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Faria, P. O.
Geonumerics Engenharia Civil, Florianópolis, SC, Brasil, pfaria@geonumerics.com.br
Noronha, M.
UFSC, Departamento de Engenharia Civil, Florianópolis, SC, Brasil, marcos.noronha@ufsc.br
Resumo: O presente trabalho apresenta o estudo de caso da análise geotécnica-estrutural das fundações de
um parque eólico no Rio Grande do Sul com 10 torres. Para tanto, são considerados os critérios-base dos
Estados Limite Último, Estado Limite de Serviço e Estado Limite de Fadiga. Em todos os casos, a análise
observa as normas técnicas vigentes no Brasil, no caso a NBR-6118 e a NBR-6122, e também as
especificações técnicas do fabricante das torres eólicas e ainda as normas Europeias Eurocode 2, Eurocode 3
e Eurocode 7 e CEB-FIP 1990. A primeira análise apresentada corresponde ao estudo da geologia do local,
seguido do cálculo geotécnico para avaliar o comprimento das estacas de cada base. Por fim, o estudo
utilizou um modelo 3D e o método dos elementos finitos para realizar verificações com alta precisão.
Abstract:This article presents the case study of the geotechnical/structural and design aspects of the
foundations of a wind farm in Rio Grande do Sul State, Brazil.The study has focused especially on the most
critical issues of Ultimate Limit State, Serviceability Limit State and Fatigue Limit State for the concrete
piles.In order to provide reliable results based on updated calculation procedures, the study was based on the
well-established Brazilian Norms NBR-6118 and NBR-6122, the European Norms Eurocode 2, Eurocode 3
and Eurocode 7 and CEB-FIP Model Code 1990, also considering the requirements and technical
specifications from the manufacturer. Besides simplified procedures, the calculation herein presented has
also considered a 3D FEM model to produce more accurate results.
No ensaio CPT, medem-se as grandezas de Figura 1: Sondagens SPT na base UERS-01 (A e B).
resistência de ponta e do atrito lateral resultantes da
cravação da ponteira cônica, ambas utilizadas para a As conclusões sobre os materiais encontrados são
classificação do solo. Os estados de tensões e as seguintes:
deformações gerados no solo devido à cravação do -Areia fina amarela, medianamente
cone permitem usar hipóteses simplificadoras e compactada a compactada, apresentando
correlações para a determinação dos parâmetros dos resistência avaliada como entre 10 e 20
materiais, Schnaid & Odebrecht, (2012). golpes do martelo do SPT;
-Areia fina cinza medianamente a muito
No sítio de locação do parque UERS foram compactada (com variações de cinza claro,
executadas 20 sondagens SPT (UERS-01 a UERS- escuro e preto). A resistência na superfície é
10, com índices A e B). Os furos foram executados de 10 a 25 golpes SPT. Com o aumento da
ao longo dos aerogeradores com separação entre as profundidade há um correspondente
sondagens de 18 m, sendo a distância entre acréscimo de resistência, passando a mais
aerogeradores de 150 m. Com os furos de sondagem de 30 golpes SPT. Na cota aproximada de
sobre um alinhamento reto (v. item 3), somente foi -15 m, tem-se material extremamente
possível considerar camadas geológicas horizontais compactado, tratando-se de uma possível
nos modelos de cálculo. Para fornecer uma análise
camada de rocha arenítica.
de projeto mais confortável, esta simplificação foi
-Argila com areia fina, muitas vezes com
compensada pela minoração (50%) dos parâmetros
do solo nas camadas superiores (primeiros 10 m). vestígios de conchas. Até a profundidade
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média de 15 m, a resistência desse material
é da ordem de 8 a 15 golpes SPT. Em Cabe ressaltar que tanto a NBR 6122:2010 quanto
maiores profundidades a argila se torna rija o Eurocode 7 – Geotechnical Design não
necessitando em média de 30 golpes para estabelecem os métodos de cálculo da capacidade de
prosseguir nos últimos 30 cm do tubo. suporte, mas sim os tipos de verificações a serem
-Areia fina com pouca argila, normalmente atendidas e seus respectivos fatores de segurança.
