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Tecnocontroles Da Subjetividade
Tecnocontroles Da Subjetividade
RESUMO
1
Cientista social, mestrando pelo Programa de Ciências Sociais da UFRN (PPgCS-UFRN) e membro do
Núcleo de Estudos Críticos em Subjetividades Contemporâneas (NUECS-UFRN) e do Grupo de Pesquisa
Saúde, Gênero, Trabalho e Meio Ambiente (SAGMA-UFRN) Email: kelvis_nascimento@hotmail.com
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Jornalista, mestre pelo Programa de Pós-graduação em Estudos da Mídia da UFRN (PPgEM-UFRN) e
membro do Núcleo Interdisciplinar Tirésias de Estudos em Gênero, Diversidade Sexual e Direitos Humanos
da UFRN. Desenvolve pesquisas sobre mídia, corpo, gênero e sexualidade. E-mail:
allysonjornalista@hotmail.com
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Cientista social, mestrando pelo Programa de Ciências Sociais da UFRN (PPgCS-UFRN)
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Professora doutora do departamento de Ciências Sociais – UFRN. Coordenadora do Grupo de Pesquisa
Saúde, Gênero, Trabalho e Meio Ambiente (SAGMA-UFRN)
INTRODUÇÃO
Maria Elvira Díaz, no seu livro “Nas redes do sexo: os bastidores do pornô
brasileiro” de 2010, demonstra como nossa herança colonial escravocrata personificou o
negro e sua sexualidade em torno do que seria proibido, amoral.
Nossa historiografia, a partir dos anos 1930, traz profundos estudos de como o
Brasil se constituiu em relação aos povos múltiplos que aqui encontraram abrigo. O povo
africano, extraído à força de sua terra e trazido em navios para serem vendidos aos
grandes fazendeiros brancos, são um caso particular em que a repressão e submissão
respingam em seus descendentes até os dias atuais.
Muitas africanas conseguiram impor respeito dos brancos; umas, pelo temor
inspirado por suas mandingas; outras, como as Minas, pelos seus quindins e
pela sua finura de mulher [...] Situação de ‘caseiras” e “concumbinas” dos
brancos; e não exclusivamente de animais engordados nas senzalas para gozo
físico dos senhores e aumento do seu capital-homem (FREYRE, 2006, p 516)
Freyre conta que as próprias condições sociais nos antigos engenhos, rapazes
rodeados da “mulata fácil”, podem explicar essa disposição sexual dos senhores brancos
pelas negras. Freyre chega a comentar episódios onde essa preferência se tornava fixação
e homens brancos que só conseguiam obter prazer com mulheres negras, como o caso do
jovem de família escravocrata do Sul que “para excitar-se diante da noiva branca
precisou, nas primeiras noites de casado, de levar para a alcova a camisa úmida de suor,
impregnada de bodum, da escrava negra sua amante” (FREYRE, 2006. p 368).
Eles não podem, por conseguinte, fazer face à competição com trabalhadores
brancos, especialmente os de oriegem europeias, a sibstituição populacional
adquire, para eles, um sentido estrito e impiedoso. Portanto, a pauperização o
negro e do mulato na cidade de São Paulo possui traços específicos. Ela decorre
da degradação que ambos sofreram com a perda do monopólio de serviços e
sua eclusão concomitante [...] Trata-se, em suma, de uma pobreza associada
que à privação, em larga escala,de fontes regulares de ganho e de sustento, que
à adaptaão inevitável a ocupações flutuantes, descontínuas e infimamente
retribuídas. Uma pobreza que tendia, em bloco, para a miséria, da qual se
separava por muros quase imperceptíveis, invariavelmente tênues e instáveis,
se existissem de fato. Realisticamente falando, ‘a miséria rondava a pobreza’
do negro e do mulato. A distinão entre as duas era sutíl, sustentando-se em
precários envolvimentos nosistema de trabalho e na ânsia incontida,
compartilhada desigualmente, de não ser considerado ‘dependente’ ‘inválido’
ou ‘desgraçado’. (FERNANDES, 2008, p. 270 e 271).
