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Cormioirr © 2017 Geshard Richter ‘Totunomtoneae Thoughesmages: Frankfurt School Writes’ Reflections fram. “Damaged Life, Stanford Caiversity Pess ~ Stanford, California, 2007 CConctnt on reanecto © 2017 Fablo Akcelrud Dario ‘Coonnexacko worroruat: Valenti Pactoli ‘Cara x pxosero africa bo 1010: AntOnio do Amaral Rocha [Riswso: Thiago Valentim Janeiro Contciais Margarida Congo Foro mica Retato de Stesited Kise, 190, Schiller Natonalmuseu und Destsche [tecture petri ease % Boe CIP-BRASIL, CATALOGACAONA PUBLICAGAO a SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DELIVROS, cm a leo | TA | SNES nate ston des de Ponte vi Be ee seca Date tad" Soa Roel, > a 5 EB ae yo ‘radu de: Thought-Inages: Frankf Scho! Weiter’ Reflections from Damage Life Tye [ig tomnsecatd be ISBN: 978-85-T751-116-7 s : Fa se 2 Litre Dat, Ato 1 be 2 ES |Fegow coves : cou elas ia Roe soserads ete pe Editorial Rie pbRingucta, 240, anda, con 809 Beni “o1620-060 - Sto Paulo = SP ~ Beat ‘Teo. i) 8106-7567, 8105-0261 e (LL 8104-7038 ‘waankscombe an peas nn ext GERHARD RICHTER, IMAGENS DE PENSAMENTO Reflexdes dos escritores da Escola de Frankfiurt a partir da vida danificada ‘Traducdo de Fabio Akcelrud Durao SUMARIO Agradecimentos.. son ee oD Paleonomias da imagem-pensamento: uma introdug20.. voll Cantevio 1 ‘Uma questio de distancia: A Rua de mio inica de Benjamin por meio das Passagens 58 Cavtreto2 Ossonho de Bloch, vestigios de misica. Cavfruo3 Imagens sem lar: a extraterritorialidade de Kracauer, ‘© monolinguismo do outro, de Derrida... 125 Cantranos Nazismo e Dialética negativa: O Hitler de Adorno nas Minima moralia.. 71 Coda 1221 Pir Lexi fiir spater “Os otimistas escrevem mal." (Valéry) Mas os pessimistas nfo eserevem. Maunace Beavctor, escritado desastre O conceito de Verstchen, entendiment interpretative, fo pode ser apica- do sem mais aum texto herméteo, Exsencial tal texto o chaque com o qual violentamentsinterompe a comunicagio, A rsp lide inntligibilidade que tal obra jogana diregio do eitor toma suspeit a intligibilidadecomiqueira como sendo ds habitual, reiicada em suma ré-artistica “Tyeo00K W. AnoRND, "Pressponigdes,em Notas de tran magens-pensamento (Denkbilder) nfo so imagens como os mitos platO- nicos da caverna ou carruagem. Ao invés, io retratos rabiscados como puzzle, levocagses parabélicas de algo que nfo pode ser dito em palavras (des in Worten Unsagbaren). Querem menos parar 0 pensamento conceitval da que chocar por ‘meio de sua forma enigmtica e assim fazer mover-se 0 pensamento, porque 0 Pensamento em sua forma conceitual tradicional parece rigido, convencional eultrapassado. Aquilo que ndo pode ser provado no estilo usual eno entanto 6 perempt6rio isso deve desencadear a espontaneidade e energia do pensamento ¢, sem ser tomado literalmente, gerar fafscas por meio de um ipo de custo cuito intelectual que langa uma luz repentina no familiar, talver.inflamando-o. “Tuzooon W. Aponwo, “Rua de mao tnica de Walter Benjamin’ fem Notas de literatura AGRADECIMENTOS ostatia de registrar minha gratidii aqueles amigos e coleges que, gen- tilmente, reagiram aos capitulos que compdem este estudo: Klaus L. ‘Berghahn, Fritz Breithaupt, Stanley Comgold, Alex Dittmann, Peter Fenves, ‘Michale Jennings, Dirk Oschmann,e Liliane Weissberg. Também agradego @ eter Uwe Hohendahl e aos participantes de um col6quio na Comell Univer- sity, no qual apresentel uma primeira versfio do material sobre Adomo. Sou pat- jclarmente grato.a Rodolphe Gasché, Jost Hermand ¢ Martin Jay, que leu todo ‘omanuserito ¢ compartilhou comigo seus valioses pensamentos. Pitblicos Académicos em Amsterdam, Atenas, Atlanta, Berkeley, Bonn, Buf- falo, Davis, Hartford, Irvine, Ithaca, Los Angeles, Madison, Minncapolis, New ‘Orleans, New York, Philadelphia, San Diego, San Juan (Porto Rico), State College, Stony Brook e Washington, D.C. pacientemente ouviram meus argu- rmentes sobre a Escole de Frankfurt nos Gltimos anos, Agradego a meus anf twides ¢ interlocutores nessas ocasides, e posso apenas esperar que sua hospi talidade, generosidade intelectual e exatidio de espirito tenham deixado ves- tigios nestas pina. ‘A pesquisa ea escrita deste livre foram amparadas por um generoso aut lio do Dean's Office do College of Letters and Science da Universidade da Ca- lifmia em Davis, bem como de um H. I. Romnes Faculty Research Award do ‘Wisconsin Alumni Research Foundation, um Vila Associate Reasearch Award dos trustees do Willaim F, Vilas Estate, e vérios auxilios para pesquisa durante 1s férias de vero concedidos pelo Rescarch Committe ofthe Graduate Schoo! {da Universidade de Wisconsin, Madison. Um sébatico na Universidade de Kéin permitin que me dedicasse exclusivamente a este projeto por um semestre em 0 Gere CHTER HAGENS DE PENSANENTO 2004, enquanto uma bolsa do Andrew W. Mellon Foundation (2004-5) possibi- titou-me codirigir um seraindrio multidisciplinar de um ano sobre ‘Theodor W. ‘Adorno para alunos e professores promovido pelo Center forthe Humanities da Universidade de Wisconsin, Esse seminério foi um forum revigorante para tes- ar ideias apresentadas neste livt. Sou grato a0 Schiller-Nationslmuseum ¢ Deutsches Literaturarchiv em ‘Matbach am Neckar por sua generosidade em disponibilizar uma versio im- pressa dos cacos remanescentes da chapa de vidro da fotografia de 1930 de ‘Siegfried Krakauer, que éreprodurida na capa deste livro eno capftuio 3. Chris- toph Kinig, do Deutsches Literaturarchiv, agora professor na Universit ‘Osnabriick, estendeu sua cordial hospitalidade durante minha visita a Marbach ‘em 2004, ornecendo-me acesso a documentos raros — alguns no publicados —de Adomo, Benjamin e Krakauer, ‘Quero também agradecer a Norris Pope, da Stanford University Press, por seu entusiasmado apoio a meu projeto, bem como a Carolyn Brown, Emily-Jane Cohen, ¢ Barbara Norton por seus esforgos para que o proceso de publicagio c’chegasse apropriadamente a seu térmiino. Por fim, gostaria de dar o meu muito obrigado ts seguintes editoras por per- ‘mitirem 0 uso de partes ou versbes de textos meus que vieram a pablico ante- riormente: “O sonho de Bloch, vestigios de misica”, Sound Figures of Moder- nity: German Music and Philosophy, ed. Jost Hermand e Gerhard Richter (Ma- dlison: University of Wisconsin, 2006), “Nationalsozialismus und Negative Dialektik in Adornos Minima moralia”, in Gerhard Richter, Asthetik des Ereig. nisses: Sprache ~ Geschichte - Medium (Munique: Fink, 2005). Uma versio in glesa desta aparacen em Unmasking Hitler: Cultural Representations of Hitler from the Weimar Republic to the Present, ed. Klaus L, Berghahn ¢ Jost Herman (Oxford: Lang, 2005), ¢ “Uma questio de distincia: a Rua de mdo tnica de ‘Benjamin por meio das Passagens” também foi inclu{do em Walter Benjamin and The Arcades Project, ed, Beatrice Hanssen (London: Continuum, 2006). San Francisco, East Bay abril de 2006 PALEONOMIAS DA IMAGEM-PENSAMENTO Uma introducao A Escola de Frankfurt ¢ a imagem-pensamento ‘ma paleonomia, como explica Jacques Derrida, é “a manutengio de um rome antigo para se Iangar um conceito novo”! Bstendendo essa obser- ‘vagio, poderiamos dizer que todo o engajamento sério com conceitos estéticos « filoséficos requeica alguma forma de articulagzo paleondmica, Na escrita ‘moderna, exemplos-chave incluem a critica de Kant; a ironia de Friedrich ‘Schlegel; 0 sistema de Hegel; aideologia de Marx; a genealogia de Nietzsche; inconselentelde Freud; lei de Katka; 0 Ser de Heidegger; 0 gesto de Brecht; ‘0 real de Lacan; o auror de Foucault; 0 Outro de L&vinas; a escrita de Derri- «da; a alegoria de de Man; 0 espetdculo de Debord. Em todos 0s cas08, 0 gesto paleondmico exige que se esteja, a0 mesmo tempo, dentro ¢ fora de uma tra- ddigdo, perpetuando-a enquanto se rompe com ela, e rompendo com ela 20 perpetus-l. reser odes reer o pagoda freauetemente negligeciado do Denkbild — “imagem da reflexo”, ou, simplesmente, “expen cepsest epino uma paledmome ao examinar 0s textos flo sbfieas € Wterdrios de uma constelago de amigos e colegas associados aquilo ue ficou conhecido como a Escola de Frankfurt de Teoria Crtica: Theodor W, Adorno, Walter Benjamin, Siegfried Krakauer, e, mais indiretamente, Ernst Bloch, Profundamente ligados, por relagdes pessoais ¢ intelectuais, uns aos T Taegues Deda, Positions, sd. Alan Bas (Chicago: Univesity of Chicago Press, 1982), PT 2 Ce¥HARD RICHTER HAGENS OF PENSAMENTO outros € ao projeto da Teoria Crstica, esses importantes escritores judeus ale- mis escolheram estrategicamente o género menor do Denkbild porque pertence Aqueles fendmenos especulativos eestéticos aparentemente marginais que, sob um olhar mais euidadoso, surgem como avenidas secretas da imaginago cr tica. Denkbilder nfo sao tratados programéticos, nem manifestagdes objetivas de um espiritohistérico; nem ficgdes fantasiosas, nem meras reflexBes acerca da realidade, Ao invés, as miniaturas do Denkbild podem ser entendidas como ‘engajamentos conceitaais com 0 estético e como engajamentos estéticos com o conceitual, prando entre a etica filoséfica e a ioeststicea. O Denk- bild codifica uma forma poética da escrita condensada, epigramética em ins- tantineos textuais,iluminando-se como meditagdes pungentes que, via de re- ‘ra, focalizam um detalhe ou t6pico marginal, normalmente sem um enredo ou ‘um agenda narrativa obrigat6ria no entanto carcegados de intuigdes teéricas. (0 Denkbild era um objeto tho forte de preocupasio desses autores porque cele reconfigura a relagto entre as categories conceituais e estéticas, entre a fi- Josofia e a arte, nfo apenas tematizando, mas também enconando a dificulda- ‘de que Adomo dingnostica na Teoria estética que organiza tanto seus préprios Denkbilder quanto aqueles de seus amigos, em torno de um ntcleo comum, & saber que “a arte necessita da filosofia que a interpreta para dizer aquilo queesta no pode dizer, enquanto a are s6 & capaz de dizer o que diz ao nto dizé-1o:* [A pritica do Denkbild representa uma resposta duradoura e obsessiva 8s exi- _géncias rigorosas desse axiom. "Ao conftontar a inseriglo material da I6gica eda poética por meio da figu- ra do Dentbild, pretendo ler Adorno, Benjamin, Bloch e Kracauer no somen= te como fildsofos e crticas culturais, mas como escritores. Minha pressuposi- ‘go de base é a de que muito do que é mais valioso nesses autores, e que os liga ‘como um grupo de pensadores que estilo atentos para a natureza da escrita, 6 visto de que aquilo que dizem ndo pode ser pensado isoladamente de como 0 dizem, que qualquer teorde verdade que sua escrita possa conterinvariavelmen- te estaréassociado e mediado por suas figuras especificas¢ potencialmente ins- téveis de pensamento, Em sua produgdo escrita, cada um deles responde, im- plicita ou explicitamente, & famosa metéfora da metéfora de Nietzsche: “O que 6.entlo, averdade? Um batalhdo mével de metéforas, metonfmiss, antropomor- fismos, eofim, uma soma de relagses humanas, que foram enfatizadas postica ¢ retoricamente, transpostas, enfeitadas, ¢ que, ap6s longo uso, parecem a um. 3 "Thador W. Adorno, Aesthetic Theor tad. Robert Hullot Kentor (Minneapolis: Uni- ‘etsy of Minnesota Press, 1997), p. 72; Asteische Theorie, vol. 7 dos Gesammtelte Sehritensed. Rolf Tedemaan (Prenkfur am Main: Sbrkarp, 1997p. 113.Doravante tlevid "AT", com a paginas da radugo para o ings ei primeio lugar seguide ‘da mumerago do origins alemzo, ALEONOWAS DA MAGEI-PERSAENTO: Una nadie ® ovo sélidas, canénicas, obrigatérias; as verdades so ilusbes, das quais se es- quecen que o si." Assim como 6 0 caso com o batalhio mével de tropos de Nietzsche, os ropos do Denkbild insistem que qualquer verdade, mesmo a ver- dade da existEncia da nio-verdade, pode apenas ser aleangada levando-se em consideragio a metéfora da metifora a figura da figura. Dessa oDenk- bpd mosceseepontvel eaa des emt um ca qs eons CE TT cng we oon Te teas rehatathee splice escrtores¢ lé-os primordialmente como escritores significa também proble- matizar a propria nogio de uma Escola de Frankfurt homogénes e contida em siimesma, Esse nome refere-sefrouxamente hoje aos membros do Instituto de Pesquisa Social, fundado por Felix Weil em Frankfurt, em 1924, para ser um centro de pesquisa progressstainterdisciplinar,e o nome nf era normalmen- te utilizado por seus proprios membros. Os principas historiadores da Escola de Frankfurt, Martin Jay e Rolf Wiggershaus, eseavaram as citcunstincias com- plexas sob as quais 0 rtulo “Escola de Frankfurt” foi retroativamenteaplica- do, comegando nos anos 50, aeste grupo de pensadores e escritores, todas cles envolvidos no projto de elaborar uma critica cultural ideolégico-filossfica que tomava as ideias politias, epistemol¥gicasepsicanalticas de Marx, Nietzsche, Freud tio seriamente quanto as estéticas, moras e hist6ricas de Kant e Hegel. “Mas possivel, em tltima instinca realmente “ler” uma “escola”? Ela é urna entidade homogénea que posse ser capturada por tempo suficiente para que ppossamos fazer generalizagdes sobre ela? Ou cla nao seria pelo contrério, uma rede de uma rca textura de