o meu amigo Carlos Alberto Brilhante Ustra que escreva uma apresentacdo - um prefacio - para seu novo livro. Costuma-se dizer que se um livro é bom nao precisa de prefacio e se nao presta nao hd prefacio que o salve. O novo livro do Ustra nao precisa de prefacio, como dele nao precisou 0 seu corajoso Rompendo o Siléncio. Pelos frutos se conhece a arvore, pois arvore ma nao da bons frutos. Prefi- ro, assim, falar do autor antes que do seu livro. Pelo autor os leitores poderdo avaliar a importancia do livro. Conheci 0 autor quando me mandaram comandar a Artilharia Divisionaria em Porto Alegre, que tinha como uma das unidades subordinadas 0 Grupo de Artilharia de Sao Leopoldo comandado pelo entao tenente-coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra. Jeito retrafdo, quase timido, fala mansa, freqiientemente assinalava as palavras com um sorriso que parecia encabula- do. Sua tarefa era comandar uma unidade acomodada precariamente em um aquartelamento muito antigo, com os pavilhdes - alguns ainda com velhissima cobertura de zinco - subindo morro acima. Nao obstante, 0 16° GAC osten- tava um excelente padrao de instrugio e disciplina e mantinha uma estreita ligagdo com a comunidade civil, especialmente com as familias dos jovens recrutas, no que muito se empenhava seu comandante. Pude ver com que pesar e amargura o coronel Ustra enfrentou a dificil e dolorosa tarefa de restituir aos pais 0 corpo inanimado de um soldado morto em lamentavel e quase inexplicavel acidente na instrugao, quando sofreu um choque térmico ao cair em um agude sobre o qual fora estendida a corda de travessia da pista de obstaculos a ser percorrida. Logo, pude perceber que o comandante era um lider de valor, que mantinha sua unidade “na mao”, como se costumava dizer. E foi sem surpresa que fui me inteirando da vida pregressa do meu novo subordinado. Que, entre outras coi- sas, ele enfrentara a dificil tarefa de comandar 0 recém-criado DOI de Sao Paulo por um longo tempo, na época em que mais acesa corria a guerrilha urbana na capital paulista, quando se improvisara a Operagdo Bandeirante para dar resposta 4 altura da agressividade dos comunistas, fato que tanto impressi- nara 0 entdo comandante da 2* RM - general Dale Coutinho - 0 que 0 levaria, alguns anos depois, a reveld-lo, para escindalo dos escribas revanchistas, em conversa com 0 ja designado presidente Geisel que 0 convidava para ser 0 ministro do Exército. “Ah!, naquela época as coisas melhoraram quando come- gamos a matar” - disse o general em conversa que ficou gravada em fitas surrupiadas pelo Heitor Aquino Ferreira que, muitos anos mais tarde, as entre: garia ao jornalista Elio Gaspari. — Conheceria também a esposa do comandante, Josefta, mulher de aparéncia fragil, mas animo forte que fora um dos artimos de Ustra naqueles tempos difi- Ceis © que se transformaria na “maezona” das mogas que as peripécias da guer- rilha colocariam sob a guarda de seu marido na Rua Tut6ia, nas terttlias com Miriam, Joana, Lila, Cristina, Shiruca, entre as aulas de tricé e croché e as brincadeiras com a sua pequena filha. Os anos passam. Repete-se com 0 adido militar em Londres a farsa armada contra 0 coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, adido no Uruguai. Com uma significativa diferenga: em 1985, embora no governo diibio de José Sarney, o ministro Leénidas - condestdvel da Nova Reptblica - viu-se compelido a prestigiar e defender o nosso adido que terminou normalmente sua missio, 20 passo que o da Inglaterra ficou desamparado e terminou seu tempo de “aditanga” em uma sala do “Forte Apache” em Brasilia, como se ainda esti vesse junto a corte de Saint James. Uma injustica! ° coronel Ustra, poucos meses antes de passar i reserva, saiu em campo, viseira erguida e de langa em riste, na defesa de sua