Você está na página 1de 200

BIBLIOTECA PARA O CURSO DE CIENCIAS DA RELIGIÃO

Selecionamos para você uma série de artigos, livros e endereços na Internet


onde poderão ser realizadas consultas e encontradas as referências necessárias
para a realização de seus trabalhos científicos, bem como, uma lista de sugestões
de temas para futuras pesquisas na área.
Primeiramente, relacionamos sites de primeira ordem, como:
www.scielo.br
www.anped.org.br
www.dominiopublico.gov.br

SUGESTÕES DE TEMAS

1. AS ORIGENS SOCIAIS DAS DENOMINAÇÕES CRISTÃS

2. AS RELIGIÕES AFRICANAS: contribuição a uma sociologia das


interpenetrações de civilizações

3. ELEMENTOS DE SOCIOLOGIA RELIGIOSA

4. HISTÓRIA DAS RELIGIÕES E RELIGIOSIDADES

5. GLOBALIZAÇÃO E RELIGIÃO

6. AS LENDAS DA CRIAÇÃO E DESTRUIÇÃO DO MUNDO COMO


FUNDAMENTOS DA RELIGIÃO DOS APAPOCÚVA-GUARANÍ

7. TURISMO RELIGIOSO: ensaios antropológicos sobre religião e turismo

8. O QUE A RELIGIÃO PODE FAZER PELAS CIÊNCIAS SOCIAIS

9. PLURALISMO, MODERNIDADE E TRADIÇÃO–TRANSFORMAÇÕES DO


CAMPO RELIGIOSO

10. RELIGIÃO E POLÍTICA: sincretismos entre alunos de ciências sociais

11. O SUBTERRÂNEO RELIGIOSO DA VIDA ECLESIAL: intuições a partir das


ciências da religião

Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
12. O FUTURO NÃO SERÁ PROTESTANTE

13. DESENCANTO E FORMAS CONTEMPORÂNEAS DO RELIGIOSO

14. AS RELIGIÕES NO BRASIL: continuidades e rupturas

15. QUANDO VISÕES DE MUNDO SE ENCONTRAM: religião e ciência na


trajetória de formação de alunos protestantes de uma licenciatura em ciências
biológicas

16. RELIGIÃO NA METRÓPOLE PAULISTANA

17. OS DEUSES DO POVO: um estudo sobre a religião popular

18. REPRESENTAÇÕES E RELAÇÕES DE GÊNERO NOS GRUPOS


PENTECOSTAIS

19. CONSIDERAÇÕES SOBRE A MODERNIDADE RELIGIOSA

20. MAIS REALISTAS DO QUE O REI: ocidentalismo, religião e modernidades


alternativas

21. AS NOVAS RELIGIÕES JAPONESAS COMO INSTRUMENTO DE


TRANSMISSÃO DE CULTURA JAPONESA NO BRASIL

22. A GUERRA DOS DEUSES: religião e política na américa latina

23. RELIGIÃO NUMA SOCIEDADE EM TRANSFORMAÇÃO

24. REVISITANDO O MESSIANISMO NO BRASIL E PROFETIZANDO SEU


FUTURO

25. EFEITOS DA SECULARIZAÇÃO DO ESTADO, DO PLURALISMO E DO


MERCADO RELIGIOSOS SOBRE AS IGREJAS PENTECOSTAIS

26. CIÊNCIA, RELIGIÃO, PSICOLOGIA: conhecimento e comportamento

27. AS CIÊNCIAS DA RELIGIÃO NUMA PERSPECTIVA INTERCULTURAL

28. O MESSIANISMO NO BRASIL CONTEMPORÂNEO

29. GÊNERO, RELIGIÃO E POLÍTICA: as evangélicas nas disputas eleitorais da


cidade do rio de janeiro

30. RELIGIÃO E SAÚDE: um estudo sobre as representações do fiel carismático


sobre os processos de recuperação de enfermidades nos grupos de oração

31. TEMPLO, PRAÇA, CORAÇÃO: a articulação do campo religioso católico


2
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
32. RELIGIÃO E POLÍTICA NAS ELEIÇÕES 2000 EM PORTO ALEGRE (RS)

33. ENSINO RELIGIOSO NA ESCOLA PÚBLICA: o retorno de uma polêmica


recorrente

34. O ENSINO RELIGIOSO É MAIS DO QUE APARENTA SER

35. ENSINO RELIGIOSO: dialética entre secularização e laicidade no interior de


contextos históricos e culturais precisos

36. O ENSINO RELIGIOSO NO BRASIL: a questão da laicidade do estado, a


secularização da cultura, a realidade socioantropológica dos múltiplos credos
e a face existencial de cada indivíduo

37. A LEI Nº 9.394/96, DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO NACIONAL


(LDB) E O ENSINO RELIGIOSO

38. O CARÁTER FACULTATIVO DO ENSINO RELIGIOSO

39. A FORMAÇÃO DE PROFESSORES PARA O ENSINO RELIGIOSO NA


ESCOLA PÚBLICA DO ENSINO FUNDAMENTAL

40. PARECER 016/98 E A CARGA HORÁRIA DO ENSINO RELIGIOSO NO


ENSINO FUNDAMENTAL

41. DIÁLOGO EM TORNO DA REPÚBLICA: os grandes temas da política e da


cidadania

42. A EDUCAÇÃO NA CONSTITUIÇÃO DE 1988 E A LDB

43. ENSINO RELIGIOSO E ESCOLA PÚBLICA: o curso histórico de uma


polêmica entre a igreja e o estado no Brasil

44. O DIREITO À EDUCAÇÃO E A CONSTITUIÇÃO

45. VERBETE SOBRE O LAICISMO

46. A RELAÇÃO EDUCAÇÃO-SOCIEDADE-ESTADO PELA MEDIAÇÃO


JURÍDICO-CONSTITUCIONAL

47. A EDUCAÇÃO NAS CONSTITUINTES BRASILEIRAS, 1823-1988

48. MEDO À LIBERDADE E COMPROMISSO DEMOCRÁTICO: da LDB ao plano


nacional de educação

49. CIDADANIA REPUBLICANA E LEGISLAÇÃO EDUCACIONAL

50. DIREITO À EDUCAÇÃO: direito à igualdade, direito à diferença

3
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
51. ENSINO RELIGIOSO NA ESCOLA PÚBLICA: o retorno de uma polêmica
recorrente

52. FUNDAMENTOS FILOSÓFICOS DOS VALORES NO ENSINO RELIGIOSO

53. OS PARÂMETROS CURRICULARES PARA O ENSINO FUNDAMENTAL:


convívio social e ética

54. OS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS E O ENSINO RELIGIOSO

55. ENSINO RELIGIOSO SEM PROSELITISMO É POSSÍVEL

56. ESTRATÉGIAS DE SUPERAÇÃO DA DISCRIMINAÇÃO ÉTNICA E


RELIGIOSA NO BRASIL

57. O NOVO, О VELHO О PERIGOSO: relendo a cultura brasileira

58. PENSANDO A ESPIRITUALIDADE NO ENSINO DE GRADUAÇÃO

59. RELIGIÃO, ESTADO, MODERNIDADE: notas a propósito de fatos provisórios

60. ESCOLAS PÚBLICAS E ENSINO RELIGIOSO: subsídios para a reflexão


sobre o estado laico, a escola pública e a proteção do direito à liberdade de
crença e de culto

61. A ESCOLA TEUTO-BRASILEIRA CATÓLICA E A NACIONALIZAÇÃO DO


ENSINO

62. A ESCOLA PRIMÁRIA COMO TEMA DO DEBATE POLÍTICO ÀS VÉSPERAS


DA REPÚBLICA

63. A CRÍTICA AO ENSINO RELIGIOSO

64. ENSINO RELIGIOSO EM ESCOLAS PÚBLICAS: subsídios para o estudo da


identidade nacional e o direito do outro

65. ENSINO CONFESSIONAL, LAICO OU INTER-RELIGIOSO? Qual a melhor


resposta

66. O ENSINO RELIGIOSO E A INTERPRETAÇÃO DA LEI

4
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
ARTIGOS PARA LEITURA, ANÁLISE E UTILIZAÇÃO COMO
FONTE OU REFERENCIA

Estudos Teológicos, v. 46, n. 1, p. 122-151, 2006

AS CIÊNCIAS DA RELIGIÃO NUMA PERSPECTIVA INTERCULTURAL


A PERCEPÇÃO OPOSTA DA FENOMENOLOGIA DA RELIGIÃO NO BRASIL E
NA ALEMANHA*

Hermann Brandt**

Resumo:
Este texto apresenta uma comparação da maneira como a fenomenologia da
religião é percebida e avaliada pelas ciências da religião no Brasil e na Alemanha.
Procederei da seguinte forma: primeiramente, vou esboçar a avaliação da
fenomenologia da religião na Alemanha, depois vou descrever as expectativas que
se tem em relação a ela no Brasil e, por fim, vou propor algumas ponderações sobre
essa disciplina e seus dois rostos e sua posição dentro das ciências da religião na
América Latina e na Europa.
Resumen:
Este texto presenta una comparación del modo como la fenomenologia de la religión
es percibida y evaluada por las ciencias de la religión en Brasil y em Alemania.
Procederé de la siguiente forma: primeramente, voy a esbozar la evaluación de la
fenomenología de la religión en Alemania, después voy a describir las expectativas
que se tiene con relación a ellas en Brasil y, para finalizar, propongo algunas
ponderaciones sobre esa disciplina y sus dos rostros, así como, su posición dentro
de las ciencias de la religión en América latina y en Europa.
Abstract:
This text presents a comparison of the way in which the phenomenology of religion is
perceived and evaluated by the Sciences of Religion in Brazil and Germany. I will
proceed in the following way: first, I will outline the evaluation of the phenomenology
of religion in Germany, then I will describe the expectations that exist in relation to it
in Brazil, and finally I will propose some considerations about this discipline and its

5
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
two faces and its position within the Sciences of Religion in Latin America and in
Europe.
* Título original: Religionswissenschaften interkulturell – die gegensätzliche Wahrnehmung der
Religionsphänomenologie in Brasilien und Deutschland. Tradução de Luís M. Sander.
** Dr. Hermann Brandt é professor emérito da Theologische Fakultät der staatlichen Friedrich-
Alexander-Universität Erlangen-Nürnberg, Alemanha.

1 - Ensejos desta comparação


Este texto apresenta uma comparação da maneira como a fenomenologia da
religião é percebida e avaliada pelas ciências da religião nos dois países ou
continentes. Já que essa comparação trata, como ainda se mostrará, dos
pressupostos da ciência (da religião), considero adequado explicitar também os
pressupostos deste artigo: o que me levou a escrevê-lo?
Vou mencionar três motivos. O primeiro é de natureza exterior: este estudo surgiu no
marco de uma estada de vários meses do autor como professor visitante da Escola
Superior de Teologia (EST), em São Leopoldo (RS). Essa estada contou com o
apoio de uma bolsa de pesquisa concedida pela Fundação de Amparo à Pesquisa
do Estado do Rio Grande do Sul (FAPERGS). Uma das condições disso era que um
projeto de pesquisa fosse definido e executado.
A escolha do tema – este é o segundo ensejo – se baseou em experiências que eu
fizera em estadas anteriores no Brasil. Havia me chamado a atenção a maneira
diferente como as ciências da religião estão constituídas e são feitas no Brasil e na
Alemanha, sem que, na época, eu pudesse examinar essa impressão mais de
perto1. A partir daí, fazia sentido verificar essa suposição de maneira mais detida
nessa ocasião.
O terceiro motivo se relaciona com a obra representativa intitulada New Approaches
to the Study of Religion; Volume 1: Regional, Critical and Historical Approaches;
Volume 2: Textual, Comparative, Sociological and Cognitive Approaches,
entrementes publicada e cujos editores são Peter Antes, Arnim G. Geertz e Randi R.
Warne2.
A obra pretende oferecer um panorama da ciência da religião e os desdobramentos
que a têm caracterizado desde os anos oitenta3 e mostrar que, nesse meio tempo, a
ciência da religião se tornou um ―empreendimento global‖. Para os editores, essa
obra representa agora – depois de problemáticas fases anteriores nos últimos mais

6
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
de 150 anos – a nova ―‗guinada crítica‘ [critical turn] na ciência da religião. Ela
consiste em afastar a ciência da religião das vaidades e guinadas equivocadas do
passado e proporcionar-lhe um referencial teórica e metodologicamente sólido para
uma busca global [!]‖4.

1 Cf. minhas observações a esse respeito em BRANDT, Hermann. Die heilige Barbara in Brasilien:
Kulturtransfer und Synkretismus. Erlangen: [s.n.], 2003. p. 91s., incluindo a nota 110 (Erlanger
Forschungen, Reihe A, Geisteswissenschaften, 105).
2 ANTES, Peter; GEERTZ, Arnim G.; WARNE, Randi R. (Ed.). New Approaches to the Study of
Religion. Berlin e New York: [s.n.], 2004. v. 1 e 2. Entretanto, o preço dessa obra com mais de mil
páginas em dois volumes – • 216,00 – vai dificultar sua divulgação no ―hemisfério sul‖.
3 ANTES; GEERTZ; WARNE, 2004, v. 1, p. 1 (Prefácio).
4 ANTES; GEERTZ; WARNE, 2004, v. 2, p. 458s. (Resumo).

Aí se mostra uma consciência epocal e uma pretensão global que poderão parecer
estranhas numa perspectiva africana e latino-americana: no primeiro volume, sob a
rubrica ―Abordagens regionais‖, são tratados os novos enfoques do estudo científico
da religião na América do Norte, na Europa, na Turquia, na Índia, na Austrália e no
Pacífico. Mas nessa obra abrangente estão ausentes as ―regiões‖ da América
Central e do Sul (ou da América Latina), bem como da África. Assim, perguntei-me:
por quê? Não há ―novas abordagens‖ na África e nos dois terços restantes da
América? As ciências da religião feitas nessas regiões não se enquadram na
mencionada concepção acadêmica ―global‖ e na ―guinada crítica‖ por ela defendida?
Ou simplesmente não se conseguiram recrutar autores e autoras competentes
dessas regiões? Como quer que seja, esta contribuição pretende, ainda que de
modo limitado, examinar a seguinte pergunta: como se faz ciência da religião na
América Latina e qual é sua relação com a ciência da religião européia5?
A essas referências sobre meus três motivos para esta contribuição acrescento
ainda uma explicação da limitação mencionada. Essa limitação diz respeito tanto ao
aspecto regional quanto ao conteúdo: no que se segue, vou fazer referência apenas
a publicações do Brasil e da Alemanha e me concentrar nas avaliações diferentes da
fenomenologia da religião.

2 - A cabeça de Jano da fenomenologia da religião


Ao se observar a avaliação da fenomenologia da religião por parte das ciências da
religião no Brasil e na Alemanha, tem-se forçosamente a impressão de que a
7
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
fenomenologia da religião é uma disciplina dotada de uma cabeça de Jano. Neste
tocante, utilizo a expressão ―cabeça de Jano‖ em sentido figurado, que quase não é
empregado no Brasil, mas decerto na Alemanha. Ao se fazer referência ao antigo
deus romano Jano com sua cabeça dupla6 – amistoso para dentro, pouco amigável
para fora –, a cabeça de Jano é tida como ―símbolo da discrepância‖; ela
caracteriza, portanto, ―rostos‖ contraditórios de um fenômeno e, por conseguinte,
sua equivocidade7.

5 Agradeço cordialmente a meu colega brasileiro Dr. Oneide Bobsin, da Escola Superior de Teologia
(EST), por diálogos estimulantes durante a elaboração desta contribuição.
6 Quanto ao deus romano Jano numa perspectiva da história das religiões, cf. ELIADE, Mirceia (Ed.).
The Encyclopedia of Religion. New York: Macmillan, 1987. v. 7, p. 519; DIE RELIGION in
Geschichte und Gegenwart. 4. ed. [S.l.: s.n., s.d.]. v. 4, cols. 373s.
7 Cf. a correlação do termo ―cabeça de Jano‖ com os campos semânticos ―dois‖ e ―ambíguo‖ em
DORNSEIFF, Franz. Der deutsche Wortschatz nach Sachgruppen. 5. ed. Berlin: [s.n.],
1959. p. 184s. e 376, além de DUDEN. Fremdwörterbuch. Mannheim: [s.n.], 1960. p. 293, bem
como FERREIRA, Antônio Gomes. Dicionário de latim-português. Porto: [s.n.], 1988. p. 643s.

Procederei da seguinte forma: primeiramente, vou esboçar a avaliação da


fenomenologia da religião na Alemanha (seção 3), depois vou descrever as
expectativas que se tem em relação a ela no Brasil (seção 4) e, por fim, vou propor
algumas ponderações sobre essa disciplina e seus dois rostos e sua posição dentro
das ciências da religião na América Latina e na Europa (seção 5).

3 - Adeus à fenomenologia da religião – até nunca mais(?)


Comecemos com uma diferença entre a Alemanha e o Brasil: enquanto que no
Brasil, como mostra a próxima seção, introduções e manuais próprios sobre a
disciplina de ciências da religião ainda representam um desiderato, na Alemanha
foram publicadas, nas últimas décadas, numerosas exposições desse tipo de
introdução. Elas foram escritas por autores individualmente ou como obras coletivas
de diversos cientistas da religião, informando sobre a história da disciplina, sobre
seus questionamentos e métodos clássicos e atuais, a relação da ciência da religião
com suas disciplinas vizinhas e as perspectivas para o futuro8. Essas introduções e
manuais são um sinal de que a disciplina de ciências da religião, embora de modo
algum esteja representada em todas as universidades9, consolidou-se na Alemanha;

8
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
em todo caso, não há falta de ofertas de auto-apresentações da ciência da religião
como disciplina própria.
Como no caso de introduções a outras disciplinas acadêmicas, também nas
introduções às ciências da religião se podem distinguir dois tipos: as que defendem
e formulam preponderantemente teses e concepções próprias do autor ou dos
autores (quase não há cientistas [do sexo feminino] da religião estabelecidas), de
sorte que a prestação de informações passa para segundo plano, e as que, embora
contendo as opiniões pessoais dos autores, colocam em primeiro plano o objetivo de
oferecer uma introdução ao material e às disciplinas da ciência da religião.
As duas introduções apresentadas no que se segue podem ser enquadradas de
maneira exemplar nesses tipos distintos. Como mencionei acima, na perspectiva
deste ensaio o interesse se concentra no modo como a fenomenologia da religião é
avaliada nas duas introduções.

8 Cf., p. ex., as introduções de Greschat, Stolz, Rudolph, Lanczkowski e as de Hock e


Stuckrad/Kippenberg, discutidas mais abaixo.
9 Quanto a esse aspecto, cf. o ensaio (carente de correções, porém) de USARSKI, Frank. Perfil
paradigmático da ciência da religião na Alemanha. In: TEIXEIRA, Faustino (Ed.). A(s) ciência(s) da
religião no Brasil: afirmação de uma área acadêmica. São Paulo: Paulinas, 2001. p. 67-102.

No tocante ao título desta seção – Adeus à fenomenologia da religião – até nunca


mais(?) –, essa primeira introdução representa pelo menos o ponto de interrogação,
portanto uma despedida possivelmente revogável, ao passo que a segunda propõe
decididamente que a ciência da religião despache definitivamente a fenomenologia
da religião.

3.1 - A fenomenologia da religião na ―Introdução à ciência da religião‖ de Klaus


Hock e a ―suspeita de ser teologia‖ em relação à fenomenologia da religião
clássica
A obra de Klaus Hock, Einführung in die Religionswissenschaft10, convence por sua
exposição concentrada e sua organização pedagogicamente orientada da extensa
matéria, fazendo isto sem prejudicar a pletora de problemas apresentados. Hock é
reservado na avaliação de controvérsias da ciência da religião e, quando emite
juízos, é justo. De modo geral, trata-se de uma obra muito informativa; justamente
sua exposição um tanto ―fria‖ encoraja leitoras e leitores a formar seu próprio juízo.

9
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
A categoria ―acessos‖ é característica da maioria dos 12 capítulos da obra: ela
contém acessos da ciência da religião e de suas diversas subdisciplinas a seu
objeto, a religião. Eles são, entre outros, os seguintes: acessos sistemáticos e
fenomenológicos, acessos a partir da sociologia da religião, acessos a partir da
etnologia das religiões, acessos a partir da psicologia da religião, outros acessos às
religiões (a partir da geografia, da estética, da economia das religiões).
Nesse esboço, todos os acessos pressupõem a história das religiões.
E não é por acaso que os acessos sistemático e fenomenológico se encontram
antes de todos os outros. O fato de Hock colocar a fenomenologia da religião ou a
ciência sistemática da religião no início dos acessos pode significar duas coisas: por
um lado, a fenomenologia da religião (como disse, pressupondo a pesquisa da
história das religiões) é vista como a origem genuína das ciências da religião mais
recentes; ela é valorada como principium da ciência da religião. Mas pode significar
também que o início da ciência da religião na fenomenologia da religião está
ultrapassado pelos acessos posteriores, se é que não está liquidado.
Hock expressa, por um lado, apreço pela importância da fenomenologia da religião
para o presente, mas também menciona a crítica levantada contra ela. Entre as
questões mais importantes, atuais até hoje, que a fenomenologia da religião
levantou, encontra-se, sobretudo, a seguinte:

10 HOCK, Klaus. Einführung in die Religionswissenschaft. Darmstadt: Wissenschaftliche


Buchgesellschaft, 2002.

