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Roksyvan Silva2
Buscaremos aqui, por meio da análise imanente, desvendar esse discurso visivelmente
autoritário, no qual vemos, de partida, uma assimetria entre locutor e destinatário: se para
Foucault é no discurso que se entrecruzam saber e poder, nesse discurso autoritário há uma
pretensão de se concentrar saber e poder no polo do locutor, esvaziando o ouvinte de fala e
de pensamento. Também buscaremos tracejar o contexto histórico deste discurso, bem como
expor a relação entre a ideologia veiculada e as práticas da classe proprietária na
particularidade do capitalismo brasileiro.
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Texto produzido sob orientação da profa. Tânia Dantas durante a disciplina Análise do Discurso no
curso de Especialização em Língua, Linguagem e Literatura (2017-18) do Centro Integrado de Tecnologia
e Pesquisa (Cintep).
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Graduado em Letras Português/Inglês e em Ciências Sociais pelo Centro Universitário Fundação Santo
André (CUFSA).
(SP), Jundiaí (SP), Fortaleza (CE) e Resende (RJ).Maia é proprietário da empresa Zoom
Comunicações e Publicidade e ex-presidente da Acrissul (Associação dos Criadores de Mato
Grosso do Sul). Ele afirmou ter agido por conta própria: “Eu vi o discurso e, como aquilo estava
ao meu alcance, fiz uma contribuição” (LINHARES, 2016). Disse ainda:"Esta ação não tem
interesses comerciais. É uma forma de interagir com este movimento de mudança no País,
para causar impacto e reflexão da população. Temos que mostrar que existem milhões de
pessoas que desejam sair desta crise. Com esta adesão, a campanha será de abrangência
nacional" (ROCHA, 2016). Tratava-se, portanto, de interesse puramente político: difundir uma
ideologia favorável ao seus negócios e ao novo governo.
Uma parte da população não concordou com o outdoor. Segundo Maria de Fátima, 28,
empacotadeira, a própria crise é um empecilho para o trabalho: “Não penso assim, está muito
difícil arrumar um emprego. Fiquei meses desempregada e só agora consegui. Meu marido
está há 3 anos na busca como mecânico de moto e até agora nada, temos que enxergar a
realidade”, desabafou (MIRANDA, 2016). Com isso, temos indícios de que o presidente ora
dialoga, ora ordena, a depender da classe social a quem se dirige.
Mais à frente, Temer afirmou que “O diálogo é o primeiro passo” (FOLHA DE S.PAULO,
2016). As frases seguintes sugerem, nas entrelinhas, que o diálogo seria com partidos e líderes
políticos alinhados com entidades empresariais. A própria atividade do Estado aparece
subordinada e a serviço dos negócios da burguesia: “O Estado depende da conjugação de ação
de empregadores e trabalhadores” (FOLHA DE S.PAULO, 2016). Esta conjugação das classes
sociais burguesa e trabalhadora não é, obviamente, realizada em condições de igualdade,
como se observará a seguir: "O emprego, sabemos todos, é um bem fundamental para os
brasileiros. O cidadão, entretanto, só terá emprego se a indústria, o comércio e as atividades
de serviço estiverem todas caminhando bem" (FOLHA DE S.PAULO, 2016). Logo, seu governo
põe-se, aparentemente, a serviço do empresariado.
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Para o pensador burguês Immanuel Kant (1724-1804), cuja influência grandiosa, embora idealista, se
estende até nossos dias, carregamos em nós duas porções de humanidade: o homo fenomenon (uma
porção egoísta e natural, de natureza real e sensível) e o homo noumenon (a porção social, que contém
as leis morais, o imperativo categórico e a liberdade, de natureza ideal e inteligível). A porção
fenomênica tem três inclinações volitivas (mais poder, mais riqueza, mais privilégios), visíveis nas
atividades da sociedade civil. Nós nunca seremos plenamente uma ou outra porção; daí a necessidade
de um Estado que politicamente prenda o ser humano e, entretanto, seja a fonte da sua liberdade: "Só
dentro da cerca que é a constituição civil é que essas mesmas inclinações [egoístas] produzem o melhor
resultado – tal como as árvores num bosque, justamente por cada qual procurar tirar à outra o ar e o
sol, se forçam a buscá-los por cima de si mesmas e assim conseguem um belo porte, ao passo que as
que se encontram em liberdade e entre si isoladas estendem caprichosamente os seus ramos e crescem
deformadas, tortas e retorcidas" (Ideia de uma história universal com um propósito cosmopolita, 5ª
proposição). Sobretudo nas atividades políticas ou de Estado onde atua o cidadão, segundo a ética
kantiana, deve ser posto e reposto o homo noumenon, que atuará com boa vontade em busca do bem
comum. Quando se fala em falta de “vontade política” no Brasil, faz-se referência a ausência desta
porção noumênica.