dignidade e de seu passa- do. Publicou, em margo de 1987, com sacrificio de seus recursos pessoais, um livro desmascarando a farsa e sua principal vedete, a entdo deputada Bete Mendes, colocando a nu os lances da luta armada em Sao Paulo. Reptou sua acusadora a provar as mentiras de que se servira e que apresentara com o largo €costumeiro apoio de jornais, revistas e entrevistadores de televisdo. Arespos: ta foi o siléncio e uma pa de cal sobre o livro embaragoso que nunca foi des- mentido ou contestado publicamente. As tinicas respostas foram as ameagas anénimas que passaram a fazer ao militar e a sua familia. A guerrilha rural ou urbana é modalidade de guerra nao convencional que fez suas pr6prias regras, dentro da estratégia comunista da Guerra Revoluci- onaria, com a qual conseguiram apossar-se de muitos pafses. Um dos alvos dessa guerra - eficientemente utilizada como um dos instrumentos soviéticos da Guerra Fria - foi o Brasil, como ficou cabalmente comprovado pela aber- tura dos arquivos moscovitas da KGB e pelos depoimentos e confissdes de seus agentes na farta literatura por eles publicada. Para combaté-las, as Forgas Armadas, especialmente 0 Exército, tiveram de adotar processos e organiza¢ées também nao convencionais, descaracterizando seus homens, infiltrando-se nas facgdes subversivas, para poder chegar aos porées da PL VECERS SUICR clandestinidade, de onde nos moviam sua luta armada sem quartel, proclama- dae ensinada por Marighella e seus mentores cubanos. Muitos dos episédios dessa guerra suja, baseada, essencialmente, na informagao € na contra-infor- magao, tiveram de ser planejados e comandados de “pordes” de sigilo ¢ tra- vados adotando praticas inusitadas. Em tais ambientes, onde necessariamen- te teria de haver uma grande descentralizagao e autonomia operacional, ¢ precariedade dos controles e os excessos eram inevitdveis ¢ muitas vezes 4 violéncia da resposta, pela propria natureza da luta, subiu a altura da violéncia empregada pelos guerrilheiros, desenvoltos nessa guerra em que eles mes- mos faziam as regras. Achar, hoje, que tal guerra poderia ter sido conduzida e vencida com “punhos de renda e luvas de pelica” é uma abstragao de quem nao viveu 0 dia-a-dia de tais momentos ¢ nao sentiu na pele as agruras de ter de ganhd-la em nome do futuro democratico da Nagao. Um dos mais estrénuos combatentes dessa guerra foi Carlos Alberto Brilhante Ustra que, antes de renegar essa posi¢ao, desde a primeira hora assumiu a honra que teve er cumprir o dever que Ihe era imposto pela missdo que recebera quando ¢ desafio comuno-castrista soava como uma bofetada desferida na face di Nagao, em ameaca aberta ao compromisso das Forgas Armadas com i liberdade e a democracia. Por outro lado, uma das preocupagées mais visiveis e explicitas da es querda brasileira foi escrever, ¢ muito, sobre as circunstancias de seus suces sivos fracassos nas tentativas de assalto ao poder, realizadas a partir de 1935 Um longo processo de justificativas e autocritica extravasou em livros, depo imentos, entrevistas, filmes e em toda a sorte de manifestagoes feitas pelo: proprios personagens ou por escribas simpatizantes ou engajados. Aind: no exilio e aproveitando-se do apoio de governos comunistas e da esquer da internacional, os fracassados de 64 e os derrotados na luta armada dc final dos anos 60 e inicio da década de 70 desfilaram suas versGes € sua’ falacias que ganharam destaque e credibilidade por nao ter havido da part dos governos pés-64 0 necessario empenho em apresentar, em sua verda deira dimensiao, os lances e os acontecimentos que marcaram a mais longi mais séria tentativa de implantar no Brasil uma ditadura de inspirag& marxista-leninista. Na vastissima bibliografia citada no alentado livro Dos filhos deste solo constam cento e quinze publicagdes