compacta a muito compacta, com
resistência ao SPT de 8 a 20 golpes. Uma estaca submetida a um carregamento
vertical irá resistir a essa solicitação tanto pela
-Argila com areia fina verde (ou também
resistência ao cisalhamento gerada ao longo de seu
classificada como de cores variegadas),
fuste e quanto pelas tensões normais geradas na sua
media a dura, com valores de SPT variando ponta.A carga última ou de ruptura do conjunto
de 12 a 25 quando próximo da superfície e estaca-solo (Qult) é definida como a soma das cargas
da ordem de 30 golpes quando em maiores máximas que podem ser suportadas pelo atrito
profundidades. lateral (Qatrito) e pela ponta (Qponta), ou seja:
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depende do tipo de solo. Os autores sugerem os
valores apresentados na Tabela 1. 7.1.3 Considerações de Carregamento
Tabela 1 – Valores de α.
Tipo de Solo α A fabricante dos aerogeradores do parque UERS
(%) apresentou critérios de projeto particulares para a
Areia 1,4 determinação da capacidade de suporte da fundação
Areia siltosa 2,0 em estacas.
Areia argilosa 3,0
Silte 3,0 Para efeitos de dimensionamento preliminar esta
Silte arenoso 2,2 especificação estabelecer valores de carregamento
Silte argiloso 3,4 nas estacas, conforme a Tabela 4 apresenta. Estes
Argila 6,0 valores são referentes ao uso de 30 (trinta) estacas
Argila arenosa 2,4 cravadas por base, com diâmetro = 50 cm.
Argila siltosa 4,0
Tabela 4 – Carregamento da Fundação.
7.1.2 Método Decourt e Quaresma (1978) Tipo de carregamento Fd(kN)
Compressão 1774
Esse método, originalmente previsto para estacas Tração 310
de deslocamento, utiliza para a determinação da 7.1.4 Resultados de Cálculo
capacidade de carga das estacas os valores do SPT e
apresenta as seguintes características, Velloso, D.A. Na Tabela 5 são apresentados, de forma
e Lopes, F.F. (2002): compilada, os resultados dos cálculos de previsão da
capacidade de suporte do conjunto estaca-solo para
Resistência de Ponta os aerogeradores do parque UERS. No caso, o
Toma-se como valor de N a média entre o valor comprimento mínimo das estacas (Lmin) foi
correspondente à ponta da estaca, o imediatamente escolhido como o caso mais crítico do resultado
anterior e imediatamente posterior. A resistência de entre os métodos Aoki/Veloso e Decourt/Quaresma.
ponta é dada por:
Tabela 5 – Resultado das previsões de
qp,ult = CN Capacidadede Carga.
Fundação Lmin Carga Carga
Em que C é dado pela Tabela 2. Estaca Ruptura Admis.
(m) (kN) (kN)
UERS -1 18,0 4090 2045
Tabela 2 – Valores de C UERS -2 23,0 4090 2045
Tipo de Solo C UERS -3 19,0 4140 2070
(tf/m2) UERS -4 17,0 3660 1830
Areia 40 UERS -5 18,0 3680 1840
Silte arenoso 25 UERS -6 19,0 3710 1855
Silte argiloso 20 UERS -7 19,0 3660 1830
Argila 12 UERS -8 20,0 4230 2115
UERS -9 19,0 4550 2275
Atrito Lateral UERS -10 19,0 4440 2220
Consideram-se os valores de SPT ao longo do fuste,
sem levar em conta aqueles utilizados para a Cabe destacar que a real mobilização da
estimativa da resistência de ponta sem levar em capacidade de carga de estacas de deslocamento ou
conta o tipo do solo. O atrito médio ao longo do cravadas é obtida através da interação estaca-solo.
fuste é calculado pela média dos SPT e retirado da Logo, o próprio processo de cravação das estacas
Tabela 3: tem papel fundamental para garantir a mobilização
requerida em projeto.