Quando a fenomenologia da religião se esforça para ―colocar entre parênteses‖ a


questão da verdade e a fé do pesquisador ou da pesquisadora – será que então não
se exclui, ao mesmo tempo, uma das questões centrais [...]
Neste sentido, também para além de uma crítica abrangente e radical à
fenomenologia da religião, muito do que a determinou tem importância ainda hoje –
primordialmente a pergunta sobre como as religiões devem ser entendidas
adequadamente, a pergunta acerca de uma ciência das religiões ―hermenêutica‖.
Neste contexto, o termo ―fenomenologia da religião‖, porém, é muitas vezes evitado,
por estar demasiadamente comprometido por sua história.11

10
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
Em que consiste esse comprometimento pela história, que de fato fez com que
muitos cientistas da religião europeus só usem o termo ―fenomenologia da religião‖
para investir contra a disciplina dos primórdios da ciência das religiões por ele
designada12? Hock informa, mediante uma organização e correlação própria, sobre
diversas posições existentes dentro da fenomenologia da religião, apresenta a
imponente série de seus antepassados (entre outros, Söderblom, Otto, van der
Leeuw, Mensching, Lanczkowski, Eliade) e expõe a crítica feita a ela.
As críticas movidas pela ciência da religião mais recente a esses fenomenólogos da
religião e suas pesquisas podem ser resumidas da seguinte maneira13: contra
Söderblom, Otto e van der Leeuw se objeta que eles postulam uma categoria
específica – a do sagrado ou a do poder – e as respectivas experiências religiosas
para descrever a essência da religião com base nesse fundamento. Isto é,
considera-se como central e universal um elemento que, sozinho, de modo algum
pode levar em conta a realidade e pluralidade dos fenômenos religiosos.
Semelhante é a crítica feita a Eliade: ele entende sua fenomenologia como uma
espécie de ―teoria do ser‖ dentro da qual as diversas religiões e elementos religiosos
são classificadas e enquadradas. Em outras palavras: todas as diferentes religiões
remetem a um único e mesmo ser em si.
Segundo Hock, a conseqüência dessas críticas foi que a fenomenologia da religião
em seu conjunto passou a sofrer um ataque maciço. A maioria dos cientistas da
religião se recusaram e se recusam até hoje a aceitar as ―especulações
metafísicas‖ de seus colegas fenomenólogos da religião.

11 HOCK, 2002, p. 55.


12 E neste tocante há uma diferença marcante para com as ciências da religião na América Latina!
Veja infra.
13 Para o que se segue, cf. HOCK, 2002, p. 58-67.

A fenomenologia da religião em seu conjunto foi colocada sob a ―suspeição de ser


teologia‖. Por conseguinte, ela não foi mais encarada como ciência (auto)crítica. A
cientificidade do método fenomenológico foi questionada.
Portanto, a ciência das religiões rejeita sua fenomenologia – tão famosa no passado.
Ela propõe que se ―supere‖ a fenomenologia da religião e, se possível, se a

11
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
―esqueça‖ definitivamente. De fato, se pode constatar que a fenomenologia da
religião clássica foi despachada pela ciência da religião mais recente.
Mas enquanto Hock descreve e discute objetivamente as razões do crescente
distanciamento e – quanto a isso, veja abaixo – considera possível uma
fenomenologia renovada da religião, portanto não a quer despachar ―até nunca
mais‖, a ―Introdução‖ publicada por último na Alemanha julga os representantes da
fenomenologia da religião de maneira muito mais polêmica.

3.2 - A polêmica contra a fenomenologia da religião na ―Introdução à ciência da


religião‖ de Hans G. Kippenberg e Kocku von Stuckrad
Na mais recente introdução à ciência da religião, escrita a quatro mãos por Hans G.
Kippenberg e Kocku von Stuckrad14, fica-se sabendo muito pouco sobre a história
da fenomenologia da religião e os motivos que orientaram os pesquisadores com
ela comprometidos, mas muita coisa sobre os sentimentos negativos dos dois
autores em relação à fenomenologia da religião, aos quais eles dão um livre curso
considerável15, e, neste sentido, sobre aspectos da atual discussão da ciência da
religião. Os autores afirmam que os fenomenólogos da religião construíram uma
―essência atemporal da religião‖. Sem levar em conta, p. ex., a crítica de Otto à
teologia liberal de sua época, é dito o seguinte: ―A ciência acadêmica da religião
tornou-se [pela influência da fenomenologia], por assim dizer, uma refinaria que
processa uma matéria-prima, transformando-a num produto bem aceito pelo
mercado‖.16

14 KIPPENBERG, Hans G.; STUCKRAD, Kocku von. Einführung in die Religionswissen-schaft.


Bremen: [s.n.], 2003.
15 Sinto falta, nesta obra, de algo da soberania de alguém como Gerardus van der Leeuw, que, na
época, avaliou a filosofia da religião do ―velho‖ Hegel com senso de humor e, ao mesmo tempo,
criticou a ―ciência critiquenta‖ e sabichona; cf. LEEUW, G. van der. Phänomenologie der Religion. 2.
Aufl. Tübingen: [s.n.], 1956. p. 707 com a nota 3 (p. 707s.). (Aliás, quando da recepção da
fenomenologia de van der Leeuw, com freqüência se esquece sua cooperação com Rudolf Bultmann.
Assim, van der Leeuw escreveu no prefácio da 1ª edição [de 1933]: ―Quero dedicar um
agradecimento especial a meu caro colega Rudolf Bultmann, que não só, da maneira mais abnegada
e conscienciosa, ajudou a fazer a leitura das provas, mas também ajudou a moldar o conteúdo de um
modo que muitas vezes me envergonhou e sempre me auxiliou‖. [LEEUW, 1956, p. vi]).

Assim, chega-se a descrever o ―fim do funcionalismo e da fenomenologia da


religião‖ como fase da ―história cultural da ciência da religião‖17 e a compreender o
12
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
―abandono simultâneo do funcionalismo sociológico e da concepção fenomenológica
da religião‖ como condição de uma reorientação da ciência da religião: ―Dessa
maneira, interpretações enrijecidas foram transformadas fundamentalmente‖.18
Segundo os autores, os métodos fenomenológicos – isto se dirige principalmente
contra Eliade – foram ―concebidos, em última análise, de maneira a-histórica‖,
abstraindo ―de contextos históricos e voltando-se ao genérico‖19. A acusação de
―ontologização do transcendente‖ é a seguinte: ―Quando Rudolf Otto fala da
experiência do ‗numinoso‘, Mircea Eliade da ‗irrupção do sagrado no profano‘ ou
quando C. G. Jung propaga a existência de um acervo de símbolos coletivos
arquetípicos do inconsciente‖, eles estão seguindo uma linha ―que ontologiza o
transcendente e o associa como poder influente com o mundo de vida do indivíduo.
Neste caso se desconsideram o elemento narrativo da identidade religiosa e o papel
dos contextos sociais‖.20
Bastam essas abonações; elas confirmam a concepção dos autores de que o adeus
à fenomenologia da religião é irreversível. Essa concepção, por mais que tenha sido
apresentada de modo categórico e emotivo, não é, entretanto, uma communis opinio
[opinião comum] predominante em toda parte; há posições divergentes dela – não
só na Alemanha, mas também, mais ainda, na América Latina.

3.3 - Estamos diante de um reavivamento da fenomenologia da religião?


Diferentemente da introdução às ciências da religião de Kippenberg e von Stuckrad,
Hock coloca, após a seção ―Desenvolvimento da pesquisa da fenomenologia da
religião‖21, sobre a qual relatei em 3.1, uma seção intitulada ―Novas abordagens da
fenomenologia da religião‖22. Segundo Hock, as perspectivas resultantes dos
trabalhos de Jacques Waardenburg e Carsten Colpe permitem concluir que o adeus
da ciência da religião à fenomenologia da religião não é um ―até nunca mais‖.

16 KIPPENBERG; STUCKRAD, 2003, p. 13.


17 KIPPENBERG; STUCKRAD, 2003, p. 32-34.
18 KIPPENBERG; STUCKRAD, 2003, p. 34s.
19 KIPPENBERG; STUCKRAD, 2003, p. 60.
20 KIPPENBERG; STUCKRAD, 2003, p. 142s.
21 HOCK, 2002, p. 58-67.
22 HOCK, 2002, p. 67s.

13
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
Hock faz referência expressa à contribuição de Carsten Colpe intitulada
―Refundamentação(!) de uma fenomenologia das religiões e da religião‖23. Colpe
propõe que se parta hipoteticamente da autonomia da fenomenologia da religião
(neste sentido: fenomenologia ―reflexiva‖ da religião) e se incluam os resultados de
ciências afins. A comparação de fenômenos precisa estar direcionada para a
multidimensionalidade, e é preciso desenvolver uma metalinguagem que seja
claramente distinta da linguagem das próprias religiões. Com isso se nomeiam, de
fato, condições para uma refundamentação da fenomenologia da religião – por
assim dizer, num nível reflexivo, científico. Hock indica, porém, que essa concepção
de uma nova fenomenologia da religião ainda aguarda ―a discussão posterior, a
implementação concreta e o emprego mais amplo‖.
Portanto, um avanço real para uma fenomenologia da religião refundamentada e
reavivada ainda está por acontecer24.
Enquanto, pois, a avaliação da fenomenologia da religião pelas ciências da religião
na Alemanha se estende de uma rejeição decidida até uma refundamentação
cautelosa sob determinadas condições, sendo por enquanto só objeto de alusão, ao
se perguntar a respeito da avaliação da fenomenologia da religião pela ciência da
religião no Brasil se entra num país inteiramente diferente, e não só em termos
geográficos.

4 - A fenomenologia da religião como portador de esperança das ciências da


religião
Este título alude à diferença fundamental existente na atitude para com a
fenomenologia da religião no Brasil em comparação com a Alemanha. De modo
geral, pode-se dizer o seguinte: as associações ligadas à ―fenomenologia‖ na
América Latina são, sem dúvida, efetivamente positivas. Isso se aplica não somente
à ciência da religião, mas também a outras disciplinas das ciências humanas. Por
conseguinte, recorrendo à imagem da cabeça de Jano mencionada acima, poder-se-
ia dizer metaforicamente o seguinte: no Brasil, a fenomenologia da religião dirige
um olhar convidativo e amistoso a várias disciplinas acadêmicas, como se quisesse
animá-las a fazer uso dela em suas pesquisas, com a finalidade de estabelecer uma
ciência interdisciplinar e com múltiplas perspectivas.

14
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
23 Essa contribuição que aponta o caminho para o futuro encontra-se em outra ―Introdução‖, que se
distingue das duas discutidas aqui pelo fato de os diversos aspectos da ciência da religião serem
expostos por autores diferentes: ZINSER, Hartmut (Ed.). Religionswissenschaft: Eine Einführung.
Berlin: [s.n.], 1988. p. 131-154. 24 HOCK, 2002, p. 70.

4.1 - A presença geral da ―fenomenologia‖


Chamou-me a atenção que no Brasil o discurso sobre a fenomenologia está
surpreendentemente disseminado de maneira ampla e que o termo ―fenomenologia‖
é, muitas vezes, usado com toda a naturalidade, sem reflexões metodológicas
especiais sobre o significado desse termo. Uma causa disso certamente deve ser
vista na posição proeminente da filosofia (não por último, nas universidades
católicas, que na América Latina se chamam
―pontifícias‖) e em sua influência sobre as outras ciências humanas. Os nomes de
Husserl e Heidegger estão presentes não somente dentro da filosofia, e referências
a suas obras aparecem em contextos bem diferentes25.
Assim, existem investigações não-filosóficas, p. ex., sobre a fenomenologia da
pedagogia26. Um exemplo do apreço pela fenomenologia em sentido não-específico
é o fato de ―fenomenologia‖ ser usado como termo decorativo no título do livro que
contém uma investigação empírica da religiosidade popular, sem que ele apareça
em qualquer parte, ou seja, definido no próprio estudo27. – É possível depreender
duas coisas desse uso genérico,
por assim dizer irrefletido do termo: ele pressupõe que ―fenomenologia‖ é um termo
de conhecimento geral e não necessita de qualquer explicação e que a
fenomenologia é, em todo caso, algo efetivamente positivo, sobre cuja aceitação não
há dúvida.

4.2 - A esperança depositada na fenomenologia da religião pelas ciências da


religião
Face ao clima favorável à fenomenologia que predomina de modo geral no Brasil, é
compreensível que a ciência da religião associe esperanças especiais justamente
com sua ―própria‖ fenomenologia da religião. Essas esperanças e suas razões
serão examinadas mais de perto agora. Expoentes brasileiros das ciências da
religião esperam da fenomenologia da religião (clássica) que ela possa – com
15
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
vistas, entre outras coisas, à presença já existente da fenomenologia no âmbito
universitário – contribuir eficazmente para assegurar e fortalecer a posição e
aceitação ainda não consolidadas da ciência da religião como disciplina acadêmica
autônoma.

25 Só um exemplo atual: HEBECHE, Luiz. O escândalo de Cristo: ensaio sobre Heidegger e São
Paulo. Ijuí: Unijuí, 2005; a ficha catalográfica classifica o livro nas seguintes áreas: 1. Filosofia 2.
Religião cristianismo 3. Fenomenologia 4. Heidegger 5. Filosofia da religião. 26 Cf. WARNECK, Vera
Rudge. O eu educado: uma teoria da educação fundamentada na fenomenologia. Rio de Janeiro:
[s.n.], 1991.
27 Cf. POLLAK-ELTZ, Angelina. La religiosidad popular en Venezuela: un estudio fenomenológico
de la religiosidad en Venezuela. Caracas: San Pablo, 1994. Na quarta capa, o termo
―fenomenológico‖ designa o distanciamento desta obra de um ―estudo sociológico e estatístico‖. Algo
análogo pode ser dito a respeito do emprego desse termo na seguinte obra em dois volumes:
COSTA, Valdeli Carvalho da. Os ―seres superiores‖ e os orixás / santos: um estudo sobre a
fenomenologia do sincretismo umbandístico na perspectiva da teologia católica. São Paulo: [s.n.],
1983.

Com base na fenomenologia da religião, seria possível estabelecer as ciências da


religião em seu conjunto como ciência autônoma nas universidades. Portanto,
enquanto na Europa a ciência da religião diz adeus à fenomenologia da religião, na
América Latina ela a acolhe com braços abertos. A partir de três publicações
representativas, pretendo evidenciar agora esse acolhimento e as esperanças
depositadas na fenomenologia da religião.
4.2.1 - A fenomenologia da religião como coroa das ciências da religião
Um manual escrito por José Severino Croatto originalmente para um curso à
distância de ciência da religião amplamente disseminado para introduções às
ciências da religião tem o título As linguagens da experiência religiosa: uma
introdução à fenomenologia da religião28. O fato de essa obra escrita originalmente
em espanhol fazer parte da bibliografia básica da ciência da religião no Brasil
chama a atenção para o já mencionado déficit de manuais próprios, brasileiros.
(Além da introdução de Croatto, as pessoas se contentam com obras de
proveniência européia29.) O fato de Croatto considerar a fenomenologia da religião
como coroa das ciências da religião pode ser depreendido da própria estrutura do
livro. Inicialmente, porém, quero destacar o emprego do plural ciências da religião,
totalmente incomum na Europa: enquanto na Alemanha esse plural é rejeitado com
veemência pelos cientistas da religião, porque ele ameaçaria a unidade da ciência

16
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
da religião como disciplina autônoma, na América Latina ele é usado em parte de
maneira irrefletida, em parte de modo muito deliberado – p. ex., para acentuar as
múltiplas perspectivas que caracterizam essa disciplina30.
Croatto divide seu livro em cinco ―módulos‖: os acessos à religião, a experiência
religiosa e sua expressão simbólica, mito e interpretação da realidade, a
manifestação gestual da religião, a fixação da experiência religiosa na doutrina e
nos textos. Como o fará mais tarde Hock (v. supra), Croatto começa, portanto, com a
exposição dos diversos ―acessos‖.

28 CROATTO, José Severino. As linguagens da experiência religiosa: uma introdução à


fenomenologia da religião. São Paulo: Paulinas, 2001.

29 Cf., p. ex., VELASCO, J. Martin. Introducción a la fenomenología de la religión. Madrid:


Cristiandad, 1978 (ele entende a fenomenologia da religião como a ciência da religião moderna, que
se volta de igual maneira contra a teologia e a antropologia secular [p. 52s.]); FILORAMO, Giovanni;
PRANDI, Carlo. As ciências das religiões. São Paulo: Paulus, 1999. Tradução do italiano.

30 Na seção 4.2.2 abaixo voltarei a abordar essa controvérsia.

Entretanto, esses diversos acessos são ―coroados‖ pela fenomenologia da religião:


1. A história das religiões
2. A sociologia da religião
3. A psicologia da religião
4. A filosofia da religião
5. A teologia
6. A teologia das religiões
7. O estruturalismo
8. A fenomenologia da religião31.
O que chama a atenção nessa estruturação é, em primeiro lugar, a inclusão da
teologia (cristã), bem como da teologia das religiões nos diversos acessos da ciência
da religião; com isso, a teologia é contada com toda a naturalidade entre as
ciências da religião, pois Croatto coloca todos os oito acessos sob o título ―A
fenomenologia da religião entre as ciências da religião‖. E, como já foi dito, todos os
acessos como que desembocam na fenomenologia da religião. A abordagem
fenomenológica é ―necessária para enriquecer os outros acessos‖32. Em resumo, a
17
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
contribuição específica da fenomenologia da religião consiste na investigação dos
três aspectos seguintes do fenômeno religioso:
1. ―o sentido das expressões religiosas no seu contexto específico;
2. sua estrutura e coerência (sua morfologia);
3. sua dinâmica (desenvolvimento, afirmação, divisões, etc.)‖.33
Desse esboço se depreende, portanto, que a fenomenologia da religião coroa e
consuma as ciências da religião.

31 CROATTO, 2001, p. 17-28.


32 CROATTO, 2001, p. 17.
33 CROATTO, 2001, p. 27.

4.2.2 - Esforços pelo reconhecimento da(s) ciência(s) da religião como disciplina


acadêmica autônoma
Antes de abordar, na próxima seção, o papel da fenomenologia da religião na
constituição da(s) ciência(s) da religião como disciplina universitária reconhecida,
aponto primeiramente os esforços feitos para obter esse reconhecimento.
Sintomática é, neste sentido, a obra coletiva editada por Faustino Teixeira com o
expressivo título A(s) ciência(s) da religião no
Brasil: afirmação de uma área acadêmica34. Nela, cientistas de diversas disciplinas
das ciências humanas que lecionam juntos ciência(s) da religião na pós-graduação,
falam de suas experiências e das perspectivas para o futuro. Eles visam, em
conjunto, ―trabalhar a questão da afirmação desta área no Brasil, a sua pertinência e
os seus desafios‖35.
Essa busca de reconhecimento da ciência da religião como disciplina universitária
própria espelha o fato de que as ―ciências da religião‖ são amplamente
desenvolvidas por sociólogos, filósofos, etnólogos e teólogos e, por conseguinte, o
desiderato de tirar a(s) ciência(s) da religião dessa dependência e determinação
alheia. Neste ponto é perfeitamente possível traçar linhas de conexão com a
situação da ciência da religião na Europa36; também aí estão em pauta a
demonstração de sua autonomia como disciplina acadêmica e sua aceitação social.
Ainda assim, o contexto e os campos de discussão são diferentes daqueles da
Alemanha.

18
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
Quando se formula, no título da obra, o objetivo da afirmação de uma disciplina
acadêmica, o acento é colocado não somente em ―afirmação‖ e ―acadêmica‖, mas
também em ―uma‖, justamente porque se costuma falar de ciências da religião no
plural37. Neste ponto alguns pesquisadores vêem um indício da divisão dessa
ciência em ramos de trabalho e métodos separados, da ausência de identidade
científica como ciência autônoma. Assim, para alcançar a unidade da ciência da
religião, busca-se, por um lado, a troca das ―ciências da religião‖ por uma ciência
da religião (como conhecimento sistemático e coerente)38. Por outro lado, defende-
se a posição de que o singular só reflete ainda as necessidades de emancipação da
ciência da religião surgida no século 19, mas está ultrapassado em face da
consolidação, hoje alcançada, da autonomia e pluralidade das competências nas
ciências humanas39.
– Aqui se mostram dois dilemas que ainda terão de ser esclarecidos no futuro: as
diferentes concepções do conceito de ciência e a questão de até que ponto se pode
falar da existência de ―a‖ religião nas religiões.
Outro campo de discussão diz respeito à inclusão da teologia ou da teologia da
religião na(s) ciência(s) da religião.