de comunistas ou elementos da esquerda vindas a lume a partir de 1964. Ainda hoje, jornalistas ressentidos, como Albert: Dines, Carlos Heitor Cony, Carlos Chagas, Elio Gaspari, Vilas Boas Correia‘ 24- Carlos Alberto Brilhante Ustra outros, continuam tentando reescrever ao seu talante a historia daqueles anos € o fazem confiando na curta meméria dos leitores. Durante muito tempo, ficaram sem resposta 0 que os fez acreditar num falacioso pacto de siléncio para encobrir supostos crimes. Na realidade, trata- va-se do equivoco de acreditarmos nés que a Lei da Anistia fora para valer. Uma das primeiras e corajosas vozes a se erguer para restabelecer a verdade foi ado coronel Ustra com seu primeiro livro, em que resolveu romper 0 silén- cio e colocar os pingos nos is. Agora, completa a obra entio iniciada e deixa extenso depoimento pessoal com sua A Verdade Sufocada. Raymundo Negrdao Torres Introdugao Ano apés ano, os revanchistas langam uma “dentincia” ou criam um fato novo, de preferéncia préximo de datas importantes para as Forgas Arma- das como 0 Dia do Soldado, o Dia do Aviador, 0 Dia do Marinheiro, a Semana da Patria e os aniversdrios da Contra-Revolugao de 1964 ¢ da Intentona Comunista de 1935, Foram as falsas fotografias do Herzog; os arquivos “enterrados” na sede do antigo DOI de Brasilia; a escavagiio da Fazenda 31 de Marco, em Sao Paulo; a queima dos arquivos na Base Aé- rea de Salvador; a vala “clandestina” do Cemitério de Perus; os agentes “arrependidos” que denunciam, com inverdades e talvez por vantagens, os Orgios de seguranga onde trabalharam; e muitos outros. Tudo publicado com estardalhago e quase nunca desmentido. No segundo semestre de 2004, a opiniao publica brasileira foi bombarde- ada, novamente, por intensa orquestragao, desencadeada pela imprensa e pelos “arautos da demoeracia e dos direitos humanos”, para a “abertura dos arquivos da ditadura”. Nesse esforgo, sobressaiu-se o ministro da Justiga, Marcio Thomaz Bastos. Pouca gente, no entanto, se apercebe, de que nada havia de inédito nessa pretensao. Tais arquivos ja foram abertos, ha mais de vinte anos, ainda du- rante 0 periodo militar, quando a equipe do arcebispo de Sado Paulo, D. Paulo Evaristo Arns, coordenada por Luis Eduardo Greenhalg, em pesquisas para produzir o livro Brasil Nunca Mais, esquadrinhou os documentos sob a guarda do Superior Tribunal Militar (STM). Nao sei quem autorizava o areebispo ¢ sua equipe a copiar esses docu- mentos. Deve ter sido um ministro do Tribunal que “escancarou” os guarda- dos dessa alta corte. Vejo nesse gesto a clara demonstragao de boa vontade desse ministro do STM em abrir os arquivos, crente, por certo, de que os documentos seriam usados com responsabilidade, honestidade e isengdo. E bom frisar que no STM se encontra 0 maior e mais confidvel acervo sobre o combate ao terrorismo. Sendo a tltima instancia da Justiga Militar, eram en- caminhados para esse Tribunal os processos e inquéritos dos implicados nos crimes de subversao ¢ terrorismo. A cquipe que escreveu 0 livro Brasil Nunca Mais, de posse dessa vali- osa documentagao, fez a triagem a seu modo, privilegiando o que queria, publicando o que interessava, distorcendo os fatos e ignorando 0 que nao lhe convinha. Nao consideraram os atentados terroristas, os “justigamen- . oS seqiiestros € os assassinatos praticados pela esquerda. Tais crimes m propositadamente omitidos, para que a Nagao nao tomasse conheci- mento das atrocidades dos que pegaram em armas para implantar no Brasil 26- Carlos Alberto Brilhante Ustra a ditadura comunista. Hoje, derrotados, se apresentam como “heréis”, muitos deles encastelados em altos cargos no governo. Basta folhear a obra de D. Evaristo Ams para constatar que, segundo ele, 0 desvario da esquer- da simplesmente nao teria existido Ementrevista