vestigios heterogéneos e singularidades? Esc ade- rnominagio “Escola de Frankfurt” privilegia a localizacto geosréfica de uma cidade alemi, 0s nomes préprios de Nova York, Los Angeles, Berlim, e mes- ‘mo Paris ndo desemperltam um papel tio importante na hist6ria complexe do agrupo de deslocaynento, sxUine sstatertrilidade? A Escola de Frankfurt de- veria estar satisfeta de considerar-se uma escola ou no seria o caso de ela dei- xar de ser, no instante de tal designago, uma escola dedicada wo pensamento transformador ¢ crftco permanentements.em fluxo? Talvez. Escola de Frank 3” Feedich Nietzsche, "From: On Truth and Li nan Exra-Moral Sense”, in The Portable Dietesche, ed. e tad, Walter Kaufmann (New York: Penguin, 1982), p. 42-47; “Uber ‘Wahrheit und Lige im austermoralischen Sia”, in Kridsche Studionauspabe, ed, Giorgio Cole Mazzino Mortinar, vo. 1 (Munique: Deutscher Taschenbuch Verlag, € ‘Berlim: de Gruyter, 1999), p 813-897, Martin ay, The Dialectica! Imagination: A History ofthe Frankfurt School and the Inatinte of Social Research, 1923-1950 Boston: Lite Brown). c Ralf Wiggeeshovs, Die Frankfurter Schule: Geschichte Theoretische Enovicklng,Poisce Bedeutung (Mu ‘igue: Detecher Taschenbuch Verlag, 1991). ——— ll —————————— “ GRID RICHTER - WAGERS OF PENSAMENTO furt possa permanecer fiel, como uma escola, a seus objetivos de transforma- «80 somente quando no mais for uma escola, endo for aescola caracterizada por néo poder ser uma escola, uma escola ser escola. Da perspectiva de tal re= flexi, devemos abandonar quaisquer nogbes pré-concebidas ou apropriagoes politicas e permitir que o termo Escola de Frankfurt rearticule-se segundo as linhas de uma leitura cuidadosa e investigativa de textos singulares e espect 0s produzidos em sua 6rbita. Gostaria, assim, de propor que o Denkbild ofe- rece uma oportunidade frutffera para essa reconsideracio. Meu uso do termo “Escola de Frankfurt", portanto, também merece ser lido como uma paleono~ ‘mia, a conservagdo de um nome antigo para um novo conceito. ‘Uma dimensiio dessa mobilizago paleonOmica do temo “Escola de Frank furt" envolve minha escolha de escritores inclufdos neste estudo. Ao basear-se no engajamento especifico com 0 Denkbild postico, ele nfo aborda a obra de eseritores importantes associados, mais ou menos intimamente, coma primeira ‘geracto da Escola de Frankfurt, membros daquilo que & época era charmado de Instituto de Pesquisa Social, tais como sen diretor, Max Horkheimer, ou Erich Fromm, Ovo Kirchheimer, Leo Lowenthal, Herbert Marcuse, Franz Neumann, Friedrich Pollack, Karl August Witfogel ¢ muitos outros Mesmo dentre 0 escritores que selecionei, 2s relagdes com o Instituto ndo sfo de forma alguma homogéneas, Embora Adomo, especialmente devido a sua ligago com Hor- Ikheimer, pertenga ao cfteulo mais interno do grupo ~ com efeito, 0 livro que cescreveram juntos, Dialética do esclarecimento (1947) tomou-se um dos mais ‘canonicamente associados & Escola de Frenkfurt—outros escritores, como Kra- ccauer, pertenciam a esse grupo em um sentido mais periférico e indireto, ape- sar da importincia vital de sua obra para as formulagdes tedricas do grupo. Além disso, Bloch, que nunca pertenceu ao Instituto ou 8 Escola de Frankfurt oficial- ‘mente, mantinh relagGes profundamente intrincadas com varios de seus mem- ‘bros. Ele foi um importante mentor para os jovens Adorno, Benjamin, Kracaver ‘outros na Escola de Frankfurt, e sua obra desdobrava-se em um didlogo cons- tante com aquela produzia por seus membros. Ha correspondéncias importantes entre Bloch ¢ varios participantes do gru- (pO, eno € um acidente que tanto Adorno quanto Benjamin considerassem 5 “Denne estes afliados Escola de Frankfurt, fi prncipalmente Max Horkheimer quem ‘ambsrarabalho com Dentilder. Sob o pseadnimo de “Heintich Regias” publicos Daimmerang: Noticen in Deutschland conn uma editora sfga em 1934. Ess cole, ‘menos plida epeticemente eliza do que as de tvs amigos ecolegastratadss aqui storda temas socoldgics que viram a oeuparo nicl és preocupaybes da Teria C= ticada Escola de Fraakfurt,inclindo uma rites a0 exptalisme esas formas de cons cieneiaburgosa. Cf. Max Horkheimer,Dinonerang: Notizen in Deuschland, vol. dos Gesanmeite Schriften, ed. Gunzelin Schmid Noert Frankfurt am Main: Subriamp, 1987, p. 308-452, PALEONOMIAS DA AGEN PENSAMENTO: Ura oct 8 0 espirito da utopia (1918) uma obra formativa no desenvolvimento intelec- tual de ambos. Boch, por sua vez, produzin seu livro de Denkbilder, Spuren [Vestgios} (1930), no contexto de discuss6es frequentes com Benjamin durante ‘© perfodo no qual este ttimo estava compondo seu préprio livro de Denkbil der, Rua de méo nica (1928), uma pubicagio que Bloch também resenhou para uma revista. Outs vinculos entre Bloch e esses escritores foram forjados ‘or suas contribuigbes revista do Instituto de Pesquisa Social, 0 Zeitschrif ir Soziaforschung,¢0 conve que ecebeu de Horkheimer, Adomo outros mem- bros do Instituto, no final dos anos 30, para participar de um volume coletivo sobre quests e teoras do materialismo.* Ao inclu Bloch nesta constelagfo, «estou menos nteessado em realizar um gesto de hst6ra intelectual revisionsta «do que em permit que os Denkbilder de Bloch iluminem e sejam iluminados pelos projetosintelectusis daqueles eseritores que compuseram uma parte tio importante de sua 6bita de esrita, Ao fazé-o, estou de acordo com ohistoria- dor das ideias Wiggershans, il6sofo Eduardo Mendieta e o germanista Jack Zines, que defendem uma inclusto ampla no cireulo da Escola de Frankfurt de escritores como Bloch e Kracaver, ue eram aliados pessoaiseinteletuais de ‘membros do Instituto sem jamais terem participado oficialmente dele. Por cexemplo, 0 sentimento de Wiggershaus em sua histéria da Fscola de Frankfurt Godeque as obras desses colegs, especialmente as de Bloch, Benjemin, Kra- cauer ¢ Adorno, esto inseparavelmente entelagadas ao compartlhar 0 gesto do pensamento mierol6gico: Essa hist6ria, que circunstincias externas tornaram extremamente desi- ‘gual, sugére que nZo seria adequado entender o termo “Escola de Frankfurt” por demais esteitamente, Duas consideragSes adicionais confirmam-no: pri- ‘meiramente,ofato de que Horkheimer, a “figura carismética”,assumia uma pposicdo cada vez. menos decisiva, o que, consequentemente, ndo era propf- para a formagao de uma escola; em segundo lugar, héa seguintecircuns- ‘fneia relacionada a essa. Quando se observa as quatro décadas da Escola dde Frankfurt em sus totalidade, ndo se encontra o desenvolvimento de um pparadigma unificado, nem uma mudanga de paradigma que pudesse acomo- dar tudo aquilo que ver 4 mente quando se fala da Escola de Frankfurt. AS ‘duas figuras principais, Horkheimer e Adorno, tbalhavam temas comuns ‘partir de perspectivas diferentes... Adamo representava um pensamento ‘7 Baora lvo planejado nunc tenho sido realizado, Bloch expandix sua contibuiglo 20 projeo em seu estdo Das Moterialismusproblen: Seine Geschichte und Substan, primeirament puicado om 1972, Hoje, 60 volume 7 de sua Werkausgabe (Frankfurt, fm Main: Subekamp, 1985). 6 {GERARD RLCHTER~ NAGINS DE FENSAMENTO microldgico-messifinico que o igavaesteitamente a Walter Benjamin, que, devido a seus esforgos, péde publicar no Zeitschrift fr Sozialforschung & finalmente tomnar-se um membzo do Instituto de Pesquisa Social, assim como Siegfried Kracauer¢ Ernst Bloch.” Fé assim que Wiggershaus desenvolve essa imbricagdo em outro texto: Por mais que possa ser dito que Kracauer nfo pertenceu a chamada Escola ‘de Frankfurt, ele no entanto pertence, junto com seus mais importantes re- presontantes, a uma constclagio comum. Ela é composta por Ernst Bloch, ‘Siegfried Kracauer, Walter Benjamin, Theodor W. Adorno e Max Horkhei ‘mer. O que faz de todos eles elementos na mesma constelagio € que podem ser entendidos como materialistaseriticos cujo materialismo foi moldado ‘por motives teol6gicos, ou acolheu motivos teol6gicos dentro de si. [..J A ‘combinagao de artigo, ensaio¢ livro; a combinagao de notas, aforismos ¢ ‘obras ocasionais com forma de montagem ou enciclopédica; a inclusto de formas literérias no espectro de apresentagao e 0 uso de meios literirios apropriados ao objetivo em contextas filos6fico-teéricos: tudo isso era uma expressio da tentaiva de combinar um espectro sensorial que se abria an plamente para a experiéncia contemporsnea com um pensamento filos6f- coe teérica que resistia dossificagto.® Indo na mesma dirego, Zipes lembra que enquanto “Bloch nunca tena re- ‘cebido a atengio critica que a Escola de Frankturt recebeu’”, ¢ importante no~ tar que “ele possufa muito em comum com seus membros, especialmente Walter Benjamin.” E, mais recentemente, Mendieta inclu textos de Bloch em uma antologia que seleciona as principais declaragOes da Escola de Frankfurt sobre arelagio entre religigo e erftiea, lembrando-nos que a obra de Bloch “foi de FWiggershaus, Die Frankfurter Schule. 1 1 Rolf Wiggershaus, "Bin abfrundefe Realist: Siegfied Kracauer, die Aktualisierung des ‘Marxists und das Inst flr Sovialforcchong in Stegried Kracauer: Neue Inter preteionen, ed. Michael Kesslere Thom Y, Levin (Tubingen: Stautfenburg, 1990), 284-95, » Sack Zipes, “Traces of Hope: The Nor-Syuchronicty of Est Bloch”, in Not Yer ‘Reconsidering Emit Bloch, lame Owen Dante Tors Moylan (Londres: Verso, 1997), I-12 Para una consierapéoarespeita do para de fundo contra o qual as preocupagses eeséncusdo jovem Blot edo jovem Benjamin gradualmentefndram-s em uma Teo- fia Critica da Esco de Frankfurt of. Anson Rebinbach, "Between Apocalypse and Eali- ‘shenmerts Benjamin, loch, nd Modern German Jewish Messin Inthe Shadow {Of Caasrophe: German Intellectuals benwown Apocalypse and Enlightenment (Berkey University of Calforia Press, 1997), p. 2665. ‘PAEOKOMAS DA MAGEN-PENSAMENTO: Una oducto o ‘erminante pare o desenvolvimento do pensamento da Bscolade Frankfurt acer- ca dareligito, da eologia cdo judaismo", especialmente em vista dos clemen- tos messidnicos que & obra de Bloch constantementeinseria na negativiéade jrredutivel de Adorno," A guisa de exemplo, pademos lembrar que Benjamin esoreve a Ernst Schoen, jem 1919, que apesar de todas as eservas que guar da.em relagio a O espirito da utopia, de Bloch, ele “é 0 tnico liv [J diante do qual posso medi a mim mesmo." Adorno expressa a mesma visio muitos anos depois, quando escreve a respeito do mesmo texto: “O liv, o primeiro de Bloch, jé contendo em si toda sua obra posterior, pareseu-me uma prolon- sda rebel contra a rentincia no pensamento que se estende mesmo até seu caréter puramente formal. Antes de qualquer contetido filos6fico, adotei do ‘completamente esse motivo que nko creio jamais te escrito algo que no 0 ce Tebrasse, fose implicita on explictamente."? Jéna década 1930, época na qual ‘a maior parte dos Denkbilder abordados por estudo estava sendo composta, ‘Adorno confirma, diretamente, seu desejo de envolver Bloch no Instituto de Pesquisa Social. Escreve aele em 2de outubro de 1937: “como sabe, sou ag0- raummembro regular de ur insttato Internacional de Pesquise Social, 20 qual sempre estve estreitamente ligado por meio de minhe amizade com Max Horkeimer. [..] E desnecessério dizer que o restabelecimento de nosso conta- to pessoal 20 mesmo tempo traz consigo um aspecto material © factual {sachlich] Eno é menos evidente que gostaria de estender nosso conatoigual- ‘mente para o Ambito do Instituto.” Adorno conelui sua carta pedindo a Bloch, 1 quem se refere como “irmiio vermelio”, por e6pias de seus tiltimos manus- critose assegurando-Ihe de gue esté“intensamenteinteressado” em seus ta- balhos mais reeentes e que “Horkheimer, com quem me correspondi breveren- te arespeto disso, também nur uma grande afnidade por eles." Por fim, uma notével conversa radiofénica entre Bloch e Adorn a respeito das contradigBes {nteras no anseio ut6pico sublinha as maitas preacupagbes comuns ¢ coneor- TGF, a intodgso de Mendieta “Religion as Critique: Theology as Social Ceque and Enlightened Reason” ao vim Thed Franfur School on Religion: Key Writings by the Major Thinkers, ei. Elustdo Mendieta (Nest York: Routledge, 2005p. 1-17 ' Walter Benjamin, The Correspondence of Walter Benjamin, 1910-1940, tod. Mantied R. Jacobson eBvelyM. Jacobson (Chicago: University of Chicago Press, 1994). p 148; Gesammelte Briefe: Band I, 1919-1924, cd. Christoph Gédde e Heast Loni (Pe foram Main: Suirkamp, 1986), p46. "2 TEW-Adomo, "The Handle, the Po, and Barly Experience, in Notes to Literature, tad, Shiery W. Nicholien, vo. 2 (Nova Yor: Columbia University Press, 1992), p.211-219;, "Henkel, Krug und fe Eriahrung”, in Noten 2x Literatur, vl Il dos Gesammelte Schriften Frankfurt am Main: Sohekamp, 1997). 556-566. 