Tabela 3 – Valores de atrito médio
N Atrito Lateral Sistemas de controle de cravação, tipo repique e
(médio ao longo do fuste) nega, além das planilhas de cravação, são
(tf/m2) fundamentais para a verificação da mobilização de
≤3 2 carga requerida na fundação em estacas cravadas.
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9 4 Os comprimentos de estacas apresentados são
12 5 valores mínimos. Podem ocorrer variações no
˃15 6 campo em decorrência da heterogeneidade do solo e
da energia de cravação.
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regras de correlação propostas por Aoki/Velloso,
Os valores de carga de ruptura e admissível Decourt/Quaresma. Em particular, o módulo de
apresentados na tabela 4 atendem os critérios de elasticidade das camadas de solo foi obtido através
carregamento apresentados pela Contratante, ou das regras de correlação propostas por Teixeira &
seja, 1774 kN de compressão e 310 kN de tração em Godoy (1996), que também complementaram a
cada estaca. obtenção dos parâmetros de coeficiente de Poisson,
coesão e ângulo de atrito interno. O presente estudo
considerou a base UERS-1 como o caso
8 UERS: CARGAS E GEOMETRIA representativo, com estacas de 16 m de
comprimento (Fig. 4).
Quanto às estacas, foi considerada a distribuição
circunferencial de 30 estacas, sendo 20 estacas com Com o objetivo de incorporar os efeitos de
inclinação de 4.5:1 (para fora) e 10 estacas com alteração e degradação (induzida e natural) do solo
inclinação 7:1 (para dentro), conforme as Figuras 2 mais superficial, foi considerada uma minoração
e 3 ilustram. A conexão entre as estacas e a (50%) nas propriedades geomecânicas da camada de
fundação foi considerada com o comprimento de 4 m iniciais, também em concordância com os
superposição de 1 m (Fig. 3). resultados dos ensaios de SPT e CPT.
A estacas são do tipo “SCAC especial” de
concreto centrifugado, com seção circular vazada
com 50 cm de diâmetro externo e 9 cm de espessura.
A armadura longitudinal tem9 barras de aço CA-50
com 16 mm de diâmetro. Já o comprimento das
estacas varia para cada base (Tab. 4).
Figura 7: Relação - para o aço. A interação entre as estacas e o solo foi
incorporada no modelo com elementos de interface
A verificação estrutural do concreto das estacas sofisticados, permitindo a representação da
seguiu as recomendações da norma Brasileira NBR- resistência de ponta, do atrito lateral e do empuxo
6118. O caso mais elaborado da verificação da transversal do solo nas estacas. Já a interação entre a
fadiga foi realizado segundo as normas Brasileira e estaca e a fundação é considerada através de um
Europeiae as especificações da fabricante da torre. comprimento de transpasso de 1m (Fig. 3),
permitindo a transferência de forças e momentos
para o topo da estaca. Assim, o comprimento total
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das estacas é de 17 m, sendo que 1m das mesmas
estão incorporadas no bloco da fundação.
As cargas provenientes da torre e do aerogerador
são aplicadas no centro do topo da fundação através
de forças e cargas-momento (Fig. 9) de acordo com
os valores fornecidos pela fabricante da torre.
Considera-se também o peso-próprio tanto da
fundação como das camadas de solo. Nos casos que Figura 11: Cargas nas estacas para DLC 1.1.
incorporam o efeito do nível da água, as cargas de 11.1 Caso DLC 1.1 sem Subpressão
subpressão foram consideradas de forma explícita
com a aplicação do empuxo na base da fundação. Os resultados para o caso de carga DLC 1.1
foram obtidos na análise do modelo tridimensional
gerado com os carregamentos especificados pela
fabricante (Fig. 10). A aplicação desses
carregamentos (forças e cargas-momento) foi
considerada no topo da fundação (Fig. 12).