intitulada “Abram ja os arquivos”, concedida ao jornalista Rol- dao Arruda, de O Estado de S. Paulo, em 28/10/2004, 0 arcebispo declarou: “Na preparagdo do livro Brasil Nunca Mais, obtivemos auto- rizagdo para copiar 707 processos da Justiga Militar. No total co- piamos | milhdo de paginas - um documento valioso na reconstitui¢do das violagées dos direitos humanos. Eram dentinci- as feitas diante de autoridades militares, em juizo, com nomes de torturadores, de locais de tortura. de presos desaparecidos. Penso hisso e pergunto: quantos outros arquivos existem por ai?” Posteriormente, na matéria intitulada “A verdade é que nos liberta”, do jornalista Adauri Antunes Barbosa, publicada em O Globo, de 28/11/2004, diz o prelado: “O principal ja foi publicado, mas a gente quer ver por escri- to, saber que & verdade. Nao é a informagdo que nos liberta. A verdade € que nos liberta. Vale a pena abrir.” O “principal”, a que se refere D. Paulo, foram as acusagées de tortura feitas perante os juizes, durante os julgamentos, quando os criminosos usavam esse argumento para se inocentar dos crimes praticados ou para justificar as dela- ges de companheiros. Ele somente se refere a isso no seu livro. Os “justiga- Mentos”, os seqiiestros, os assassinato: “expropriagdes”’, os atentados a bomba, com vitimas inocentes, nao sao relevantes para 0 arcebispo, pois, se- gundo ele, foram confessados sob tortura. D. Paulo e sua equipe tiveram acesso a vasta documentacao, copiaram o que desejavam, inclusive documentos sigilosos, 0 que é vedado por legislagio pertinente. Ardilosamente, usaram o que lhes interessava, utilizando somente o que chamam de “principal”. O “restante” para 0 arcebispo, ou seja, os arquivos existentes na ABIN, no DPF, nas Forgas Armadas ¢ nos antigos DOPS, sido documentos secundanios. Certamente, por conterem explicitamente os crimes € as intengdes dos protegidos do eminente prelado. Em 2004, foi criada uma comissio encarregada de “abrir os arquivos da ditadura” Baixou no ministro da Justiga o espirito da Santa Inquisigdo. Sugeriu que se requisitassem as cdpias dos documentos em poder dos civis e militares que lutaram contra o terrorismo. Para 0 ex-ministro chefe da Casa Civil, José Dir- ceu, tal posse é crime. Nao € crime, para ele, a posse dos arquivos que estao com D. Paulo Evaristo Ams? Outros arquivos importantes, que também deveriam ser requisitados, estdo com organizacdes ndo-governamentais, especializadas em denegrir os gover- nos militares. Os revanchistas julgavam que ficarfamos calados ¢ aceitarfamos, passiva- mente, a triagem que eles pretendiam fazer, como 0 fizeram D. Evaristo e sua equipe, buscando, apenas, documentos que contribuissem para comprometer os 6rgiios de seguranga da €poca. Nio esperavam pela reagao de organizagoes, grupos e, até, de par- cela da imprensa, exigindo a abertura dos arquivos por uma comissdo isenta e responsdvel, nao aceitando a proposta governamental que indi- cou, inicialmente, José Dirceu como o arbitro que definiria o que deve ser ou nao do conhecimento ptblico. Ao pressentirem que, finalmente, através do proprio governo, a Nagao tomaria conhecimento contra 0 que e contra quem lutamos, durante algum tempo, 0 assunto foi tempo- rariamente esquecido. Ja que estavam tao interessados nos documentos guardados por civis e militares, em 2004, e antes que viessem procurd-los em minha casa, resolvi abrir os meus, alguns arquivados na meméria, outros na memoria de companheiros de luta, outros pesquisados em jornais, livros, revistas € na Internet, onde, também, pouca coisa existe sobre as atrocidades co- metidas pelos terroristas. Eu e minha mulher iniciamos as pesquisas para escrever 0 meu primeiro livro, Rompendo o Siléncio, e continuamos a fazé-las no curso dos ultimos vinte anos. Possivelmente, nada de