1 Theodor W. Adorno, “Brief an Ems Bloeh,.10.1937",in Theodor W.Adomo und Max Horkhelmer:Brefuechsel, 1927-1969; vol. 1927-1937, ed. Christoph GBdde e Hen Cont (ankfrt mm Main: Subrkam, 2003), p, 336-538, Gh AHTER- AGEN DE PENSAMENTO Embora recusassem o espirito nacionalista ea atitude patritica que, por vezes, ceracterizava a perspoctiva primordialmente burgues® {e Simmel (Bloch chegou mesmo a repudiar seu professor devido aiss0),0ri~ ‘gor fenomenolégico e tedrico que Simmel trouxe &andlise microl6gica da cul- {ura dos objetos, fosse em sua investigacio dos encontros humanos cotidiaios com o rosto, ou em suas sutis leituras da légica cultural do dinheiro, como no Philosophie des Geldes (1900), permaneceu uma pedra de toque para seus ami- ‘g0s. Afinal de contas, seus projetos também eram o de ler determinados fend- ‘menos de superficie da modernidade como cifras de processos culturais © po- liticos mais profundos. ‘© Denkbild, como coneebido por esse grupo de amigos, & um texto em prosa breve, aforfstica, tipicamente variando entre algumas poucas sentengas © um per 7 Ginst Bloch “Something's Missing: Discussion between Ernst Bloch and Theodor W. ‘Adorn on the Contaditions of Utopian Longing”. The Utopia Function of Art and Literature: Selected Essays, ted Jak Zipes¢ Fratke Mecklenburg (Carbrige MA: MIT Press, 1988), p,[-17, “Blwas fehlt.: Uber die Wiederspriche der uropschen Sehnsuch; Ein Rundfunkgespch mit Theodor W. Adorn”, in Tendenz-Latens-Utopie, Soupimento ao Werkangabe (Frankf: am Main: Subrkamp, 1985), p. 350268, 1s Kataner em particular dedicou ros ensios livros ao peassmento de Simmel, O mais Iimpotante Gente eles € urea monografa qe foi publiesda um ano depois da morte de Simmel, Georg Simmel: Ein Beirag eat Deutung des gestign Lebens unserer Zeit (1919), bem come Sociclogie als Wissenschaft (1922), um io que se basa em ums ands de Simmel e Mix Webee. PALEONOMAS DANAE PERSAENTD: Una ntadueso » de piginas que tanto ilumina quando explode as distingdes convencionais en- tre literatura, fllosofia, intervengio jornalistica e critica cultural. Como apro- priagdes criativas da tredigdo do emblema barroco e as versbes subsequentes do genero no século XVIIL, em Herder e outros, os Denkbilder modemistas, que ‘cram um meio predieto, no apenas para autores da Excola de Frankfurt, mas também para autores contemporineos como Karl Kraus, Robert Musil e Bertold Brecht, tendem a centrar-se na especificidade de um objeto do dia a dia, ou em ‘um fen6meno aparentemente negligencivel: um sonko, um paste de gasolina, ‘um comercial, um filme, uma sombra, um lobby de um hotel, um evento espor- tivo, estadas afetivos como o tédio, até mesmo o telefone ~ de forma a situar {ais objotos e fenémenos em uma constelayio nova e inesperada que possibi- lite que sejam dos eavaliadas como signos de uma semistica cultural mais am- pla. O Denkbild pode ser compreendido, para tomar uma frase emprestada de ‘Adorno, como uma inovadora “forms filos6fia (..] na qual espiito, imagem € linguagem estio intereonectadas". A forga fragmentéria, explosivae descen- tradora do Denkbild também f0j dtl a Adomo e seus amigos em sua Tuta con- creta e conceitual contra modos reacionsrios de coordenacto politica e cultu- ral que consttuiram a chamada revoluco conservadora na Alemanha nos anos de 1920 e 1930, um conjunto de tendéncias nacionalistas de direita associadas anomes como Oswald Spengler, Ernst Jnger, Arthur Moller van den Bruck, cEmst Von Salomon, Figurando a imagem de pensamento : ois exemplos podem nos fornecer uma ideia mais clara de algumas das tra- Jet6rias formais latentes no Denkbild, O primeico é uma das imagens de pen- ‘amento mais famosas que surgiu do corpus desse grupo de escritares, © anjo dda histdra que Benjamin evoca em suas teses sobre o conceito de historia. ‘segundo, também de Benjamin, 6 menos conbecido, mas atesta vigorosamen- ‘eo impulso formal desse modo de composigao. ‘Acélebre imagem do anjo constitu o eixo em tomno do qual se gira toda a constelagio de suas teses sobre a hist6ria, a saber, na nona de suas dezoito te- ses. Neste Denkbild, ele escreve: Hd.um quadro de Klee que se chama Angelus Novus. Representa um anjo {que parece querer afastar-se de algo que ele encara fixamente, Seus olhos esto escancarados, sua boca dilatada, suas asas abertas. O anjo da historia deve ter esse aspecto. [Der Engel der Geschichte up so aussehen,] Seu ros- toestidirigido para o passado, Onde nés vemos uma cadeia de acontecimen- Ey Geet RUCHTER~ MAGENS DE FERSANENTO tos, ele vé uma catéstrofe Gnica, que acumula incansavelmente ruina sobre rufna eas dispersa a nossos pés. Ble gostaria de deterse para acordar os mor- tose juntaros feagmentos. Mas uma tempestade sopra do paraiso e prende- se-em suas asas com tanta forga que ele ndo pode mais feché-las, Essa tem- pestade o impele iresistivelmente para o futuro, a0 qual ele via as costas, tenguanto o amontoado de ruias cresce até o céu, Essa tempestade 60 que ‘chamamos progresso."* Benjamin aul regisra seu dese geal de reconeituaizarahistrit, que cexvolve una ejeigd da ineardadebstoricit, um exploir estat date- Teologia do progreso, e uma mptura da temporaidade que resulta em um r0- mento revolucionarzinentechariscado de um “tempo-ugor”, na imagem do inj de Paul Klee-Dependendo de como sé a frase “eve ter esse aspecto", tse anjo um Angelus Norus~umnovoanjo~ porque imagem daguilo que Sncontecen, ou porque prefigure algo qo ands deverd aco Sea interpre {ado como ua simagao ou Como uma promessapedictva no texto de Ben- jamin o ajo de Kle reveste-e de uma frgaSgratva que prs s6, poderia Eatservero "aco poder messinica”e “abrir a port esteita keine Prt] pela qual o Messias pode entrar.”!” Benjamin epropria-se da imagem do anjo de Klee para uma reartculago do hstérico que allo entende o messianismo como un movimento histo concrto, nem como ums doutinarelgise mas como um engajsmento mais gral que erecus a desvencilharse da esperan- Garem relago a0 que anda est por vr, Para poder menter viva a promess da ponte, anjo dahistriaista-no “acuaropassaohistrcamente" fois de fechizara imager em Stra instnci sive, “do que realmente for" Areulro passa historcamente sige avarahistrckede de nossos bjs de ested de uma manera queos iu para além da eleologi do progres Soe dos grandiosos enunciads J histeriisme convenciondl. Do mesmo modo Heo adam ene ENG Oia do ax dehistra, “a VerONTia is fun do passa” de Benjamin “perpassa velo, “elampejlndo]iveversive- ‘mente no momento em que é reconhecidfa}.”"* O anjo da histéria apresenta-se ‘xaamence como uma imagem. Para Benjamin, esta ntangiiidae bist ca, sua estado entre uma afzmagfo e uma nega, corpocfca uma esperan- Ga police, Em certo nivel, todos os Denthlder comparham dsse movimes- ‘© Walter Benjamin, io Paulo: Brailiene, 1987. Magia etéonica arte politica, p. 226, Oper den BegnffderGeschitte” vl. 1 os Gesanmele Schriften, ed Rol Tiedemann Herman Sehsveppenhtaser Frinkfur am Main; uirkamp, 1991), p- 691-704, "Tid p- 390 397; p. 6940 708 8 Ibid, p. 3900p. 695. PALEONOMAS DAIWAGEN-PENSANENTO: Un todo n toestéticopolitco, mesmo quando as figuras ¢ imagens espectficas no corpus de ‘um autor permanecem, em cada caso, iredutivelmentesingulares. (0 segundo exemplo 6 um Dentbild inttulado, “O choque”, que Benjamin ncluiu na versio de 1938 de Infancia berlinense por volta de 1900: Oprimeiro armétio que se abriu por minha vontade foi ae6moda. Bas- tava puxar o puxador, ea porta, impelida pela mola, se soltava do fecho, Lé ‘dentro ficava guardada minha roupa, Mas entre todas as minhes camisas, calgas, coletes, que deviam estar ali e dos quais nfo sei mais, havi algo que no se perdeu e que fazia minha idaa este armério parecer sempre uma aven- tua atraente, Era preciso abrir caminho até os cantos mais recOnditos; en- ‘io deparava com minhas meias que ali jaziam amontoadas, enroladas ¢ do- ‘bradas na maneira tradicional, de sorte que cada par tinha o aspecto de um bolso. Nada superava o prazer de mergulhar a mio em seu interior to pro- fundamente quanto possivel. E nfo apenas pelo calor da If. Bra 0 “wazido Jjumto” (das Mitgebrachte}, enrolado naquele interior que eu sentia na mi ‘nha mo e que, desse modo, me atrafa para aquela profundeza. Quando en- cerravano punho econfirmava, tanto quanto possivel, a posse daquela massa save ¢ lanosa, comesava entao a segunda etapa da brincadeira que trazia ‘aempolgante revelagso. Pois agora me punha a desembrulhar‘o trazido jun- 10’ de seu bolso de Ii. Eu puxava cada vez mais proximo de mim até que se Cconsumasse 0 espantoso: 0 ‘trazido junto’ nha sido totalmente extratdo do seu bolso, porém este dltimo nfo estava mais 1. Nao me cansava de provat aquela verdade enigmitica: que a forma e 0 contetido, o envolt6rio eo envol- vido, 0 “iazido junto” eo bols0, eram uma tnica coisa ~ sem ddvida, uma terceira: aquela meia em que ambos haviam se convertido.” (1987, p. 45)? 0 Mitgebrachte, aquilo que foi trazido junto como um presente em um in- vélucro, nfo apenas no pode ser separado de seu suporte: ele ¢ esse suporte. Desenrolar a meia buscando seu nicleo interior equivale a faz8-la desaparecer, ‘mesmo quando ela incessantemente pede para ser desenrolada. Nossa tentati- vvade extrairo dom de um Denkbitd da Iingua que o traz para n6s leva-nos sem- pre A descoberta de que a lingua 6 0 dom. Nfo ha urn teor de verdade semdnti- 0, extratextual que pudesse ser escavado das fibras materials da retérica de um Denkbiid. Aprender com a forma lterdria do Dentbild 6, assim, aprender a partir de uma série potenciaimente aberta de significagves, que significam nfo ape- 7 Wl Desai, nia etn por ltd 10 "nando penne ras ecolidas de Walter Benjani, elo eeaoga0 Ge Tao Bare, Aino & Alvim, Lisboa, 2004, potions n GERARO RITE - MAGENS DE PENSANENTO nas 0.0 que, mas também o como da significacio, convertendo-se, com isso, €m alegorias das maneiras na quais conseguem e fracassam em dizer algo. Nesse sentido, todo Denkbild é uma meia, “Ainda que se aproxime de formas curtas ipicas da modernidade como 0 afo- rismo, o fragmento, a parébola ea maxima, o Dentbild poético-flos6fico possui «um deseavolvimento geneal6gico préprio. Nos anos de 1920, Benjamin foi 0 primeiro dentre seus colegas da Escola de Frankfurt a empregar 0 termo Denk- Dild para sua eserita, mesmo ainda que outros na mesma época estivessem es- crevendo nesse modo, Nessa formacio textual condensada, a prépria forma toma-se contedido,¢ a percepso de um objeto aparentemente trivial transfor- _ma-se, por meio de uma reflexo continuada, uma reflexdo teériea exemplar. ‘Benjaimin tinha conscigncia, devido a seu estudo sobre o drama barroco alemao ‘que deu origem & sua teoria da modernidade no livro do Traverspiel, que @ n0- ‘glo de Denkbitd remonta ao emblem barroco.® Com base no registro meticu- Tosamente anotado de Benjamin dos livros que liae das fontes para o estudo 60 ‘Trauerspiel, sabemos que ele inspirou-se pesadamente em volumes sobre 0 ‘emblema batroco de eseritores como Giovanni Piero Valeriano Bolzani, Diego ide Saavedra Fajardo, ¢ Julius Wilhelm Zinegref, e ue ele mobilizou as teorias do emblema de escritores como Franz Von Baader, Jacob Boehme, Karl Gietlow, e Georg Phillip Harsddrfer! O emblema barroco consistia de uma es- tratura tripartite: moto ou inseriptio (o titulo), {cone ou pictura (a imagem 60 objeto descrito), © epigrama ou subscriptio (0 comentario interpretativo). Aqui, asignificagdo singular e conereta da pictura 6a base para uma estratégiainter- pretativa que reconhece, no singular, um sentido mais universal e abstrato.#*(Os ‘curtos itlos epigraméticos que encabegam os Denkbilder de Rua de mio tniea ‘de Benjamin, tais como “Canteiro de obras”, “Para homens”, © “Oculista"; ou (08 das Minima moralia, de Adorno ~ tais como “Gato por lebre”, “Deitar fore ‘crianga com a dgua”, “Mesa e cama” ~ reencenam essa fungao do inscriptio ddo emblema barroco”). Ne arte barroca holandesa, também se encontra o ter- ‘mo denkbeeld, que se refere a uma apresentacio figural em um sentido amplo ‘ou & uma representagdo espectfica de uma ideia nfo-empfrica.? No século 37 No context do comego de seu desenvolvimento modern, Benjamin cits por exemplo, TLadwig Volknann,Bildrschrifen der Renaissance: Hieoplphi and Emblimatkin fren Becielurgen und Forirangen (Leipzig: Hiersemann, 1923). 