34 TEIXEIRA, Faustino (Ed.). A(s) ciência(s) da religião no Brasil: afirmação de uma área
acadêmica. São Paulo: Paulinas, 2001.
35 TEIXEIRA, 2001, p. 3.
36 Cf. a seguinte obra traduzida do italiano: PERRIN, Aldo Natale. O Sagrado off limits: as
experiências religiosas e suas expressões. São Paulo: [s.n.], 1998. O capítulo 1 se intitula ―Em defesa
da autonomia do estudo da religião‖!
37 Entrementes teve início uma reflexão sobre o que implicam o singular e o plural: ―Quem fala de
ciência da religião tende, de um lado, a pressupor a existência de um método científico e, do outro,
também de um objeto unitário. Quem, ao contrário, [...] prefere falar de ciências das religiões, o faz
porque está convencido tanto do pluralismo metodológico (e da impossibilidade de reduzi-lo a um
mínimo denominador comum) quanto do pluralismo do objeto (e da não liceidade e até
impossibilidade, no plano da investigação empírica, de construir sua unidade)‖. (TEIXEIRA, 2001, p.
203).

Neste contexto são tratadas as questões preliminares: é possível ocupar-se da


religião de forma científica e, ainda assim, continuar sendo religioso? E o que se vai
dizer da plausibilidade de uma investigação científica de fenômenos religiosos in
vitro, ou seja, sem identificação emocional40? (Neste tocante se faz, como cientista
da religião europeu, uma experiência de déjà-vu!) Causa surpresa – ao menos a
19
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
partir de uma perspectiva alemã – encontrar, num livro comprometido com a
proposta da autonomia da ciência da religião, a discussão explícita do lugar e da
função ―da teologia entre as demais disciplinas da ciência da religião‖41. Defende-
se a hipótese de que, justamente como teologia das religiões, a teologia dá uma
contribuição singular e inovadora à ciência da religião, pois clareia a ―originalidade
irredutível e irrevogável‖42 do fenômeno religioso.
Essa subsunção quase natural da teologia sob a(s) ciência(s) da religião tem a ver
principalmente com o contexto e as condições de constituição de ambas as ciências,
que, entretanto, praticamente não são mencionadas de maneira explícita: assim,
teólogos trabalharam sob o teto da(s) ciência(s) da religião para, desse modo, se
esquivar do controle dos bispos (católicos) responsáveis pela teologia; por isso,
justamente teólogos da libertação se designavam com freqüência como cientistas da
religião: como tais, eles não tinham compromissos normativos e, assim, a liberdade
para uma percepção e interpretação autônomas dos fenômenos religiosos.
Inversamente, era e continua sendo oportuno ancorar e desenvolver a(s) ciência(s)
da religião dentro de faculdades de Teologia ou departamentos de Teologia. (Na
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo existe o ―Departamento de Teologia e
Ciências da Religião‖.)

38 TEIXEIRA, 2001, p. 162s.


39 TEIXEIRA, 2001, p. 203s. A isto se contrapõe a proposta de usar o singular ―ciência da religião‖,
apresentada com veemência no seguinte texto: RUDOLPH, Kurt. Texte als religionswissenschaftliche
―Quellen‖. In: ZINSER, 1988, p. 38-54. Só como uma ciência da religião ela poderia ser
inconfundivelmente perceptível e ter consistência no contexto universitário. O estabelecimento do
plural ―ciências da religião‖ na Alemanha desde a década de setenta ―só pode se basear em
desconhecimento de causa ou na tentativa deliberada de minar o caráter dessa disciplina, e isto nos
moldes de sua requisição por parte da teologia, colocando as áreas tradicionais da teologia em forma
reduzida sob o mesmo teto de ‗ciências da religião‘ junto com a disciplina da ciência da religião
reduzida [...].‖ Rudolph remete a um prospecto em inglês intitulado Study in Marburg, no qual, entre
os cursos de mestrado, se encontra ―Religious Science, Theology‖ [ciência da religião, teologia],
enquanto que a versão em alemão diz ―ciências (!) da religião‖ e, separada dela, ―teologia
protestante‖. E Rudolph comenta: ―Como é que um estudante vai compreender isso?‖ (p. 38s., e 51,
nota 1).
40 Cf. TEIXEIRA, 2001, p. 298-300.
41 TEIXEIRA, 2001, p. 304-313.
42 TEIXEIRA, 2001, p. 321s.

20
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
É que, para o apoio por parte do Estado no Brasil, a teologia representa uma
disciplina claramente identificável, cujo financiamento não está sujeito a dúvidas, ao
passo que a(s) ciência(s) da religião, sozinha, (ainda) não possui(em) plausibilidade
do ponto de vista dos órgãos de financiamento43.
Um último aspecto diz respeito à problematização da equiparação, geralmente não
questionada, da teologia e teologia da religião com a teologia cristã (da religião),
que também pôde ser percebida na presente exposição. A isso se refere a exigência
de que a teologia não deveria ser incluída de maneira irrefletida como teologia cristã
no cânone das disciplinas da(s) ciência(s) da religião. Dever-se-ia, antes, levar em
consideração a pluralidade das diversas teologias (da religião). Por conseguinte,
seria necessária ―uma desidentificação entre teologia e teologia cristã‖. A
fundamentação é a seguinte: essa identificação, em parte inconsciente, em parte
consciente, seria, por boas razões, um dos maiores obstáculos para a aceitação da
teologia como disciplina da(s) ciência(s) da religião no âmbito acadêmico44.

4.2.3 - A fenomenologia da religião como elo de unidade das ciências da religião


No que se segue pretendo mostrar que expectativas são depositadas na
fenomenologia da religião e como elas são fundamentadas. Antonio Gouvêa
Mendonça argumentou, num ensaio45, que a fenomenologia da religião
possibilitaria a superação da ―multiplicidade de métodos que impossibilita a
discussão [da religião] em termos de sua singularidade‖46. Por meio da
fenomenologia da religião se poderiam apreender, não obstante toda a contingência
dos fenômenos religiosos, ―os a priori religiosos‖ ou o ―essencialmente religioso‖.
Para isso, faz-se necessário tirar do esquecimento os fenomenólogos da religião
clássicos47. Com a ajuda deles seria possível elaborar uma ―natureza religiosa‖,
uma ―universalidade da realidade religiosa‖.
O autor quer superar ―o empirismo em que caíram as ciências sociais no Brasil‖ e,
em vez disso, assumir a perspectiva de uma(!) ciência da religião de cunho
filosófico e fenomenológico.

43 Por outro lado, escolas de Teologia também podem se deparar com dificuldades quando, p. ex.,
por causa de prescrições de órgãos estatais (com vistas à continuação da concessão de verbas),
adeptos de cultos afro-brasileiros exigem cursos sobre ―cultura negra‖, mas a oferta de tal curso
entraria em conflito com o respectivo perfil da escola e teria conseqüências negativas para o apoio
financeiro por parte das respectivas instâncias mantenedoras (comunidades, igrejas). Abstraindo
21
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
disso, mantenedoras eclesiásticas de instituições de ensino superior e universidades vêem com bons
olhos que ―seus‖ cientistas da religião investiguem outras religiões e igrejas, mas não gostam tanto
que sua própria religião ou igreja se torne objeto de pesquisa da(s) ciência(s) da religião.
44 TEIXEIRA, 2001, p. 331.

Esse modelo de ―conhecimento científico‖ se orienta por aspectos essenciais do


objeto religioso (como ―misticismo‖ ou ―experiência religiosa‖) que seriam
subjacentes a suas formas fenomenais exteriores48.
A última obra coletiva a ser mencionada aqui se dedica ao tema da posição da
fenomenologia dentro da ciência da religião que opera de maneira interdisciplinar:
Dreher, Luís H. (Org.). A essência manifesta: a fenomenologia nos estudos
interdisciplinares da religião49. No prefácio, o editor, por assim dizer, pega o touro
pelas guampas: a fenomenologia teria sido objeto de suspeição por ter rompido
―barreiras disciplinares‖. Mas, em vez de se deter nesse aspecto, Dreher faz
referência aos cientistas que possuíam e possuem a independência ―para discernir a
centralidade de jure das contribuições da fenomenologia, centralidade que adquire
estatura ainda maior no estudo da religião e das religiões‖50. Daí se explica o título
do livro. As autoras e autores não hesitam, seguindo a Edmund Husserl, em partir de
―uma essência própria da religião‖, ―de uma essência que, porém, é capaz de
manifestar-se para a subjetividade cognoscente assim como é ‗em si mesma‘‖51.
Se acima, ao tratar de Croatto, falei da fenomenologia da religião como ―coroa‖,
neste caso seria apropriado usar a imagem da fenomenologia como centro vital ou
―coração‖. Trata-se de elaborar a influência ou o influxo da fenomenologia da
religião sobre as diversas disciplinas que constituem a(s) ciência(s) da religião e o
diálogo com elas.
Dessa maneira, a fenomenologia da religião obteria ―significação e estatura
transdisciplinar‖52, pois no Brasil ainda não teria ocorrido um tratamento detalhado e
profundo com a fenomenologia (da religião)(!)53.
Diferentemente do livro editado por Teixeira mencionado acima, as contribuições
avulsas reunidas nesta obra são de caráter menos programático e tático, e sim
analítico, orientado pela história da ciência e pela teoria da ciência. No que se
segue, apresentarei brevemente algumas posições.

22
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
45 MENDONÇA, Antonio Gouvêa. Fenomenologia da experiência religiosa. Numen, Juiz de Fora, v.
2, n. 2, p. 65-89, jul.-dez. 1999.
46 Apud TEIXEIRA, 2001, p. 206.
47 Mendonça faz referência a Schleiermacher, Husserl, Otto, van der Leeuw, Wach, Eliade
(MENDONÇA, 1999, p. 65-89).
48 Mas essa argumentação também é rejeitada, p. ex. pela antropologia, com o argumento, entre
outros, de que o aspecto do caráter inderivável da experiência religiosa já seria coberto pela teologia;
cf. TEIXEIRA, 2001, p. 207-217.
49 DREHER, Luís H. (Org.). A essência manifesta: a fenomenologia nos estudos interdisciplinares
da religião. Juiz de Fora: UFJF, 2003.
50 DREHER, 2003, p. 5.
51 DREHER, 2003, p. 6.

Vitória Peres de Oliveira ocupa-se com a crítica segundo a qual a fenomenologia da


religião careceria de uma base empírica sólida. Sua objeção é que os autores de tal
crítica partem, por sua vez, do pressuposto de uma dicotomia – problemática – entre
método empírico (indutivo e histórico) e não empírico (dedutivo e a-histórico), tirando
dele a conclusão de que a ciência da religião que procede dedutivamente não seria
científica. Não se deveria, porém, visar um retorno ―para a segurança ‗ilusória‘ de
uma visão de mundo positivista‖54. Apesar do emprego ocasionalmente vago e
acrítico do termo ―fenomenologia‖, a fenomenologia da religião seria tanto uma
disciplina científica ―em pleno direito‖ quanto um método atual e proveitoso.
Para as pesquisas das ciências da religião, a fenomenologia da religião seria –
quer como uma das disciplinas da ciência da religião, quer como método – de
importância fundamental, pois possibilitaria a integração dos fatos religiosos no
conjunto da experiência humana55.
Sidnei Vilmar Noé reflete sobre a relação entre fenomenologia da religião e
psicologia da religião dentro das ciências da religião. Cada uma das perspectivas
características dessas duas ciências parciais teria sua legitimidade; ambas
precisariam reconhecer a legitimidade da outra56. Elas teriam em comum a tarefa
de entender e reconstruir a vivência religiosa como vivência sui generis, e deveriam
fazer isso na interação entre um fenômeno que se mostra a alguém e a reação a
esse fenômeno na subjetividade desse alguém. ―Isto requer do pesquisador que
abra mão de uma pretensa objetividade, para deixar-se abalar subjetivamente pelo
fenômeno religioso a ser estudado.‖57 Nessa contribuição também se rejeita um
positivismo empiricista; ele não seria adequado ao objeto investigado. Antes, ambas
as disciplinas não poderiam fazer mais do que tatear ―na dimensão do provisório, do
23
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
penúltimo, e precisam reconhecer que a experiência religiosa indica que há uma
fronteira aquém da sua capacidade de alcançar respostas‖58.
O já mencionado Antonio Gouvêa Mendonça59 destaca ―a persistência da
fenomenologia na sociologia da religião‖, visando, assim, ―evitar o excesso de
empirismo que leva, às vezes, à valorização demasiada, para não dizer exclusiva,
dos epifenômenos‖60.

52 DREHER, 2003.
53 DREHER, 2003, p. 9.
54 DREHER, 2003, p. 56s.
55 A autora qualifica isso como desafio e cita um poema persa: ―No fundo do mar há
riquezas incomparáveis. / Mas se queres segurança, busca-a na praia‖ (DREHER,
2003, p. 57).
56 DREHER, 2003, p. 59s.

Também nesta argumentação aparece a idéia orientadora da fenomenologia como


centro da ciência da religião. Decisivo, segundo o autor, não é se se parte da
―periferia‖ para chegar ao ―centro‖ ou à origem ou se se empreende o caminho
contrário, e sim que esse caminho seja percorrido. Mesmo que se sigam as
tendências de todo o século XX e abandonem as construções de grandes princípios
gerais em favor de modelos provisórios de compreensão, a fenomenologia mostra
ser, ainda assim, um instrumento metodológico efetivamente adequado. Além disso,
a fenomenologia de modo algum é exclusivista, mas compartilha seus esforços com
seus vizinhos mais próximos, a Gestalttheorie (o termo alemão consta no próprio
original) e o estruturalismo.
Rodrigo Toledo França se refere a desideratos da investigação de relações entre a
religião e a literatura e defende a hipótese de que a fenomenologia da religião de
Rudolf Otto representaria um caminho viável para isso. A partir do exemplo do
clássico da literatura brasileira Grande sertão: veredas, de João Guimarães Rosa (e
nele particularmente do episódio do suposto pacto de Riobaldo com o diabo),
mostra-se como o acesso de Otto ao fenômeno religioso pode ser aproveitado para
a análise literária61.
Por fim, Eduardo Gross faz, partindo de Paul Ricoeur, considerações sobre a
fenomenologia e a teoria freudiana em seu significado para os estudos da religião.
24
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
Para Gross, os conflitos existentes entre essas duas formas de acesso à religião
contêm um potencial criativo. Os conflitos e as diferenças, que são evidentes no
tocante à fenomenologia (reflexiva), por um lado, e à psicanálise (analítica), por
outro, podem desenvolver sua produtividade científica inerente sob a condição de
que exista ―espaço para a autocrítica e para a rejeição de reducionismos
dogmáticos‖62.
Só quem já possui a verdade não precisa se deixar ―contaminar‖ por perspectivas
estranhas, porém tal pessoa estaria no lugar errado no ―ambiente acadêmico‖. Mas
se a religião é percebida em seu ―caráter multifacetado‖ e com as tensões que lhe
são inerentes, a psicanálise, fundamentada em causas, e a fenomenologia
escatológica, porque comprometida com intenções de validade última (ultimate
intentions), podem entender sua relação como complementar: ambas testemunham
a variedade que é intrínseca aos fenômenos religiosos63.

57 DREHER, 2003, p. 75.


58 DREHER, 2003, p. 75.
59 Cf. supra, notas 41 a 43.
60 DREHER, 2003, p. 101.
61 Cf. DREHER, 2003, p. 111-120. Entretanto, a tradução de Das Heilige, de Otto, para o português,
usada como base, e o estudo de Bruno O. Birck mencionado pelo autor são inapropriados para
assegurar essa tese; quanto a ambos, veja infra o excurso sobre a tradução de Das Heilige para o
português.

No final deste panorama das diversas percepções diferentes da fenomenologia da


religião, pode-se dizer, usando uma imagem simplificadora do universo dos bancos:
a ciência da religião na Alemanha ainda possui a conta bancária chamada
―fenomenologia da religião‖, mas essa conta já está com o saldo zerado há muito
tempo. E praticamente não há mais ninguém que tentasse sacar alguma coisa ou
estivesse disposto a depositar alguma coisa nessa conta. A ciência da religião no
Brasil, ao contrário, está não só descobrindo sua conta chamada ―fenomenologia da
religião‖ como uma conta com um bom saldo, mas também sacando dessa conta,
aos poucos, quantias consideráveis para assegurar seu futuro com elas. Justamente
a seção 4.2.3 mostrou que expectativas a ciência da religião deposita em sua
fenomenologia64.

25
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
5 - Perspectivas: diferenças e aspectos comuns
À guisa de conclusão, também vou procurar aludir a aspectos comuns em meios às
diferenças e, assim, indicar perspectivas que dizem respeito à ciência da religião
em ambos os continentes.

62 DREHER, 2003, p. 130.


63 DREHER, 2003, p. 131.
64 No final desta exposição da avaliação da fenomenologia da religião no Brasil e na Alemanha,
remeto a dois trabalhos de peso, cujos autores acolheram impulsos vindos de fora e construíram,
assim, um elo de ligação entre dois universos distintos. Ambos dizem respeito à obra de Eliade.
O primeiro é o seguinte: SILVA, António Barbosa da. The Phenomenology of Religion as a
Philosophical Problem: An Analysis of the Theoretical Background of the Phenomenology in
General and of M. Eliade‘s Phenomenological Approach in Particular. Uppsala: [s.n.], 1982. (Studia
Philosophiae Religionis, 8). O autor, entretanto, não é, como seu nome faz supor, brasileiro, mas seus
pais eram provenientes das ilhas de Cabo Verde e viveram em Oslo desde 1972. Com a obra
mencionada, Barbosa da Silva obteve seu doutorado em Teologia na
Universidade de Uppsala, na Suécia. O trabalho se caracteriza por um grau de reflexão insolitamente
elevado, particularmente no tocante à metodologia e aos esclarecimentos conceituais. Ele espelha a
ciência da religião analítica escandinava. Que distanciamento científico o autor pratica aí, que
exclusão de emoções, só se torna claro quando se compara essa análise dos fundamentos teóricos
da fenomenologia da religião com uma obra do autor de gênero inteiramente diferente, publicada em
português na Noruega juntamente com SILVA, Domingos Barbosa da. A odisséia crioula. 2. ed.
Oslo: Aktierrykkeriet, 1993. Este livro está dedicado à memória de seus pais e de sua irmã que
morreu de câncer. Trata-se de uma erupção poético-política, como o indica o subtítulo: As tristezas,
alegrias e esperanças do povo cabo-verdiano.
O segundo trabalho é o seguinte: GUIMARÃES, André Eduardo. O Sagrado e a história: fenômeno
religioso e valorização da história à luz do anti-historicismo de Mircea Eliade. Porto Alegre:
EDIPUCRS, 2000. (Coleção Teologia, 21[!]). Após a conclusão de seus estudos em Psicologia Clínica
e Teologia no Brasil, o autor foi a Roma para fazer o doutorado na Gregoriana. Depois de defender
sua tese em julho de 1989, ele voltou ao Brasil. Esse livro é sua tese de doutorado. O autor não
vivenciou mais sua publicação, pois faleceu, em 1991, num acidente automobilístico no trajeto entre
Belo Horizonte e Juiz de Fora. O livro tem 600 páginas e é uma exposição magistral não só da obra e
das intenções de Eliade, mas também na análise das recepções diversificadas e controvertidas. Só
posso aludir aqui à interpretação do próprio autor, citando os títulos de três capítulos: A
indissociabilidade entre experiência do sagrado e simbolismo religioso; A integração entre
fenomenologia e história na hermenêutica de Eliade; Da morfologia do sagrado à história das idéias
religiosas. Com esta obra, o autor brasileiro estabeleceu um critério pelo qual pesquisas futuras sobre
a fenomenologia da religião terão de ser medidas.
Ambas as obras mostram a produtividade científica de autores que ultrapassaram as fronteiras de
seu contexto original. Suas obras corroboram a esperança de que uma cooperação entre cientistas
da religião brasileiros e europeus possa ter um futuro auspicioso.
65 Veja supra a respeito de TEIXEIRA, 2001, p. 207ss.