novo foi escrito por mim. Os dados pesquisados foram reunidos e ordenados para facilitar a leiturae o entendimento da mensa- gem que agora transmito. Abrindo meus arquivos, explico os moti vos que levaram civis e milita- res a desencadear a Contra-Revolugao, em 31 de margo de 1964, neu- tralizando a Segunda Tentativa de Tomada do Poder pelos comunistas. Aproveitei a minha experiéncia como comandante do DOI/CODI/II Ex (1970 a 1973), para contar a nossa luta contra as organizagoes terroris- tas que tentaram, nas décadas de 60 e 70, na Terceira Tentativa de Toma- da do Poder, implantar uma ditadura, a exemplo de Cuba € outros satéli- tes do Movimento Comunista Internacional 28- Carlos Alberto Brilhante Ustra Tego, também, algumas consideragées sobre a anistia e o revanchismo até os dias atuais. Para isso, foi preciso voltar no tempo e escrever, ainda que muito superfici- almente, sobre: - 0 Partido Comunista Brasileiro - PCB; - os presidentes da Reptiblica, de Getilio Vargas a Juscelino Kubitschek de Oliveira; -a Primeira Tentativa de Tomada do Poder pelos comunistas, em 1935 (Intentona Comunista); ~a vitoria da revolugdo cubana e 0 fascinio exercido por Che Guevara e Fidel Castro, transmitido aos jovens brasileiros por experientes comunistas; - as Ligas Camponesas e 0 Grupo dos Onze; e - 0 governo relampago de Janio Quadros. Voltei no tempo e escrevi sobre o governo Joao Goulart. Foi necessdrio pesquisar, estudar e analisar 0 perfodo que vai de 1960 até os dias de hoje, para mostrar a verdade sob a ética de quem, nesse periodo, viu, viveu e lutou contra a Segunda e a Terceira Tentativas de to- mada do poder pelos partidos e organizagGes marxista-leninistas que opta- ram pela luta armada. Retornei ao passado para contribuir, modestamente, com aqueles que, diuturnamente, trabalham para impedir que uma nova historia seja reescrita pe- los derrotados e que uma nova tentativa revoluciondria tenha exito. Creio ser imperioso desmistificar versdes veiculadas, macigamente, por al- guns 6rgios da imprensa escrita, falada e tele visada, por partidos politicos, por professores e outros formadores de opiniao, que tém recursos, platéias e opor- tunidades para difundir, com uma visao ideoldgica e ressentida, 0 que ocorreu no Brasil em passado recente. Com mentiras e meias-verdades eles vém, h4 anos, deturpando os fatos e falseando a hist6ria, pois somente eles tm voz e vez. Nao poderia deixar de voltar a agosto de 1985, quando a deputada federal Bete Mendes extasiava-se com a repercussio de suas entrevistas e declara- gGes a imprensa escrita, falada ¢ televisada, ap6s regressar do Uruguai onde integrara, oficialmente, a comitiva do presidente José Sarney. Com atuagao mediocre no Congresso Nacional, expulsa do Partido dos Trabalhadores e sem partido, Bete Mendes meteoricamente tornou-se uma celebridade nacional. EmA Verdade Sufocada fago um resumo do desmentido feito por mim em Rompendo o Siléncio, liyro editado em margo de 1987. A verdade sufocada - 29 Coincidentemente, com a repercussio desse livro, “Rosa” calou-se. A sua mudez desde entdo, embora excepcionalmente reveladora, nunca foi conveni- entemente explicada. Em 2006, 0 assunto “abertura dos arquivos” retornou a baila, pois que interessava ao governo do PT desviar as atengGes do mar de lama dos “mensaldes”’, da corrupgao desenfreada, dos caixas-dois, das compras de cons- ciéncias, das mentiras cfnicas dos dirigentes de um partido que se diz campeao da ética e da moralidade, afrontando a inteligéncia de todos nés ao afirmarem nada saber acerca de toda essa sujeira. Para eles, urgia mudar 0 rumo dos noticidrios e fazer a mfdia, que tanto os fustigou em 2005, buscar de novo no passado o veio do seu sensacionalismo. Afastado José Dirceu do cenario, assumiu o papel de “preferida do rei” a ministra chefe