21 Keconlie Kits "Walter Benjamin's Denkbid: Emblematic Historiography ofthe Recent ast”, Monatshafte 86, n 4 (1994),p. 514-524 2 Sabine Modersheim,“Ezblem,Embleratik’ in Histoviches Warterbuch der Rhetori ‘ol. 2,68, Gert Ueing (Tubingen: Niemeyer, 1994), p, 1098-1108. TRgui eno resto dessepardgratosigo a genealogia histrica do Dentbild desenvolvide por Eberhard Wiel Schl, "Zam Work Denki”, Wort und Zeit: Aufsee urd Moree tur Literaturgschichte (Neurtaster: Wachnoltz, 1968), p. 218-252, assim PALEONOWAS BA MAGEASPENSAMENTO: Un itrasupio a XVIII eseritores como Lessing, Goethe, Hamann, Winkelmann usaram oer ‘mo Denkbild em varios contextos filos6ficos, que cobriam uma variedade de sentidos, desde a cogniedo sensivel da forma d Ideia do eidos plat6nico, Win- kelmann, por exemplo, emprega.otermo ao lamentara superficialidade arbitré- ria da porcelana rocoes em favor do ressurgimento de formas mais “dignas” e bbanhadas didaticamente na antiguidade cléssica que, em seu julgamento, cons- titufam o nico Denki de proporgéies e qualidades realmente de valor. Heeder também emprega o termo Denkbild —embora utilize-o, pr vezes alternadamen- te, com o Sinnbild de inflextio kantiana, uma imagem sensfvel ou ideia alego- em sua discussfo da figuracdo simbélica no contexto de um classic! ‘mo germénico emergente e de um insisténcia na relago sensoriamente medig- ddacentre a intuigho (Anschawung)e a reflexio, ‘No século XTX, momentos importantes para o desenvolvimento do Denk- bild como viria ase cristalizar em Adorno, Benjamin, Bloch e Kracauer foram ‘rosa filosofica aforstica de Nietzsche e, em relagao ao tropo da urbanidade ‘eaanalise obsessiva dos fenémenos da cidade, a obra literiria de Baudelaire e sua “leitura” de Paris em termos daquilo que Benjarmin viria a chamar de capi tal do século XIX. Quando os escritoresalemies e austriacos do comego do sé- ‘culo XX e da Reptblica de Weimar, sis como George, Kraus, Musil, Brecht, mais do que ninguém, os membros da nascente Escola de Frankfurt, empre- _gavam 0 Denkbitd como wma forma literéria privilogiada, inscreviam-se em ‘uma tradiedo poética subterranea, ao mesmo tempo em que refuncionalizavam essa tradigdo para seus préprios fins estéticos ¢ filos6ficos. E da perspectiva dessa refuncionalizasto que Adorno escreve a espeito dos Denkbilder na Rua de méo inica\de Benjamin: No poema “Siebenten Ring”, no qual George expressa sua gratido & Franga, Mallarmé € louvado como tendo “fir sein Denkbild blutend,san- grado por sua ‘imagem de pensamento’. A palavra Denkbild, oriunda do ho- andes, substitu Idee, idea, deteriorada pelo uso; aqui entra em jogo uma concepeio de Platdo que é oposta ao neokantianismo, de acordo com a qual aideia nfo é uma mera representeeZo, mas algo que existe em si mesmo, que ppoderia ser contemplado, ainda que apenas espiritualmente, A expressio Denkbild foi veementemente atacada na resenha de Borchardt sobre George €eteve pouca sorte no alemio. Porém, assim como os livros, as palavras, das {uais so compostos, também possuem seu destino. Enquanto a germani- omg Haro Molle Michaels, Hesder: Denkbilde der Kultaren; Herder poctisces und Aidasisches Konzepe der Dentbider, in Natlonen und Kulturen: Zum 230. Geburtstag Joiann Gonfried Herders(Wisebirg: Kenaingshsusen & Neumann, 1996), p. 65-76. i u GERD RICHTER - MAGENS DE PENSANENTO zagio da ideia mostrava-se impotente perante a tradcto da ingua, impulso {quoinspirou anova palavra permaneceu ative, Rua de mao tnica, de Walter ‘Benjamin, publicado pela primeira vezem 1928, néo é como se poderia pen- sar’ primeira vista, um live de aforismos, mas uma colecdo de Denkbilder, ‘uma sé:e posterior de eurtas pogas em prosa de Benjamin que compartlhaen do espitto de Rua de mao tnica waz de ato 0 seu nome. O sentido da pa- Javra sem diivida alterou-se, O tnico elemento em comum entre ode George ‘co de Benjamin so justamente aquelas experiéacias que uma visto trivial ‘considera simplesmente como subjetivase foruitas, mas que adquirem ob- jetividade, com efeito, nas quais 0 subjetivo ¢ concebido como manifesta~ (fo de algo objetivo ~ os Denkbilder de Benjamin sio, portant, platénicos ‘apenas no sentido em que se pode falar do platonismo de Marcel Proust, com ‘euja obra Benjamin converge e nfo somente por ter sido seu tradutor, No centanto, as pesas de Benjamin de Rua de mio tinea nfo sio imagens como fos mitos platBnicos da caverna ou da carruagem. Sto, antes, quebra-cabe ‘as rabiscados, evocagdes como que em pardbolas do indizivel nas palavras| {des in Worten Unsagharen}, Nao desejam menos parar 0 pensamento con- ceitual do que chocar por meio de sua configuragio enigmatic ¢ assim por ‘em movimento o pensamento, porque em sua estrutura conceitual tradicional ‘ossificasse, aparecendo como convencional e envelhecido, Aquilo que nao pode ser provado em um estilo costumeiro e, no entanto, € pesemptsrio ‘deve esporear a espontancidade e energia do pensamento ¢, sem ser toma {do literalmente, gerar fagulhas por meio de um tipo de curto-circuito inte- Tectual, que iluraina repentinamenteo familiar, quando no The ateiafogo.™* Para Adomo, um Denkbild, que trabalha pars dizer em palavras aguilo gue ‘nko pode ser dito em palavra, fanga uma impossibilidade; com efeito, deseja fazer de tal impossibilidade seu prinefpio estruturante. Se em um dito faroso ‘Wittgenstein insiste que se deve silenciar a respeito daquilo que nfo se pode falar, o Denkbild procura falar somente sobre aquilo do que nao se pode falas Consequentemente, o Denkbild esforga-se para criar uma imagem (Bild) em palavras das maneiras nas quais diz-o que néo pode ser dito, E umm instant@neo ‘a impossibilidade de seus proprios gestos retéricos, Aquilo que nos faz pen ‘sor (denken) sfo justamente as formas nas quais se transmite uma imagem (Bild), nfo apenas deste ov duquele contesdo particular, mas sempre também {de seu préprio dobrar-se sobre si mesmo, eu fracasso mais bem sucedido. ‘TTheodor W. Adorno, “Benjamins Einbolsorae", em Noten zr Literatu, vo. 11 dos ‘Gesanmelie Sehrifen ed. Rolf Tiedemann (Frankfurt am Main: Suhrkamp, 1997p (680-685. PALEONOMIAS DA WAGEN-PENSANENTO: Ua taco 2 ‘Adorno situa nos Denkbilder de Benjamin um impulso enigmético que per- ‘passa os seus proprios, bem coma os dos seus amigos Bloch e Kracauer. A prosa poética do Denhild trabalha tanto com como contra o pensamento conceitual, permanecendo fiel ao conceito ao trai-o, iluminando resfduos da experigneia ‘a sorvigo de uma futuridade que esses resfduos possam ainda conter em si. O Denkbild quer comenter a respeito de sus prépria contingéncia, mesmo 20 es- forgarse para asseverar proposigdes de verdade que também desejam perma- necer desetreladas da contingéncia que elas mesimas diagnosticam, ‘As frases que o Denkbild nos dé. ler capturam o pensamento em uma ima- ‘gem composta de palavras. Cada frase, espectralmente em sia iluminagio apoditca, tematiza sua relagto niio-transparente para com as outras que aan- tecedem ¢ sucedem. A sentenca particular do Denkbild chama a atengio para si como sentenga para tematizar, ao envolver o leitor em um jogo sério eem uma Pré-hist6rias da imagem de pensamento [Em seu modo autoconsciente de escrite ede pensamento, 0 Denkbild espera ‘reservar algo da consciéneia poética que a prosa conceitual reprimiu a servi- {¢0 apenas da razio, Segundo o germanista Heinz Schlaffer, “o resto de poesia lirica que ainda edere d "Teoria Critica’ logra desdobrar-se no Debild”. > B jus- 3 Oatia questi bésea que merece ser explorad em releso is preocupagdes de Adorno referece diferenga Denkbilder Klangfiguren (figuras de som), un teamo diletoem ‘suas eflexses masioldgies, Poder-s-ainterrogarasignifcdnea de diferengaente {ima obafilossfica,em grande medide, nio-concetal, mas que no abandonatotslmen- {eo concstual ao seguir o modo visual-verbal do Dentbitd,e 9 modo auditério da [Rlonghgur As Klanghiguren de Adorno, ast, iam que ser elias nfo spenasem re- Jago 20 Denkbil, mas também em relagdo agilo que Benjamin, par quem as Klan- ighguren musicas no figuram proeminentemente, chama de “imagem alten”, 2 Heine Schllfer,"Dendbilder: ine klein Prosaorm zwischen Dichtung und Gesell Cchaftstheoie" om Poesle und Politik: Zur Situation de Lteratar in Deutschland, Wolfgang Kuttenkeole (Stttga: Kehtharamer, 1973). 137-154. Alem dos ensaios pionstos de SchlafereSchale,exploragbes Soldgicas mais reentes do Dentbildpo- etn ser encontrades, unto com exiensa ibliografias, ra Ralph Kohnen, ed. Denkbi der: Wondlungen itraischen und dtetischen Sprechens in der Moderne (Frat, fm Main: Pas Lang, 1996), Brita Leifeld, Daz DenBbild bel Walter Benjamin: Die tinsaghare Modeme ats denthare Bild (Frankfurt am Main: Peter Lang, 2000); Su Senne Kroche, Lennar Koch Ralph Kohnen, es. Lust ant Kanon: Denthider in i= {enatur und Unterricht (Prankfortam Main: PsterLang, 2003), » GERARD RICHTER - AGEN DE PENSANENTO tamente essa valorizagio da poesia —entendide no sentido extensivo de Poesie, 1 pritica estética mais ampla segundo a qual, desde os romanticos alemaes como Novalis, Tieck, Schlegel e Wackenroder, ¢ a filosofia idealista de Schelling e Hegel, o termo aponta para algo além da mera escrta ~ que 0s €5- critores do Denkbild desejam manter para seas prdprios projetos. No suxpee- cede, portant, que Adorno, na dedicet6ria que introduz seus Denkbilder, reu- ‘idos como Minima moralia expliitamente situe sua produgfo textual come ‘contra Hegel “Hegel”, Adorno nos lembra, “cujo método foi a escola em que se formou o método das Minima moralia, argumentava contra o mero Ser-para- si da subjetividade em todos os seus niveis." Dentro desse quadeo de referén- cia, § Denkbilder de Adorno “ievam a sério a exigéncia de que ‘aquilo mes- smo que desaparece" seja‘considerado como essencial™ eles “insistem, em ‘oposigio ao procedimento de Hegel «ainda assim em consequénca de seu pen- ‘samento, na negatividade."™” © Denkbild opera assim tanto com econtra Hegel, ‘em uma maneira que éfiel a Hegel ao desviar-se dele sempre ainda mais uma ‘vez. No movimento de negagio, perpétuo eimpossivel de ser contido, do Denk- pild ~ uma negatividade que, em seu carter implacdvel, também ativa um sen- tido da futuralidade do positivo, mesmo se apenas como uma imager refit da da perda.e do trauma ~aideia da redencio ea esperanga que se liga cla nun- cca podem ser totalmente dadas por mortas, assim como no pode haver a inicializagdo ingénua ou triunfalista de qualquer programa que procurasseres- taurara vida danificada a uma condigéo de completude e presenge. A vida da- nificada nao pode ser restaurada porque sempre jé foi danificada; ela nfo pode ser feita presente, porque sempre jé esteve ausente; porém a falta ¢ 0 vazio rau- :nético podem tomar-se ocasides poéticas e Hilossfics para uma posturavigi- Inte que no iré nem simplesmente deleitar-se com a resignaglo, nem total mente abandonar@ loucurae oestimulo enigmatic da esperanga que no su- ccumibe&iluslo. Aqui, 0 Denkbildrecusa-se a abrir mo do “uabalho sobee 0 ‘conceito” hegeliano, mesnio quando sua forma esteticizadaefloreios retéricos pparecam prvilegiar o Spiel ao Arbeit, da mesma mancira que as tensSes melan- Cblicas draméticas de um Traverspiel nunca podem ser descartadas ou parali- sadas por resultado algum aleangado pelo Trawerarbe. ‘A prxis de escrita do Denkbild perseguida por Adorno, Benjamin, Bloch e Keacauer nfo pode ser pensada sem conexio 2 insisténcia de Hegel, to signifi- cativa para esses autores, de que oespiitoabsouto pode conhecere ser conhe- cido de diferentes formas, e que seu autoconhecimento pode ocorrer de diversas F Minima moralia, Reflesdes a patr da vida danificada (S40 Paul: Ata, 1982) tad TveBduardo Bion, p. 89; Minima moralia; Reflerione aus dem beschldigien Leber, ‘ol. 4 dos Gesammelte Schriften 4, Rolf Tiedemann (Frankfurt Frankfort am Main, 1999), p. 14615 PALEDNMIAS DAINAGEALPENSAMENTO: Ua tod20 2 ‘maneicas. © Absoluto, que € derivado do absolvere latino (estacar ow solar algo), aquilo que fornece si mesmo suas préprias leis, e que situa suas condigdes de possbilidade somente em si, ¢ nZo em algom outro. Para os primeiros romanti cos alemes, o Absoluto éa categoria do indizivel como tal. O sistema de Hegel, no entanto, enta especificar as condigGes sob as quais o Absoluto é pensado.e csteticamente efetivado, Uma maneira privilegiada por meio da qual o espirito absolulo naestética de Hegel pode emergir, ou sej, vira conhecer-se como ums Forma do esplrito absoluto, reside justamente na arte, Em artes como a poesia e ‘a miisica ~ aquilo que Hegel chama de das sinnlicke Ersckeinen der Idde, ou 0 aparecimento sens6rio da ideia ~o Absoluto percebe a si mesmo como tal. Por exemplo, como Hegel esereve na sero intitulada “A posiggo da arte em relago Arealidade finitae&religigo e filosofia” no Curso sobre a esttica, “o belo artis- tico [das Kunsischine] nfo 6 nem a ideia I6gica, o pensarsento absoluto & medi- aque se desenvolveno puro elemento do pensamento, nem €a Kdeia natural, mas pertence ao reino espiritual ou intelectual [dem geistigen Gebiete}, som, n0 en- tanto, perar nas cognigdese agdes do espirtofinito.” E Hegel acrescenta, “oreino dabela are 6 reino do espitito absoluco. A arte encena, naestética de Hegel, ‘a superagdo do Finito no Absoluto, ou seja, na verdade especulativa, Abso- Ito aparece como uma presenga estética na singularidade e finitude das obras dearteespecificas. Ao invés de tabalhar contra a aparéncia do Absoluto, a sin. golaridade inverificdvel e a finitude inexorével da obra de arte individua e es- pecifica o Absoluto de maneiras nlo-programticas e imprevisiveis. A obra de arte singular efinita, assim, é uma criptografia para a filsofia de como a ver- dade especulativa do Absoluto no aparecer de uma forma estética. Dessa ma- neira, 0 pensdmento especulativo sobre o Absoluto na estética de Hegel requer uma forma manifesta para além do Ambito da ebstracdo, como a obra de arte, ‘para concretizélo e para faz8-lo sensoriamente experienciével. E possivel entender a visio de Hegel da forma estética como uma resposta ‘e uma claboragio de uma das distingbes bésicas introduzidas na filosofia eu- ropeia por Kant a diference fundamental entre a flosofia tebrica ea prética, Segundo ele, nunca se age de acordo com os