5.1 - Dependência institucional


A ciência da religião encontra-se, tanto na Alemanha quanto no Brasil, numa
situação de dependência. Ela compartilha essa dependência com as outras ciências.
As estruturas institucionais dependem da política cultural e educacional do Estado.
No caso da ciência da religião, podem se acrescer ainda dependências de religiões
e igrejas cristãs, na medida em que estas são mantenedoras de instituições de
26
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
ensino superior próprias ou exercem influência sobre a política universitária do
Estado: quem paga decide sobre a criação e definição de cadeiras.
No que diz respeito ao Brasil, o lugar mais seguro da ciência da religião parece ser
(ainda?) sob o teto da teologia cristã. Apontei para o argumento de que a teologia
precisaria – sobretudo com vistas à sua teologia das religiões – ser ou permanecer
integrada nas ciências da religião65. Portanto, para assegurar sua existência e
continuar se ampliando, a ciência da religião depende da teologia, pois por
enquanto ela, diferentemente da teologia, ainda não tem uma posição firme e
inconteste no contexto das universidades.
O interesse pela fenomenologia da religião também é guiado, como mostrei, pela
expectativa de que ela contribua para a autodeterminação teórica e institucional da
ciência da religião.
É verdade que na Alemanha, diferentemente do Brasil, existe uma tradição de
cadeiras autônomas só de ciência da religião. Mas essa tradição está se tornando
cada vez mais frágil. Todo cientista da religião que se aposenta tem de contar com
a possibilidade de que sua cadeira não volte a ser ocupada. Para assegurar as
cadeiras e institutos de ciência da religião ainda existentes, os cientistas da religião
são obrigados a se manifestar publicamente e apontar para a necessidade da
ciência da religião para a sociedade, bem como para a contribuição imprescindível
da ciência da religião para outras faculdades, menos ameaçadas.
Na perspectiva da dependência estrutural, portanto, a situação da ciência da
religião no Brasil e na Alemanha nem é tão diferente assim. Essa situação acarreta
a possibilidade de que, em ambos os países, a dependência da ciência da religião
em relação às finanças e à política universitária leve a um afastamento forçoso dos
temas científicos próprios. A ciência não pode mais decidir por conta própria o que e
como se pesquisa, mas é determinada a partir de fora. Embora na Alemanha e no
Brasil haja dependências de características distintas, a ciência da religião é
dependente em ambos os países66. Neste sentido, os/as cientistas da religião de
ambos os lados do Atlântico estão no mesmo barco.

5.2 - A não-simultaneidade das ciências da religião

27
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
Em relação à ciência da religião feita no Brasil e na Alemanha, pode-se constatar a
existência de uma não-simultaneidade. Chama a atenção, p. ex. – como indiquei
acima –, o fato de que a ciência da religião brasileira quase não dispõe de manuais
e exposições abrangentes produzidos por ela mesma. Do ponto de vista europeu,
justamente a existência de tais introduções seria um sinal da aceitação e presença
de uma disciplina científica.
Também no tocante às traduções de clássicos da ciência da religião disponíveis no
Brasil a situação é, em parte, precária. Assim, por um lado, O Sagrado, de Rudolf
Otto, tem uma ampla recepção e desencadeia, como mencionei, surpreendentes
inspirações interdisciplinares. Mas a base textual ainda é, atualmente, uma tradução
completamente insuficiente, à qual recorrem até mesmo dissertações e teses sobre
O Sagrado. Em ambos os pontos existe, portanto, necessidade de recuperar terreno.

66 Neste sentido, a teoria da dependência discutida na década de setenta do século passado de


modo algum é apenas ―teoria‖ para a ciência da religião atual. – Um tema à parte seria, neste
contexto – também com vistas a um entendimento intercultural entre os/as cientistas da religião –
uma comparação dos objetivos da formação existentes nos dois países.

Excurso: A tradução brasileira de O Sagrado, de Rudolf Otto


Atualmente, uma nova tradução desse clássico está sendo preparada na Escola
Superior de Teologia, e por boas razões, pois a tradução de Prócoro Velasques
Filho, O Sagrado: um estudo do elemento não-racional na idéia do divino e sua
relação com o racional, até agora utilizada e amplamente disseminada, apresenta
deficiências consideráveis. Ela foi publicada em 1985 pela Imprensa Metodista, de
São Bernardo do Campo (SP).
O Programa Ecumênico de Pós-Graduação em Ciências da Religião, localizado na
mesma cidade, é co-responsável pela publicação. De resto, não há quaisquer
indicações bibliográficas: nem sobre a edição do original que lhe serve de base, nem
sobre a tradução francesa – provavelmente utilizada – que a tradução para o
português tomou por base, nem sobre os direitos adquiridos para a tradução.
Constata-se meramente o seguinte: ―O Programa Ecumênico de Pós-Graduação em
Ciências da Religião agradece à Missão das Igrejas Reformadas da Holanda pela

28
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
ajuda financeira para o serviço de tradução desta obra‖. Tudo isso dá a impressão –
para dizê-lo incisivamente – de que se trata de uma edição-pirata.
Acrescenta-se a isso o fato de que, dos 23 capítulos do original (refiro-me à 23.-25.
ed. do texto alemão disponível na biblioteca da EST, München: C. H. Beck, sem
indicação de ano, mas cujo prefácio é datado de janeiro de 1936), a tradução
oferece meramente 12 capítulos (enquanto o original tem 229 p., a tradução tem
172). Além disso, as notas do original são tratadas de uma maneira extremamente
arbitrária67.
As conseqüências dessa tradução para o discurso científico são consideráveis68, e
é por causa dessas conseqüências que abordei mais de perto aqui a tradução
parcial de Velasques: menciono, a título de exemplo, uma dissertação de mestrado
em Filosofia defendida na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul:
BIRCK, Bruno Odélio. O Sagrado em Rudolf Otto. Porto Alegre: EDIPUCRS, 1993.
Nela só há uma referência – implícita – ao original.
Com vistas à terminologia corrente no Brasil, o autor aprova a decisão do tradutor
Velasques de não empregar, no subtítulo, a expressão ―irracional‖, que consta no
original, e sim, como já citei, reproduzi-la por ―não-racional‖69. Por outro lado, nem o
tradutor nem o autor da dissertação fazem referência à decisão – tão importante
quanto compreensível – de traduzir, no título, Das Heilige por O Sagrado e não por
―O Santo‖70. A dissertação, embora mencione o original (edição de 1961) na
bibliografia (p. 163), não o faz em nenhuma passagem do corpo do texto.
De resto, ela busca demonstrar que a descrição do Sagrado feita por Otto não
corresponde ao formalismo de Kant, e sim à fenomenologia de Husserl: no
pensamento de Otto, o Sagrado ―não é um conceito formal, mas descrição
fenomenológica do fato primeiro da religião‖71.
Ao se observar as recepções da obra de Otto, depara-se com surpresas – tanto em
sentido positivo quanto negativo. Um exemplo de ambos os casos: na introdução à
fenomenologia da religião de Piazza, Otto é acusado de encarar o Sagrado ―como
algo objetivo, mas, fiel à sua orientação kantiana[!], não o identifica com Deus‖ e de
reduzir o Sagrado a uma categoria vazia e sem sentido72. Por outro lado, depara-se
com um inesperado recurso a Otto numa contribuição sobre a relação entre missão
(cristã) e espiritualidade, mais precisamente à tese de Otto acerca da harmonia

29
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
entre o elemento irracional e o racional como critério para determinar a
superioridade de uma religião73.

67 Assim faltam, para mencionar apenas um exemplo, na tradução da oração final do cap. 19 do
original (p. 171), que corresponde ao cap. 9 da tradução (p. 120), tanto a palavra decisiva ―religião‖,
que constitui a base das ―analogias‖ mencionadas nesta passagem, quanto a nota respectiva, na qual
Otto aponta para a diferença da linguagem que deve ser usada no ―estudo das religiões‖ e na
―comparação das religiões‖, por um lado, e nos auto-enunciados do cristianismo, por outro: por um
lado, temos enunciados do ―estudo das religiões‖ e, por outro, enunciados ―teológicos‖. Ao mesmo
tempo, Otto relativiza essa distinção: ―É preciso conhecer a diferença entre elas, mas sua separação
intencional seria pedante num texto como este‖.

68 Concordo com o juízo emitido por Baeske, que, referindo-se à tradução para o português de O
Sagrado e ao estudo de Birck mencionado a seguir, afirma: ―Parece que, em nossos dias, Otto está
sendo bastante copiado – mais inconsciente do que conscientemente? – e pouco entendido [...]‖.
BAESKE, Albérico. Testemunhando a Jesus Cristo em nossos dias. Estudos Teológicos, ano 42, n.
2, p. 85-107, 2002, citação à p. 100, nota 53.

Justamente essa última referência à aplicação de um critério por parte de Otto para
―medir‖ as religiões merece atenção. Pode ser que particularmente o cap. 22
(Divination im heutigen Christentume) de Das Heilige, que é muitas vezes ignorado
na recepção da obra de Otto, confirme os críticos da fenomenologia da religião em
sua atitude de rejeição e irrite seus adeptos: para Otto, o fenômeno do numinoso ou
a harmonia contrastante entre o mysterium fascinans e o mysterium tremendum é
um critério para a avaliação das religiões quando o numinoso é interpretado a partir
da teologia da cruz ou quando se consuma, ou melhor, aprofunda, na cruz de Cristo.
Recorrendo à ―cruz de Cristo, esse monograma do mistério eterno‖, o [...] sentimento
cristão realizou a aplicação mais viva da ―categoria do sagrado‖, produzindo, por
conseguinte, a mais profunda intuição religiosa que jamais se encontrou no campo
da história da religião. Ora, é a respeito disso que se tem de perguntar quando se
pretende medir as religiões uma em relação à outra e constatar qual delas é a mais
perfeita. Em última análise, o critério para aferir o valor de uma religião enquanto
religião não pode ser o que ela faz pela cultura, nem sua relação com os ―limites da
razão‖ e ―da humanidade‘, que se acredita poder construir previamente e sem a
religião, nem nada que lhe seja externo. O que pode fornecer esse critério neste
caso só pode ser aquilo que constitui o aspecto mais próprio e intrínseco da

30
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
religião, a própria idéia do Sagrado, e quão perfeitamente uma dada religião
particular faz justiça a ela ou não.74
É isto que afirma Otto. Esse Sagrado interpretado a partir da teologia da cruz
representa um duplo desafio: ele se opõe a uma utilização da fenomenologia da
religião como base de legitimação para uma concepção de ciência da religião que
ligue as disciplinas (como ocorre na América Latina), mas também a uma concepção
de ciência da religião que se sinta comprometida com o ateísmo metodológico
(como ocorre na Europa).

69 BIRCK, Bruno Odélio. O Sagrado em Rudolf Otto. 1993. Dissertação (Mestrado em Filosofia) –
EDIPUCRS, Porto Alegre, 1993. p. 13.

70 No português, ao contrário do alemão, o artigo definido não distingue entre o masculino (―der‖
Heilige) e o neutro (―das‖ Heilige).

71 BIRCK, 1993, p. 11, 160.

72 PIAZZA, Waldomiro Ocativo. Introdução à fenomenologia religiosa. Petrópolis: Vozes, 1976. p.


83.

73 QUEIRÓS, Carlos. Missão e espiritualidade. In: ANDRADE, Sérgio; SINNER, Rudolf von (Org.).
Diaconia no contexto nordestino. São Leopoldo: Sinodal; São Paulo: Paulinas, 2003. p. 91-114,
citação à p. 99s. (= OTTO, Rudolf. Das Heilige. 3. ed. Breslau: [s.n.], 1919. p. 120).

Falei acima de uma necessidade de recuperar terreno ao me dirigir à ciência da


religião no Brasil. Por outro lado, podem-se constatar orientações distintas em
termos de conteúdo tanto na Europa quanto na América Latina: trata-se da diferença
entre uma orientação para ―dentro‖ e para ―fora‖: enquanto que na Alemanha
estudos ―teóricos‖ sobre questões metodológicas e fundamentações identitárias da
ciência da religião estão no primeiro plano, no Brasil existe uma produção muito
abundante de estudos de caso e edições de textos75 sobre as mais diversas
religiões e confissões, sendo que estão no centro das atenções aquelas que se
fazem presentes – inclusive entre os/as participantes de atividades letivas76.
Abstraindo disso, o interesse pela ―religião‖ é extremamente vivo também na mídia
secular.77

74 OTTO, 1919, p. 188.

31
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
75 Cf., p. ex., a obra-padrão de PRANDI, Reginaldo. Mitologia dos orixás. São Paulo: Schwarcz,
2001 (quanto a ela: BRANDT, 2003 [nota 1]), ou o estudo de caso de BOBSIN, Oneide. O
subterrâneo religioso da vida eclesial: intuições a partir das ciências da religião. Estudos
Teológicos, ano 35, n. 3, p. 261-280, 1995; BOBSIN, Oneide. Tendências religiosas e
transversalidade: hipóteses sobre a transgressão de fronteiras. In: BOBSIN, Oneide. Correntes
religiosas e globalização. São Leopoldo: Sinodal, 2002. p. 13-38.

76 Num curso de Introdução às Ciências da Religião oferecido na EST no ano de 2005, havia, entre
os/as participantes, não só cristãos de diversas confissões (católicos, metodistas, luteranos,
pentecostais, batistas, presbiterianos), mas também espíritas, e a maioria deles/as tinha experiências
pessoais com práticas ―mágicas‖ e cultos afro-brasileiros. O cenário religioso multifacetado estava,
portanto, diretamente presente na sala de aula. Cf. quanto a isso KLIEWER, Gerd Uwe. Brodelnde
Vielfalt: Religionen und Kirchen in Brasilien heute. Öku-menische Rundschau, n. 3, p. 328-337,
2005. – Diferentemente do interesse pela religião e religiosidade na Europa, que também cresceu
nos últimos anos, na América Latina essa referência à religião me parece menos ―difusa‖.

Entretanto, não entendo essas priorizações diferentes nos moldes de


subdesenvolvimento de um lado e progresso de outro. Também existem, antes,
indícios de interesses que vão na direção contrária. No planejamento de um projeto
de pesquisa intitulado ―Caminhos e descaminhos do espírito‖, realizado em
cooperação por pesquisadores brasileiros e alemães, os alemães manifestaram
interesse por estudos empíricos, p. ex. sobre a Igreja (neopentecostal) Universal do
Reino de Deus, que está causando sensação nos últimos anos. Os brasileiros, por
sua vez, reagiram a isso com claras reservas (―Não me venham de novo com esse
tema da moda‖). Eles desejavam, em vez disso, um aprofundamento nas obras dos
grandes clássicos, como Hegel, p. ex.
Também no tocante à avaliação da fenomenologia, existem indícios de
desdobramentos que parecem corrigir o esquema desta exposição78. É verdade
que, em geral, verifica-se que na ciência da religião alemã se deu adeus à
fenomenologia, enquanto que no Brasil se depositam nela esperanças
consideráveis. Contudo, quando os fenomenólogos são criticados por causa de suas
valorações dos objetos religiosos, essa crítica foi efetivamente levada em
consideração por algumas das contribuições brasileiras, ao passo que,
inversamente, na ciência da religião alemã existem tendências mais recentes que
mostram que a abstinência na valoração ou crítica aberta de fenômenos religiosos
está sendo abandonada79. Poder-se-ia, face às cautelosas iniciativas, já
mencionadas, de uma refundamentação crítica e reflexiva da fenomenologia da

32
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
religião, dizer o seguinte: enquanto que no Brasil há fenomenologia da religião
demais, na Alemanha há muito pouco dela80.
Tanto mais promissor seria um diálogo técnico internacional que possibilitasse um
confronto de ambas as posturas para com a fenomenologia da religião e, com isso,
por assim dizer, um encontro no meio dos dois extremos. É que existem indícios de
uma aproximação mútua: na Alemanha, a ciência da religião está passando da
fundamentação de um método próprio para uma valoração de fenômenos religiosos,
abrindo-se, assim, (novamente) para questionamentos normativos; no Brasil, após a
concentração em estudos de caso analíticos (a partir das mais diversas perspectivas
científicas) e a avaliação do material empírico, existe uma tendência a se dedicar
mais acentuadamente, no futuro, ao tema de um método próprio para as ciências da
religião. Neste sentido, seria importante que não só as teologias, mas também as
ciências da religião se compreendessem como ciências interculturais81.

77 Durante minha estada no Brasil foi publicada na revista VEJA de 11 de maio de 2005 (ano 38, n.
19) uma matéria de capa intitulada ―Por que o brasileiro acredita em vida após a morte‖ (p. 112-117).
A capa mostrava um cadáver em cujo dedão do pé estava preso um bilhete que dizia: ―Volto já‖. E o
texto da capa dizia: ―Vida após a morte. Por que é tão forte a crença na reencarnação e na
comunicação com os mortos‖.

78 Carsten Colpe, p. ex., trata, no § 7 de sua contribuição, acima mencionada (v. supra nota 23),
sobre a refundamentação de uma fenomenologia das religiões e da religião, de ―Elementos da
fenomenologia da religião em outras ciências (psicologia, teoria dos sistemas, gnosiologia, ética)‖.
Esta perspectiva se assemelha aos esforços dos brasileiros, descritos acima na seção 4.2.3., de
explorar o potencial interdisciplinar da fenomenologia. Afinal, existem também – não obstante as
intenções serem diferentes – consonâncias entre posições científicas que, como neste caso, foram
formuladas independentemente uma da outra. Para uma discussão diferenciada da fenomenologia da
religião, cf. também a seguinte obra coletiva: MICHAELIS, Axel; PEZZOLI-OLGIATI, Daria; STOLZ,
Fritz (Ed.). Noch eine Chance für die Religionsphänomenologie? Bern: Peter Lang, 2001 (Studia
Religiosa Helvetica, 6/7), e nela, p. ex., BERNER, Ulrich. Religionsphänomenologie und
Skeptizismus. p. 369-391.

79 Cf., p. ex., KIPPENBERG, Hans G. Kriminelle Religion: Religionswissenschaftliche Betrachtungen


zu Vorgängen in Jugoslawien und im Libanon. Zeitschrift für Religionswissenschaft, v. 7, n. 1, p.
95-110, 1999.

80 Ou, nas palavras de meu colega Oneide Bobsin: ―O que a Europa tem demais em termos de
metateoria, a América Latina tem muito pouco‖.

81 Um exemplo de que a animosidade entre cientistas da religião e teólogos está começando a


diminuir na Alemanha é o posicionamento de uma comissão conjunta do Grupo de Trabalho ―Ciência
da Religião e Missiologia‖ na Sociedade Científica de Teologia, por um lado, e na Sociedade Alemã
de Missiologia, por outro. Portanto, cientistas da religião e missiólogos participaram de sua
elaboração. O título reza: ―A missiologia como teologia intercultural e sua relação com a ciência da
religião‖. No texto se constata conjuntamente o seguinte: ―A associação de missiologia ou teologia
intercultural à ciência da religião que é comum nas faculdades de Teologia mostrou ser frutífera e
deve, por isso, ser mantida a todo custo‖. No final se diz: ―A teologia intercultural/missiologia em

33
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
associação com a ciência da religião é de relevância fundamental para o conjunto da teologia
protestante no horizonte dos desafios globais. Por conseguinte, no futuro a posição dessa disciplina
nas faculdades de Teologia tem de ser claramente fortalecida também em termos institucionais‖. Esse
documento, entretanto, só relaciona o termo ―intercultural‖ com a missiologia; quer-se que a palavra
equívoca ―missão‖ passe para o segundo plano. Por isso se exige, invocando o atual direcionamento
da disciplina da missiologia: ―missiologia como teologia intercultural‖. Com isso, de modo algum se
visa cooptar a ciência da religião para a teologia. Afirma-se, antes, que ―a ciência da religião é
entendida como uma[!] ciência da cultura, de cujo conhecimento especializado a teologia
intercultural/missiologia depende em muitos campos de trabalho‖.
Com o título desta contribuição: ―As ciências da religião numa perspectiva intercultural‖ e com base
em minhas observações e ponderações, aqui apresentadas, sobre as distintas percepções e
avaliações da fenomenologia, eu queria incentivar a que também se considerasse a interculturalidade
da(s) ciência(s) da religião. Em minha opinião, isso se torna plausível na medida em que, como
mostrei, a ciência da religião é compreendida como uma das ciências da cultura; veja quanto a isso a
citação da Universidade de Munique na próxima nota.

5.3 - Pesquisa sob pressupostos


A última observação diz respeito à relação entre a pesquisa e seus pressupostos.
Falei acima da dependência da pesquisa. Agora não me refiro a essa dependência
institucional, por assim dizer externa, mas aos pressupostos inerentes à própria
pesquisa82. No que diz respeito à fenomenologia, as críticas movidas contra ela na
Europa vivem do pressuposto de que uma pesquisa isenta de pressupostos (p. ex.,
da metafísica e/ou da teologia) seria possível. Ora, não ter pressupostos também é
um pressuposto. No Brasil, tais pressupostos se mostram no objetivo de buscar a
autonomia da ciência da religião como disciplina acadêmica e defender a
fenomenologia como elo de unidade da ciência da religião.
Caso se buscasse uma ciência isenta de pressupostos, sucumbir-se-ia a uma ilusão
(não-científica). Proponho, por isso, uma ciência (da religião) que esteja disposta a
discutir, de forma livre e despreconceituosa, os objetivos e pressupostos que lhe são
próprios (bem como os objetivos e pressupostos das/dos pesquisadoras/es)83.
Disso fazem parte a explicitação e a resposta à seguinte pergunta: o que quer a
ciência da religião? Quer impedir que se caia na armadilha do positivismo (Brasil)
ou do tecnicismo (Alemanha) para, assim, poder fazer justiça a seu ―objeto‖, à(às)
religião(ões)?

