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Teorias da regulação

Prof. Marcos Vinicius Pó


marcos.po@ufabc.edu.br
Regulação e Agências Reguladoras no Contexto Brasileiro
Características da regulação
• Uso da autoridade governamental
• Não envolve grandes gastos ou transferências de recursos
diretos
• Pode assumir vários formatos institucionais
• Dispõe de uma grande gama de instrumentos
• Implica em direcionamento de atores privados
• Altamente técnica – requer expertise burocrático
• Graus significativos de delegação de autoridade
discricionária e normativa
• Impõe desafios para accountability e controle
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Abordagens teóricas e analíticas
• Interesse público (política)
• Teorias econômicas
► Teoria normativa
► Teoria positiva

• Teoria Agente-principal (ou da agência)


• Nova Economia Institucional (NEI)
• Regulação como política pública

• Essas linhas partem de pontos de vista diferentes, possuindo


pontos conflitantes e comuns entre si, mas podem ser
utilizadas de forma complementar, dependendo da natureza
do problema a ser estudado.
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Interesse Público
• Análise por um prisma político para o estabelecimento da
regulação e das motivações dos reguladores em relação aos
problemas ocasionados pelo mercado

• Regulação como resposta governamental para as falhas de


mercado, externalidades negativas e desejos da sociedade

• Estudo dos padrões de relacionamento entre regulador e


regulado

• Força dos grupos sociais e econômicos junto aos atores


políticos
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Teorias econômicas

• Teoria normativa: intervenção do Estado na esfera


econômica

• Teoria positiva: bases de ação do Estado frente à ação dos


agentes privados

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Teoria normativa
• Atuação do Estado para assegurar a operação Pareto-
eficiente dos mercados
• Mercados competitivos asseguram alocação eficiente de
recursos
• Falhas de mercado
► Bens públicos: não-exclusividade; não-rivalidade
► Falhas de competição: ineficiência alocativa; ineficiência

produtiva
► Externalidades: custo privado é inferior ao custo social de
produção
► Assimetria de informação: seleção adversa; risco moral

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Agenda normativa
• Integração vertical
• Liberalização
• Estrutura horizontal
• Estrutura regional
• Regulação de preço de produto
• Regulação de preço de acesso
• Regulação de monopolistas
• Regulação pró-competição
• Regulação de aspectos que não se referem a preços

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Interface entre a agenda positiva e a
normativa
A concorrência é desejável?
Sim Não
A concorrência é viável?

Mercado concorrencial
Sim

Cream skimming
normal

Barreiras impostas por


Monopólios naturais
Não

firmas dominantes ou ex-


severos
monopolistas

Fonte: Melo, 2000: 15

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Teoria positiva
• Teoria Econômica da Regulação (teoria da captura)
► Inclusão dos grupos de interesse na análise da regulação e suas
motivações
• Empresas lucrariam com a regulação e a sociedade perderia:
► Captura
► Articulação entre empresas reguladas, sistema político e os
reguladores
► Limitação ou proteção contra a concorrência

► Ampliação da renda extraída dos consumidores

• Contexto histórico de questionamento à regulação (1970-80):


elemento que distorce a alocação ótima de bens de um
mercado livre e competitivo, portanto o melhor para a
sociedade seria a desregulamentação
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Fundamentação teórica
• Lógica da ação coletiva (Olson, 1965)
• Abordagem economicista
• Grandes grupos x grupos pequenos
• Elementos analíticos
► Concentração X difusão de benefícios e/ou prejuízos
► Impeditivos para a organização
o Custos de organização
o Custo de informação
• Grupos latentes necessitariam de incentivos seletivos para se
organizarem
• Organização parcial de grupos já seria suficiente para diminuir
a apropriação de renda
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Conclusões principais da teoria positiva
• Grupos pequenos e bem organizados se beneficiarão da
regulação mais do que os grupos grandes e difusos, ou à
custa destes.

• A política regulatória procurará preservar a distribuição


de recursos entre os membros da coalizão dominante.

• A regulação é sensível a perdas de bem-estar, pois os seus


benefícios se concentram em sua capacidade de distribuir
riqueza.

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Teoria agente-principal (teoria da agência)
• Foco na delegação de autoridade: contrato permeado por
assimetrias de informação e de recursos

• O principal busca atingir seus objetivos impondo


incentivos, restrições e penalidades ao agente, buscando
superar o fato de não conseguir observar e avaliar
diretamente as ações deste
► Exploração oportunista
► Discrepância entre comportamento ex ante e ex post

► Custo de agência

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Riscos da delegação
• Risco moral: mudança de comportamento do agente em função do ônus da sua
atitude individual ser repartido por um grupo grande, o que levaria o bem a ser
usado além do razoável.

• Seleção adversa: tendência de que o sistema de proteção incorpore indivíduos de


maior risco, ou seja, aqueles que tendem a utilizar mais o bem. Dessa forma, os de
menor risco tendem a abandonar o sistema, tornando-o ainda mais caro num ciclo
vicioso.

• Seleção de risco: criação de barreiras à entrada de pessoas com maior risco e taxa
de utilização do sistema, visando limitar custos e ampliar lucros.