preceitos dos principios teéricos apenas, Ac invés, hé elementos que esto inevitavelmente presentes nas ages ‘eno ser dos homens que correspondem a movimentos de pensamento que no podem ser abarcados por esse ou aquele sistema te6rico, seja no Ambito da ética ‘04 no Ambito do uso publico da azo. Da mesma maneira, 0 Absoluto de Hegel nfo poderiarealizar-se meramente como uma lei te6tica, ov como um modo de Georg Wihelm Friedsich Hegel, “Stellang der Kunst im Verbiliis zur endichen ‘Wirklchkel und zr Religion tind Philosophic in Vorlsungen tiber die Aster, vl {ie Werk Prankturtam Ma: Subrkamp, 1986), p. 127-148 ES ERHARD RCHTER -WAGENS OF PENSAMENTO abstrago sistemiética sem fazer recurso a uma expressio figurative, ¢, por ex- tensio, nio-téorica enio-sistemstica, tal como oferecida pela obra de arte. So- ‘mente nesta, portato, a verdade pode surgir como uma avaliago de quo apro- priada serd qualquer ligagzo estabelecida entre a realidade e 0 conceito.”” ‘Schelling estende a insisténcia de Hegel na pretensfo especial da obra de arte 8 verdad espectlativa do Absoluto e defende ~ seguindo 0 romfntico Frie~ datich Schlegel, cuja obra exerceu uma poderosa influéncia nas preocupaydes intelectuais do jovem Benjamin — que as qualidades infnitas do Absoluto po- ‘dem tomar-se compreensiveis e vivencidveis nas manifestagées estticas con- ‘retas fornecidas pela obva de arte. No sistema do Idealismo transcendental de ‘Schelling, a arte 6 0 lugar no qual ocorre aquilo que a filosofia procura, mas ‘sempre falha em compreender. Como Schelling argumenta em, por exemplo, no Philasophie der Kunst, de 1802-1803, “a arte corresponde precisamente & Filosofia” ¢ “a arte ela mesma é um escoadouro do Absoluto [ein Ausfluf des ‘Absoluten)2° Aquilo que excede a filosofia em seu sistema conceituel mani- festa-se na obra de arte, representando o que se recusa ao mero conceito. Na visio de Schelling, ¢ enquanto mediada por Hegel, a arte, mais do que a l6gi- ca, 60 organon, ox instrumento, da especulagio filos6fica, Enquanto a mera J6gieafeacassa como o meio sisteratico no qual a verdade do pensamento espe- culativo poderia manifestar-se a arte contém ¢ revela aquilo que a filosofiandio consegue, formando, em sua tnificagdo de diferengas absolutas, uma ponte en- tue o pensamento e 6 conceit. Como tal, a arte atua como a aparéncia senséria de verdade especulativa, ox seja, a tnica verdade que importa, uma que se des- ‘dobra para além da simples observaglo empiricae da dedugio légico-formal. -Emibora os escrtores da Escola de Frankfurt fossem, frequentemente, cri~ ticados por certos elementos do chamado Idealismo alemio, com o qual Hegel « Schelling se identficam, concordavam somente de maneiras mediadas com ‘a nogio Idealista de que a obra de arte participa de uma forma crucial 20 incor- ‘porar a presenca negativa do infinito dentro do finito. Assim, mediar suas po- 37" Aquestdo que no pode ver shordaga agi, mas gue merece serivestgadacm outro logar ecm outvo momento refee-e elago one a obra de arte come o outro pés-conee- {bal da pura absraglo, eo envolvimenta de Hegel com oropo ds "morie” da arte. Caso Se foss separ o Hegel que sustentaa mort ou o fm da arte, também seria possvel ler Schelling io exclasivarente como urna extensto de Hegel, como sugerrd me texto, mas também como reverenda-0, no sertido de que o projeto de Schelling posta ser ‘Tis como fazendo reviver o caddver da arte que Hegel pensava ter eniemdo, Enguan- to sto, compare, pra questio doin” daar, Alexander Garefa Ditunann, Kistende: [Dre usherache Stadion (Pankfurt rm Min: Suviamp, 2000) Eva Geulen, Des Bde der Buns Lesarien elnes Gerichts nach Hegel Frankurt am Main: Subnkammp. 2002. LW. Schelling, Philosophie der Kunst, vol. 3 das Werke, ed, Manfred Scher (M- nique: Beck e OMdenboury, 1927, p. 375-507 PALEONOMAS OAINAGEN.ENSANENTO: en intoaurso » sigBieste6ricas na esfera da obra de arte significava produzir um tipo de eseri- ta que permitisse que 0 contetido teérico de suas obras fosse encenedo~ a0 in- ‘vés de meramente descrito, ainda mais uma vez, pelas categoris logicas e for- ‘mais da filosofia. A forma que escolheram, o Denkbild, deveria corporificar essa aparéncia do infinito na finitude do texto estético, 0 Scheinen (aparéncia ou bri- thar) de um determinante na forma de um outro. O Denkbild lterério, portan- to, € a forma sensorialmente apreensivel que néo reflete mimeticamente ape- ‘nas 0 contetido de um sistema te6rico, mas o realizajustamente ao excedé-Io, ‘apontando para além de se, por extensfo, para além de qualquer conteddo sis- temético pré-programado. O Denkbild, como uma obra de arte que difere de si ‘econsigo, encena a verdade especulativa como uma manifestagio sensivel con- creta da verdade espiritual que, como em Hegel, pensa nas maneiras na quais Gifere com e a partir de si. O Denkbild constitui-se como uma forma estética © especulativa precisamente ao fazer retorna, vez ap6s vez, Aexigencia dese pen- sar essa gutodiferenciagzo, Dessa perspectiva, o Denkbild pode ser concebido ‘como comporificando a presenca negativa do infinito nos tragos estétics formais de sua pepriafinitude. Nesse sentido enti, s préties atsticas de Adomo, Ben- jamin, Bloch e Kracauer encontram-se com as de Hegel, Schelling ¢0 poeta ami- {gode ambos e companheiro de turma em Tubingen Friedrich Holder ~ como bbem sabiam Adorno e Benjamin, que dedicaram estudos de fOlego sobre ele, Delineando a lei do genero Medtiarecbmplicar esses proocupigbes esttico-ilossicas por meio da pro- dugio conreta de Denbilder 6 uma tarefa que, mesmo levando em conside- ragio todas as suas diferengs indiviasis, no abandons esse grupo de eseri- totes da Escola de Frankfurt De fato, eles todos compatithavam da esperan- ade que essas preocupagées éticosilosoficaseepistemo-estéticas posse tor nar-sepalpével no Denil Bloch eluida essa esperanga em relaso aos e5- critos de Benjamin Um sentido pelo periférico: Benjamin possufa aquilo que faltava tio Nos Ukimos ano, fseofos que vém rotomando essa questi da legiilidade do mundo Como um fendmenotextialneluer, entre ovo, Has Blumenbers. CE. espcicimen- te obras como Die Leshorelt der Wels Frankfurt am Main: Sucka, 1986) Besrife ln Geschichte (Frsekfurt ar: Main: Subrkamp, 1998), PALEONOWAS DADNAGEH-PENSMENTD: Una rodeo ” tos. filosofia, mais rigorosamente, 6a disciplina que consiste em criar con- ceitos”. Porque os conceitos “nfo nos esperam inteiramente feitos, como cor- pos celestes", pademos dizer que “criar conceitos sempre novos é o objeto da filosofia".* © Denkbild, assim, no deveria ser compreendido simplesmente como um conceito pré-febricado e um género fixo, pronto para ser posto em ‘movimento, mas como um ambito formal para atos de criagao conceitual sin- gulares ¢ imprevisiveis — porém nao atbitrios ou féceis. O Denkbild é, por- tanto, a inseparabilidade da dimensfio estética do pensamento conceitval. ‘Além disso, ao especificar a histéria do género es tragos formais do Denk- bild - ou seja, 20 fazer dele um gnero e, consequentemente, generalizével — corre-se o risco de se passar a0 Targo a resistencia que o prOptio Denkbild es- ‘boca contra ais impulsos toxondmicos e classificatsrios. Afinal de conta, aqui lo que conecta os vécios Denkbilder no ianscorrer do tempo e em suas preo- ccupagées temiticas é a sua propria falta de conextio uns com os outros e com. ‘um teor de verdade que pudesse ser decalcado da especificidade de cada ocor- réncia singular. Um Denkbild, consequentemente, nfo pode ser parafraseado, ‘Ao invés disso, cle nao deixaré de ser afetado por aquilo que Adorno, na Dia- Utica negativa, sublinha em relagio ao pensamento filoséfico. Aqui, a “apre- sentagio (da flosofia] nfo & algo indiferentee extrinseco, mas imanente & sua ideia”.* Portanto, Adorno enfatiza que, seria preciso que a filosofia nfo fosse reduzida a categorias, mas, em certo sentido, primeiro compusesse asi mesma, No curso de sua progressfo, ela precisa renovar incessantemente, a parti de sua pr6pria force do mesmo modo que a partir do atrito com aquilo com o que se mede; € 2quilo que se passa nela que decide, nfo uma tese ou posigZo; otecido, no o curso de via ‘inica dedutivo ou indutivo do pensamento. Por isso a filosofiaé essencial- mente nfo-relativel. De outra forma, ela sera supérflua; 0 feto de ela se dei xara majoria das vezes telatar fala contra ela.® a mesma mancira, o que impede o Denkbild de ser algo supSrfiuo, mes- mo quando se volta para questdes filos6ficas, € sua resist@ncia a ser traduzido completamente em afiemagées de verdade ou proposigdes formais. Com efei to, essa resistincia&tradugho e &pardfrase € parte constitutiva daguilo que sig- nifiea edo que nos leva a pensar filosoficamente. A resisi@ncia do Denkbild& parsfase e tradueo, ¢ assim, também, impli citamente,& sua prépria classificagdo genérica, coloca-o como um caso lim 5 Giles Deleuze e Félix Guatar, 0 que é filosofia?. So Paulo iitora 34, 1992, ta. dd Bento Prado Jr. Alberto Alonso Moz. 10. % Dialéiea negriva. Rio de Janeiro: Zabar, 2009, ad, Mareo Antonio Casanova, p24 8 Op.cit,p.3637 A ec ecg eee ee eee 2 GERHARD RICHTER -MAGENS DE PENSANENTO. tof, no qa tatiza iia de que uso de sgnincago puss sr desig nado por bm geo el do ger”, Dea defend qe, sempre qe Ge estem op ea cestiodo gener esis robles ealion como at Toro stu, genus, ls, txonomine catego operenciment de Un {ctermiadofendmeno ov evento oun Enero partclr 6 ignfeado por cero mareador oo mar Ta mac, snl ainluso de algo am g8- perc elo princpiosauodencos expects, can codes cc ‘atria veil pode la mesa etence 40 ppt gber gue nome. contre atin oa poi J nomearopetnciento sm pete Cer popriament;petence dia de pertenemento na medida ie 0 sin Tee cnat, ao eso empo, a peence penn A macs ge revem decoréia dso poder vst conto dentro fora ao mesmo tp, Senethatmenta igure do fleur de Benjamin, qe putea pela as Saves passes evi devi, poe era sen de star simula mentee ineroreno exe Reconoendo qc posse trae mas Jeum ftoero duvet diganos, um romance que ann € una asebloprai itm mesla evn gers, a mesmo, ognero do pre “eo Borde snfatia que a observapao de uma designe genéica no neesita rmeeionrenplctmente o goer, come, eens, €ocaso 20 Halo Ae bas iterias ono ua romanes ou pga eta, le continu um texto nfo pertenceria a gnero algum. Todo texto participa de um 08 mais géneros; nfo existe texto sem género[...] no entanto tal participagio nunca equivale um pertencimento.E nao por causa de um transbordamento abandante, ou uma produtividade live, anérquica inclassficdvel, mas por ccausa do trago da prépria panticipagdo, por causa do efeito do eédigo e da rarca de género, Na marca cla mesma o texto desmarca-se [se demargue}, ‘Se a observago do pertencimento pertence sem pertencer, participa sem pertencer, entio as designagaes de género ndo podem ser simplesmente par- te de um corpus. (..] Essa incluso e exclusto ao permanecem exteriotes ‘uma a outra; nfo excluern uma a outra. Porém também nfo so imanentes ‘ou idénticas entre si. Nao so nem um, nem dois. Elas formam aquilo que chamarei de cldusula-género, uma cléusula que afirma, ao mesmo tempo, ‘uma fala juridica, a designagdo que cria 0 precedente e um texto-lei, mas também 6 fechamento, o fechamenta que exclui a si mesmo daquilo que in- cli. [..]No exato momento em que um género ou uma literatura éabordada, neste preciso momento comegau a degenerescéncia o fim comega.