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77%, a — ~~ = off Tr > 4) = fit PU Quando micro-organismos capazes de causar alguma doenga invadem o corpo humano, nos- SUS CUL ER aCe MCU CRS ae Lee SD ‘inimigos’. Entre os componentes desse sistema estao os neutrdfilos, células sanguineas en- Tan cee cere ects filos usavam dois processos para matar os.micro-organismos, mas agora uma terceira estra- Doe ON UNC aS SC ee PERC CC UES Coc Pre eC CU MSOSRLCO CSU SE Er RCS CREE OAT SSUES ss Pon oer oe DO eee Bey Se eee eet eg eee acer ee ay an evtvcunae Armadilhas geradas por neutrofilos prendem e matam micro-organismos sangue contém varias células encarre- gadas de combater os micro-organismos que invadem 0 organismo. Entre elas /) sstio os neutréfiles, as eélulas brancas // (também chamadas de globulos brancos) G ‘mais numerosas no sangue. Os neutréfilos sdo rapidamente recrutados pelo sistema de defesa para atuar em locais onde ocorre uma infla- magao e/ou infeccao, por causa de sua grande capacidade de migrar para esses locais ou para onde esto micro- -organismos. A principal caracteristica dessas células é um micleo —local onde é armazenado o material genético (DNA) - diviciido em trés partes ligadas por filamentos nucleares (figura 1). Par isso, afirma-se que os neutréfilos sG0 polimorfonucleares, termo que significa um miicleo com muitas (poli) formas (‘mofo’) Além disso, 0s neutréfilos tém no citoplasma um gran- de mimero de granulos (os pontas, na figura 2) que servem para armazenar grande variedade de moléculas capazes de matar micro-organismos (fungao microbicida). Segun- doo conhecimento traclicional, essas células brancas de~ sempenham seu papel mictobicida por meio de dois me- canismos: a) a fagocitose, que consiste na entrada de micro-organismos do meio externo para o interior da cé- lula, onde so destruidos; e b) a degranulacdo, que con- SoD siste na liberago dos granulos contidos em seu citoplas- ma, para que as proteinas microbicidas ali guardadas atuem sobre os agentes infecciosos presentes no local da inflamacao. Uma evidéncia da importancia dessas células de defesa é 0 aumento de infecgées recorrentes em in- dividuos que sofrem de neutropenia (baixa quantidade de neutréfilos no sangue) ou tém neutréfilos com ago microbicida atenuada. Recentemente, no entanto, foi demonstrado que os neutréfilos também podem destruir micro-organismos usando uma terceira estratégia, diferente da fagocitose € da degranulacao. Esse novo mecanismo é intrigante, pois, envolve a liberacio do DNA e de proteinas do miicleo (as, histonas, responséveis pelo suporte estrutural do proprio DNA), além de diversas outras proteinas com proprieda- des microbicidas (que podem estar nos granulos ou dis- ‘A. Ocontato entre a Leishmania (emazu) e oneutrdia (om amarelo) desencaseiauma série de transformagées nessasclulas osistema imunoogien| B. iniciaimente, o nicieo do neutréfite perde sua ‘rma caracteristica, com ts lobuos, eadguire _aparéciaarredondada. A seguir, a membrana ‘Go icleo se rompe, prmitindo que ocontedo ruclear se misture as conteds do ctoplasma Figura 1. Os neutrilos, reconhecidos por seu nicleodividido em {tes partes, sao células brancas presentes no sangue e importantes ‘componentes o sistema de defesa do corpo humano persas no citoplasma). O que chama a atencao é que 0 DNA eas proteinas dao origem a uma estrutura em for- ma de rede, batizada com o nome de NET (sigla da ex- pressdo neutrophil extracellular traps, ou seja, ‘armadilhas — ou redes ~ extracelulares de neutréfilos’). Nessa estratégia de combate alternativa, a estrutura gerada pelo DNA e pelas proteinas serve como uma ar- ‘maditha para aprisionar micro-organismos invasores, co- ‘mo bactérias, fungos e protozoérios. Em resumo, a fun- ‘cdo dessas redes & prender e confinar os agentes causa- dores de doencas, evitando sua disseminacao pelo corpo € permitindo, ao mesmo tempo, a ago conjunta ¢ loca zada das diversas