82 Quanto a isso, cf., p. ex, o estudo sobre a história da pesquisa de KIPPENBERG, Hans G.
Rivalitäten in der Religionswissenschaft: Religionsphänomenologen und Religionssoziologen als
kulturkritische Konkurrenten. Zeitschrift für Religionswissenschaft, v. 2, p. 69-89, 1994. Instrutiva
em relação aos pressupostos atuantes em cada caso é uma comparação do material publicitário com
o qual as instituições de ensino superior divulgam seus cursos de Ciência da Religião. Um material
publicado pela EST, p. ex., diz o seguinte sobre a especialização em Ciências da Religião: ―O

34
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
crescente pluralismo religioso e a decorrente complexificação dos fenômenos religiosos que
demarcam e diluem fronteiras requerem uma metodologia de análise no horizonte da
transversalidade [...] Ao fomentar uma visão crítica e solidária dos fenômenos religiosos este lato
sensu visa preparar profissionais de diversas áreas para que superem o preconceito frente às
diversas formas de crer, facilitando o diálogo religioso como base para o exercício da cidadania [...]‖.
O curso interdisciplinar de Ciência da Religião da Universidade de Munique, por sua vez, é divulgado
da seguinte maneira: ―A ciência da religião faz parte das ciências da cultura. Muitas vezes, ela
também é confundida com teologia protestante ou católica. Mas a ciência da religião não tem um
ponto de vista religioso. Ela é marcada pelo discurso comovisivo de sua época [...] A ciência da
religião está conectada com numerosas disciplinas científicas e constitui, de maneira abrangente,
uma disciplina autônoma com um questionamento e um método particulares. Ela tem uma atitude de
abertura para a diversidade cultural. Quem a estuda passeia não apenas por diversos mundos, mas
também por diversas ciências [...]‖.

83 Cf. a apreciação de Nathan Söderblom por parte de COLPE, Carsten. Über das Heilige.
Frankfurt/M.: [s.n.], 1990. p. 39s.: justamente o pressuposto da ―teologia da revelação permite que
Söderblom até perceba, com maior clareza do que o conseguem alguns teóricos da ciência atuais, o
que é uma premissa. Isto também beneficiou suas investigações sobre ‗o Sagrado‘.‖ Quanto a isso,
cf. também BRANDT, Hermann. Vom Reiz der Mission. Neuendettelsau: Erlanger Verlag für Mission
und Ökumene, 2003. p. 268s.

Com isso se deveria concordar plenamente. Mas justamente com isso se mostra a
inevitável tensão e relação entre pressuposto e pesquisa. Justamente a pergunta a
respeito dos pressupostos leva, assim, à pergunta a respeito da própria pesquisa.
Uma não pode ser dissociada da outra. E a inexorabilidade da decisão sobre o que
deve ser pesquisado e com que objetivo une as ciências da religião no Brasil e a
ciência da religião na Alemanha.
As discussões controvertidas sobre a fenomenologia da religião mostram
justamente isto: não é possível pesquisar seu ―objeto‖ – a(s) religião(ões) que se
nos mostram – sem prestar contas dos pressupostos próprios de cada projeto de
pesquisa e sobre os motivos condutores das pesquisadoras e pesquisadores. E,
assim, a investigação dos fenômenos se torna e permanece um empreendimento
humano. ―Todo discurso, particularmente o fragmento de um discurso, em geral
pressupõe algo de que parte; quem quiser fazer do discurso ou do enunciado objeto
de reflexão fará, por isso, bem em descobrir primeiro o pressuposto, para, então,
começar por ele.‖84

REFERÊNCIAS

ANTES, Peter; GEERTZ, Arnim G.; WARNE, Randi R. (Ed.). New Approaches to
the Study of Religion. Berlin e New York: [s.n.], 2004. v. 1 e 2.
35
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
BAESKE, Albérico. Testemunhando a Jesus Cristo em nossos dias. Estudos Teoló-
gicos, ano 42, n. 2, p. 85-107, 2002.

BERNER, Ulrich. Religionsphänomenologie und Skeptizismus. In: MICHAELIS, Axel;


PEZZOLI-OLGIATI, Daria; STOLZ, Fritz (Ed.). Noch eine Chance für die Religions-
phänomenologie? Bern: Peter Lang, 2001. (Studia Religiosa Helvetica, 6/7).

BIRCK, Bruno Odélio. O Sagrado em Rudolf Otto.1993. Dissertação (Mestrado em


Filosofia) – EDIPUCRS, Porto Alegre, 1993.

BOBSIN, Oneide. O subterrâneo religioso da vida eclesial: intuições a partir das


ciências da religião. Estudos Teológicos, ano 35, n. 3, p. 261-280, 1995.

______. Tendências religiosas e transversalidade: hipóteses sobre a transgressão


de fronteiras. In: BOBSIN, Oneide. Correntes religiosas e globalização. São Leo-
poldo: Sinodal, 2002.

BRANDT, Hermann. Die heilige Barbara in Brasilien: Kulturtransfer und Synkre-


tismus. Erlangen: [s.n.], 2003. (Erlanger Forschungen, Reihe A, Geisteswissenschaf-
ten, 105). 84 KIERKEGAARD, Søren (no início de sua interpretação de Mt 12.39).
Der Liebe Tun. Düsseldorf: [s.n.], 1966. p. 21 (Gesammelte Werke [ed. de Emanuel
Hirsch], 19. Abteilung).

______. Vom Reiz der Mission. Neuendettelsau: Erlanger Verlag für Mission und
Ökumene, 2003.

COLPE, Carsten. Über das Heilige. Frankfurt/M.: [s.n.], 1990.

COSTA, Valdeli Carvalho da. Os ―seres superiores‖ e os orixás / santos: um


estudo sobre a fenomenologia do sincretismo umbandístico na perspectiva da
teologia católica. São Paulo: [s.n.], 1983.

CROATTO, José Severino. As linguagens da experiência religiosa: uma


introdução à fenomenologia da religião. São Paulo: Paulinas, 2001.

DIE RELIGION in Geschichte und Gegenwart.4. ed. [S.l.: s.n., s.d.].

DORNSEIFF, Franz. Der deutsche Wortschatz nach Sachgruppen. 5. ed. Berlin:


[s.n.], 1959.

DREHER, Luís H. (Org.). A essência manifesta: a fenomenologia nos estudos inter-


disciplinares da religião. Juiz de Fora: UFJF, 2003.

DUDEN. Fremdwörterbuch. Mannheim: [s.n.], 1960.

ELIADE, Mirceia (Ed.). The Encyclopedia of Religion. New York: Macmillan, 1987.

FERREIRA, Antônio Gomes. Dicionário de latim-português. Porto: [s.n.], 1988.

36
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
FILORAMO, Giovanni; PRANDI, Carlo. As ciências das religiões. São Paulo:
Paulus, 1999. Tradução do italiano.

GUIMARÃES, André Eduardo. O Sagrado e a história: fenômeno religioso e


valorização da história à luz do anti-historicismo de Mircea Eliade. Porto Alegre:
EDIPU-CRS, 2000. (Coleção Teologia, 21[!]).

HEBECHE, Luiz. O escândalo de Cristo: ensaio sobre Heidegger e São Paulo. Ijuí:
Unijuí, 2005.

HOCK, Klaus. Einführung in die Religionswissenschaft. Darmstadt: Wissenschaft-


liche Buchgesellschaft, 2002.

KIERKEGAARD, Søren. Der Liebe Tun. Düsseldorf: [s.n.], 1966. p. 21 (Gesammelte


Werke [ed. de Emanuel Hirsch], 19. Abteilung).

KIPPENBERG, Hans G. Kriminelle Religion: Religionswissenschaftliche Betrachtun-


gen zu Vorgängen in Jugoslawien und im Libanon. Zeitschrift für Religionswis-
senschaft, v. 7, n. 1, p. 95-110, 1999.

KIPPENBERG, Hans G. Rivalitäten in der Religionswissenschaft: Religionsphäno-


menologen und Religionssoziologen als kulturkritische Konkurrenten. Zeitschrift für
Religionswissenschaft, v. 2, p. 69-89, 1994.

______.; STUCKRAD, Kocku von. Einführung in die Religionswissenschaft. Bre-


men: [s.n.], 2003.

KLIEWER, Gerd Uwe. Brodelnde Vielfalt: Religionen und Kirchen in Brasilien heute.
Ökumenische Rundschau, n. 3, p. 328-337, 2005.

MICHAELIS, Axel; PEZZOLI-OLGIATI, Daria; STOLZ, Fritz (Ed.). Noch eine Chan-
ce für die Religionsphänomenologie? Bern: Peter Lang, 2001. (Studia Religiosa
Helvetica, 6/7).

OTTO, Rudolf. Das Heilige. 3. ed. Breslau: [s.n.], 1919.

PERRIN, Aldo Natale. O Sagrado off limits: as experiências religiosas e suas


expressões. São Paulo: [s.n.], 1998.

PIAZZA, Waldomiro Ocativo. Introdução à fenomenologia religiosa. Petrópolis:


Vozes, 1976.

POLLAK-ELTZ, Angelina. La religiosidad popular en Venezuela: un estudio


fenomenológico de la religiosidad en Venezuela. Caracas: San Pablo, 1994.

POR que o brasileiro acredita em vida após a morte. Veja, São Paulo, ano 38, n. 19,
p. 112-117, 11 maio 2005.

PRANDI, Reginaldo. Mitologia dos orixás. São Paulo: Schwarcz, 2001.

37
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
QUEIRÓS, Carlos. Missão e espiritualidade. In: ANDRADE, Sérgio; SINNER, Rudolf
von (Org.). Diaconia no contexto nordestino. São Leopoldo: Sinodal; São Paulo:
Paulinas, 2003.

RUDOLPH, Kurt. Texte als religionswissenschaftliche ―Quellen‖. In: ZINSER, Hartmut


(Ed.). Religionswissenschaft: Eine Einführung. Berlin: [s.n.], 1988.

SILVA, António Barbosa da. The Phenomenology of Religion as a Philosophical


Problem: An Analysis of the Theoretical Background of the Phenomenology in
General and of M. Eliade‘s Phenomenological Approach in Particular. Uppsala: [s.n.],
1982. (Studia Philosophiae Religionis, 8).

SILVA, Domingos Barbosa da. A odisséia crioula.2. ed. Oslo: Aktierrykkeriet, 1993.

TEIXEIRA, Faustino (Ed.). A(s) ciência(s) da religião no Brasil: afirmação de uma


área acadêmica. São Paulo: Paulinas, 2001.

USARSKI, Frank. Perfil paradigmático da ciência da religião na Alemanha. In:


TEIXEIRA, Faustino (Ed.). A(s) ciência(s) da religião no Brasil: afirmação de uma
área acadêmica. São Paulo: Paulinas, 2001.

VELASCO, J. Martin. Introducción a la fenomenología de la religión. Madrid:


Cristiandad, 1978.

WARNECK, Vera Rudge. O eu educado: uma teoria da educação fundamentada na


fenomenologia. Rio de Janeiro: [s.n.], 1991.

ZINSER, Hartmut (Ed.). Religionswissenschaft:Eine Einführung. Berlin: [s.n.],


1988.

38
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
Revista Brasileira de Educação
Print version ISSN 1413-2478
Rev. Bras. Educ. no.27 Rio de Janeiro Sept./Oct./Nov./Dec. 2004
doi: 10.1590/S1413-24782004000300013

ENSINO RELIGIOSO NA ESCOLA PÚBLICA: o retorno de uma


polêmica recorrente

Carlos Roberto Jamil Cury


Universidade Federal de Minas Gerais,
Faculdade de Educação. Universidade Católica de Minas Gerais,
Programa de Pós-Graduação em Educação

RESUMO

O texto objetiva refletir sobre a rumorosa questão que envolve o ensino religioso em
escolas públicas. Esse ensino religioso, ainda que facultativo, vem revelando-se
problemático em Estados laicos, perante o particularismo e a diversidade dos credos
religiosos. Cada vez que tal proposta compareceu à cena dos projetos educacionais,
veio carregada de uma discussão intensa em torno de sua presença e factibilidade
em um país laico e multicultural. No caso do Brasil, o conjunto de princípios,
fundamentos e objetivos constitucionais, por si só, garante amplas condições para
que, com a toda a liberdade e respeitadas todas as opções, as igrejas, os cultos, os
sistemas filosófico-transcendentais possam, legitimamente, recrutar fiéis, manter
crentes, manifestar convicções, ensinar seus princípios, fundamentos e objetivos e
estimular práticas em seus próprios ambientes e locais. Além disso, hoje mais do que
ontem, as igrejas dispõem de meios de comunicação de massa, em especial as
redes de televisão ou programas religiosos em canais de difusão, para o
ensinamento de seus princípios.

Palavras-chave: ensino religioso; laicidade; religião

39
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
ABSTRACT

The article seeks to reflect on the thorny question of religious education in public
schools. Although optional, religious education has become problematic in secular
states, when faced by the particularity and diversity of religious creeds. Whenever
such a proposal appears on the scene of educational projects, it comes charged with
an intense discussion concerning its presence and viability in a secular multicultural
country. In the case of Brazil, the set of constitutional principles, motives and
objectives alone guarantees ample conditions to enable the churches, cults and
philosophical-transcendental systems, with all liberty, and respect for diverse options,
to recruit followers legitimately to maintain their beliefs, demonstrate convictions and
teach their principles, motives and objectives and stimulate practices in their own
places and spaces. Besides this, today more than ever before, the churches have at
their disposal means of mass communication, in particular television networks or
religious programmes on broadcasting channels, for transmitting their principles.

Key-words: religious education; secularity; religion

Introdução

O ensino religioso é mais do que aparenta ser, isto é, um componente curricular em


escolas. Por trás dele se oculta uma dialética entre secularização e laicidade no
interior de contextos históricos e culturais precisos.

Nas sociedades ocidentais e mais especificamente a partir da modernidade, a


religião deixou de ser o componente da origem do poder terreno (deslocado para a
figura do indivíduo) e, lentamente, foi cedendo espaço para que o Estado se
distanciasse das religiões.

O Estado se tornou laico, vale dizer tornou-se eqüidistante dos cultos religiosos sem
assumir um deles como religião oficial. A modernidade vai se distanciando cada vez
mais do cujus regio, ejus religio. A laicidade, ao condizer com a liberdade de
expressão, de consciência e de culto, não pode conviver com um Estado portador de
40
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
uma confissão. Por outro lado, o Estado laico não adota a religião da irreligião ou da
anti-religiosidade. Ao respeitar todos os cultos e não adotar nenhum, o Estado libera
as igrejas de um controle no que toca à especificidade do religioso e se libera do
controle religioso. Isso quer dizer, ao mesmo tempo, o deslocamento do religioso do
estatal para o privado e a assunção da laicidade como um conceito referido ao poder
de Estado.

Já a secularização é um processo social em que os indivíduos ou grupos sociais vão


se distanciando de normas religiosas quanto ao ciclo do tempo, quanto a regras e
costumes e mesmo com relação à definição última de valores. Um Estado pode ser
laico e, ao mesmo tempo, presidir a uma sociedade mais ou menos secular, mais ou
menos religiosa. Grupos sociais podem professar-se agnósticos, ateus, outros
preferem o reencantamento do mundo, muitos continuarão seguindo várias e
variadas confissões religiosas e todos podem convergir na busca da paz (Zanone,
1986 apud Bobbio et al., p. 670-674).

Por outro lado, não é menos real verificar-se a existência de polêmicas com fundo
religioso explícito: é o caso da proposta de afirmação do cristianismo na Constituição
da União Européia, cujo texto não incluiu o patrimônio cristão como um valor da
Europa, a presença dos crucifixos em prédios públicos da Itália, dos véus das moças
de grupos islâmicos nas escolas francesas e a recente polêmica entre criacionismo e
evolucionismo nos currículos das escolas estaduais do Rio de Janeiro, em nosso
país.

O ensino religioso é problemático, visto que envolve o necessário distanciamento do


Estado laico ante o particularismo próprio dos credos religiosos. Cada vez que este
problema compareceu à cena dos projetos educacionais, sempre veio carregado de
uma discussão intensa em torno de sua presença e factibilidade em um país laico e
multicultural.1

O ensino religioso no Brasil

Em nosso país, o ensino religioso, legalmente aceito como parte dos currículos das
escolas oficiais do ensino fundamental, na medida em que envolve a questão da
41
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
laicidade do Estado, a secularização da cultura, a realidade socioantropológica dos
múltiplos credos e a face existencial de cada indivíduo, torna-se uma questão de alta
complexidade e de profundo teor polêmico (Cury, 1993).

No caso do Brasil, antes de mais nada, cumpre recordar dispositivos constitucionais


que remetem à problemática em discussão e que permitem maior amplidão da
temática. Assim, diz o art. 19 da Constituição Federal de 1988:

É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

I – estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o


funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência
ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público;

A laicidade é clara, o respeito aos cultos é insofismável e quando a lei assim o


determinar pode haver campos de mútua cooperação em prol do interesse público,
como é o caso de serviços filantrópicos.

Além disso, o art. 1º, inciso III, põe como fundamento da República "a dignidade da
pessoa humana". Já o art. 3º, inciso IV, coloca como objetivo da República a
promoção do "bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e
quaisquer outras formas de discriminação". Se a cidadania é fundamento da
República, a prevalência dos direitos humanos é um dos princípios de nossas
relações internacionais. Portanto, há aqui, à luz da dignidade da pessoa humana, o
repúdio a toda e qualquer forma de discriminação e a assinalação de objetivos
maiores como a cidadania em nível nacional e os direitos humanos em nível
internacional.

Não contente com esses dispositivos, a Constituição Federal explicita no longo e


detalhado art. 5º uma pletora de direitos e deveres individuais e coletivos entre os
quais se pode citar os incisos:

VI – é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre


exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de
culto e a suas liturgias;
42
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
VII – é assegurada, nos termos da lei, a prestação de assistência religiosa nas
entidades civis e militares de internação coletiva;

VIII – ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de


convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal
a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei.

Esse conjunto de princípios, fundamentos e objetivos constitucionais, 2 por si sós,


dariam amplas condições para que, com a toda a liberdade e respeitadas todas as
opções, as igrejas, os cultos, os sistemas filosófico-transcendentais possam,
legitimamente, recrutar fiéis, manter crentes, manifestar convicções, ensinar seus
princípios, fundamentos e objetivos e estimular práticas em seus próprios ambientes
e locais. Afinal, hoje mais do que ontem, as igrejas dispõem de meios de
comunicação de massa, em especial as redes de televisão ou programas religiosos
em canais de difusão.

No caso do Brasil, a Constituição Federal de 1988, seguindo praticamente todas as


outras constituições federais desde 1934 e atendendo a pressão de grupos
religiosos, inclui o ensino religioso dentro de um dispositivo constitucional como
disciplina3 em seu art. 210, § 1º: "O ensino religioso, de matrícula facultativa,
constituirá disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino
fundamental".

Há que se destacar aqui que o ensino religioso é de matrícula facultativa. Trata-se de


um dispositivo vinculante. Logo, é um princípio nacional e abrange o conjunto dos
sistemas e suas respectivas redes públicas e privadas.

A lei nº 9.394/96, Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), em sua versão


original, dizia, no art. 33:

O ensino religioso, de matrícula facultativa, constitui disciplina dos horários normais


das escolas públicas de ensino fundamental, sendo oferecido, sem ônus para os
cofres públicos, de acordo com as preferências manifestadas pelos alunos ou por
seus responsáveis, em caráter:

43
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
I – confessional, de acordo com a opção religiosa do aluno ou do seu responsável,
ministrado por professores ou orientadores religiosos preparados e credenciados
pelas respectivas igrejas ou entidades religiosas; ou

II – interconfessional, resultante de acordo entre as diversas entidades religiosas,


que se responsabilizarão pela elaboração do respectivo programa.

Em parecer normativo relativo ao assunto, ainda na vigência da primeira redação do


art. 33, o Conselho Nacional de Educação (CNE), através do parecer CNE nº 05/97 4
se pronunciou a fim de dirimir a questão relativa aos ônus financeiros da oferta desta
disciplina pelo poder público já que "haveria violação do art. 19 da Constituição
Federal que veda a subvenção a cultos religiosos e a igrejas". E afirmava também:

[...] por ensino religioso se entende o espaço que a escola pública abre para que
estudantes, facultativamente, se iniciem ou se aperfeiçoem numa determinada
religião. Desse ponto de vista, somente as igrejas, individualmente ou associadas,
poderão credenciar seus representantes para ocupar o espaço como resposta à
demanda dos alunos de uma determinada escola. (p. 2)

Essa redação não agradou várias autoridades religiosas, em especial as católicas,


cujo objetivo inicial era pressionar a presidência da República a fazer uso do seu
direito de veto. O próprio Executivo assumiu, então, o compromisso de alterar o art.
33 mediante projeto de lei, daí resultando a lei nº 9.475/97. Por ela, o art. 33 passou
a ser expresso nos seguintes termos:

O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do


cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino
fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural e religiosa do Brasil,
vedadas quaisquer formas de proselitismo.