®* 57 Faoquee Derrida, “The Law of Gone” rad. Avital Ronell em Acts of Literature, ed Derek Acridge (Londres: Rouledeg, 992), p, 21-52, ——————————————————————————————— ee —————————— PALEONOWIS DIMAGEAPENSANENTO: Un intoepdo a ‘No contexto do Denkbild, portanto, essa forma genérice, sempre que 6 0b- servadla como uma designagao genérica ou formal no presente estudo, também seré vista como incapaz.de pertencer plenamente 2quilo que designa, A desig- nnagio genériea “Denkbild”nifo pode ser ela mesma um Denkbild. Se escrito- tes como Benjamin conferem o titulo genético Denkbild e Denkbilder a seus textos, essas marcas ndo podem senfio ocupar o lugat daquilo que ao qual nfo ppocem pertencer, mas para cujo pertencimento sto indispenséveis, O Denkbild proclama ser membro de um categoria enquanto reside tanto fora quando den- tro, como se sentado em uma cerca de mbltiplos compromissos e determinagies ‘genéricas,fechando seu género sem fechamento, sendo-the interior ¢ exterior ‘20 mesmo tempo. Como uma forma de discurso liminar, uma forma menor de escrita ¢ uma pratica textual marginal, o Denkbifd,talvez diferentemente de tras formas literérias dominantes como o romance, o poema ou a pega tea- tral, nio apenas participa deste jogo de nBo-fechamento ¢ excesso, como tam- bbém comenta-o, encenando-o, no como um empecilho aser superado, mas aco- lhendo-o como parte da constelaco de formas estéticas e conteidosfilosficos ue nos dé a pensar em tantos eventos singulares. Poderiamos até dizer que 0 Denkbild € 0 género-sem-genero por exceléncia, ou seja, o g2nero tanto carece ‘de um género e que depende daquilo que € “sem-género” para sua afirmagao ‘como tal~similarmente& preferéncia de Benjamin para pensar o momento da ex: ressiio em termos do sem-expressdo (das Ausducklose). A codicagio dupla do Pertencimento e ndo-pertencimento genérico permanecerd operante por todas as ‘minhas leituras de Denkbilder espectficos neste estudo: elas nos do a pensar, entre outras coisas, as maneiras nas quais nunca podem plenamente pertencer. Essa énfasd na simultaneidade do pertencimento e nlo-pertencimento, enes formas com as quais essa simultaneidade 6 mediads pelas inseriges materiais do Denkbild, pode ajudar-nos a ressituar certos aspectos da pesquisa homanis- {ica hoje. Afinal de contas, meu estudo do Denkbild também € motivado pela rogio de que a pesquisa humanistica de hoje 6 frequentemente caracterizada or tm retomo ticito a determinados modelos de correspondéncia mimética entre oestético eo politico, entre o artefato material e um mundo supostamente ndo-estético. Em sum, hé uma tendéncia para regredir-se a sistemas de leit ‘a que oulorgam, muitas vezes com motivagOes politicas compreensiveis, um estatuto de funcionalidade transparentee totalmente referencial a modos esté- ticos de produgio e recepeio. Essa tentativa de formalizar em uma agenda po- litica as significagdes frequentemente incontroléveis da forma estética tem sido chamada de “idcologia esttica”. Meu argumento & que o Denkbild merece ser reconsiderado neste contexto. Defendo que ele pertence aquelas criticas este- ticamente autoconscientes da ideologia estética, que se esforgam para desve- lar einterrogar os pressupostos problemiticos ¢ nfo-ditos que pretensamente “ Gefen fHTER- mace De PERSIENTO conectam a esfera do estético diretamente e sem mediagdes adieionais & esfe~ tabard soi court © Deni emareadplieamentona mea {que oferece um modo de pensamento, de leitura ede escrita que nos permite ‘questionarahist6riae légica das ideologias estéticas. Ble fornece uma via de ‘acesso aos caminhos muitas vezes subterraneos nos quais arguments de g0s- to apaentemente desineressados ov formas atscamente mediadas de copsigio sonra zforar wa visio artic ds norma soai¢ ua mpo- siglo tendenciosa de vis6es de mundo construfdas e contingentes como sen a expresso de uma suposta necessidade politica. Como 0 Denkbild permane~ ce suspenso em uma tensio significaiva entre o figural eo literal ao encenar sua ela sobredeerminad pra com obit ds pris dicursivas no estétices, oferece-nos novas ¢ ousadas estratégias para o questionamento cri- tico. Mesmo comparilhando o espirito de oposiglo de Marx, na nova forms de materialism que o Denkild az cen, no pode ser ez Retica mate, Flalista que Marx erigiu contra aspectos do idealismo de Kante Hegel. Mais do {que isso, como uma forma radicalizada de materialismo textual ~ preocupada ‘com a materialidade da lingua ~ sem cesar toca no momento de inserigdo crt- tica mais do que de mera descrigao.”” Imagens de pensamento ¢ as cenas do politico ara nossos quatro escritores, cada um a sua manera, o tipo deestética que 0 Denkbild nomeia revestido de uma promessa, a promessa da liteaturs, que, para eles, no pode ser pensada separadamente de um repensat do politic, Tia , so séno cee 5 Travia fomlage ns iterengscrieas eaten e deen cae Beco do nad denne The Rests Feory ine a ee once e, 198), Por exemle no csi yea a Tipe’ no gal de Mn ematiza matealidae da insengo cl argument ge, "Sz pene uaa cai. ei A a oignnrot na copii, ae ea, ners iO fom emi mite mo ena wove tro psa ode at onset sia se [...] responde a suas poténcias somente por uma evasdo figural que, neste oso ov sent tis domo do Mae iS tito Stn ue pen Ps eta algo provisias de dexdcrar algunas das sans eon, ‘Her Berjin de Man and alvin (Canis: Carbide UF 1998). cleyio itr Beis fl Mo and he ere of Theory 8 Tn Coke, Barba Eten le Mere Andres Warsi (Mianepais Universi of Pres 3001). : oe oy Osage que coastive et sds nod ua aap de wen cere clr adorn’ Seat lacs Anacluhot", German Plies and ‘elt nt in, 0p. 93-12. a PALECNOWIASDAMMAGEN-PENSANENTO: in Intofueso 3 {sso implica nfo apenas que existe uma conextio entre o texto literétio € a po- litica, como tambéin que essa conexto pode ser pensada, e mesmo repensada, em termos de uma promessa, a promessa da escrtaliterdri. Porém, hoje, em ‘nossa era global digitalizada, quem ou o que, pode ainda essummir a responsa- bilidade por essa promessa? Quem o que promete o que para quem? Eo que siz- nificaria manter essa promessa? Ou quebré-la? Uma promessa nfo precisa ser ‘epetida afirmada vez apés vez, para permanecer o que €? O que 0 Denkbild mostra é que a promessa da literatura, se é que hd tl coisa nfo reside naquilo {que ela ensina sobre o politico - como repraduz. questées politicas que parecem ser prevalentes no tempo empirico ou historico no qual umn texto esté inserido mas, ao invés, em seu convite para a reconsideragao, vez ap6s vez, das fo ‘mas ndo-idénticas de pensamento politico que so encenadas na apresent artistca. “Este nfo 6 um tempo", escreve Adorno, “para obras de ate politicas; 280 invés disso, a politica migrou paraa obra de azte autSnoma, penetrando mais rofundamente em obras que se apresentam como politicamente morta. Longe de subscrever qualquer ideologia realista simplista, 0s escritos ‘autoconscientes de Adorno, Benjamin, Bloch e Kracauer lembram-nos das for- ‘mas nas quais o texto poético encena a inseparabilidade entre lingua e apresen- tagdo e questées da politica. Porém, ialvez formas posticas como o Denkbild no se permitam 0 tuxo do conforta enganador da mimesis —muito menos uma ‘mimesis do que seria o politico, O Denkbild nem simplesmenteafirma nem nega ‘© que existe, nem nos fornece uma nova plataforma politica que pudéssemos implementar monoliticamente, uma utopia que jé houvesse sido decidida. Ao invés, a promessa do Denkbiid pode resiir no convite que nos deixa para abrir ‘acomplexidade do conceito do politico para sus nfo-identidade perpétua e con- sequentemente para seu futuro imprevisivel. Tal abertura pode ovorrer mesmo = ou especialmente ~ quando a linguagem de um Denkbild aparenta, em sua superficie, ter pouco ou nada a ver com problemas de politica ou hist6ria. As- sim como # néo-sincronicidade da utopia de Bloch, a promessa do Denkbild sempre reside em um outro lugar inominével Por que tais questdes estéticas continuam a ser relevantes hoje? Sem divi da, estes sio tempos diffceis para a critica literdriae cultural de inflexdes ted +icas, Como modios de pesquisa que so probleméticos quanto a sua descrigdo ccresistentes em relacio& quantificagio, essas formes de critica ajustam-se mal as exigéncias de um sistema globalizado que esté ancorado nos princiios de ‘consumo ¢ ne maximizagao do lucro, A escrita lteréria em especial nega-se 8 53 Theodor W. Adorno, “Commitment em Notes Literature vo. 2 tra, Shieny Weber Nicholsn (Nova York: Columbia UP, 1992), p.409°30; “Engagement” in Noten aur Literatur, v.11 dos Gesammelie Schriften 6d. Relf Tiedemann (Pankiurt a Man Swhrkamp, 1997), p. 409-430, % GeMARD RUHR - MAGENS DE PENSANENTO seguir os idesis de instrumentalidade e a economia do valor de troca que tio completamente tomou conta de nosses instituigdes académicas. De fato, 0s pe- gos inerentes a uma ideologia do conhecimento institucional que acolhe 0% ‘modelos de produgio globalizada foram vividamente abordados por crticos como Bill Readings, J. Hillis Miller e Christopher Fynsky, dentre outros. Readings desvela sutimente as maneiras com as quais a nova “universidade de exceléncia” prepara seus produtos para papeis conformistas e afirmativos na rede transnacional de conglomerados empresariais. A “exceléncia” atingida em ‘uma educagdo como essa nfo necessita ~ com efeto, nilo deve ~ ser excelente ‘em algoem particalar, muito menos ser baseada em uma postura critica. Somen- te exceléncias talvez mesmo, na fala corporativa, uma “McExeellence”. Essa ‘exceléncia generalizada pode entfo sex facilmente instrumentalizada para uma finalidade corporativa particular? Programas apropriados para tanto j foram implementados. Por exemplo, como Miller sponta, quando um presidente dos Estados Unidos tomou posse alguns anos attés, ele imeditamente contratou ‘consultores do mundo das finangas para determinar como a aplicagao de mo- {elos corporativos de pensamento poderiam fazer a universidade mais “produ- tive’! Em vista dessas press6esinstitucionais, Fynsk lembra,cabe-nos rivin-~ dicar a significdncia da pesquisa fundamental nas humanidades, de maneira que cla preserve sua especificidade material lingufstica como uma politica de en gajamento.* ‘De mios dadas com as transformag6es corporativas da universidade ocor- rou ume reagdo de oposigdo literatura, esética, teoria literéia, eespeculagdio teGrica em geral. Como recentemente eseroveu Fredric Jameson, um dos mais “argutos intérpretes americanos da heranga politica da Escola de Frankfurt: Nossa época € antitesrica, o que significa dizer que €anti-intelectual; ¢ no preciso ir muito longe para descobrir as razGes para tanto. O sistema jd com- preendeu que as ideias ¢ a andlise, assim como os intelectuais que as realizar, ‘io seus inimigos, e desenvolveu vérias maneiras de lidar coma situagdo, no- tadamente—no mundo aeadmico ~ voltando-se contra aquilo que gosta de cha~ mar de grande teoria [..] 20 mesmo tempo em que incentiva positivismos € cempiricismos mais confortaveis ¢ locais nas virias disciplinas.” Por exemplo, continua Jameson, “Se voc® ataca o conceito de totaidade (..] vocé ter mui- tomenos chance de se controntar com modelos eandlises emibaraposas daquela totalidade chamada capitalismo tardio ou globalizagdo capitalista; se voce pro- ove o local eo empftico, voo8 teré menos chance deter que lidar com abstra- Bil Readings, The Universty in Ruins (Cambridge, MA: Harvard UP, 1999) 41 5 Hills Mller, Black Hols (Stanford: Stanford U.P, 1998), p. 4. "© Ghuistopher Fynsk The Claim of Language: A Case forthe Blunanities (Minneapolis ‘University of Minnesota Press, 2008), rr PALEONOWAS OA MAGE PENSALENTO: Una intodugS0 ” ‘ges [...] sem as quais o sistema nfo pode ser compreendido.“ Nao & nece que sua abordagem esboca. A tendénciaanitesrica, amide associada ¢ um ata, oe ee thera fe Aya pesa scone ler sears vetdade,¢alienado, a palavra cunhada pelo comércio, capaz de tocé-las camo Popeettametca a true es oje? E qual €0 lugar da literatura e do estético nessa resisténcia autorreferente, 0 Wiederstand de Adorno? “ fa a secant densest old Pete emepaoe © es pose deer comida ri emis ele soma como ss See eee ee ee com a ideia da Lei como tal mas apenas podem abordar essa generalidade por 19 Fredric Jameson, “The Theoretical Hesi (Crea Inguiry 25, n. 2 (1999), p. 267-88, ion; Benjamin's Sociological Predeceson”, reunidos em Just Being Difficult? Academic Writing in the Public Arer 2. Jonathan Dron Tekan oon eanefTaan. 9.320 s ERHARD ICHTER—WAGENS OF PENSAMENTO meio de situages narcativas especificas, locas, nfo generalizéveis e inverf ceveis: um homem do campo diante do portao da lei; um agrimensor visitan- do um castelo misterioso; ou Joseph K. repentinamente sendo preso uma bela rmanba sob dibias circunsténcias. Similarmente, se Proust preocupa-se com ‘uma filosofia geral do tempo e da meméria, Em busca do tempo perdido pode ‘somente” nos oferecer umsa série de momentos espectficos, singularidades que 'mostram Marcel em seu quarto de cortiga insula, refletindo sobre a morte de ssua av6 ou devorando uma madeleine. E se 0 desejo de Flaubert era escrever 0 ‘grande romance do séctlo XIX sobre “nada”, 0s personagens em A educapao Sentimental estio sempre envolvidos com algo, a comegar com a volta de Frédéric Moreau a Nogent-sur-Seine. Isso significa dizer que a literatura seja Ge alguma maneira deficiente em seu poder representativo, nem que ela, no ‘melhor dos casos, ilustre um conceito geral a priori. Afinal de contas, mesmo © tipo de discurso teérico que se esforga vigorosamente para evitar exemplos cespecificos e explictos para sustentar suas nopdes filos6ficas nfo pode esca- par da particularidade potencialmente destruidora da linguagem figureda. estatuto desconfortével do “exemplo”, muitas vezes curvando-se tacitamente ‘em sua forgailustrativa sob o peso ce todas as metanarrativas que deveria apoiat, nas estéticas de Kant e Hegel é um caso que vem & mente Porém, esse nfo 60 pontofuleral da questio. Ao invés, a relagio entre oli- terétio e 0 te6rico mosira como a realidade de um conceito sempre, e necessa riamente, esté baseada em um momento lingufstico singular, um tropo cuja ‘materialidade da significago nunca pode debulhar por completo. Como nfo pode haver coneeito teérico que esteje livre da singularidade (precéia) do for- ‘mato que, necessariamente, assume ao adentrar a linguagem, a literatura, como ‘0 Denkbiid, expe de modo autoconsciente a contaminacdo inescapével do te6- rico pelo figurativo ~ ao invés de passar por cima dessa tensio em uma tentati- vvade criar a falsa aparéncia de um sentido descorporificado. Poderiamos por- tanto dizer que a literatura no apenas contém uma rede de metsforas ¢ meto~ ‘nimias, como também que é ela mesma uma metonimia para a especificidade Tinguistica do eto te6rico, Como essa assinatura dupla da literatura no acon- {ece em um vécuo, como a leitura interpretativa dessa assinatura€ uma questo de disputa, mais do que autoevidéncia, sua andlise é um ato eminentemente politico com implicagbes propriamente politicas ~ mesmo quando um texto li- {erério inicialmente parece ter pouco ou nenhium teor politico. Por extensi, o Denkbild sempre opera como um performative duplo. Como tum modo especial de eseritaliterria, ele ple uma selagao entre o universal & ‘osingular: cada Denkbild tematiza um conteddo singular ~em outras palavras, 6 “sobre” algo, © o esse “sobre” abre-se para questGes mais amplas de escrita ‘na medida em que cada Dentbild 6 ele mesmo uma representagao do singular, eh PAEONOMIS DA NAGEA-PENSAMENTO: Un todo » ‘no importa quio especifcoo tema, de uma ideia mas abrangeno, universal de literatura. £ a aposta dos escritores da Escola de Frankfurt que trabalham esse modo composiional que o performative dupto do Dentbild toma im. bude polite e filosoicamente “0 Denkbildajuda-nos a questionar se poe haver tl potencal politico no ert. spods her una prone aaa led in pio do prazer, caso aftmativo, 0 que poderiasgnifiar, para tl promess Sestobrsse no limite dx mimesis daca reali, A questo ase posta, Portanto, nao € simplesmente quando a literatura sia © mesmo “hermética™ a literatura que tematiza sua préprialterariedade, supostamente cessaria de ser polttica, mas qu significa que ela rompa, dentro do ambito do estéco, com os eos referenciis que frequentemente sto fornecidos como os slvaguardas de seu engajamento social. (Vem & mente aqui oterico de sistemas alemio Niklas Luhmann, que impliitamente aprofendando uma observagio previa ‘mente feitapor La Rochefoucaul, faz remontar a invengio do amor moderm0 a0 leitores de romances do século XVM, que areditaria que também eles do- ‘veriam sentir essa emogo chamada “amor”, da mesma maneia que os perso- rnagens sobre os quais liam.