da Casa Civil, Dilma Vana Rousseff - a “Estela”, “Luiza”, “Patricia”, ou “Wanda’’-, dos tempos de militante das organiza- gGes clandestinas subversivo-terroristas POLOP (Politica Operaria), COLINA (Comando de Libertagao Nacional) e VAR-Palmares (Vanguarda Armada Revolucionaria Palmares). A atual ministra passou a ser dona dos rumos dos “arquivos da ditadura’”” € prometeu abri-los, a partir de 2006, para mostrar ao mundo os “horrores do regime dos generz omprometendo-se a resguardar os anistiados “com- batentes da liberdade”, omitindo as suas agdes criminosas, sob 0 argumento de preserva-los, j4 que hoje foram promovidos a herdis nacionais. E essa a isengdo de quem esta no poder e que se inclui no rol dos protegidos. Mais uma vez, a anistia é para um so lado. Por fim, procuro mostrar como agiam “os jovens estudantes”, alguns hoje recebendo vultosas indenizagOes e altos saldrios pela “‘perseguigao” que a ditadura lhes impés. Pretendo deixar bem claro, como a revolugdo comunista vinha sendo preparada e como as cabegas dos nossos jovens vinham sendo amoldadas, desde antes de 1935, ano da Intentona Comunista. E isto que eu sei e é disto que resulta a abertura dos meus arquivos. Lupes Ustra: minha primeira motivacao ideoldgica Nasci na cidade de Santa Maria, interior do Rio Grande do Sul, numa épo- ca em que os meios de comunicagao eram precarios. As estradas até Santa Maria eram de terra, os telefones mal funcionavam. Minha mae, Cacilda Brilhante Ustra, dona-de-casa, dedicava-se 4 criagao e educagao dos quatro filhos. Era uma mulher maravilhosa, amiga e carinhosa que se esforgou muito para que meu pai pudesse trabalhar e estudar com tran- qililidade. Meu pai, Célio Martins Ustra, funcionario dos Corteios e Telégra- fos, estudava e trabalhava para manter a familia. Quando fiz trés anos, ele con- cluiu o que, hoje, chamamos de segundo grau. No ano seguinte, no dia em que meu irmio Renato nasceu, ele pegou 0 “noturno” e, viajando num vagao de passagciros de 2* classe, foi a Porto Alegre prestar vestibular para a Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Aprovado, cinco anos mais tarde era bacharel em Direito. Foi nessa luta ardua, mas cheia de vit6rias, que meus pais conseguiram formar os quatro filhos. Minha irma, Gléucia Ustra Soares, formou-se em Farmacia pela Universi- dade Federal de Santa Maria, onde, apds o curso, fez parte do corpo docente até se aposentar. Nunca parou de estudar. Até hoje, continua fazendo cursos em Sao Paulo, Rio de Janeiro e Porto Alegre, procurando sempre se atualizare se uperfeigoar na técnica da manipulagao de medicamentos e na fabricagao de cosméticos, produzidos nas suas conceituadas Farmacias Nova Derme, sediadas em Santa Maria. Meu irmao Renato Brilhante Ustra formou-se pela Academia Militar das Agulhas Negras. Como oficial do Exército, fez os cursos de Para-quedismo, Educagao Fisica, Aperfeigoamento de Oficiais, Estado-Maior, Superior de Guerra e comandou a Escola de Educagao Fisica do Exército. Oirmao cagula, José Augusto Brilhante Ustra, seguiu 0 exemplo de nosso pai e formou-se em Direito pela Universidade Federal de Santa Maria. Como professor de Direito daquela universidade, foi designado para a Casa de Rui Barbosa, no Rio de Janeiro. Ao dirigir-se para essa cidade, um acidente na BR -116 tirou-Ihe a vida. Sua morte prematura interrompeu uma brilhante carreira. Era reconhecido por seus alunos e colegas como um professor ex- tremamente competente. Escreveu livros sobre Direito Tributario. Meu pai estava sempre ds voltas com seus estudos, com 0 Correio e com suas Causats, Mas, nas horas vagas, falava-nos de sua vida e, pelo exemplo, 1a sedimentando nosso carter 32- Carlos Alberto Brilhante Ustra Encantavam-me as historias contadas por ele, entre elas a sua participagao e de um seu irmao, Lupes, na “Grande Marcha” ou “Coluna Prestes”, como ficou conhecida. Um grupo de militares, entre eles Miguel Costa, Pinheiro Machado, Siqueira Campos, Juarez Tavora, Osvaldo Cordeiro de Farias e Luis Carlos Prestes, cheio de sonhos de reformar o Brasil, marchou de nortea sul do Pais, com suas fileiras engrossando em cada local que passava. Jovens, sempre idealistas, ade- riam a marcha e seguiam certos de que seriam “herdis ¢ salvadores da Patria”. Contava meu pai que, ainda solteiro, servia no 5° Regimento de Cavalaria, em Uruguaiana, como soldado. Junto com ele prestava servigo 0 seu irmao Lupes Ustra. Ambos, jovens idealistas, aderiram 4 Grande Marcha que, segun- do seus lideres, salvaria 0 Pais e traria melhores condigées sociais para 0 povo. Os dois eram inseparaveis. Nos combates estavam sempre lado a lado. Certo dia, meu pai, doente com pneumonia, ficou na retaguarda e meu tio Lupes pros- seguiu na vanguarda. Acabou morto em combate com a Brigada Militar - a Policia Militar do Rio Grande do Sul, por tradigao, chama-se Brigada Militar - -no dia 24 de margo de 1925, por uma rajada de metralhadora, longe de casa, na regio de Maria Preta, numa densa floresta ao sul do Parana. Meu pai, sempre se lamentava de nao estar naquele dia ao lado do irmao. Aspasia Camargo e Walder de Gées, no livro Meio século de combate, didlogo com Cordeiro de Farias, relatam como Cordeiro de Farias descreve esse combate: u havia mandado quase todo 0 meu Destacamento para Bar- racao, retendo comigo uns 80 homens para sustentar aquela posi- ao em Maria Preta com uma tropa mais agil. Derrubamos arvo- res ¢ fizemos trincheiras. Vi quando a tropa do Claudino Nunes Pereira atravessava 0 Rio Maria Preta e marchou em nossa dire- ¢ao. Fomos atacadi resistimos o quanto pudemos. Em Maria Preta, o companheiro, que atirava com o unico fuzil-metralhador que possuiamos, caiu morto por cima de mim. Todo ensangiienta- do, Peguei sua arma e passei a atirar.” Meu pai procurou, junto aos militares da Brigada Militar, que haviam parti- cipado desse combate, localizar a regiao onde ele morreu. Segundo esses mili- tares, aps 0 combate, Lupes Ustra foi encontrado morto, tendo ao seu lado um outro soldado, cujo nome nunca conseguimos apurar. Eles morreram en- quanto protegiam a retirada de seus companheiros Em homenagem aos dois soldados que, segundo o pessoal da Brigada Mi- litar, morreram como herdis, os sepultaram lado a lado, junto aos dois coquei- A verdade sufocada - 33 ros que haviam derrubado e que serviram como trincheira. Marcaram cada sepultura com uma cruz. Tempos depois, Prestes asilou-se na Argentina aderiu ao comunismo. A revolta de meu pai foi grande. O tio Lupes morreraem vao. Das conversas mantidas com 0 pessoal da Brigada, meu pai fez um croquis que permitiu, 20 anos depois daquele combate, encontrar o local onde os cor- pos foram enterrados. Ele foi até 14 com um outro ex-soldado, que também participara da coluna. Retiraram os restos mortais do tio Lupes e do seu com- panheiro e os levaram para Santa Maria. Estao no tamulo da nossa familia, no Cemitério Municipal. Essas historias povoaram meus sonhos de menino, com a cabega repleta de aventuras. Comegou af, creio eu, a minha motivagao de ser militar. Em 1949, com dezesseis anos, ingressei na Escola Preparatoria de Cade- tes de Porto Alegre, a querida EPPA. Em 25 de agosto desse mesmo ano, numa emocionante formatura no Parque da Redengiio, com os olhos cheios de lagrimas. fiz o Juramento a Bandeira Nacional com outros cem colegas do primeiro ano. ; Nesse dia, recebi de minha mae uma significativa carta, que me emociona até hoje e que a seguir transcrevo. O Dia do Soldado (Dedicado ao meu filho Carlos Alberto) Em todo o Brasil se comemora em 25 de agosto o Dia do Soldado. Nesse dia, desde muito cedo despertei com 0 toque de