Logo após declarar que manteria os programas sociais, embora aprimorados com
reformas, diz o novo velho presidente: "O povo precisa aplaudir as medidas que venhamos a
tomar. E nesse sentido a classe política unida ao povo conduzirá ao crescimento do país"
(FOLHA DE S.PAULO, 2016). Aqui, novamente se põe a metonímia, na qual povo equivale
somente à classe dos empresários. A união que pede é, na realidade, um convite ao lobby dos
empresários junto aos congressistas para fazer as reformas que pretende. As reformas são
necessárias para “melhorar o ambiente de negócios”, na direção seguinte: “De forma que ele
[o ambiente do capital] possa retomar sua rotação natural de investir, de produzir e gerar
emprego e renda”(FOLHA DE S.PAULO, 2016). A busca pela nova “rotação natural” do capital é
a busca por um novo “milagre econômico”, que se traduzirá em novo investimento, nova
produção e nova geração de mais-valia ou lucro, mesmo que exija duras reformas que tirem
direitos dos trabalhadores.Há milagres econômicos que exigem ditaduras políticas. Daí a
necessidade de que do alto venham “aplausos” às reformas (para fazer o enfrentamento das
vaias vindas de baixo).
Estes são os passos discursivos de Temer que antecedem a menção à frase do outdoor,
que vai aparecer fechando o discurso. Na crise, o governo tem o remédio das reformas, que
será pensado e negociado diretamente com a classe empresarial; ao trabalhador, excluído
desse debate, resta apenas trabalhar. Não lhe cabe fala, nem pensamento.
Diversos estudiosos, das mais diversas ideologias, identificaram uma lei fundamental
da sociedade brasileira: seu movimento histórico pendular entre democracia e autoritarismo.
Na década de 1980, ogeneral Golbery do Couto e Silva, chefe da Casa Civil no governo
Geisel e mentor da abertura política, usava uma metáfora cardíacapara descrever o
movimento das instituições brasileiras: sístoles (fechamentos) e diástoles (aberturas). Com
essa imagem, buscava compreender o processo em curso e controlar seus efeitos. Por isso,
advogava uma abertura “lenta, gradual e segura” (O GLOBO, 2017). Dessa maneira, buscava
evitar que os crimes cometidos pela ditadura militar viessem a ser punidos: sequestros,
assassinatos, desaparecimentos, torturas (inclusive sobre crianças), estupros. Obteve sucesso.
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O conceito de “bonapartismo”está na obra O 18 de Brumário de Luís Bonaparte, na qual Karl Marx
observa que, em momentos de acirramento da luta de classes, a burguesia se recolhe às atividades
privadas e se afasta do poder, o qual, em coups d'état, é ocupado por figuras militares, sendo Napoleão
Bonaparte, o tio, o caso clássico e trágico, e Luís Bonaparte, o sobrinho, uma repetição farsesca do
mesmo fenômeno.
jornada de trabalho são, para as classes subordinadas, as condições da dominação política
brasileira em tempos de guerra. Aqui, portanto, avistam-se indícios de uma virtual passagem
ao bonapartismo. O modo como se desenrolarão as eleições em 2018 confirmarão esta
hipótese.
Vladimir Safatle (2017) chama a atenção para o alto grau de desaprovação doatual
presidente da república, Michel Temer, superior aos 90%, e alerta:"Seria suprema ingenuidade
acreditar que esses que agora nos governam, esses senhores de uma guerra civil não
declarada, esses mesmos que têm consciência absoluta de que nunca ganhariam uma eleição
majoritária no Brasil para suas políticas, aceitem ir embora de bom grado em 2018." Nesse
caso, o jogo político do ano que vem já está decidido: não acontecerá. Três caminhos são
divisados por Safatle: a) uma eleição bielorrusa (que consiste em tirar do jogo quem pode
ganhar, mas não faz parte do núcleo atual de poder, como fizeram com o PCB em 1947); b)
uma mudança na estrutura do poder, que institua o fim do presidencialismo e a implantação
do parlamentarismo (que, na prática, é ser governado pelas oligarquias, como foi feito em
1961 contra Jango); ou c) por fim, caso falhem as primeiras opções, resta ainda executar-se
uma guinada explicitamente autoritária (como em 1964). Nesse último caso, outra vez
viveríamos “tempos de guerra”, com o bonapartismo propriamente dito.
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LINHARES, Carolina. Empresário espalha frase citada por Temer em outdoors de MS. Folha de
S. Paulo. Poder. 16/05/2016. Disp. em:
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MADUREIRA, Maria da Anunciação. "A problemática dos modos de produção na obra de
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2017
ROCHA, Leonardo. “Criada em MS, campanha com frase de Temer terá outdoors no país
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<https://www.campograndenews.com.br/politica/criada-em-ms-campanha-com-frase-de-
temer-tera-outdoors-no-pais-inteiro> Acesso em: 4 nov. 2017
SAFATLE, Vladimir. “Não haverá 2018.” Folha de S. Paulo. Opinião. 25/08/2017. Disp. em:
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Anexos
Figura 1: Placa no posto Doninha, rodovia Castelo Branco, km 68, SP (O POVO ONLINE, 2016).