A análise indicou que os máximos valores dos
esforços normais (-1753 kN, Fig. 13) e dos
momentos fletores (73 kN.m, Fig. 14) no topo das
estacas ficaram em boa concordância com os valores
fornecidos pela fabricante (-1774 kN e 74.2 kN.m).
Figura 10: DLC 1.1 – Carregamento extremo. Figura 14: Momentos Fletores nas Estacas.
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situam-se abaixo dos patamares máximos,
Como a Figura 15 ilustra, a verificação da garantindo a limitação da abertura de fissura.
capacidade de resistência das estacas no diagrama
de interação P-My-Mz indicou que no ELU a estaca Por fim, verificou-se que a região dos 3 m abaixo
mais solicitada (inclinada para fora) trabalha com da fundação provoca momentos fletores relevantes
79.7% da sua capacidade máxima, satisfazendo nas estacas. Assim, a recomendação é de que as
portanto a condição de segurança no ELU. conexões com solda fiquem além desta região.
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Figura 18: Esforços Normais nas Estacas. Figura 21: Recalque diferencial da fundação.
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O caso do ELS também foi verificado quanto
Para representar o comportamento à fadiga dos às questões de recalques diferenciais e de abertura
três materiais (concreto, aço e solda), foram de fissura no concreto das estacas.
consideradas as curvas S-N constantes tanto na
NBR-6118 quanto no Eurocode. Quanto ao ELF, a análise com a regra de
Palmgren-Miner para estimar dano acumulado
Em termos resumidos, considera-se que para indicou que o concreto, as barras de aço e as
realizar a análise de fadiga o método de Palmgren- conexões soldadas atendem com folga o efeito da
Miner efetua o cálculo do dano acumulado que deve fadiga.
obedecer ao seguinte critério:
(n/N)< 1 , (7) Por fim, quanto à posição da solda de conexão
onde N é a faixa analisada (1E+3, 1E+4, etc.) e n é o entre segmentos de estaca em relação à base da
número de ciclos que causa a ruptura para o fundação, a simulação 3D recomendou que a solda
carregamento correspondente à faixa analisada. fosse posicionada a partir do limite de 3 m.
O presente estudo de caso utilizou um modelo Eurocode 3 (1993), Design of Steel Structures,
3D e o método dos elementos finitos para realizar ENV1993-1-1
verificações da fundação profunda das torres de um
parque eólico no Rio Grande do Sul. Para tanto, Eurocode 7 (1997), Geotechnical Design, EN 1997
foram observadas tanto as normas BrasileirasNBR-
6122 e NBR-6118 quanto as normas internacionais Manwell, J.F. et. al., (2009) Wind Energy Explained
Eurocode 2, Eurocode 3 e CEB-FIP. – Theory, Design and Application. John Wiley
& Sons Ltd.
A verificação foi feita de forma separada para
os casos de carga mais críticos dos Estados Limites Schnaid, F. (2000), Ensaios de Campo e suas
Último, de Serviço e de Fadiga (ELU, ELS e ELF). Aplicações à Engenharia de Fundações, Oficina
Em geral, verificou-se que o nível de solicitação das de Textos.
estacas é relativamente baixo.
Schnaid, F., Odebrecht, E. (2012), Ensaios de
A verificação do ELU considerou dois casos Campo e suas Aplicações à Engenharia de
distintos, com e sem o efeito da subpressão. Em Fundações, Oficina de Textos.
ambos os casos, a análise revelou que a fundação é
segura e fornece segurança dentro de todas as Teixeira, A. H., Godoy, N. S. (1996), Análise,
condições necessárias. Projeto e Execução de Fundações Rasas,
Fundações: Teoria e Prática, Ed. Pini.
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Velloso, D.A., Lopes, F.R. (2002), Fundações –
Fundações Profundas, v. 2, COPPE/UFRJ, Rio
de Janeiro, Brasil.
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