proteinas microbicidas associadas a esas estruturas. Formagao das redes Para que as armadilhas (NETS) se formem, 6 necessério 0 contato entre o micro- -organismo e os neutréfilos. Esse contato desencadeia alteragdes nas caracteristicas dessas células e seu micleo perde a aparéncia caracteristica, tormando-se uma tinica estrutura arredondada e central. A seguir ocorre a mistura do DNA do miicleo com af proteinas dos granulos e esse material é expelido para o ambiente extracelular com 0 rompimento da membrana, evento que provoca a morte C. Por itimo, ocorre © rompimento ta membrana externa d neutréie com sso, so iberadas as redesestracelulares qu prendem ematam os parasites ‘eds grnuloseistentes nessa cluta de detesa = Figura 2. Aformagao de armadi >> Figura 4. Leishmania indicada pela seta) presa em uma rede extraceluarprodurida por neutflos, em imagem obtida com micrascpin eletrinico de varredura contato com a Leishmania, as redes sur- iam, e que o aumento da proporcéo de protozoérios, em relagao as células de defesa, implicava a formagao de mais re~ des. Essa indugo eo aprisionamento dos parasitas nas redes foram observados por diferentes metodologias de microscopia. Em uma delas, foram usadas substin- cias que emitem cor quando se ligam aos constituintes das NETs: 0 DNA aparece na cor azul, as histonas em vermelho e a elastase (proteina caracteristica dos gra- nnulos dos neutréfilos) em verde (figura 3). As imagens permitiram observar os parasitos associados as armadilhas. O uso de um microsc6pio eletrénico especial (denominado ‘de varredura'), capaz. de mostrar a superficie de células, permitiu observar uma rede induzida por Leishma rnia com um desses parasitos aprisionado (igura 4), © passo seguinte foi investigar se as NETs causavam a morte do parasito. Para isso, as redes foram tratadas com uma enzima capaz de romper 0 DNA (chamada DNase) e assim desfazer as armadilhas. Os resultados indicaram que as redes no s6 aprisionam, como também matam a Leishmania, pois a aplicagao da DNase desfez as redes e isso diminuiu a morte dos para sitos. Vale notar que, quando as redes foram degradadas com DNase e, ao mesmo tempo, os neutréfilos foram tra- tados com citocalasina D, substéncia que inibe a fagoci- tose, a sobrevivencia dos parasitos foi trés vezes maior do que na auséncia desses tratamentos. Dugas Fee eu processo de autodestrugdo de céluas, que ocorre em con- Se eee cut as células do nosso corpo. Quando ja cumpriram suas fun- Ce ee See eee ee Se Cue ad necrose é um tipa de morte que ocorre com orompimento da Pee etc rere] Sa eee De eee en eco 24 uewn 81285 Esses resultados demonstraram que ambos os meca nismos dle combate aos parasitos (fagocitose e netose) so importantes para provocar a morte da Leishmania. Noen- tanto, ainda era preciso explicar comoas NETs matavam as, Leishmanias, jé que o aprisionamento fisico dos parasites nio poderia, por si s6, explicar sua morte. Para investigar os mecanismos microbicidas das armadilhas, avaliamos 0 papel de proteinas presentes nessas estruturas, como as histonas. Pesquisas anteriores j4 haviam demonstrado que as histonas eram as responsdveis pela morte de varias espécies de bactérias aprisionadas em NETs, enquanto a proteina calprotectina (também associada a essas redes) era a responsével pela morte de fungos. Nossa pesquisa constatou que as Leishmanias sao mor- tas, principalmente, pelas histonas presentes nas NETS, pois quando as redes foram tratadas com um anticorpo que neutraliza o eféito dessas moléculas, a sobrevivéncia dos parasitos aumentou mesmo na presenga de reds in- tegras. Para ter certeza do efeito t6xico das histonas para a Leishmania, tratamos os parasitos diretamente com his- tona purificada, na presenca de substéncias que coram as células mortas de vermelho e as vivas de verde (figura 5), € confirmamos que os protozodrios expostos a histo- nas morrem. Esse conjunto de resultados demonstrou os efeitos