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Abebê - Um objeto nascente da cabaça

No amplo e diverso conjunto de objetos usuais nas religiões de origem africana eem outras
processadas em âmbito afro-brasileiro, há destaque especial para a cabaça, enquanto objeto e
símbolo pluralmente interpretado e visíveis nos templos, nos santuários, e nas cozinhas entre
outros espaços. A cabaça forma instrumentos musicais, como aguê e o afoxé, contempla o
berimbau-de-barriga ou, ainda, é referencia ao xere - chocalho de Xango, peça que emite sons
característicos e que chama os Orixás nos candomblés, notadamente os nagos. Acabaça
imemorialmente representa a barriga - útero, a sexualidade feminina e todo emanente dessa
simbolização, - marcando desenho volumoso, sempre lembrando um estado de gravidez -
repertório constante da vida e sua procriação, para os homens e os deuses. O abebê é objeto
yorubá - condicionamento ao amplo imaginário referente a cabaça, constituindo-se num
emblema das Yas, que são as mães ancestrais, divindades das águas, relacionadas com a vida e
a morte.Tanto em espaço africano, em pólos de coexistência histórica e religiosa dos Orixás e
Voduns na Nigéria e Benin, como em núcleos de manutenção dessahistoria no Brasil,
notadamente no candomblé e no xangô, há objetos rituais elitúrgicos evidentemente
masculinos e femininos e uma terceira categoria, para os andrógenos. O abebê inclui-se entre
os femininos e andrógenos. Geralmente, objetos masculinos são verticais, eretos,
expressivamente fálicos como os apá-ogô de Exu, ferros de assentamentos de Ogum, Oxosse,
Ossãe, Erinlé, entre outros santos machos como são chamados pelo povo do santo. Para as
santas fêmeas, são guardadas as formas arredondadas, comparadas à anatomia da mulher -
seios, nádegas e barriga, onde novamente se referem à cabaça - útero fortemente ligadas a
laços ancestrais e formuladores do gênese do mundo e dos homens. São meias cabaças para
os assentamentos e abebês como insígnias de Oxum e Yemanjá. Oxalufã, na sua interpretação
essencialmente nàgó, porta o opaxoro e um abebê que marcam o caráter andrógeno do Orixá
da criação, símbolos gerais dos Orixás funfun (brancos). O abebê é identificação imediata das
Yas, popularmente chamadas e conhecidas como as mães d'água
Diz o costume que os abebês de Oxum são dourados, em latão, até em ouro, recebendo de
seus construtores trabalhos elaboradíssimos, revelando aspectos identificadores do Orixás
mais vaidoso, as água doces, yalode - a grande senhora. Abebê - do yorubá, leque - leque em
diferentes metais, mantendo o formato arredondado, decorado por marcheteamento, incisos,
ampliações e pendantis, geralmente em metal. O tamanho médio de um abebê gira em torno
de 30 cm de altura e 15 cm de largura, podendo nos candomblés acrescido de laços de fitas em
cetim e nas cores dos Orixás: amarelo e rosa pra Oxum; azul e verde paraYemanjá. Os abebês
compõem assentamentos nos santuários pejis - especialmente no candomblé e no xangô. São
vistos também em miniatura na composição dos ibás- conjunto de louças, peças em metal e
otás (pedras) que fazem os assentamentos dos Orixás, Voduns e Inkices. Os abebês são peças
indispensáveis nas roupas cerimoniais, sendo emblema marcante e identificador de Oxum e
Yemanjá. Os abebês poderão ser complementados com outras ferramentas, como o alfanje e o
ademata - arco e seta, representando as qualidades das Santas -características mitológicas.
Abebês recentes feitos em papelão e cobertos de tecidos e lantejoulas ou ainda com detalhes
em canutilhos e metalóide, são francamente consumidos pelos terreiros, ocupando as mesmas
funções dos objetos convencionais, em diferentes folhas metálicas. O abebê pode também ser
interpretado enquanto um objeto emissor de sons -instrumento musical não formal
quando exibe elementos complementares, como guizos, pendantis em latão, búzios entre
outros. Durante as danças rituais de Oxum, segundo modelo gexá, o abebê é usado e
mostrado com diferentes finalidades e, assim, emite sons característicos que se unem aos dos
atabaques, afoxés e agogôs. Alem do abebê marcar visualmente as Yas, ha o uso feminino dos
leques à européias também integrados as montagens simbólicas nos santuários, convivendo
com os demais objetos de uso e representação nitidamente afro-brasileiro. Alguns casos
especiais são incluídos neste âmbito de abanos - abebês -, são os feitos em pele, couro e
estrutura de metal, couro e detalhamento em búzios. No Benin, o ezuzu é um abano circular
em pele, couro e cabo em madeira. O ezuzu expressa o poder social da mulher - distingue
rainhas - mães e amplia seus domínios ao âmbito religioso - relativamente uma insígnia, como
o bastão, para a representação do poder masculino. Diferentes soluções plásticas e
destinações de abebês são documentadas nos livros catálogos sobre as mais importantes
coleções afro-brasileiras existentes no país, destacando as do Instituto Histórico e Geográfico
de Alagoas, do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia, do Museu do Estado de Pernambuco
e Museu Arthur Ramos. Próximo à casa do presente, no Rio Vermelho, Salvador, Bahia, ve-se
esculturas representando uma sereia em cimento armado sexual, segundo concepções
imemoriais da mulher - peixe, no caso afro-brasileiro uma das formas usuais das Yas, para os
candomblés e os xangôs. As Yabás exibem um abebê que se projeta por sobre o mar -
referencias dos Orixás das águas, símbolo da fertilidade e das mães ancestrais.
Transcrito do livro - O Povo do Santo - de Raul Lody

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