• Assimetria informacional: uso da informação em benefício próprio, limitando a


ação dos controladores (principais).

• Dificuldade de revisão: os reguladores podem criar apoios dos favorecidos pelas


novas regras, tornando politicamente mais difícil reverter as ações realizadas.

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Controle administrativo
• Estratégias utilizadas para reduzir o espaço discricionário e a
derivação (slack) da burocracia reguladora, mantendo agenda
definida originalmente
• Procedimentos administrativos: ampliam a disponibilidade de
informações e as oportunidades de que algum ator soe o
alarme de incêndio
• Desenho institucional: seleção dos grupos de interesse
habilitados a monitorarem as agências a participarem do seu
processo decisório.
• Regras e mecanismos que aumentem a transparência e
diminuam a velocidade do processo de regulação permitem
aos interessados agir antes que alguma decisão contrária aos
seus interesses seja tomada
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Transferência de culpa (blame shifting)
• As instituições seriam criadas com mandatos vagos, recursos e
autoridade como uma forma de afastar dos políticos as
decisões controversas e difíceis sobre assuntos complexos

• Assim, os políticos poderiam usar a sua influência em prol


dos cidadãos ou de grupos descontentes, denunciando
problemas da burocracia para o aplauso público

• Dilema da delegação: risco de perdas por má decisões e/ou


custos políticos X perda de poder decorrente da delegação e
custos de controle

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Teorias institucionalistas

• Institucionalismo: análise das instituições e seu papel no


comportamento dos agentes

• Nova economia institucional: análise do papel das


instituições para o desenvolvimento econômico e social

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Institucionalismo
• Instituições:
► Restringem e corrompem o comportamento humano
► Induzem comportamentos específicos, estratégicos
► Fornecem meios de liberação do vínculo social
► São criação humana, podem ser modificadas pela política
► Mudanças provocam resultados incertos: altera as regras do jogo

• Pressuposto: os resultados são racionais do ponto de vista


coletivo, dentro das regras postas

• Eixos de análise
► Poder
► Cálculo racional
► Estrutura de incentivos
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Instituições e atores
• Os atores sociais, econômicos e políticos não apenas
maximizam seu interesse próprio com base em limitações
do contexto, mas:

► Buscam garantir suas apostas em ambiente incerto

► Traçam estratégias

► Tentam moldar o contexto para:


o Melhorar chances futuras
o Constituir suas identidades e interesses
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Nova Economia Institucional (NEI)
• Origem teórica: teoria da Firma (final da década de 1930)
► Incluiu nos modelos econômicos questões como os custos de
transação

• Firma: estruturas para diminuir os custos de transação e


superar falhas de mercado e oportunismo
► Com custos de transação baixos o mercado tenderia a propiciar
uma alocação eficiente dos recursos

• Tipos de custos de transação


► Busca e informação
► Negociação

► Determinação de políticas e implementação

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O que são instituições para a NEI?
“Instituições são restrições humanamente planejadas que
estruturam as interações políticas, econômicas e sociais.
Elas consistem de restrições tanto informais (sanções,
tabus, costumes, tradições, e códigos de conduta) como
formais (constituições, leis, direitos de propriedade). [...] As
instituições proveem a estrutura de incentivos de uma
economia; conforme a estrutura se desenvolve, ela molda a
direção da mudança econômica em direção ao crescimento,
estagnação ou declínio”
NORTH, Douglass. (1991). Institutions. The Journal of Economic Perspectives,
Vol. 5, No. 1 (Winter): 97

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Papel básico das instituições
• Reduzir os níveis de incerteza no ambiente de negócios

• Dar credibilidade às relações sociais em uma economia de


mercado

• Garantir os contratos (diminuir a possibilidade de


descumprimento)

• Fornecer compromisso (commitment)


► Estabilidade contratual
► Estabilidade de regras

► Limitar possibilidade de expropriação de rendas ou ativos

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Privatização e instituições
• Serviços públicos privatizados possuem:
► Custos irrecuperáveis (sunk costs)
► Longa maturação para retorno de investimentos

► Forte interesse político (alto consumo, direitos...)

• Assim, seria necessária uma estrutura institucional com:


► Restrições à ação discricionária dos reguladores
► Restrições à mudança de regime regulatório

► Instituições que garantam as restrições

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Governança regulatória
• Diversas combinações possíveis envolvendo:
► Legislativo
► Executivo

► Judiciário

► Regras informais

► Capacidade institucional do país

• Também deve-se considerar que processos de


privatização/concessão implicam em:
► Gerar coalizões favoráveis com peso institucional e econômico
► Há altos custos legais e políticos de se desfazer o que já foi
realizado

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NEI como referencial analítico
• Pesquisas sobre o papel das instituições, muitas delas
financiadas pelo Banco Mundial, indicava que marcos
regulatórios que proporcionassem segurança contra ações
arbitrárias e oportunistas dos governos encorajavam o
investimento privado de longo prazo.

• Tipos de instituições analisadas:


► Executivo e Legislativo;
► Judiciário;

► Costumes e normas informais que impõe restrições às ações de


indivíduos ou instituições;
► As características dos interesses sociais presentes no país,
incluindo o papel da ideologia;
► As capacidades administrativas do país.