§ 1º Os sistemas de ensino regulamentarão os procedimentos para a definição dos


conteúdos do ensino religioso e estabelecerão as normas para a habilitação e
admissão dos professores.

44
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
§ 2º Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constituída pelas diferentes
denominações religiosas, para a definição dos conteúdos do ensino religioso.

Mantido o princípio constitucional da oferta obrigatória e matrícula facultativa para


todos da disciplina nos horários normais, no ensino fundamental, a nova versão é
omissa quanto à anterior vedação de ônus para os cofres públicos, abrindo a
possibilidade de recursos públicos dos sistemas para essa oferta, mas vedando
explicitamente qualquer forma de proselitismo e impondo o respeito à diversidade
cultural religiosa no Brasil. Esses dois últimos dispositivos não só combinam com os
princípios constitucionais já citados como permitem uma articulação com os
princípios de "respeito à tolerância e apreço à liberdade", expostos no inciso IV do
art. 3º da LDB.

Ao mesmo tempo, a nova redação introduz um novo aposto: o ensino religioso "é
parte integrante da formação do cidadão". Salta à vista a inadequação dessa
introdução num assunto que toca diretamente ao direito à diferença e à liberdade.
Em contrapartida, os dois parágrafos postos na nova versão deixam como
incumbência do poder público regulamentar "os procedimentos para a definição dos
conteúdos do ensino religioso". Como se sabe, procedimentos são formas
estabelecidas em ordenamento legal para cumprir os trâmites de um processo
administrativo (Di Pietro, 2004, p. 530-531). Cabe ainda aos poderes públicos de
cada sistema de ensino estabelecer as normas para a habilitação e admissão dos
professores.

Através do parecer CNE nº 12/97, a Câmara de Educação Básica se pronunciou


sobre a inclusão do ensino religioso para efeito da "totalização do mínimo de 800
horas". O parecer diz que "a resposta é não", devido ao fato de a matrícula ser
facultativa e a disciplina fazer parte da liberdade das escolas. 5

A mesma Câmara, em resposta à solicitação da Secretaria de Estado da Educação


de Santa Catarina que pedia maior explicitação do assunto âmbito das 800 horas
obrigatórias no ensino fundamental, se pronunciou, através do parecer nº 16/98, de
modo a incentivar o ensino religioso interconfessional e ecumênico e a confirmar o
desenvolvimento de "um currículo com 840 (oitocentas e quarenta) horas anuais, o
45
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
que propicia, com grande facilidade, o cumprimento do preceito legal do ensino
religioso". Além disso, no histórico do parecer, o relator enuncia que a normatividade
vigente implica na oferta regular, "para aqueles alunos que não optam pelo ensino
religioso, nos mesmos horários, outros conteúdos de formação geral [...]".

Por sua vez, o Conselho Pleno do CNE pronunciou-se sobre a formação de


professores para o ensino religioso por meio do parecer CP/CNE nº 097/99, na
medida em que a nova redação incumbe ao poder estatal a definição das normas
para habilitação e admissão dos professores desta disciplina. Diz o parecer, em
vários trechos importantes:

Nesta formulação [da lei nº 9.475/97] a matéria parece fugir à competência deste
Conselho, pois a questão da fixação de conteúdos e habilitação e admissão dos
professores fica a cargo dos diferentes sistemas de ensino. Entretanto, a questão se
recoloca para o Conselho no que diz respeito à formação de professores para o
ensino religioso, em nível superior, no Sistema Federal de Ensino. [...] A Lei nº 9.475
não se refere à formação de professores, isto é, ao estabelecimento de cursos que
habilitem para esta docência, mas atribui aos sistemas de ensino tão somente o
estabelecimento de normas para habilitação e admissão de professores. [...]
Considerando estas questões é preciso evitar que o Estado interfira na vida religiosa
da população e na autonomia dos sistemas de ensino. [...] Esta parece ser,
realmente, a questão crucial: a imperiosa necessidade, por parte do Estado, de não
interferir e, portanto, não se manifestar sobre qual o conteúdo ou a validade desta ou
daquela posição religiosa, de decidir sobre o caráter mais ou menos ecumênico de
conteúdos propostos [...] (p. 3).

E conclui:

[...] não cabe à União determinar, direta ou indiretamente, conteúdos curriculares que
orientem a formação religiosa dos professores, o que interferiria tanto na liberdade
de crença como nas decisões do estados e municípios referentes à organização dos
cursos em seus sistemas de ensino, não lhe compete autorizar, nem reconhecer,
nem avaliar cursos de licenciatura em ensino religioso, cujos diplomas tenham
validade nacional. (p. 4)
46
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
Outro ponto, posto na lei nº 9.475/97, refere-se à oitiva obrigatória de "entidade civil,
constituída pelas diferentes denominações religiosas, para a definição dos conteúdos
do ensino religioso".

Portanto, o que transparece é a necessária articulação do poder público dos


sistemas com essa entidade civil multirreligiosa que, a rigor, deveria representar um
fórum de cujo consenso emanaria a definição dos conteúdos dessa disciplina. Nesse
caso, é complicado que um texto legal imponha a existência de uma entidade civil,
sendo que alguma denominação religiosa pode não aceitá-la.

Vê-se, pois, que o ensino religioso ficaria livre dessa complexidade político-
burocrática caso se mantivesse no âmbito dos respectivos cultos e igrejas em seus
espaços e templos. Mas, dada a obrigatoriedade da oferta nas escolas públicas e o
caráter facultativo de sua freqüência para o conjunto dos alunos, importa refletir um
pouco sobre aspectos da religiosidade que podem ser úteis em favor da tese da
importância da religião.

Religião

A etimologia do termo religião, donde procede o termo religioso, pode nos dar uma
primeira aproximação do seu significado. Religião vem do verbo latino religare (re-
ligare). Religar tanto pode ser um novo liame entre um sujeito e um objeto, um sujeito
e outro sujeito, como também entre um objeto e outro objeto. Obviamente, o religar
supõe ou um momento originário sem a dualidade sujeito/objeto ou um elo primário
(ligar) que, uma vez desfeito, admite uma nova ligação (re-ligar).

A presença entre os homens de situações indicadoras e reveladoras de guerra e


violência, de fratura social, dos desastres ecológicos e das formas de desigualdade,
discriminação e opressão, entre muitas outras, sempre se chocou com a
consideração do outro como um igual. O relato bíblico de Caim e Abel é
emblemático. À fraternidade originária se segue o fratricídio e daí a busca dos
múltiplos caminhos de recuperação da irmandade perdida. Algo semelhante se pode
depreender do relato mítico grego de Chronos, que chegava mesmo a devorar seus
filhos. Também o jusnaturalismo, na versão hobbesiana, rechaça a idéia de um
47
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
homem naturalmente social, como queriam os clássicos e os medievos, e advoga o
homo homini lupus. Busca-se um novo elo de ligação entre os humanos, iguais entre
si. A estes caminhos de religação, muitos nomes foram dados, daí nascendo também
múltiplas maneiras de religações, civis, laicas ou sacrais. Entre outras denominações
pode-se citar a via de reconstrução racional da vida social e política pelo pacto ou
contrato racionais, a fraternidade universal realizada, a humanidade altruísta, o reino
da liberdade, a justiça na igualdade, o abraço do lobo com a ovelha nos novos céus
e nas novas terras, a paz perpétua e também a ligação do homem com a divindade.

Tal dimensão da religação, contudo, supõe um vetor crítico que elimine,


gradualmente ou de vez, o fratricídio ou seus resquícios e seqüelas. Este vetor ora
se denominou o fim das desigualdades, das discriminações de qualquer natureza
pelo reconhecimento da essência universal igualitária entre todos os entes humanos,
ora se denominou o fim da exploração e opressão alheias. Vários são os
documentos de caráter internacional que expressam a dignidade igualitária da
pessoa humana através de declarações universais. No Brasil, a Constituição Federal
de 1988, em vários artigos, principalmente nos cinco primeiros, endossa, de modo
inconcusso, a dignidade da pessoa humana e o caráter igualitário dos seres
humanos.

Todo ente humano é, em sua individualidade, uma pessoa moral, e neste ponto
reside o caráter ao mesmo tempo universal e igualitário de todos.

É da consciência dessa realidade fundante, negada pelas inúmeras formas


opressivas de vida e de relações sociais, que nascem os combates aos mais
diferentes modos de dominação, desigualdade, discriminação e exploração. Surgem
também dimensões afirmativas e propositivas da pluralidade de caminhos no afã do
reconhecimento universal do parentesco humano e sua religação fraterna e livre.

Ao lado deste reconhecimento de novo congraçamento entre os homens, múltiplos


também são os caminhos pelos quais os homens vão à cata de sua origem comum.

Para uns, a religação é um retorno ampliado a uma comunhão cósmica e telúrica.


Para outros, o surgimento da vida, o encantamento com o céu estrelado e com a
48
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
consciência interior de cada qual inspiraram postular a passagem do universo terreno
ao universo da transcendência ou, em outros termos, no encontro do outro com o
Outro. Esta passagem – para uns, uma questão de argumento lógico, para outros um
salto na fé – significou o aparecimento de múltiplas modalidades de expressar a
religação do homem com o Transcendente. Ao mesmo tempo, tal religação foi a
oportunidade para que muitos também expressassem um humanismo radical no
âmbito exclusivo da terrenalidade e da temporalidade.

Dentro desta multiplicidade, historicamente objeto de afirmações contundentes a


favor ou contra a liberdade de religião e de expressão religiosa, as denominadas
religiões do "livro" (Bíblia, Tora e Alcorão) e do monoteísmo enunciam a afirmação
do encontro entre o Deus Único e sua ligação criadora com o mundo e com os seres
humanos. E a religião seria, ante o distanciamento dos homens entre si e deles com
o seu Criador, um caminho de reencontro e de religação mútuos.

Outras manifestações de caráter religioso, místico, cósmico ou transcendental


também aspiram por um reencontro do ser humano e do conjunto dos seres
humanos vivos ou já mortos com a Totalidade. Contudo, a realização histórica de
tentativas de re-encontro nem sempre se deu à luz do respeito mútuo e nem da
visada do outro como radicalmente humano e igual. Crispações fundamentalistas,
comunitarismos identitários exarcebados, intolerâncias advindas da auto-atribuição
de um "povo eleito" a um segmento humano ou até mesmo a autoafirmação de uma
versão "verdadeira", concepções de liames intrínsecos entre religião e nação e/ou
etnias, já conduziram a inúmeras formas de violência e de guerras religiosas. O
oposto da religação, o oposto da religião.

A contemporânea celebração do ecumenismo, dentro e fora das religiões, repudia o


dogmatismo e a intolerância, além de se bater pelo respeito recíproco, pela liberdade
de consciência, de crença, de expressão e de culto, tende à busca de uma
efetivação histórica do reconhecimento da igualdade essencial entre todos os seres
humanos.

49
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
Todas as tradições religiosas, tenham elas origens em quaisquer regiões ou povos
da terra, merecem respeito e, portanto, devem contar com a pluralidade cultural dos
diferentes modos de se buscar a religação.

Estes princípios são, hoje, componentes inarredáveis da Constituição Federal de


1988 e expressamente reafirmados na Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional e nos pareceres do Conselho Nacional de Educação relativos à educação
básica.

Um pouco de história

Com a contribuição diversa e diversificada que o constituiu, o Brasil, por meio de


suas elites, nem sempre se pautou pelos princípios mencionados anteriormente.
Negros escravizados, índios reduzidos e brancos conflitantes em lutas religiosas se
encontraram em um quadro de intolerância, desrespeito e imposição de credos. As
sofridas experiências históricas, nem sempre superadas pela prática no
reconhecimento da igualdade essencial de todos e da liberdade religiosa,
impulsionaram a afirmação da igualdade e a busca do direito à diferença também no
campo religioso.

De um país oficialmente católico pela Constituição Imperial, nos fizemos laicos pela
Carta Magna de 1891 com o reconhecimento da liberdade de religião e de expressão
religiosa, vedando-se ao Estado o estabelecimento de cultos, sua subvenção ou
formas de aliança. Essa primeira Constituição Republicana, ao mesmo tempo em
que reconhece a mais ampla liberdade de cultos, pune também a ofensa a estes
como crimes contra o sentimento religioso das pessoas. O ensino oficial, em
qualquer nível de governo e da escolarização, tornou-se laico, ao contrário do
Império em que a obrigatoriedade do ensino religioso se fazia presente.

Entretanto, desde a proibição do ensino religioso nas escolas oficiais em 1891, a


Igreja católica se empenhou no restabelecimento desta disciplina ora no âmbito dos
estados, ora no âmbito nacional, sobretudo por ocasião de mudanças
constitucionais. Tímidos retornos nos estados, forte na proposição da Revisão
Constitucional de 1926, bem-sucedida por ocasião da reforma educacional do
50
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
ministro Francisco Campos na década de trinta, a disciplina retornou às escolas
públicas através de decreto, inicialmente fora do horário normal das outras
disciplinas e depois dentro do mesmo horário. Com efeito, o ensino religioso aparece
em todas as constituições federais desde 1934, sob a figura de matrícula facultativa.
Mas tal permanência não se deu sem conflitos, empolgando sempre seus
propugnadores e críticos, fazendo com que os debates, no âmbito da representação
política, bem como no interior da sociedade civil, se revestissem de contenda e
paixão. Os argumentos pró e contra fazem parte de um capítulo próprio da história
da educação brasileira, nas mais diferentes legislações sobre o ensino. Mas é
importante ressalvar que, desde o decreto sobre o ensino religioso de 1931 até hoje,
tal disciplina sempre foi caracterizada como de matrícula facultativa para uma oferta
obrigatória, embora sob as leis orgânicas do Estado Novo até 1946 ela também
fosse de oferta facultativa.

O caráter facultativo

O caráter facultativo da oferta do ensino religioso merece uma pequena reflexão. Ser
facultativo é não ser obrigatório na medida em que não é um dever. O caráter
facultativo caminha na direção de salvaguardas para não ofender o princípio da
laicidade. O mesmo pode-se dizer da vedação de quaisquer formas de proselitismo e
do fato de deixar a uma entidade civil multirreligiosa a definição de conteúdos. Como
diz o parecer CP/CNE nº 05/97:

A Constituição apenas reconhece a importância do ensino religioso para a formação


básica comum do período de maturação da criança e do adolescente que coincide
com o ensino fundamental e permite uma colaboração entre as partes, desde que
estabelecida em vista do interesse público e respeitando – pela matrícula facultativa
– opções religiosas diferenciadas ou mesmo a dispensa de freqüência de tal ensino
na escola. (p. 2)

O caráter facultativo de qualquer coisa implica o livre-arbítrio da pessoa responsável


por realizar ou deixar de realizar algo que se lhe é proposto. A faculdade implica pois
a possibilidade de poder fazer ou não, de agir ou não como algo inerente ao direito
subjetivo da pessoa. Ora, para que o caráter facultativo seja efetivo e a possibilidade
51
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
de escolha se exerça como tal, é necessário que, dentro de um espaço regrado
como o é o das instituições escolares, haja a oportunidade de opção entre o ensino
religioso e outra atividade pedagógica igualmente significativa para tantos quantos
que não fizerem a escolha pelo primeiro. Não se configura como opção a inatividade,
a dispensa ou as situações de apartamento em locais que gerem constrangimento.
Ora, essa(s) atividade(s) pedagógica(s) alternativa(s), constante(s) do projeto
pedagógico do estabelecimento escolar, igualmente ao ensino religioso, deverão
merecer, da parte da escola para os pais ou alunos, a devida comunicação, a fim de
que estes possam manifestar sua vontade perante uma das alternativas. Este
exercício de escolha, então, será um momento importante para a família e os alunos
exercerem conscientemente a dimensão da liberdade como elemento constituinte da
cidadania.

Recentemente saiu um livro com um diálogo magnífico entre Norberto Bobbio e


Mauruzio Viroli (2002). Nele, os dois intelectuais agnósticos conversam sobre o
sentido da República. O sexto capítulo do livro se intitula "Temor a Deus, amor a
Deus". Partindo do capítulo anterior, sobre "Direitos e deveres", no qual ambos
constatam o desaparecimento do sentimento de vergonha, conseqüente ao
arrefecimento da consciência moral, passam a discutir sobre as diferenças entre
caridade leiga e caridade cristã, os limites do mistério e outros trechos estupendos.
Reproduzo um trecho em favor de uma educação religiosa que, conduzida nos
espaços próprios das igrejas, abriria espaço para um ensino extra-escolar mais pleno
de sentido.

Os católicos [diz Viroli] falam de solidariedade, de caridade e de compaixão, e além


de falar, praticam. E nós, laicos? Temos uma concepção de caridade, da compaixão
e da solidariedade distinta daquela dos católicos? Creio que exista uma diferença
importante entre a caridade laica e a caridade cristã. A caridade cristã é Cristo que
compartilha com você o sofrimento; é partilhar o sofrimento. A caridade laica também
é partilhar o sofrimento, mas é também desprezo contra aqueles que são
responsáveis pelo sofrimento. É o desprezo que promove a força interior para lutar
contra as causas do sofrimento. É exatamente porque quem não possui uma fé
religiosa não vê qualquer valor no sofrimento que os homens padecem devido a
52
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
outros homens e porque não acredita na possibilidade ou no valor de um prêmio em
outra vida, que a caridade laica procura, se pode, o remédio para o sofrimento, além
de lenir o sofrimento do oprimido. Impele os oprimidos a combater a causa da
opressão. (p. 67-68)

Bobbio continua: "Creio que você esteja contrapondo a justiça à caridade. Este é um
grande tema da cultura laica".

A ausência de ensino religioso nas escolas não impede que a cultura religiosa
(caridade), ministrada nos seus espaços próprios, se expanda para "um serviço
desinteressado, humanamente desinteressado, ainda que inspirado na idéia de que
o serviço é uma boa obra, que merecerá a glória do Senhor" (Bobbio in Bobbio &
Viroli, 2002, p.69) e, nesse sentido, se aproxime do senso de justiça da caridade
laica que não pode "prometer nada, senão a satisfação da consciência" (idem,
ibidem). E ambas, de acordo com esses intelectuais, podem unir-se na necessidade
de "haver direitos sociais sustentados por leis da República e financiados com
recursos públicos sem que se dispense a caridade praticada pelas associações
voluntárias" (Viroli in Bobbio & Viroli, 2002, p. 73).

De todo modo, os princípios constitucionais e legais obrigam os educadores todos a


se pautar pelo respeito às diferenças religiosas, pelo respeito ao sentimento religioso
e à liberdade de consciência, de crença, de expressão e de culto, reconhecida a
igualdade e dignidade de toda pessoa humana. Tais princípios conduzem à crítica
todas as formas que discriminem ou pervertam esta dignidade inalienável dos seres
humanos.

