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A maioria das pessoas que vai ao cinema recebe uma avalanche de imagens e
não se encontra apta a identificá-la enquanto uma linguagem. O que interessa,
apenas, é a história, a intriga, o desdobramento das situações - aquilo que se
chama de ’fábula’. Assim, o espectador comum não percebe que o filme tem uma
narrativa e é esta que, por assim dizer, ’puxa’ a fábula - a história. Por narrativa se
entende a maneira pela qual o realizador cinematográfico manipula os elementos
da linguagem fílmica. Ou seja: o conjunto das modalidades de língua e de estilo
que caracterizam o discurso cinematográfico.
O que precisa ficar bem entendido é o seguinte: o que merece crédito na obra
cinematográfica não é o que se diz 'no' filme, mas, sim, o que o filme 'diz'. E este
'fala' por meio de sua linguagem específica, assim como na literatura o escritor se
expressa por um conjunto de palavras que formam frases, orações e períodos. A
expressão daquele que escreve se dá através da sintaxe. E o cinema também tem
uma sintaxe que se cristaliza pelo relacionamento dos planos, das cenas, das
seqüências. Assim, os elementos básicos da linguagem cinematográfica, os
chamados elementos determinantes, podem ser assim considerados: a
planificação (os diversos tipos de planos - geral, de conjunto, americano, médio,
close up...), os movimentos de câmera (travelling, panorâmica, na mão...) e a
angulação (’plongée’, ’contre-plongée’...). E a montagem, existindo também os
elementos componentes, mas não determinantes (fotografia, intérpretes,
cenografia...).
Hitchcock procura também, com seu humor negro habitual, ’brincar’ com o
espectador, que sabe ser um sado-masoquista e adoraria, no caso, presenciar o
estrangulamento da mulher pelo perverso homicida. A significação, por
conseguinte, se faz pela linguagem, pelo ’comportamento’ da câmera em relação
ao personagem. Se neste exemplo, a significação decorre de um movimento de
câmera, em outro, desse mesmo filme, ela advém pela montagem na seqüência
na qual o estrangulador procura, dentre muitos sacos cheios de batatas, aquele no
qual se encontra o cadáver da mulher que matara no apartamento a fim de lhe
tirar um broche de suas mãos, as quais, no momento da agonia, agarram o objeto.
A manipulação de Hitch é tal que o espectador ’torce’ para que o brutal homicida
encontre, tal a sua aflição - e a aflição provocada pela montagem, pela ’mise-en-
scène’, o broche que o denunciaria como criminoso.