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NEI como receituário institucional
• As conclusões obtidas nos estudos desenvolvidos sob a nova
economia institucional acabaram se tornando um receituário
para instituições reguladoras:

“(a) liberdade gerencial, (b) autonomia política (liberdade da influência


política e de grupos de interesse), (c) accountability (a obrigação de um
agente ou empregado em responder e cumprir suas responsabilidades ao
seu principal ou empregador, (d) freios e contrapesos (para limitar o poder
de indivíduos singulares na instituição) , e (e) incentivos (para recompensar
pela boa performance e punir desempenhos inadequados ou arbitrários).”
(GUASCH; SPILLER, 1999:49)

• A autonomia se tornou uma negação do controle político.


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Regulação como política pública
• Tipologia

• Características da política

• Tipo de discussão

• Tipo de ambiente

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Lowi, 1972
• Policy determine politics – o tipo de política pública
determina o jogo político.

• Cada tipo de política pública vai encontrar diferentes


formas de apoio e de rejeição.

• Cada tipo de política pública gera uma configuração de


pontos de vetos e de apoios diferentes, processando-se,
portanto, dentro do sistema político de forma distinta.

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Tipologia de Lowi
• Distributiva: decisões que desconsideram a questão dos recursos
limitados, gerando impactos mais individuais (ou em grupos determinados)
do que universais ao privilegiar certos grupos sociais ou regiões em
detrimento do todo
► Ambiente político: troca de favores
• Regulatória: coerção individuais (empresas ou pessoas) e imediatas,
situando-se em ambientes pluralistas conflituosos, com forte presença de
grupos de interesse e constituindo-se em jogo de soma zero.
► Ambiente político: confronto, negociação, barganha

• Redistributiva: atinge maior número de pessoas e impõe perdas concretas


e no curto prazo para certos grupos sociais, e ganhos incertos e futuro para
outros;
► Envolvem diretamente valores, interesses e ideologias

► Ambiente político: conflituoso, são as de mais difícil encaminhamento

• Constitutiva: Lidam com procedimentos, estrutura de governo, as regras


do jogo
► Ambiente político: negociação entre partidos, busca de apoios

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Tipologia de Wilson (1973; 1989)

Benefícios
Tipo de política
Concentrados Difusos

Grupos de interesse Empreendedora


Concentrados Luta dos grupos pela conquista da
arena política, visando desequilibrar
Leva o agente público a buscar apoio
de grupos sociais ou de políticos para
Custos

o jogo poder realizar a sua missão

Clientelista Majoritária
Difusos Captura pelo grupo dominante Dependerá de ação política que
aglutine interesses dispersos

Fonte: Wilson, 1989: Bureaucracy: what governmente agencies do and why they do it
Elaboração nossa
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Contribuições das abordagens
• Interesse público: importância das demandas e necessidades sociais e o
papel do Estado para corrigir problemas ocasionados pelo mercado.
• Econômica:
► Normativa: regulação como meio de buscar eficiência econômica/ para
atingir determinados resultados econômicos.
► Positiva: a regulação não é neutra, é permeada por interesses e pode ser
capturada para a proteção de determinados grupos.
• Principal-Agente: riscos do agente não seguir as orientações de quem
delegou e os mecanismos para mitigar essa possibilidade.
• Institucional:
► Institucional: regras e incentivos podem induzir comportamentos e afetar os
agentes de maneiras inesperadas.
► NEI: instituições reguladoras como elementos para garantir contratos,
elemento central para a atração de investimentos.
• Política pública: a regulação é um ambiente de conflitos pluralistas,
constituindo-se em um jogo de soma zero.
Trabalho final: analisar as instituições e questões regulatórias em um
setor específico usando os referenciais teóricos vistos na disciplina

• Deve conter minimamente • Setores


► Mapeamento e descrição das ► Transportes (terrestre e
instituições regulatórias do setor aquático)
(agências, ministérios, secretarias, etc), ► Energia elétrica
incluindo uma análise dos elementos ► Recursos hídricos
de accountability
► Educação superior
► Indicação das principais leis e
instrumentos legais ► Petróleo e gás
► Indicação das principais questões ► Aviação civil
regulatórias e problemas do setor ► Saneamento
► Aspectos federativos envolvidos (se ► Saúde
aplicável) ► Concorrência
► Identificação dos grupos sociais, ► Sistema financeiro
econômicos e políticos envolvidos ► Telecomunicações
► Análise geral e conclusão

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• Aulas de 27 e 29/08: Regulação e política: relações verticais e
horizontais da burocracia reguladora
► Texto base: KUTNER, R. (1998). Tudo à venda. Tradução de
Claudio Weber Abramo. São Paulo: Companhia das Letras.
Capítulo 9

• Atividade individual para entrega em 27/08: análise crítica


do texto:
► Posner, R. Teorias da regulação econômica. 1974 In. Mattos et
all. Regulação econômica e Democracia. Editora 34: São Paulo.
2004

• Material disponível em:


http://perguntasaopo.wordpress.com/disciplinas/ragcb/

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