REFERÊNCIAS

BRASIL, (1988). Constituição: República Federativa do Brasil. Brasília: Senado


Federal, Serviço Gráfico. [ Links ]

______. (1996). Lei nº 9.394/96, estabelece as diretrizes e bases da educação


nacional. Brasília: Diário Oficial da União, 20 de dezembro de 1996, seção I.
[ Links ]

BRASIL, MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO (1997). Lei nº 9.475/97, dá nova redação ao


artigo 33 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e
53
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
bases da educação nacional. Brasília: Diário Oficial da União, 23 de julho e 1997,
seção I. [ Links ]

BRASIL, MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO,


Parecer CP/CNE 05/97, sobre formação de professores para o ensino religioso na
escola pública do ensino fundamental. [ Links ]

______. CÂMARA DE EDUCAÇÃO BÁSICA, Parecer 012/97, esclarecendo dúvidas


sobre a Lei nº 9.394/96, em complemento ao parecer CEB/05/97. [ Links ]

______. Parecer 016/98, sobre carga horária do ensino religioso no ensino


fundamental. [ Links ]

______. CONSELHO PLENO, Parecer 097/97, sobre a formação de professores


para o ensino religioso na escola pública do ensino fundamental. [ Links ]

BAUBÉROT, Jean, (1990). Vers um nouveau pacte laïque? Paris: Seuil. [ Links ]

BOBBIO, Norberto, VIROLI, Maurizio, (2002). Diálogo em torno da República: os


grandes temas da política e da cidadania. Rio de Janeiro: Campus. [ Links ]

CASTRO, Marcelo Lúcio Ottoni de, (1998). A educação na Constituição de 1988 e a


LDB. Brasília: André Quincé. [ Links ]

CURY, Carlos Roberto Jamil, (1993). Ensino religioso e escola pública: o curso
histórico de uma polêmica entre a Igreja e o Estado no Brasil. Belo Horizonte:
Faculdade de Educação da UFMG, Educação em Revista, nº 17, jun., p. 20-37.
[ Links ]

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella, (2004). Direito administrativo. São Paulo: Atlas.
[ Links ]

MALISKA, Marcos Augusto, (2001). O direito à educação e a Constituição. Porto


Alegre: Sérgio Antonio Fabris Editor. [ Links ]

POULAT, Émile, (1987). Liberte, Laicïcité: la guerre dês deux France et le príncipe de
la modernité. Paris: Cerf & Cujas. [ Links ]

TOMÁS, Antonio Fernández, (2001). La Carta de Derechos Fundamentales de la


Unión Europea. Valencia: Tirant lo Blanch. [ Links ]

ZANONE, Valerio, (1986). Verbete sobre o laicismo. In: BOBBIO, Norberto et al.
(orgs.). Dicionário de política. 2ª ed. Brasília: Editora UnB, p. 670-674. [ Links ]

CARLOS ROBERTO JAMIL CURY, doutor em educação pela Pontifícia


Universidade Católica de São Paulo e com pós-doutorado na França (Paris V e École
des Hautes Études) é professor emérito da Universidade Federal de Minas Gerais e
professor no Programa de Pós-Graduação em Educação da Pontifícia Universidade
54
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
Católica de Minas Gerais. Foi membro do Conselho Nacional de Educação no
período 1996-2004. Publicações mais importantes: Ideologia e educação brasileira
(São Paulo: Cortez, 1978); A relação educação-sociedade-estado pela mediação
jurídico-constitucional (em colaboração com José Silvério Baía Horta e Osmar
Fávero, In: A educação nas constituintes brasileiras, 1823-1988. Campinas: Autores
Associados, 1996, p. 5-30); Medo à liberdade e compromisso democrático: da LDB
ao Plano Nacional de Educação (com José Silvério Baía Horta e Vera Lúcia Alves de
Brito. São Paulo: Ed. do Brasil, 1977); Cidadania republicana e legislação
educacional (Rio de Janeiro: DP&A, 2001); Direito à educação: direito à igualdade,
direito à diferença (Cadernos de Pesquisa, nº 116, jul. 2002, p. 245-262). E-mail:
crjcury.bh@terra. com.br

1 Tal polêmica ocorreu em outros diversos países, sendo o caso mais emblemático o
da França (cf. Poulat, 1987, especialmente o capítulo VIII).

2 Princípios são concepções de mundo fundantes de um assunto; fundamentos são


as regras básicas que legitimam e autorizam a existência de uma organização e
objetivos são metas a serem atingidas e efetivadas.

3 É sempre discutível que uma Constituição obrigue a oferta de uma disciplina,


sobretudo de presença tão tradicional quanto polêmica ante seus desdobramentos e
o mandamento do art. 19.

4 Disponível em: <www.mec.gov.br/cne/pareceres> (pareceres normativos do


Conselho Pleno). Acesso em: jun. 2004.

5 Pessoalmente, entendo que essa liberdade também faz parte das liberdades
individuais e do teor do art. 210 da Constituição.

55
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
OS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS E O ENSINO
FUNDAMENTAL
Carlos Roberto Jamil Cury
Faculdade de Educação, Universidade Federal de Minas Gerais

Introdução

Mais uma vez a comunidade educacional se sente provocada a se pronunciar sobre


uma discussão que preocupou sobremaneira os constituintes de 1988: como dar
encaminhamento ao dispositivo constitucional expresso no art. 210 da Constituição
Federal? E, novamente, torna-se importante não ignorar que esse assunto sempre
foi polêmico, seja pelo seu caráter de componente de uma política educacional, seja
pela importância do currículo no próprio exercício do ato pedagógico no interior da
"estrutura e funcionamento" da educação escolar brasileira.

A iniciativa do MEC em dar continuidade à discussão desse assunto por meio dos
denominados Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) deve nos remeter a algumas
reflexões a propósito de seu significado, sua oportunidade e processualística, sem
nos esquecermos de outros momentos históricos nos quais a mesma questão se
pôs. E, se tais premissas forem procedentes, tirar algumas conclusões de caráter
provisório tendo em vista a possibilidade de sua efetivação.

Parâmetros Curriculares Nacionais, currículos mínimos, currículos básicos, currículos


unificados, conteúdos mínimos, diretrizes comuns nacionais ou qualquer outro nome
que se Ihes atribua são dimensões da política educacional que sempre estiveram às
voltas com a questão federativa e com a questão da participação. Ambas as
questões passam pelo sentido maior da democracia.

Evidentemente o nome atribuído pode ter ou não uma ligação mais estreita com uma
concepção de fundo que subjaz a qualquer política educacional. Diretrizes podem ser
linhas gerais reguladoras e currículos únicos podem,significar mais do que uma
listagem mínima e geral de disciplinas obrigatórias para todo o país. Por outro lado, o
termo "parâmetro" pode dar, até mesmo pela sua origem etimológica, uma idéia de
uma "medida" ou de uma "linha" geométrica, constante e invariável.
56
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
De qualquer maneira, sempre fica a pergunta sobre de que tamanho deve ser esse
"mínimo" afim de que a criatividade também possa transparecer nas unidades
federadas e nas próprias unidades escolares. E, não menos importante, qual o
sujeito privilegiado do "serão fixados conteúdos mínimos...", evitando-se tanto a
burocratização verticalista quanto um democratismo pulverizado? [Anísio Teixeira, já
em 1952, criticando o parecer centraliza dor de G. Capanema ante o projeto de Lei
de Diretrizes e Bases enviado pelo ministro Clemente Mariani, afirmou que os
educadores não podem ser transformados em "rígidos intérpretes de leis e
regulamentos uniformes, [...] em executores rígidos de programas oficiais, e os livros
didáticos em manuais 'oficializados' e conformes, linearmente com os pontos dos
'programas'" (Teixeira, 1952, p. 85)].

A questão federativa, conquanto não limitada só à educação escolar, sempre esteve


na primeira linha das discussões quer no Brasil Império, quer no Brasil República.
Ela já se impunha ao país antes mesmo da transição da cultura centralizada e
centralista do Império para a descentralização federada da República.

Montante de verbas, distribuição de rendas, captação de impostos se cruzam com a


divisão de responsabilidades, diversificação de competências e atribuições segundo
parâmetros mais unionistas ou mais descentralizadores e, neste último caso, com
propostas até mesmo confederalistas. E o justo equilíbrio entre esses extremos, no
caso de uma nação, é o federalismo democrático, sempre ansiado como o melhor.
[Um exemplo para se ver a magnitude dessas discussões pode ser encontrado no
livro de Lêda Boechat Rodrigues (1968), intitulado História do Supremo Tribunal
Federal, 1890-1910, a defesa do federalismo, no qual a autora apresenta os
problemas ligados à questão federativa através de sentenças e processos do STF.]

Verbas, competências e atribuições, freqüentemente em clima de disputa no interior


de regimes democráticos e federados, são dirigidas para determinados fins mais
amplos, fins estes que podem ser mais consensuais. Entre eles podem-se citar as
funções clássicas do Estado nacional como guardião da soberania, da moeda, da
segurança e da coesão social. Pode-se então dizer que a coesão, uma função

57
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
permanente dos Estados nacionais, se impõe através de vários caminhos. A
educação escolar é um deles e aí ocupa lugar destacado.

Ora, se as instituições de ensino sempre foram consideradas relevantes no sentido


da coesão é porque elas socializam, culturalizam e instilam comportamentos e
valores. Elas ensinam isto é, deixam sinais. Mas, enquanto tais, elas só se
consubstanciam quando se aproximam do ato pedagógico. Este, por sua vez,
enquanto síntese do aprender-ensinar,é mediado por currículos manifestos ou
ocultos, sobretudo no interior de redes de ensino. (Aliás, isto já está posto na origem
do termo currículo seja como dimensão estática (cadastro, reunião de dados), seja
como dimensão dinâmica (curso, movimento de reunião).

Nesse sentido, currículos nacionais, mínimos curriculares, diretrizes gerais têm muito
a ver com a questão federativa, pois neles estão presentes a idéia e a prática de
conteúdos gerais válidos para toda uma nação. Mas sua operacionalização enfrenta
uma dupla problemática: se há necessidade de constrangimentos legais para esses
mínimos e, seja pela negativa, seja pela afirmativa, qual o papel das unidades
federadas. As perguntas clássicas sobre os justos limites dos entes juridicamente
autônomos no jogo União x unidades federadas se expressam também no âmbito de
currículos mínimos para todos os cidadãos em qualquer estado ou município. Assim,
pode-se: interrogar: invade-se o território da autonomia dos estados quando a União
impõe uma lista mínima de disciplinas? E o que dizer quando ela avança no sentido
de um detalhamento destas? Esse detalhamento é o que reza o art. 210 da
Constituição? Basta uma listagem mínima de disciplinas para que o objetivo da
coesão nacional se:já alcançado? Trata-se de uma peculiaridade dos Conselhos
Nacionais no sentido de sua explicitação? Qual a tarefa dos Conselhos Estaduais (ou
de quem quer que lhe faça as vezes)? Qual é o papel dos pesquisadores e
estudiosos nesse caso? (Sobre esse assunto deve-se consultar os Cadernos ANPEd
Nova Fase, n° 2, 1989, todo dedicado a esse assunto.)

Por outro lado, quem exerce a docência é quem "sente" o peso dessa tarefa, e nesse
"sentir" o professor "sabe" um caminho que nem sempre chega a quem entende que
"entende" do assunto, mas nem sempre "sente". É possível uma proposta curricular,

58
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
em qualquer nível administrativo, em que a legitimidade da proposta não passe pela
subjetividade dos profissionais da educação?

Desafio permanente para qualquer democracia é a natureza e o grau de participação


que deve pautar a relação entre "dirigentes e dirigidos". Desafio permanente para
todos é o grau de flexibilidade dos dispositivos normativos para que não impeçam a
crítica e a criatividade.

Nesse sentido, deve afirmar-se que, em uma democracia, o produto almejado deve
estar contido no próprio de produção de uma norma ou mesmo das normas que
visem regulamentar um princípio geral. Nunca é demais recordar as advertências de
Bobbio: "a democracia tem a demanda fácil e a resposta difícil; a autocracia, ao
contrário, está em condições de tornar a demanda mais difícil e dispõe de maior
facilidade para dar respostas" (1986, p. 36). Por outro lado, alerta o mesmo autor:
"Mas como pode o governo responder se as demandas que provêm dê uma
sociedade livre e emancipada são sempre mais numerosas, sempre mais urgentes,
sempre mais onerosas?" (idem, p. 36).

Um princípio de entendimento a algumas dessas questões pode ser buscado a partir


dos modos pelos quais se respondeu ao tema aqui proposto delimitando-o no plano
do ensino fundamental. Assim, uma breve retrospectiva histórica da polêmica
currículo x federação pode ser útil.

Memória histórica

Pode-se dizer que a idéia de um currículo nacional se cruza com a evolução a


educação, sobretudo a chamada educação escolar fundamental, entendida como
direito do cidadão e dever do Estado. Embora vários cruzamentos possam ser
estabelecidos, pode-se dizer que um currículo nacional se cruza com uma função
social do Estado, que é a de atender a um direito do cidadão que busca na educação
escolar uma via de cidadania compartilhada com seus concidadãos.

E o acesso a essa dupla referência (direito x dever) é tardio enquanto inscrição e


escritura em Constituições brasileiras. O que não quer dizer que - a despeito da

59
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
inexistência desses princípios em algumas Constituições - não houvesse discussões
sobre currículos.

O Império inscreve a gratuidade das escolas primárias pelo art. 179, n° 32, mas sem
reconhecê-la como direito. Até 1834, o Império tem a responsabilidade de manter
tais escolas como oferta gratuita aos que viessem procurá-las. O Ato Adicional de
1834 introduz não só a divisão de competências entre "os poderes gerais" e as
províncias, como também deixa na ambigüidade se tal responsabilidade deveria ser
compartilhada ou privativa das províncias. (Cf. Ato Adicional, art. 10, par. 1°.)

Essa ambigüidade sempre acabou permeando as discussões sobre a dinâmica


centralização x descentralização, mesmo antes de nossa República proclamada se
dizer Federativa.

É verdade que, grosso modo, pode-se dizer que coube sempre às províncias, e
depois aos estados, a tarefa do ensino fundamental e sempre coube aos "poderes
gerais" (depois União) o controle do ensino superior e em boa parte do ensino
secundário (em especial na capital do Império/República).

Mas até onde podem ir as "diretrizes"? E como se pode defini-las? Como discriminar
especificamente as várias competências e responsabilidades? Pode-se dizer que se
criou um entendimento geral que a União tem, em relação ao ensino primário,
apenas uma função supletiva. Já em relação ao ensino médio e sobretudo em
relação ao ensino superior seu papel seria bem mais diretivo e até mesmo
interferidor. (Cf. Constituição Federal de 1891, art. 35, par. 2°, 3°,4°.)

E será no interior destas duas dinâmicas, a educação como direito e dever e a


educação enquanto constante de uma federação republicana (após o Império), que o
tema dos currículos será sempre reposto enquanto instrumento de coesão nacional.
Certamente, como se verá, essa questão tem história junto à história das políticas
educacionais no Brasil.

A Constituinte de 1823, antes de sua dissolução pelo imperador, já se debatia com


essa questão e não conseguiu efetivar a proposta de um tractatus de educação

60
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
válido para toda a juventude brasileira, sob a forma de um compêndio a ser levado a
todos os rincões do país (Chizzotti, 1996).

E, ao que parece, na medida de suas possibilidades e vontade política, as províncias


não deixaram de considerar as disciplinas listadas pela primeira lei de ensino do
Brasil, aquela que traduzia a regulamentação do artigo da gratuidade do ensino
primário e que foi publicada a 15 de outubro de 1826. Nela se prescrevia a oferta
obrigatória de língua portuguesa, aritmética, história do Brasil e religião católica.

Entretanto, nada havia de imperativo em relação ao detalhamento dessa lista como


ementas, guias ou programas previamente definidos. Nesse sentido, parece ter ido
se firmando a tradição de descentralização (na República transformada em princípio
da autonomia) das províncias e, posteriormente, dos estados em relação a esse nível
de ensino.

A partir de 1837, com a criação do Colégio Pedro II, as disciplinas do ensino


secundário passaram a contar com um centro de referência. As instituições de
ensino das províncias, oficiais ou não, conquanto não imperativamente, miravam-se
no espelho dos currículos e até mesmo dos livros didáticos adotados pelo Colégio
Pedro II. E a existência de exames de admissão para o ingresso no primeiro ciclo do
ensino secundário (ginásio) criava uma situação em que aqueles exames
condicionavam os conteúdos dos estudos anteriores.

Quanto à organicidade institucional do ensino primário, não se pode negar que ela foi
bem mais lenta que a relativa ao ensino médio e superior. Boa parte dele possuía
uma dimensão doméstica, nem sempre se realizando em instituições escolares. (A
própria Lei de Diretrizes e Bases de 1961 diz textualmente no seu art. 2°: "a
educação é direito de todos e será dada no lar e na escola" (grifos nossos). Também
a proposta de LDB em tramitação fala em "alternativa satisfatória" ao dever de
"matricular no ensino obrigatório".)

Aliás, não se ignora que católicos e positivistas, embora com fundamentações


diferenciadas, tinham preferência pela educação primária dada na família, com
ênfase no papel feminino de educadora a ser cumprido pela mulher.
61
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
A proclamação da República não altera significativamente esse quadro. Aliás, no que
se refere à dinâmica direito x dever, a República não inscreveu em sua Constituição
de 1891 sequer a afirmação da gratuidade do ensino primário. Tal possibilidade
poderia vir a ser inscrita nas Constituições Estaduais. Mas, por outro lado, a Lei
Maior determinou a laicidade nos estabelecimentos oficiais de qualquer nível,
inclusive os sob responsabilidade dos estados e municípios. (Cf. CF/1891, art. 72,
par. 6°.) Uma disciplina até então vigente no currículo geral das escolas do Império -
a de doutrina religiosa católica -foi cortada dos currículos dos estabelecimentos
oficiais da República.

Excetuada, porém, a presença paradigmática do Colégio Pedro II, as competências


relativas ao ensino primário (e em certa medida relativas ao secundário) ficaram com
os estados ou municípios, os quais poderiam exercitar sua autonomia no âmbito dos
currículos.

E não deixa de ser notável uma certa oscilação entre centralização e


descentralização no âmbito das reformas educacionais na assim denominada
República Velha. (Cf.Marquesjr., 1967, e Tannuri, 1981.)

E a já conhecida dispersividade regional em relação a um currículo básico não


passou desapercebida dos movimentos sustentadores de uma democratização da
rede pública escolar brasileira. (Cf. Nagle, 1974.)

E tal foi o vigor desses movimentos que a Revisão Constitucional de 1925-1926


tratou do tema com bastante abundância, em especial através do ângulo da
formação de um "caráter nacional". (Cf. Cury, 1992.) A educação escolar mediaria
vínculos nacionais através dos quais garantir-se-ia uma dimensão da coesão
nacional. Tal mediação ganharia ímpeto pelo abalo trazido pelos movimentos sociais
proletários e pelos movimentos políticos internos, com destaque para a Coluna
Prestes.

O que não quer dizer que só essa Revisão houvesse buscado o princípio de uma
diretriz geral e nacional para a educação. Sucessivos projetos de reforma do ensino
público encaminhados por parlamentares, durante a chamada República Velha, não
62
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
lograram êxito em seus propósitos. (Cf. Moacyr, 1944.) Além disso, não se pode
deixar de lembrar os esforços pelos quais instituições de ensino estaduais, oficiais ou
livres, ansiavam pelo mérito de serem equiparadas ao Colégio Pedro II.

A Revolução de 30 haveria de trazer algumas alterações significativas no quadro até


então existente.

O ano de 1931 traz, pelo menos, três importantes mudanças: a introdução do ensino
religioso nas escolas oficiais, a oficialização dos estabelecimentos do ensino
secundário, via aceitação do regimento e currículos do Pedro II, e a criação do
Conselho Nacional de Educação, órgão consultivo e opinativo do Ministério da
Educação e Saúde Pública, de cujas atribuições fazia parte "firmar diretrizes gerais
do ensino primário, secundário e superior", de tal modo que nelas os "interesses do
país" se sobrepujassem a qualquer outro.

O Manifesto dos pioneiros da educação nova, além da defesa da gratuidade,


obrigatoriedade e laicidade da escola pública como dever do Estado, afirmará a
importância de um processo de homogeneização básica, a partir da escola primária,
visando " a identidade da consciência nacional". Homogeneização básica defendida
como alternativa criadora à uniformidade rejeitada, aliás bastante distante dos
métodos ativos defendidos pelo escolanovismo.

A Constituição de 1934, ao inscrever a educação como direito do cidadão e


obrigação dos poderes públicos, tornou-a gratuita e obrigatória no primário,
responsabilizou os estados em termos de sua efetivação, impôs percentuais
vinculados para o bom êxito dessa efetivação (Cf. CF/1934, capítulo sobre
educação.) e firmou a existência de Conselhos Estaduais ao lado do Conselho
Nacional de educação a quem competiria elaborar o Plano Nacional de Educação.
(Cf. idem, art. 152.) Ela introduziu também a "competência privativa " da União no
estabelecimento de diretrizes da educação nacional e na fixação do Plano Nacional
de Educação, (Cf. idem, art. 5, XIV.) sem deixar de reconhecer a competência
concorrente da União e estados quanto ao objetivo de difundir em todos os graus a
instrução pública. (Cf. idem, art. 10, VI.)

63
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
De acordo com esse espírito que congregava a tarefa de elaborar o Plano Nacional e
de fazer cumprir a Constituição, o então governo eleito de Vargas reorganiza o
Conselho Nacional de Educação pela lei n° 174 de 6 de janeiro de 1936 e lhe impõe
o regimento interno. Por ambos os instrumentos fica claro que a dimensão
interferidora da União ante o ensino primário se esgota substancialmente na guarda
da Constituição e na elaboração do Plano Nacional de Educação (para cuja
elaboração criar-se-ia uma comissão específica voltada para o ensino primário).
Coube também à União a função supletiva de estimulação, promoção de
conferências e apoio técnico ao ensino primário. Embora houvesse um representante
do ensino primário e normal e uma comissão de ensino primário e secundário na
composição do Conselho Nacional, de fato esse parece ter se voltado mais para as
questões do ensino superior. (Esse Plano não chegou a se efetivar pois sua
elaboração final, pelo projeto de lei enviado ao Congresso, não teve seqüência por
causa do golpe de Estado de 1937.)

Mais especificamente em relação à questão curricular, a Constituição impõe como


constante dos currículos oficiais o ensino religioso como disciplina de oferta
obrigatória e matrícula facultativa. Tal dispositivo atravessará todas as Constituições
Federais após 1934. (Cf. Cury, 1995, e Horta, 1995.)

