Você está na página 1de 22
UMA PEGA POR OUTRA de Jean Tardieu ‘Traduzido por Manuel Bandeirs, ina Ceo e Renato learehy Adaptado pelo GRUPO TAPA SO BLES © SABEM PERSONAGENS Cristiane Simone Lauro Cesar Janete Avnesiravon = Jean Tardieu costumava dizer que, multas vezes, 05 espectadores Sho convencidos a seguir uma ago teatral cujos verdadeiros motivos fles no vem a entender: ‘— Sera conseqiigncia de uma en- fermidade propria a arte dramatica? = Seri por que a vida dos outas no paleo, como na realidade, no nos revela seu segzedos? ~ Ser por que as personayens especialmente nor dramas dit “realiatas” ~ ocupam-se apenas com seus problemas e munca com os dos tspectadores, atitude que denota uma falta de cortesia Lamentivel? ‘= Sera enfim por que os autores, abusando de sua situagio privile- Giada, fazem questio de nce del ar sob uma desagradivel Impres- ‘Sho de mister? ‘So perguntas que. sem divids voots ndo deixario de fazer en quanto assistem: "SO ELES O SABEM”. (Cristiano e Simone extio de pé no meio do palco, envolvidos numa grande discussia, Cristiano vat © ‘vem nervcsamente, Simone 0 acom- panha com os olhos, com tima ex bressso ma, As cortinas da. janela (stdo puradas pela metade. O quar {0 esti na penumbra.) Cristiano — Voce pode ertar cera que cles alo vBo consegutr we pegae Simone ~ Fala € fact Ghisrinno — Veet nfo pende por esperar. ‘Siuows ~ Duvido! Cusine — Ti & 0 ave mon ‘Smione (dando de ombros) — INa seu gee eu deaista loge! Camano (go) Deity, eal Depo de tudo. que aconteces! Nunes ess ouvindos auncal,. E logo voct que me di exse tonse- thot, "Ab, ‘obrigedo.milto cbt ee ‘SIMONE Eu te previao pela él tina vex, Colsano, Voce tad 20 Camino errado, E tle val te pegat, ere tenho certeza que dle val te egar. Cuisriano — E cu tenho certeza, Simone, que aso nio val acabar ae ‘Sin! Seria muito simples, muito si lel. Quer saber de’ uma coisa? yoet nit tem nada a ver com le, nada, entende? Voct 36 tem ma Gcisa a fazer: calor e boca e me detsar agi Sntoxe — Nio, eu aio vou me ealac! Sei que tenho razio e quer> que voce fe renda ds evidencias Nao conte Caismiano (Jurioso) — Voce vai se calar no final! Simone (continuznde) — Nao conte com meu silencio, Voe® janis conseguiria wma coisa dessa Te- saho meu papel aqui tanto quanto ChistiaNo — 2 ment ‘6 que tenho que fazer Sintoxe — Nao, voct néo sabe de nada! Enguanto que ex me sinto nia obrigagio de deixar tudo claro! Eu nto quero que nada figue eseon Csmsano — Bu sei o que eu se. Sitone — Sempre essas palavras na hocal Defisitivamente, mew po- bre Cristiano, © que voce espera fa zer nessa altura dos acontecimen- fost Eu repito que voce néo sabe de ads, absoluiamente nada! Chisiaxo — B al que voot se ‘enganal Quando ew digo que eu sei (0 que eu sei, € que eu sti realmente (0 que eu sell... Nio € como voce € claro! Vocé. ew dia SIMONE (com vor sibilante) ~ Vamos, conclua © que pensou, por favor, eu dia, . Cusriaxo — Nio, eu nfo vou dizer, & muito idiotal Sitoxe — Nio ful eu quem disse! CCrisriANo (subitamente furioso € tonando uma determinaggo) — EB quer saber de oma coisa? Pra mim Chega! Com voce nada € possivel ‘SIMONE — Realmente, nada do que € Imposstvel € possivell Pelo ‘menos com isso, eu tenho certera (que voce “concord! (Cristiano se 25 Eu set dirige para a porta.) Voct nio vai 1a, eu espero? ‘Cuisraxo ~ Eu nio tenho que Ihe dar satisfagees. ‘SiMONE (impedindo-o de soir) Tem sim! Eu exijo uma explica- ‘Gio, E jal Onde voct vail Cnismiao — Aande et hem ea- tender! (Ble a empurra brusca mente.) Sisto — Seu brutol... Sem eduengao! Patife! Csnalhal (Cris ‘tang sai sem dizer nada e bate a porta, Simone fica $6. caminha de tim lado pore © utrn @ Pouca pouco se acalma,) Vemos! Calma, falmal Pars que ficar nervosa? Vamos ver... Das dvas uma, ‘ou cle escolhe’ a primetea solucio. . fon cle opta pola segunda, No pi- mnelzo caso, ha graves inconvenien- tes... No segundo também, Cla- ro, ha vantagens e desvantagens Iguats.., Mas... alguma coisa me diz... mas pode ser gue seja pu Cusial.., Se ele fosse.. Nao, nio © possiveh (Alguém toca a cam- poinha, Simone. vai abrir, Entra Lalo Cesar. Simone de repente miaito omavel) Ab, Lauro Cesar, vvoc® chegou em boa hora, Eu es tava te esperando! TAURO CESAR: (espantado, mas serridente) — Mas como! Nem eu sobin que vishal SIMONE — Eu quero que... de certa mancina eu esperava sua ¥isi~ ta. (afetacsamente) Sente-se agul perto de mim... Me ajuda: eu estou ‘Ruma perplesidade tersvell (Sen- arse mo cansyé) Tauno Case (sentando.se a se lado) — Eatio, foi todo bem? Simone — Mais para mal que ‘para bem! Alémdisso, ele no esta 26 mais aqui. Lauro Cesar — Ah! Bem que eu desconfiaval... No fundo, ele no Kaka outta opsio. SIMONE ~ B, mas nio se pode firmer que ele ndo vai voltae. Lauro Cesar ~ Voltar também € uma apse... (Depois de hesitar tum pouco. em voz Baisa) Ex. iit ‘Siwoxe (dando de ombros) ~ Lat Eu nfo. soube de mais nada les vao © vém, de um lado para o ccutro, fomam grandes resolugacs € hesitam no alto fastante., Eofin, contin tudo no ae. Para dizer a verdade, eu acho que eles ndo espe- ram fazer grande cosa Lauso Cusaa — Eles no me dam mesmo. Fu bem que avisel que ficassem atentos! Eee nem ligaram! ‘Sitowr — Meu pobre amigo! Voce se iludist Eu ja aprendi a dar com eles. Olha, se voce juror segredo, eu to moctro uma coisa que vosé vai esclarecer tudo. Promete ‘Que no val cantar a ninguém? Lauro Cxsar — Claro! Sissons — Jura? Lauro Cesar — Vamos, Simone! Claro que ee no vou contar a nin- quem! Como ¢ que voce pode duvie Gar de mint ‘Sistone — B verdade! Desculpal Ah, voct me ajuda tanto... Com vote eu pocso falar claranente, & luz do dial (Eta se levanta. vai pro- ‘otrar wma carta nas gavetas da es- Grioaninha e volia para se sentar perto. de Lanro Cesar. Entroga-the 2 carta) Lelal (Lauro Cesae Ia carta em sifén- cio © parece horrorizado) ‘Smoxe (procurando entender sua ‘expressae) — que voce achat ‘Nao ¢ inctivel? Lauro Cxsar — Mas ¢ uma'lou- Como se pode chegar a Esse panto? 6 vendo para acedear Smons — Agora woot entende porque es exigi segredo. Uma coisa cdesaas ao pode ser do conhecimen- fo de ningués, Lauro Cesar ~ Claro! De nine squém! Ja € demais nés dois saber- ros disso, ‘Smione — Nos do's... © a pes son que escreven a cartal Lauzo Cesar (com raiva) — Ak! Se eu 0 pegasse! Alids nio ¢ 36 ele ‘Tem os outros dos... E além des- ses tem também... yoct sabe de (quem o2 estou falaade, Simone (saspira) — B, eu sei rouito bem. Lato Cesar, mew aro Lauro Cesar, onde vamos chegar ‘com tudo isso? Launo Cesar (sé aproximando) = Vamos, Simone! Vee® sake mui- to hem que enguanto eu estiver aqui, vyoot nd val lear sozinha, (Ele Ihe Nguca a mio, Ele deixa. ereciona- sda, Lao Cesar, prosseguindo) En (guanto houver ume kes; uma luz de Sspernngs, en vou Iutar para que tudo volte a ser como antes. Sinton® (iristemente) — Mew-po- bre Lauro Cesar! © passado & 0 passadol (ila se debulha em lige yas) ‘Lauro Cesar ~ Mas pode ser também 0 faturol (consolando-a) rs, minha pobre amigal Nao fica assim! Pra qua? Eu ja nio disse que estou com voce? (Ele the acaricia ddocements a mio) ‘Simons (ensugando as igrimas) AR verdadel,.. B preciso que ‘voot me diga para que eu acredite Tauro Castr ~ Mas claro que ce estou agail Voce esta vendol ‘Siwtoxe — f tio bom saber disso! Tauro Cesar (largando-the do) — B agora