*”) Neste cenério, nossos escritores da Escola de Frankfurt tomam-se 0s mortos-vivosdateatiaesttca, que, como os espectros Jembrados por Bloch em sua letura do conto de fadat “0 louto Eckben”, do romantico alemio Ludwig Tieck, voltam para assombrar, . Tais preoeupagées nos colocama bem no meio de uma cadeia de ques sobre areas entre extra foal eressondncia social ene problemas sencilmenteestfcos coats ugentementeplitcs.Afnal de contas, para ‘Adorno, assin! como para seus colegas da Escola de Frankfurt, no pode haver Imeditago imanenteacere do esttco que nio sea simaltancamente um pt em cena ov uma negacto determinad das esratra soci e politica nas quais sua manifesto particalar, 0 rigores da forma, estejam imbricados. Entetan- io, oque determina o conteddo potico de um encontro com oestético no & nem transmissi deste au daguele conteédo, nem arevelago de uma men- sagem comunicével Avinvés, o estéticoresta ainda a ser entendido em termos dos motos espectics formais com os quis resise&apropriacdo ea instru. rmentalizagi. Deparamno-nos com o estéico, particalamente no ambitodaes- crit, em uma sie de hir6glifos que exigem sr ldos, masque se recosam & {omnecer seu sentido pleno. Apontando para as maneiras com as quis “o con- éeito de derture toro relevants", Adamo defende, na segio “Enigmatic dade, teor de verdade,metafisca da Teoria estética qu “toda as obras de ate ‘7 Nias Luhmann, Liebe ols Passion: Zur Coiran von inci (Fras Nii Lara, ig Yon Tule (rank ama Main « GERHARD ROCHE - IMAGENS DE PENSAMENT sto escrte, nfo somente aquelas que obviamenteo so; so hiesdlifs paras {quaisoc6digo perdeu-se, uma perda ques insere no coneido, Obras de ate Sho inguagem apenas como eseia,” Embora esses hieréifos no possam ser reduzosauma proposio ce verde parca, ox um sentido estével sem fer com isso anulados, também nfo podem ndo ser lidos. Ao invés, 0 que est tm jogo naleitura~em seu sentido enftico ~ dos hierglitos do estéico € & determingio das formas espeificas com as quis resistem a determina Como nos diz Adorno, o “objetivo da obra de arte €adeterminago do indeter rminado” (TE 189; 124), Como os hieréaifos do esfticorevelam-se norms ome enigms, 0 sej, como “escrita (Schr na qual, “como nos signosin- fuisticos, oculta-s [ershlsel| eu elemento processialem sua bjetivego” (LE 264: 177, a obra de arte somente pode see compreendia como um siste- ‘ma cjas lis interns esto fora de cio: “Cada objeto artistco 6 um sistema ‘de rreconciabiidade (ein System von Unvereinbarket) (TE ZA: 84), ‘Una vez que ess sistema de Unvereinbarkeit ores vsivel em um texto teri como o Denkbild~e continua sendo um t6pico para discusso quaa- do exatamente esse poato€aleangado ~0 que se revela para oleitor€ que nas “obras de ate nada liteal,em primeiro agar suas psivras” (TE 135; 87). 180 significn que lr obras de ute como o Denkbild assim como oambito do eté- tivo ao qual pertence, ocasiona uma vrada dcisva que das costa pao feito realist ov mimético que podem simular na superficie, Em um ato de dissinis- Iapio,tomam-se pensveis somente de uma maneie iredutivelmente figura- tivae como figuracio. Seria possvel denominar isso de seu momento material deinsergao. As obrs de arte tomam-se mterias epveisnauilo que Adorno hamma de “sa figuragfo propria”, ou sea, o pr em cena alegérco da “sol- go" a problemas “que so ineapazes de fornece por conta propria sem inter- Tengo" A intervengioespestica que a obra de arte pode realizar nto se des- Usbra, portano, na esfera da imediatcidae ou a vol2ncia das mas, mes jus- tamente no evento estétco e incomensurével marcaéo — porém nao abarvel v por sua inseriqdo. Iso sugere, segundo Adorno, que “toda obra de are impor- tate dia rasros em seu materiale tence, esegu'-1s define o modem como tarefaa ser levade a cabo, que 6 0 contri deter o nariz votado para aquilo {que est no ar. A crtiea faz esa definigdo conereta."Econtinaa: “Os rats a Ser encontrado no materiale nos procedimontostéenicos, apatr dos qual toda obra qulitativemente nova segue seu rumo, Si cearizes: 0 os lai nos Gqusis a obras precedentesfracasaram" Para Adorno, a insrigo material do vento eatéice como um ato patio apresentasena figura da cicatiz. Como tm vestigio da esrtacorpcea, ela marcao focal de uma incisto ou lesso pé- via, Um signo de algo que no mais existe, ¢ também um sinalizador profun- damentc histrco, A cient sempre surge como um gest dplo: ela representa asimesma como a imagem concreta e presente de uma desfiguragio, excessi- vva1em sua referéneia a algo que nfio mais existe, um significante com um sig- nificado, porém sem um referente. A cicatriz deixa entrever aquele momento ut6pico de acerto de contas, de recuperagio perante uma ferida trauméties, ‘mesmo & medida que torna impossivel o esquecimento do trauma. A bem ver, acicatriz 6 signo tanto de cura quanto de perigo: ela sempre ameaga abrir-se de novo, Observada sob essa perspectiva, ela ccupa uma posicdo fantasmagérica ‘entre os vérios eixos de tempo e cognigfo. Poderfamos mesmo dizer que a fi- gura da cicatriz, como as préprias frases de Adomo, ndo apenas significam a complexidade hist6rica e te6rica da inscrigio material, como também @ corporificam. Seguindo Adorno, ahistéria do Ocidentec aestética merecem ser reeseritas, nfo em termos de uma sucessio teleolégica, mas como um arquivo ‘ou constelagdo de cicarizes. cicatriz, eno a continuidade histérica das de- ppendéncias [entre si), liga as obras umas as outras” (TE, 59; 35) ‘A insisténcia na materialidade dessa inscrigo cicatrizada, articulada por ‘Adorno e comparilhada por seus colegas da Escola de Frankfurt, foi frequen- temente ignorada, mesmo por letores sensfveis ao desejo de articular engaj :mentos politicos no ¢ com oestético, Dentre as muitas dimensdes sugestivas da ‘obra de Adorno, tal insisténcia ¢ especialmente relevante hoje, em Vista de um retorno generalizado a modelos de correspondéncia mimética entre o esttico eo politico, entre 0 artefato materiale sua elaedo a um mundo nfo-estético. Ao invés de atentar para o aviso de Roland Barthes a respeito das sodugbes do "efei- tode realidade” ~ ou seja, a confusdo que toma uma construgéo ret6rica com- plexa ou uma sparéucia de realidade dentro de uma obra de ate pela realidde cla mesma, edmo no caso do bardmetro inexplicével de Flaubert — hé uma re- gressio a modelos de leitura que conferem, frequentemente com motivagbes politicas plenamente compreenstveis, um caréter de funcionalidade transparente eplenamente referencial a modos estéticos de produgio. (© Denkbild, em sua resistencia e natureza transbordante, deve ser lido lado ‘lado de ertieas contundentes a esse tipo de “ideologia estética”,erticas que se esforgam para desvelar 0s pressupostos probleméticas e na-ditas que ssubjazem a qualquer tentativa de conectaraesfera do estético diretamente sem ‘qualquer mediagao posterior ao campo nio-estético da préxis concreta ou po- litca. A ideologia estética torna-se assim visfvel como o nome para um movi= ‘mento que objetiva deduzir um modelo social ou politico de um eststico. No ‘caso da estética de Schiller, por exemplo, 6 possivel discemir, frequentemen- tc, o impulso ut6pico para construir um novo estado de acordo com a “educa- ‘9 Roland Barthes, “The Reality Eifect, in The Russe of Language tod, Richard Howard (Berkeley: University of California Pres, 1989), p, 141-148, i 2 GERARD RATER - HAGENS DE PENSAMENTO i estética” que adere a certes principios de contemplagao reflexiva. Pode-se argumentar, no entanto, que a confusto da realidade estética com a nBo estética 6elamesma obergo daideologie, que 0 trabalho de cfticos tio diferentes como Paul de Man e Terry Eagleton fez muito para questionar ess ideologia.” "Todavin, isso nfo quer dizer que,em um raio de reconhecimento, atradigio da especulapao estétiea moderna de Baumgarten em diantetenha se tornado suspeita de uma hora para outra,exposta em sua corrupsdo incorsigive.®° Nem setia util conceber “O Estético” como uma categoria de reflexto teérica trans- histérica cidéntica asi prépria sem, em primeiro lugar, considerarem que me- dida foi retrabathada erepensada em especificidades histricas flos6ticas he terogéneas e contraditérias demais para ser redutivel a qualquer entidade mo- nolitica de sentido. Da mesma forma, nem todo discurso estético deve ser ‘equacionado a priori com mé-fé e ilusdes: & certamente possfvel e desejével imaginar um discursoesttico que se liberce subvert de dentro a ideologia da estética ao mesmo tempo que rtenha seu carter de discurso esto. A ideo- lopia estética, portato, pode ser compreendide como 0 nome para un movi- ‘mento particular de pensamento n0 interior de um discurso esttico, um des- lize do formal para o politico, Um exame demorado da lgica histéria das ide- ologias estticas € assim capaz de revelar as manciras, muitas vezes subterri- ‘neas, com as quais proposigbes aparentemente desinteressadas de gosto ou de cognigo sensorial artisticamente mediada auxiliam na criacdo e eforgam urna visio critica, organist, da norma social ¢ ume imposigdo tendenciosamen- te violenta de visdes de mundo altamente construfdas e contingentes como a expresso de uma suposta nccessidade poltica. Ou sea, as efticas da ideolo- gin es(ética io mais persuasivas quando visam aos pontos nodais na formagao histrica e sistemdtica dessa ideologia que demandam a jungao de encoatros cognitivos e sensoriais com um estado absoloto de relidade empfrica ou mes- ‘mo com as exigéncias imperdodveis de uma Razio estreitamente concebida. ‘Sob esse prisma, torna-se um dever de qualquer critica da ideologiaestéticain- agar sobre o que hd na apresentagdo ret6rica de um discursoestético que per- rite ¢, igualmente importante, nao impede que seus proponeates busquem poiar poder empirico aoimbricar esrategicamenteaesfera do real com aigi- rmentos de gosto ede jfzo. ‘Um pressuposto permanente nesse tipo de ideologiaestética a ideia de que ‘as obras de arte comunicam algo além de si mesmas, um contesido que excede 3 Ghrespecaimente Paul de Man, Aesthetic Ideology (Minneapolis: University of Minne- Soa Press, 1996), e erry Eagleton, The Ideology of the Aesteti (Oxford: Blackwell, 1990) 5 Cha percept hic de Stanley Corngold sobre isso em Gomplex Pleasure: Forms of Feeling in German Literanire (Stnfor: Stanford University Pres, 1998p. 176, nota 21 PALEONOWIAS DA MMGEN.PENSANENTO: Ura nods ® sua forma material. Porém, uma reconsideragio do Denkbild nesse contexto ‘deixa claro que, mais do que se basear em um modelo de eomunicagio trans- parente e salvaguardar um solo de referencialidade, essa modalidade de escri- ta concebe 0 estético como um Ambito no qual os signos, acima de tudo, e ‘bem como a escrita no comunica sentio a sua propris ineomunicabilidade. ‘Como nos diz Adorno em relego & poesia de Paul Celan, “A arte € integral so- ‘mente quando se recusa a aderir a comunicagdo. (TE 476;371).Sob essa pers- pectiva, a esfera do nio-estético torna-se pensével como uma alteridade irre- ‘Gutivel, no apenas em relagdo ao estético, mas também perante aquilo que a estética comunica, ou seja, 0 que Adorno chama de sua incomunicabilidade. ‘Essa comunicagao da incomunicabilidade é a