alvora- da. Sentia alguma coisa diferente, uma sensagio estranha, ¢ 0 meu coragdo vibrava com mais forga. Passei sonhando, imagi- nando e com o pensamento distante. Imaginava a hora do hasteamento da bandeira, a concentra- ¢Go, o juramento & bandeira e o desfile dos soldados pelas ruas Assim, passei toda a manha de 25 de agosto. Alguém ha de dizer: por que serd que esta mulher hoje sonha e esta com o pensamento voltado para longe? Eis a resposta: € que nesse dia, longe daqui, tenho um filho que esti jurando & bandeira e, desde esta data, ele sera um dos soldados do nosso querido Brasil 34- Carlos Alberto Brilhante Ustra Nao sei se todos os coragées de mie sentem a mesma sensa- nesse dia, mas acredito que todas sentem o mesmo orgulho no dia em que véemos seus filhos marchando com garbosidade, como soldados. Foi por isso que passei toda a manhd com o meu pensamento voltado para a Escola Preparatéria de Porto Alegre, ali onde esta- va o meu filho, com o seu uniforme de gala, ao lado de seus cole- gas, jurando 4 bandeira. Nessa escola. onde estio se preparando Para serem os futuros oficiais do nosso Exército Brasileiro. Na véspera, li nos jornais o programa da festa, o lugar da con- centragdo, 0 juramento e o desfile pelas ruas. Entio, no pensa- mento, eu Via direitinho e, meu coracao palpitava, em ansias, por nao poder estar presente, vendo de perto. Como muitas mies, sentia nao poder homenaged-los com uma s no intimo sentia muito mais. Agora, preparam-se para a Semana da Patria, e pego a Deus que me dé essa grande bénciio de estar presente nesse dia, dando a minha salva de palmas ao ver desfilando os alunos da Escola de Cadetes, onde estao 0 meu filho e mais de 300 mogos, bem jovens, mog¢os que esperamos sejam Os nossos futuros generais € o orgu- Iho do querido Exército Brasileiro. Iva de palmas, m Oxald, Deus me abengoe e, nao sé eu, como muitas mies também possam nesse dia prestar essa homenagem a seus filhos. Tua mae, Cacilda. Santa Maria, 25 de agosto de 1949. Em Porto Alegre, comecei a me inteirar melhor das coisas. Vivia numa capital, longe da “corte”, mas era uma capital. As estradas e as comunica- ¢6es no Brasil ainda eram muito precarias. As noticias chegavam pelo radio ou, atrasadas, pelos jomais, mas chegavam. Pela primeira vez, comecei a ler e ouvir alguma coisa sobre politica e ai compreendi a revolta de meu pai Soube, com detalhes, que Luis Carlos Prestes - por um periodo, idolo de meu pai e de meu tio Lupes - chefiara em 1935 a Intentona Comunista, quando varios quartéis foram atacados. Mais de 30 militares, além de cen- tenas de civis, foram mortos de forma traigoeira, muitos enquanto dormiam. Passei o restante da minha adolescéncia em Porto Alegre e de 14 me trans- feri para Resende/RJ, como cadete da Academia Militar das Agulhas Negras (AMAN). Trés anos depois, em 1954, seria declarado aspirante e a saudade do Rio Grande me levou de volta a Santa Maria, para servir no Regimento A verdade sufocada - 35 Mallet. As estradas de Porto Alegre a Santa Maria continuavam de terra e as comunicagGes péssimas. Hoje, depois de tantos anos, pensando em meu pai, e depois de minha vivéncia no combate a subversao e ao terrorismo, imagino como tantos jovens jogaram suas vidas fora, desde aquela época, fanatizados, sem saber, por uma ideologia estrangeira. Lutando contra irmaos, pensando que seriam herdis © que salvariam a Patria, como meu tio Lupes imaginava. Hoje, herdis so os que os usaram e os levaram a morte. Esses “herdis” continuam vivos €, muito vivos, distorcem a histéria, tirando proveito dos fatos para fazer fortuna, conquistar o poder e dominar 0 Estado. , Vejo em meu tio Lupes Ustra ena Grande Marcha as mais remotas motiva- ges que fundamentam as minhas convicgdes ideolégicas.

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