téxicos das histonas. Fisiologicamente, 0 papel das NETs foi evidenciado em outras pesquisas, que revelaram a abundancia dessas redes em locais de infeccéo, como na apendicite humana espontinea, na infeccéo por bactérias (como Shigella, Streptococcus e Pneumococcuis) e em infecgdes causadas por fungos (como Candida e Aspergillus). Essas armadilhas também jé foram observadas em doencas nao infecciosas, como pré-eclampsia humana, hipus eritematoso e em casos de vasculites autoimunes (inflamacao dos vasos sanguineos sem a presenga de um micro-organismo). Com relacao aos protozodiios, foram encontradas NETS no sangue de ctiangas infectadas com Plasmodium, pro- tozoario causador da maléria. E nosso estudo demonstrou a presenca dessas redes em pacientes com leishmaniose: elas foram encontradas em andlises de pequenos frag- mentos de tecido (bidpsias) provenientes de lesdes na pele de individuos com essa doenca. Todos esses resultados sugerem que essas armadilhas tém um papel importante no desenvolvimento da doenga, o que nos estimula a con- tinuar e aprofundar mais esse estudo. Figura 5. Estudo realizado em nosso aboratri,utlzando histonas isoladas, demonstrou que essas proteinas séocapazes de matar protazoaios do género Leishmania. As imagens mastram parasites Vivos (em verde) e morts (em laranja e amarelo) Novas diividas e desafios « tcishmaniose ¢ um problema de satide publica para todosos paises em desen- volvimento localizados em regides tropicais e subtropicais, como Brasil, india, Bangladesh, Nepal, Sudao e outros. Para agravar o quadro, o tratamento €é dificil, caro e provo- ‘camuitos efeitos colaterais, Ainda no existem vacinas para prevenir essa doenga. A Organizacao Mundial da Satide (OMS) inclui as leishmanioses no quadro das doengas negligenciadas (as que recebem pouca atencao de gover- nos da indiistria de medicamnentos) ¢ estima que cerca de 12 milhdes de pessoas estejam infectadas por esses para- sitos em todoo mundo. Esses fatos indicam a importancia de pesquisar e en- tender a complexa interagdo entre a Leishmania e seus hospedeiros. Esses estudos permitirao a descoberta de informagées titeis para a busca de medicamentos e tra- tamentos mais eficazes, ou de marcadores de prognéstico para esse grupo de doencas. Os resultados que obtivemos nessa etapa inicial de investigacdo sobre o papel das NETs na infeccao pelo protozoario Leishmania geraram varias novas diividas sobre as implicacdes fisioldgicas desse mecanismo de defesa no desenvolvimento das leishmanioses. Os desa- fios, agora, sio desvendar os processos bioquimicos que regulam a formacdo dessas redes e determinar como elas influenciam a resposta do sistema imunoldgico contra a Leishmania. Nosso objetivo é compreender esses me- canismos e também estudar possiveis estratégias para sua manipulacao, de forma a obter resultados mais efeti- vos no tratamento das leishmanioses Sugestdes para leitura BRINKMANN, V; REICHARD, U; COOSMANK, Ce outos. Neutrophil extracellular tras kil bacteria’ em Scene, v. 303, p. 1532, 2004, FUCHS, T.A; ABED, U; GOOSMANN, C. outros. ‘Navel cll death program leads to neutrophil extracellr traps’ em The Journal of Cell Biology, v.16, p. 281, 2007, ‘GUIMARAES-COSTA, A.B; NASCIMENTO, MT; FROMENT, 6, S.: SOARES, RP; MORGADO, FN; CONCEIGAO-SLVA Fe SARAIVA, EM “Leishmania amazonensis promastigtes induce and are killed by neuropil ‘tracellular taps, em Procedings of the Nationa Academy of Sciences PNAS) v. 106, p, 6.748, 2008 PAPAYANNOPOULOS,V, ZYCHLINSKY, A. "NETS: a new strategy or using ‘ld weapons”, em Tends io immunology, v.30, p. 513,200. VON KOCKRTTZ-BLICKWEDE, M,eNZET, inate immunity tuned inside-out antimicrobial defense by phagoyte extracellular traps em urna of Molecular Medicine, v. 87(8),p. 75, 2008, APL foes call oly etre ciforst’, Nature Mews one 21022007 ~ ganna con/nens/2007/070205Malin070208-14n 25 STMHRO 701 REM 35

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