cicatriz do Denkbild — tanto n0 ‘caso genitivo quanto no ablativo. Enlretanto, a orientagdo dessas reflexes nio autoriza leituras mais liter Jistas que sfo tentadas a ver, ainda que por razdes compreensiveis, no modelo autorreflexivo de Adorno do estético ¢ no Denkbild de maneira mais geral, ‘ameaca de negara relevineia politica da obra de arte, com isso reduzindo-a a ‘uma entidade puramente parasitica e domesticada, Pelo contrio, para Ador- ‘no, assim como para seus companheiros de escrita do Denkbild, a fungio po- Iitica do estético esté paradoxalmente situada justamente no espaco no qual ele ‘se mostra como inacessivel a0 raciocinio instrumentalista¢ a intervengd0 po- Iitca imediata, Aqui, “arte tors-se social em sua oposigio& sociedade.” Ador- ro postula que “ao cristalizar-se em si como algo singular para si mesma, a0 invés de obedecer is normas sociais Vigentes e quaificar-se como ‘socialmente ‘til’, @ ane critica a sociedade por simplesmente existir,razHo pela qual os pu- ritanos de todés as estirpes a condenam.” (TE335-336;226) Como mesmo a arte {que é social e politicamente engajada pode tornat-se afirmativa do status quo, ap exerver a funclo de critica que ostanus quo jéde antemio assegurou para ela ou seja, 20 oferecer uma critica cooptada pelo sistema que a gerou ~ Adorno prefere pensar 0 acontecimento aberrante da arte em termos de uma “negacdo doterminada de uma sociedade determinada”, Consequentemente, a arte “man- tém-se viva por meio de sua forca social de resisténcia”, sem a qual torna-se, ‘mesmo em su formas critica, “uma mereadoria”. Como “nada social na arte 6 imediatamente social, nem mesmo quando esse € 0 seu objetivo”, aquilo que ‘ arte pode contribuir para a sociedade “no € a comunicagio com ela, mas a0 invés algo extremamente mediado: 6 a resist2ncia” (TE, 335-336; 226). Para ‘Adorno e seus amigos, ndo pode haver resistencia alojada nas obras de arte © textos literdrios que ndo esteja perpetuamente recuando daquilo que signifique eda natureza determinada das conexées entre ela e o contexto que a media. O ue interessa a Adorno, especificamente na estética lterdria & qual a Teoria es- ‘idea com Srequéncia recorre, nfo pode ser teduzida, como tantas vezes fo ten- ee “ GERRARD RICHTER HAGENS DE PENSADENTO tudo, ao concsito de autonomia artistic. Ao invés, 0 que Adoro incessant mente busca a literatura, eaquilo com o que ele e seus colegasesritores do Denkbildengaja32, 6s indeterminagho determinada do que em seus préprios tropossoletra o nome “resisténca" de maneias cada vez diferentes e em mio- vimentos imprevisiveis de sua assnatora textual ‘modo flosico de esttica para Adorno mais politico e,consequen- tements, do oengajamento da Escola de Frnksrt,émais ele mesmo ~ quan ‘do move-se em diregio a alg deoatro, os sea, quando, em sua ecusa de per- ranecer 0 mesmo, resiste qualquer forme de intervencio politica no media da, O Denkbild explore os gstos por meio dos quis oexticoimbui sua pré- ‘ria negatvidad, no com um modelo u6pico para aio prética, mas coms uma alteridade excessiva que nfo pode ser plenamenteexplcada, O estético ence- nassim siarelaggoconfitivacom aesfera do dscursoto-stico nessaten- so carregade ene 0 belo e 0 verdadero. E quando vista contra esse pano de fundo que aassergo de Adomo de que toda as “obrs de arte, mesmo as afi tmatvas,sio a prior polémicas” pode ser realmente apreciada A ideia de uma obra de ae ineentemente consevadora é aura. Ao separar-seenfaticamente do mundo empirico, seu outro, cla pest testemunko 8 deia de que © mundo ele mesmo devera ser outro; elas so 0s esquemasinconscientes da transfor- ‘agéo desse mundo" (TE, p. 264; 177)" “Adorno, junto com seus amigos, no concebeoesétic, portant, como ume sera abstrgio divorciada de qualquer realidade, nem simplemente como o Conjunto de piticasarsticas eanGnias tas como a esert, a pintra, escul- turae mist. Ao invés, ele confere ao esttico uma especiiidade eoncetual, aque permite ale englobaresimultancamente exceder todas os seus eomponen- {es indviduas, Esse 60 duplo movimento que Adorro.com frequénsi chama de poesia lirica, ou simplesmente, como em Notas de literatura, literatura Depois da composigio musical ~ que, para Adorno como para Bioch, 60 ma- delo mais clevado de materialidade ndo-comunicivelencontrando-se em fig ras como Beethoven e Schoenberg, no cento de suas esttcas ilosefico-poli- ticas-aesrtliterria como ade Denkbiltorna-se um pao prvilegiado pace encara esto, Paca Adorno, no pode haver pensamento rgoros0 do esté- tico que nfo ocorra em termos da ateridadec materialidade n-comanicéveh do texto literdro, Isso acontece em parte porque aesrita itera, em sue re- usa de permanecerbuchstabich, ot literal, demonstra o que sempre € 0230 57 Algins doe termos sos quss ess tansformagdo adoeniuna pode sr pensads especi- ‘camente em elo 8 pintura modernist sao dgorosamenteinvestigados no wabatbo de IM. Bernstein Against Voluptuous Bodies: Late Moderntzm and the Meaning of Painting (Stanford: Stanford University Press, 2006) —— PALEONOMUAS DAINAGEN-PENSANENTO: Una introdugo 6 1a experiéncia estética: ndio pode haver uma letura direta ou realista de uma ctiagdo estétca capaz de ser justa 4 naturezairredutivelmente figurativa da art. Para Adorno, as obras literdtias, assim como a misica de doze sons que reve- renciava em Schoenberg e na Segunda Escola Vienense, mas desdobrando-se em uma materialidade diferente, ao figurativas ou alegérieas, posswindo “uma sintaxe sem palavras mesmo em obras verbais. O que tis abras dizem no 60 que dizem as suas palavras”, de forma que o sentida nfo pode ser sindaimo de intendo autoral. Aquilo que Adomo chama de Wahrheitsgehal ‘eor de verda- de) alegérico de um texto torma-se perceptivel quando ele separacse do senti- «do visado pelo autor: o que fala em uma obra de arte nflo 6a voz do autor, mas (0 cos formiais da propria obra: “A dindmica das obras de arte pronuncia-se rnclas” (TE, p.275; 184), Sea raiz grega de alegoria allegoren, significa 0 pro- cesso de falar diferentemente ou dizer algo de outro, entio a literatura proce- ddede modo a retere, de fato, intensificar essa alteridade. ‘Noentanto, embora os Denkbilder dos escritores da Escola de Frankfurt se- {jam inteiramente te6ricos, eles nfo propem uma teoria estética unficada da 1iteratura (ou de qualquer outro objeto). Bles aticulam um principio de letura € pensamento no qual a teora jé sempre é prxis, Ou soja, preferem, ao invés, abordar construedo da teoria com uma abertura para as exigéncias cambian- tes da singularidade e especificidade do artefato,reinventando seus procedi- meats te6ricos com a nova forma e formato de cada objeto de andlise. Por ‘exemplo, o engajamento de Bloch em uma forma nao ortodoxe de pensamen- {out6pico, um pensamento que ndo se contenta com modalidades simplesmente premonit6rias ou programiticas do futuro, também desempeaha um papel es- pecifico em Seus Denkbilder. Da mesma maneira que seu gesto ut6pico néo ponte para um futuro que nifo se fechou, mas para algo que ainda ¢ imprevie sivel, excessivo, e sempre ainda a vir, sua imagem de “eu” nunca é totalmente presente a si mesma. O “eu” é sempre o local de um outro lugar, gesticulando para além de si em uma constelagto de andlises, sonhos ¢atos imaginativos. O {que é necessério para os Denkbilder de Bloch, assim como para os de seus ami- 205, 6 um pensamento das maneiras com as quais 0 “eu” transgride ssi pr6prio ‘e dos movimentos pelos quais se converte em objeto e telos da transgressto. (© que nomeia a alteridade do Denkbild iterrio como uma forma de inscri- ‘edo material 6a linguagem ela mesma. Ler cerradamente, entamente, prestando tengo & materialidade das figuras textuais € 0 desafio que o Denkbild nos co- toca. Como Bloch escreve em "Sobre uma metéfora em Keller”: “Aquele que aprendeu a escrever nfo sabe necessariamente como ler. Isso ¢ especialmente ‘Sbvio quando alguém Iéripidae indiscriminadamente?” Porém, “as frases em ‘bons livros podem ser tao bonitas que quase ndo se tem vontade de ler adian- te", como ¢ o caso de Keller, no qual a linguagem figurativa oferece desafios “6 GERHARD RIATER -AGENSDEPENSAMENTO especiais e continuos.*? Aqui, as figuras e metiforas espectficas funcionam 20 ‘mesmo tempo para atrair e distanciar o leitor. Nas metamorfoses ret6ricas de Keller, as arankas “no se sentam em suas teias, mas “pairam’ sobre elas", um “eachorro come ‘conversando" com seu prato”, uma berba édescrita como um “matagal”e a prépria miséria “vem fazer uma visita como um ‘taciturne men sageiro do judicidrio’"? Para Bloch, as metforas de Keller nfo servem sim- plesmente para veicular este ou aquele enredo: como casos epistemolégicos, ‘mostrarm-nos a selidade de um pensamento que tanto se refere a algoem ques to como nos faz lembrar das estratégias que ele mesmo ~ como linguagem _gurativa ~emprega para nos impedir deter acesso a um tipo de verdade que se {quer autoevidentee imutvel, ou seja, que nao seria regida pela esperanga alo- Jada na contingéncia imprevisivel dos topos, “Porque”, Bloch escreve, “espe- cialmente quando os contornos das coisas cintilam com tanta intensidade, ato- talidade daquilo que aconiece em um determinado tempo ¢ justamente aquilo que s6 pode ser encontrado por meio de tentaiva e erro, por interrupgao, como algo intrinsecamente experimental ~ também em sua representagio," B aqui que 0 Denkbild reluz. Longe de apresentar-se como “modelos a ser imitados” camo “sistemas” de conhecimento a ser instalados por todos os cantos, os Denk- bilder de Bloch, Adorno e seus colegas convidam-nos a nos deparar com a ma- terialidade irreduttvel da linguagem e a liberar 0 espitito de opasico que os propele a questionar qualquer ideologia realista, qualquer modo de apresonta- ‘0 transparente ou que se queirs evidente, e quaisquer certezas institucionais ‘0 politicas que se baseiem em modelos miméticos ou anlogos da ideologia estética. © que 0 Denkbild corporifica é precévio principio da esperanca: que, ‘em nossa conversagio infinite, a ttima palavra ndo tenia sido pronunciads Lato ea inscricao da perda ‘Uma das maneiras com as quais 0 Denkbild posterga essa dtima palavra é por meio de uma énfase persistente na perda, Esta nfo pode simplesmente ser inst Bloch, “On a Simile in Kells em Literary Essays rad. Andrew Joron el. (Stanford: Stanford University Press, 1998) p-51517; “Ube ein Gleichnis Kelers",em Lierarsche Aufotze, vol. 96a Werkausgabe (Frankfurt am Main: Suhekamp, 1985) p 579-58, 2 “simile”, p. 516; “Gleichnls p. 580, 5 rast Bloch, “Spoken and Waten Symtax: Anacoluthon”, em Literary Essays p.491- 504: "Gesproctene und gescheebene Syntax: Anacoluh, em Literariche Essay, p PALEONOMAS DAINAGEN-PENSANENTO: Ui intradgso * descrta een categorizada segundo taxonomies genéticas, mas chama aten- so para si mesrna como perda: como a perda da propria compreensio e como © evento da ndo-compreensto que se tem de si Consequentemente,s@ as rihasleituras dos Denkbilder de Adorno, Benjamin, Bloch ¢ Kracauer focam no pOremcena da perdeliterria,filosotica, pessoal e politic, elas implictamente intencionam colocer tas perdas em uma elagdo gramatical com aexplicagdo do trauma, lato e melaneolia que Freud nos oferece. Em “Luto e melancolia", porexemplo, Freud diferencia entre duas modalidedes de reago ao trauma ge- rado pela peda de um ente amado, um objeto, idea ou ideal. A primeira vist, ‘0 modelo de Freud parece privilegiar 0 Iuto, no quel um sujet sradualmente retira sua libido do objeto perdido para investi-la em outro lugar, sobre a me- Jancolia, na qual um sujeito incapaz de investi sua libido em outro lugar por- «que sua retrada do objeto perdido néo é bem sucedia, Entetanto,héoutoele- mento que se revels em uma leitura mais atenta da oposigdo aparentemente bi- nésia de Freud. Embora a melancolia possa ser lida como um desvio patoli odo curso norm de um lto saudével, ela também pode sr entendida como tuma recusa de perder 0 objeto por uma segunda vez, por meio do processo de desligamento em relaio a ele, e, por extensio, um recusa de se perder a per- da. Dessa perspectva, a melancolianomeia uma perda que 6 constitutive em sua natureza¢ portantondo pode ser compensada sem desfazer 0 ego que se defi- ne portal perda CColetivamente, minhasleturs de Adomo, Benjamin, Bloch e Kracauer — todos els letores euidadosos de Freud - mostram que as miniatura filosofi- cas do Denkbild podem ser mais bem compreendidas como o desdobramento no extremo dé uma oposigio binria aparente entre lato e melancoia, O Denk- bild encena uma série de confrontages com a perda constitutive que faz0 su- jeitoser o que ele €: a perda da democracia sob o fasismo; perda das certe- 2s do “sistema” hegeliano; a perda dolar no deslocamentoe no exis 8 per- 4a do sentido estavel eda legibilidade na modernidade;e a perda do outro, ‘como, por exemplo, um amigo ausente ou moribundo. Minhas letras sugerem, portanto, que esse género de escrta 60 elo subterrinco que, surpreendentemen- {e,conecta esses pensadores da Escola de Frankfurt em sou projetocoetivo de

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