Nossa sociedade ainda está repleta desse imaginário que por um lado restringe e
subjuga o negro em contextos sociais, por outro utiliza-o num viés mercadológico para
apresentá-lo como, por exemplo, as mulatas no carnaval “tipo exportação”, os homens
negros no futebol e até mesmo no mercado audiovisual pornográfico. Em se tratando da
produção de filmes pornográficos, o mercado se vale desse imaginário social instituído e
reforça os estereótipos cristalizados em nossa sociedade desde a colônia. O sexo proibido
e violento característico das narrativas interraciais, são reproduzidos em estúdios pornôs
no mundo todo, no Brasil, isso não é diferente.
No Brasil atual, as condições de vida dos negros pouco mudou. De certo que não
são mais escravos, mas ainda permanecem envoltos por uma maquinaria de poder5 que o
preserva em condições sociais desfavoráveis.
A pornografia está repleta de certa racialização do desejo, uma vez que investe
pesado na produção de filmes com temáticas interraciais e com características de sexo
amador, ou seja, a naturalização da cena, geralmente com poucos recursos, faz com que
o ambiente retratado lembre as experiências comuns e diárias que podem passar as
pessoas. As relações de poder são visíveis nessa produção de filmes, o interdito das raças
e suas classes sociais é acentuado nas cenas para dar mais veracidade ao enredo.
5
Maquinarias do poder aos moldes foucaultianos que representam as estruturas capilares que dominam os
corpos dóceis através de uma subjugação sutil, mas eficaz. Sobre poder em Foucault ler (1979); (2008).
pobre da periferia ou favela (RAPISARDI & MODARELLI, 2001:
GIRALDO, ARIAS &REYES, 2007 apud: PINHO, 2012 p, 164)
Os efeitos dessa captura das subjetividades podem ser sentidas, por exemplo, no
imaginário social do “cafuçu”6. Ou seja, a masculinidade do homem negro coisificada e
transformada em mercadoria de barganha onde favores sexuais são trocados por favores
financeiros. E é justamente esse estereótipo o principal alvo das produções fílmicas
pornográficas na internet. Abaixo, alguns exemplos disso.
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Neologismo criado no Brasil, para adjetivar os homens mais rudes, de baixa renda, e que geralmente
moram nas periferias das cidades. Se vestem com roupas esportivas, de modo simples e largadão.
Geralmente trabalham em coisas que não exigem muito estudo, ou são malandros e não gostam de trabalhar.
Adoram ficar com a mulherada, mas devido a falta de grana, acabam fazendo "favores" ficando com gays
em troca de cigarros, bebidas ou uns trocados, e no final acabam gostando da coisa, e alguns até querem
ser o macho fixo de algum gay em troca de uma "vida boa". Extraído de
http://www.dicionarioinformal.com.br/cafuçu/
Figura 01 e 02: Site da produtora Brazilian Boys, 2017.
Figura 03: Site da produtora Clair Procution, 2017.
Considerações Finais
Seu corpo continua sendo fetichizado por estereótipos que persistem em nossa
sociedade. A mulata “tipo exportação”, o cafuçu desejado apenas para contato sexual,
mas nunca para trânsito em meio social, entre outros. O homem negro e gay sofre ainda
mais, seu corpo só pode assumir uma performance que é a virilidade e
hipermasculinidade, não sendo assim, é prontamente desprezado e subjugado pela
homofobia e o racismo.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BENÍTEZ, Maria Elvira Díaz. Nas redes do sexo: os bastidores do pornô brasileiro. Rio
de Janeiro: Zahar, 2010.
FOUCAULT, Michel. Microfísica do poder. Organização e tradução de Roberto
Machado. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1979
______. Vigiar e punir: nascimento da prisão. Tradução de Raquel Ramalhete. 35. ed.
Petrópolis: Vozes, 2008.
FREYRE, Gilberto. Casa Grande & Senzala: formação da família brasileira sob o
regime da economia patriarcal. . São Paulo: Global. (2006).
PINHO, Osmundo. Race Fucker: representações raciais na pornografia gay. Cad. Pagu
[online]. 2012, n.38, pp.159-195. ISSN 1809-4449. http://dx.doi.org/10.1590/S0104-
83332012000100006