Simone, agora que vou! sabe que eu estou aqui, © pre iso que eu va, SIMONE — Ja? Mas nds ainda nfo disemos tudo! Lauko Cesar (grave) — Sem davidal Na verdade nés aio disse- mos nada. Mas so em te ver, eu sei mais do que voc! pense Simtowe — Pode ser. Lauro Cesan — Sim, Em todo caso voce sabe o que me Uouxe, Voct sabe 9 que me prende, mas vocé sabe também 9 gue me obriga patti Stone — 8 verdade,.. Eu me cesquecia.... Mas voce me promete ‘que voce sera forte? Lauxo Cesar — Eu secei forte. por vord. Sone — preciso ser fore tsinbém pelos outzes.. Por ela principalsiente,... Mas So precisa Ser imprudent! Tato César — Ey nfo serei imprudente Eu prometo. Eu serei forte, mas. prudente. Suwon ~ Entdo eu estou tran- ‘gall, Se vocé quiser. pode ir. (Am- ‘mos se levantam, Ela'o acompanha lentamente até a porta) Lauo Crsar fsolene) — Simo- ne, eu no queso ir embora sem (ele aponta discectarsente para ma determinada parte do apartamento) Stone —' Eu pero. VA voce cconhece 0 caminho Lauro Cesar — Obrigado. (Ele beijacthe « milo longamente sai, Simone vat se sentar no ca inapé € fica um instante conkadors, Broo de apa tempo, « pos se aabre. Entra Janete, mato pilida, de “peignoie”. Ela caminha com dif culdade. Simone; quando a of, tom ttm sobresato) ‘Stone — Voct se levantou? Iso € uma lowcural Joatera ~ Bor que voce fez (20? Simone — Prineico vocé me res- ponde! Por que se leventou! Voce abe que 0 msdico,. Taser (com ma calma tert) = Por que voct fez ise? Siwone —~ Porgue era precio, Janern — Voot sabe que podla tee me metodo? SIMONE — Eu x6 pense na sua side Taner — Que bela respostal So existe 0 corpo! ‘Sitone — Primero, o corpo. O esto ver cm sega, JaMEIE (com sonia) —~ Quanta feonat Smioxt — Alem disso... ev penel que voos ia fear feliz! Jawsre (deicandose colt numa cadeira) ~ Eu repito que voct por dia ter me motadol..Bntao Tel ‘ocd gue mandou ele entrar? ‘Stone ~ Era preciso que ele te vss! TaNETE — Pols sim! Voct <6 pensou nele! Vamos, confeseel Ago- ‘cle pode partir trangiol Mas eu, tu ico com essa lembranes, ‘Sens — Se 6 26 uma lembron- 9, nada mudou entio: iso Ja eal {i antes de velo nowomente (planers, (dra) "Bu abo eon fazendo um Jogo de palavras Not estamos sée, Podencs falas sem cor dios, elaremente, face 2 face! Fi halmente ei saberei Pode ser que fs: mores, mao o mistélo tera dese vend. Snowe — Voce nto vai saber deeds Jasera — Pode ser que eu mor za fa dise, maz pelo sien, antes Ge morrer, eu terei arrancado seu segredol.,. Ak, como ce repres er equ... Palaras, sempre palovras e'nuaea 0 verdade! A ver- dade, est ouvindo, Simone, ex que ro toda a verdadel Stowe — Nio existe segredo ea verdade no € pare woot nem pra amin! Eu alo se de mada, ja dial Sua oucal Como ru posto te ajudat 2 entender, seeu mesma nla entenda nadal Tasure (levamando-se. com es orzo) — Bem, se € assim eu sel o que me resta fazer! (Vai com dir Tetldade ate © porta) Simone (Ieeantando-te cle wm salto) — Isso n90, 80 vost no va inset TaNere (com a calma do veses pero) — Se voce soubesse © que 1 quero fazec! Ew tambern tenho meu segredol SIMONE — Eu nio sei de nada ras pos adivinhar, E. isto td oavindo, no! Enquanto eu for va ‘cu me oporell (As dias rie theres se enfrentam um “momento com o othar} JANeTE ~ Bsta bem! Entio ain- da "meres una solugiol (Cor suas itimas encegas, cla se pect fila para'e escrvaninha e antes que Simone posse the impel pega at revolver) JaneTE (som apontar para. nin- gutn, mas segurando como s: fosse ftirar)'—~ Se’ nada, nem a persia: Sio nem o afeto puderam te acran- 2 6 segreo, 20 menos sabe, que tuma de ngs duas tera deampareciso fntes. que a outta tenia saido da il 27

Você também pode gostar