Se para o ensino secundário vai se firmando, cada vez mais, a presença


paradigmática do currículo do Colégio Pedro ll, a instrução primária, vista desse
ângulo, confirma-se como competência dos estados. (Nunca é demais insistir na
necessidade de maiores investigações quanto aos currículos e programas nas
unidades federadas.)

Essa orientação federalista, tanto descentralizadora quanto garantidora de aspectos


nacionais, firmada no princípio da educação como direito do indivíduo, impressa pela
Constituição de 1934, foi rompida pela outorga da Constituição de 1937. Esta voltava
a centralizar quase tudo no âmbito do Executivo federal. Não reconhecendo a
educação como direito de todos, mas como dever das famílias, cortando a
vinculação obrigatória, previa como competência privativa da União a fixação das
"diretrizes da educação nacional". Mesmo quando o Estado Novo procurou

64
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
discriminar atribuições de estados e municípios pelo decreto-lei de 8 de abril de
1939, impunha claros limites à atuação destes. No âmbito da educação, os decretos-
lei estaduais só teriam vigência após aprovação do chefe de Estado, aí
compreendida a regulamentação do ensino primário.

A criação efetiva do Instituto Nacional do Livro, sob a direção de Gustavo Capanema,


imprimiria nos currículos uma espécie de ideologia oficial nos textos, já que os livros,
para efeito de publicação e de divulgação, deveriam ter autorização do
Departamento de Imprensa e propaganda (DIP).

O decreto-lei n° 93 cria o Instituto Nacional do Livro em 21 de dezembro de 1937. 0


DIP censurava os livros em geral, embora o livro didático ficasse a cargo do ministro
da Educação. Já o decreto-lei na 1006/38 estabelece que, sem a autorização do
Ministério, "os livros didáticos não poderão ser adota dos no ensino das escolas pré-
primárias, primárias, normais, profissionais e secundárias em toda a República"
(Pereira, 1995, p.148). Este último decreto-lei cria também a Comissão Nacional do
Livro Didático, à qual competiria autorizar ou não uma determinada obra.

A Lei Orgânica do Ensino Primário (decreto-lei no 8529/46), já assinada por José


Linhares, impunha sete disciplinas válidas e obrigatórias para todo o território
nacional no ensino primário elementar: leitura e escrita, iniciação matemática,
geografia e história do Brasil, conhecimentos gerais, desenho e trabalhos manuais,
canto orfeônico e educação física. ( Cf. art. 7 dessa lei orgânica.) Isso sem, contar o
ensino religioso.

Já o curso primário complementar, além das supracitadas, deveria incorporar


geometria, elementos de história da América, ciências naturais e higiene, elementos
de economia regional. As meninas ainda cabiam economia doméstica e puericultura.
(Cf. idem, art. 8. Se questões de culto povoavam as discussões sobre currículos,
agora, ainda que de modo discriminatório, aparecem questões ligadas à
diferenciação sexual.)

O curso primário supletivo, voltado para jovens e adultos, deveria conter -além de
leitura, linguagem oral/escrita, aritmética e geometria, geografia e história do Brasil-
65
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
ciências naturais, higiene, noções de direito (do trabalho, civil e militar). As alunas
deveriam cursar economia doméstica e puericultura (art. 9).

Mais do que isso, a Lei, através do art. 10, dá orientações gerais para o ensino
primário fundamental (elementar + complementar) no sentido de uma didática
próxima da escolanovista e no art. 12 impõe o seguinte: "O ensino primário
obedecerá a programas mínimos e a diretrizes essenciais, fundamentados em
estudos de caráter objetivo, que realizem os técnicos do Ministério da Educação e
Saúde, com a cooperação dos estados".

Programas regionais teriam o caráter de complementar a programação geral fixada


pelo Ministério para todo o país.

O decreto-lei ainda regula minuciosamente os "sistemas de ensino primário" e os


enquadra em uma espécie de estrutura e funcionamento.

Embora não viessem à luz durante a ditadura, as Leis Orgânicas relativas ao ensino
primário, normal e agrícola, preparadas durante o regime varguista através de
comissões nacionais, tiveram continuidade sob o Estado de Direito da Constituição
de 1946. Tal fenômeno se deu devido ao longo processo de tramitação da Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional, aprovada em 1961. Com isso houve um
relativo choque entre a orientação estadonovista, centralizadora e autoritária, e
aquela promanada da Constituição liberal e descentralizadora de 1946.

Com efeito, a Constituição de 1946, ao repor o Estado de Direito, traz consigo


também a dimensão liberal-descentralizadora e reinsere a educação como direito do
indivíduo e obrigação do poder público. Também são repostos os preceitos de 1934
que a ditadura havia cortado. A definição da Lei de Diretrizes e Bases permanece
como competência privativa da união. E o choque entre ambas orientações
supramencionadas será eliminado pelos termos de compromisso trazidos com a
promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1961.

Esta, excetuadas as disciplinas obrigatórias impostas a todos os sistemas de ensino,


como educação física e ensino religioso, deixava aos estados ampla liberdade na

66
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
construção de conteúdos curriculares. Isso quer dizer que determinadas disciplinas
constavam nacionalmente dos currículos, mas seus conteúdos não tinham definições
específicas por parte da União. (No projeto de LDB proposto por Clemente Mariani
em 1946, pode-se ler no art. 66 que seria competência do Estado aperfeiçoar e
baratear o livro didático. Além do que os livros didáticos, para serem divulgados nas
escolas, deveriam ser registrados no Ministério e quando "impróprios aos fins
educativos" seriam proibidos, ouvido o Conselho Nacional de Educação.)

A lei 4024/61 não fixa um currículo mínimo obrigatório para o ensino primário, mas o
art. 25 assinala que o fim desse nível de ensino é o "desenvolvimento do raciocínio e
das atividades de expressão da criança e a sua integração no meio físico e social".
[O mesmo Mariani defendia "a unicidade do sistema educacional cujas variedades
estaduais obedecerão ao princípio de equivalência pedagógica em substituição ao
falso princípio da uniformidade pedagógica" (Mariani, s/d, p.328).]

Ora, o Conselho Federal de Educação, no parecer na 121/63, ao discutir os exames


de admissão, reconhece quatro grandes departamentos do ensino primário: língua
pátria, aritmética, ciências naturais e ciências sociais. E o mesmo parecer se socorre
do PABAEE/MG para um detalhamento da consistência conteudística dessas quatro
áreas. E reconhece não só a autonomia dos estados a esse respeito, como também
a existência de escolas com atividades "assistemáticas" de ação educativa e de
instrução no lar.

O que é novo na lei 4.024/61 é a permissão dada pelo art. 104 de se constituírem
escolas experimentais com currículos próprios, o que faz juz ao art. 12 da mesma,
onde se reconhece a correlação "sistemas de ensino" e "flexibilidade dos currículos".

O CFE, instalado em 12 de fevereiro de 1962, prevê uma comissão de ensino


primário e médio; quanto ao primário, a Portaria na 60 de 21 de fevereiro de 1962
prevê a competência do Conselho na "análise dos efeitos da ação supletiva" da
União em face dessa modalidade de ensino.

O regime autoritário-militar de 1964 manteve pró-forma o funcionamento precário das


Constituições e do Congresso. Ele procurou também deixar sua marca na educação
67
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
escolar. Contudo, no que se refere ao regimento do CFE, trazido pelo decreto no
64.902 de 29 de julho de 1969, o art. 3,2, ao expressar a "competência do Plenário
em interpretar a LDB", ressalvava a "competência dos sistemas estaduais de ensino,
definida na Lei na 4.024 de 20 de dezembro de 1961".

Grande mudança, entretanto, será trazida pela lei 5.692/71 no que se refere ao
ensino primário. Sob a nova denominação de "ensino de 1 o grau" ela compreenderá
tanto o que antes era o ensino primário quanto o que era o 1° ciclo do ensino médio
(ginásio).

O ensino de 1° grau passa, então, a ter oito anos obrigatórios. Já a organização


didática de cada estabelecimento ficaria sob os cuidados do respectivo Conselho de
Educação, desde que se respeitassem as "matérias" (Cf. Lei 5.692/71, art. 6, par.
único, letra a.) do "núcleo comum, obrigatório em âmbito nacional" (art. 4),
competência do Conselho Federal de Educação. E nelas dever-se-iam constar
educação moral e cívica, educação física, educação artística, programas de saúde,
língua nacional e ensino religioso.

Extenso e detalhado comentário sobre núcleo comum dos currículos nacionais será
trazido pelo Parecer 853/71, logo após a publicação da Lei 5692/71. E em certo
trecho do parecer lê-se claramente:

Por já virem tais atividades prescritas no art. 7º da lei, só consideraremos aqui na


medida em que tenhamos de relacioná-las com os demais componentes do currículo.
Associado a elas, o núcleo comum configura o conteúdo mínimo abaixo do qual se
terá por incompleta qualquer formação de 1° e 2° graus, assim quanto aos
conhecimentos em si mesmos como, sobretudo, do ponto de vista da unidade
nacional de que a escola há de ser causa e efeito a um tempo. Daí a sua
obrigatoriedade.

Já se vê que o Conselho Federal foi, como dantes o fora o Conselho Nacional, o


órgão responsável pela tradução desses conteúdos mínimos para todo o conjunto do
sistema escolar brasileiro. Nesse sentido, mesmo as alterações de nome ou de
atribuições desse Conselho não determinaram a perda dessa responsabilidade.
68
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
Assim, o regimento do CFE, de acordo com a portaria ministerial no. 691/81, define,
no seu art. 2, XVIII, como sua competência "fixar as matérias do núcleo comum dos
cursos de 1° e 2° graus, definindo-lhes os objetivos e amplitude, bem como o mínimo
a ser exigido em cada habilitação profissional ou conjunto de habilitações afins" .

E na organização do CFE como colegiado se prevê uma Câmara de Ensino de 1° e


2° graus e uma Comissão Central de Currículos. (Eis aqui um campo pouco
explorado nas pesquisas de pós-graduação em educação.)

Com isso foram se consubstanciando duas orientações relativamente recorrentes: a


primeira, de certo modo já posta pelo Ato Adicional de 1834, a de que o ensino
fundamental é competência dos estados e municípios e a de que o ensino superior
tenha um maior controle por parte da União, ficando relativamente cinzentos os
espaços de competências concorrentes e/ou comuns. A segunda é a de que o
estabelecimento de diretrizes e bases para a educação nacional continua sendo
competência privativa da União e sua tradução específica, no que se refere aos
mínimos programáticos, seja elaborada através de um Conselho Nacional ou Federal
de Educação.

Tais orientações, ainda que recheadas por novos dispositivos colocados pela
Constituição Federal de 1988 quanto à gratuidade, gestão democrática, direito
público subjetivo, municipalização e outros, foram nela reafirmadas, sem contudo se
fazer referência à existência de um Conselho Nacional ou Federal (que só aparecerá
nas propostas de LDB).

Entretanto, a Constituição determinara uma pequena reforma tributária que repassou


fontes de recursos da União para os estados e municípios. Ficava suposto que,
concomitantemente, se faria o transfert de competências, sobretudo no campo da
saúde e educação. Além disso, o projeto de Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional do deputado Octávio Elísio Alves de Brito, pelo seu caráter participativo,
franqueara a discussão sobre a polêmica noção de "sistema nacional de educação".
Ora, tal noção reporia a questão federativa, voltando-se ao confronto entre unionistas
e descentralizadores.

69
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
A longevidade da tramitação do projeto de LDB, a mudança das condições
internacionais no que se refere à correlação trabalho/emprego, a vontade da União
em diminuir seus gastos, a necessidade de especificar a vinculação orçamentária e
sobretudo a consciência da importância do ensino fundamental, de cuja situação
lamentável o país mais uma vez se envergonha, obrigaram a que tanto
parlamentares quanto Executivo tomassem iniciativas mais rápidas no enfrentamento
da questão.

Por outro lado, a educação escolar foi definida (ainda que de. modo especificado em
alguns aspectos e nem tanto em outros) competência privativa da União,
competência concorrente entre União e estados e competência comum entre União,
estados e municípios, segundo os art. 22, 23 e 24 respectivamente. Finalmente, o
art. 30 supõe a ação supletiva da União e dos estados em relação à obrigação dos
municípios em manter uma rede de ensino voltada para o pré-escolar e o
fundamental.

Urgia, pois, o enfrentamento da questão, até porque o texto constitucional em seu


art. 210 reza que "serão fixados conteúdos mínimos para o ensino fundamental, de
maneira a assegurar formação básica comum e respeito aos valores culturais e
artísticos, nacionais e regionais" .

O tom imperativo não deixa dúvida. Não menos claro é o adjativo "mínimo". E, se
"serão fixados", alguém deve ser o responsável. A tradição dessa matéria constata
iniciativa da União através do Conselho Nacional (Federal) de Educação.

Nesse sentido torna-se ilustrativo citar o projeto de Lei de Diretrizes e Bases da


Educação Nacional ora em tramitação no Congresso. Diz ela em seu art. 10, inciso
IV, que a União deve "estabelecer, em colaboração com os estados, o Distrito
Federal e os municípios, competências e diretrizes para a educação infantil, o ensino
fundamental e o ensino médio, que nortearão os currículos e os seus conteúdos
mínimos, de modo a assegurar formação básica comum".

Outros artigos desse mesmo projeto de Lei, ainda que citá-Ios alongue o texto, são
úteis para o entendimento da problemática.
70
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
Art. 24. Os currículos do ensino fundamental e médio devem ter uma base nacional
comum a ser complementada pelos demais conteúdos curriculares especificados
nesta Lei e, em cada sistema de ensino e estabelecimento escolar, por uma parte
diversificada, exigida pelas características regionais e locais da sociedade, da
cultura, da economia e da clientela.

§ 1° Os currículos valorizarão as artes e a educação física, de forma a promover o


desenvolvimento físico e cultural dos alunos.

§ 2° O ensino da História do Brasil levará em conta as contribuições das diferentes


culturas e etnias para a formação do povo brasileiro, especialmente das matrizes
indígena, africana e européia.

§ 3° De acordo com as possibilidades da instituição de ensino deverá ser oferecida


pelo menos uma língua estrangeira.

Art. 25. Os conteúdos curriculares da educação básica observarão, ainda, as


seguintes diretrizes:

I. a difusão de valores fundamentais ao interes-

se social, aos direitos e deveres dos cidadãos, de respeito ao bem comum e à ordem
democrática;

II. consideração das condições de escolaridade dos alunos em cada


estabelecimento;

III. orientação para o trabalho.

Esses artigos da LDB em tramitação, em certa medida, alteram formulações dos


projetos anteriores de LDB a respeito do mesmo assunto e que taxativamente
continham maior presença da sociedade civil organizada em torno da educação.

Assim, o Plano Decenal de Educação para Todos (1993) deu uma redação mais
participativa no âmbito desse convênio internacional assinado pelo Brasil. Esse texto
reintroduz o MEC como proponente das diretrizes curriculares ao colocar a
71
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
necessidade de "fixação dos conteúdos mínimos determinados pela Constituição"
como uma de suas linhas de ação estratégica:

O MEC, com o concurso das representações educacionais e da sociedade, deverá


propor e especificar os conteúdos nacionais capazes de pautar a quantidade de
educação socialmente útil e de caráter universal a ser oferecida a todas as crianças,
consideradas suas diferenças. Complementações curriculares serão propostas em
cada sistema de ensino e escolas, respeitando a pluralidade cultural e as
diversidades locais. Igualmente pesquisas serão desenvolvidas para fundamentar
avanços no âmbito das competências sociais, visando enriquecer o processo
curricular da escola (p. 45).

Em certa medida, esse texto do Plano Decenal faz eco à proposta de LDB, Projeto
de Lei Complementar n° 101/93 do senador Cid Sabóia de carvalho, que diz em seu
art. 23, VI, que cabe ao Conselho Nacional de Educação "fixar, após ouvir
educadores e comunidades científicas das áreas envolvidas, diretrizes curriculares
gerais, definindo uma base nacional de estudos para o ensino fundamental, médio e
superior de educação".

Essa formulação resume o conteúdo mais explícito e detalhado sobre o assunto tal
como expresso no artigo 23, VI. Caberia ao Conselho Nacional " fixar as diretrizes
curriculares gerais, definindo uma base nacional de estudos para cada nível de
ensino". Já o art. 34, além de reconhecer a competência do Estado e/ou municípios
na plenificação do currículo, além de estimular a vida concreta dos estudantes como
ponto de partida, diz no seu caput que "os currículos do ensino fundamental e médio
abrangerão, obrigatoriamente, o estudo de língua portuguesa e da matemática, o
conhecimento do mundo físico e natural e da realidade social e política,
especialmente do Brasil" .

Percebe-se, pois, que a iniciativa do Executivo federal em relação aos currículos,


mais forte em tempos autoritários, mais aberta em tempos de Estado de Direito, é,
via de regra, repassada ou delegada ao Conselho Nacional, aos respectivos
Conselhos Estaduais e às próprias instituições escolares a fim de não ignorar as
disparidades regionais, peculiaridades culturais e de respeitar. o pacto federativo.
72
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
Essa abertura em tempos de Estado de Direito vai desde uma democracia
diretamente participacionista no projeto de LDB de 28 de junho de 1990 até a
proposta da LDB em tramitação atual, que, como foi visto, deixa essa
responsabilidade sob competência do(s) Executivo(s).

O Executivo, que já perdera a iniciativa da LDB em 1988, não queria deixar passar
essa parte Ia legislação sem interferir decisivamente na questão. Daí sua postura de
maior apoio ao projeto nascido no Senado, especialmente no governo Collor e na
gestão Fernando Henrique Cardoso.

Mas não se pode omitir que é imprescindível o reconhecimento da complexificação


da sociedade brasileira dada pela forte presença de associações científicas e
profissionais que se preocupam com a educação brasileira, aí compreendidos os
conteúdos curriculares.

Finalmente, deve-se registrar a (re)criação do Conselho Nacional de Educação


através da Lei 9.131/95. A lei de criação do Conselho busca conciliar a
ponderabilidade entre sociedade política e sociedade civil, com inclinação para o
Executivo. Veja-se a esse respeito o art. 6 da lei n° 9.131/95 e seu parágrafo único:

O Ministério da Educação e do Desporto exerce as atribuições do poder público


federal em matéria de educação, cabendo-lhe formular e avaliar a política nacional
de educação, zelar pela qualidade do ensino e velar pelo cumprimento das leis que o
regem.

§ 1° No desempenho de suas funções, o Ministério da Educação e do Desporto


contará com a colaboração do Conselho Nacional de Educação e das Câmaras que
o compõem.

Por outro lado, cabe a esse Conselho, segundo o art. 7 da lei, o dever de "assegurar
a participação da sociedade no aperfeiçoamento da educação nacional" .

Órgão de articulação entre a sociedade política e a sociedade civil, responde esse


órgão colegiado, através de sua Câmara de Educação Básica, à atribuição, posta no

73
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
art. 9, letra c: "deliberar sobre as diretrizes curriculares propostas pelo Ministério da
Educação e do Desporto".

Os princípios constitucionais de "diretrizes e bases da educação nacional" e de


"coesão nacional" associados à idéia de "mínimos nacionais" existentes em leis
ordinárias ou em outras disposições normativas fizeram com que, paulatinamente,
esse campo fosse sendo assumido pelo Executivo federal, que estendeu a matéria
do ensino secundário (nele já presente) para o ensino fundamental (sempre visto
como terreno das unidades federadas).

Com a constitucionalização do "currículo mÍnimo nacional" através da Constituição


Federal de 1988, e, dada a maior tradição dessa matéria ao Executivo em termos
históricos, pode-se explicar, no interior desse contexto maior, o surgimento dos
"parâmetros curriculares nacionais" como iniciativa desse poder.

Assim, desde o governo Itamar Franco e agora através da gestão Fernando


Henrique Cardoso, embora com orientações diferenciadas, vêm sendo tomadas
iniciativas tendentes a regulamentar e efetivar o dispositivo constitucional do art. 210.

Entretanto, a questão federativa continua presente, mesmo após tentativas de


clareamento na Constituição de 1988. Aliás, tendo a educação se tornado ao mesmo
tempo (mas não do mesmo ponto de vista) competência privativa da União,
concorrente entre a União e os estados e comum entre, os três entes federativos, é
que a questão retoma com mais urgência. Prova disso é a exposição de motivos
no.273 de 13 de outubro de 1995 (e que viria a ser a PEC/233/95), pela qual o atual
governo da União apresenta ao Congresso Nacional uma série de emendas
constitucionais. A exposição de motivos encaminhada diz:

Tradicionalmente, ao Governo Federal tem sido atribuída a responsabilidade maior


pelo ensino superior, cabendo-lhe, em relação ao ensino básico, apenas função
normativa e ação supletiva, esta nunca claramente definida. Aos estados e
municípios, coma autonomia que o regime federativo Ihes assegura, cabe o
atendimento das necessidades educacionais básicas da população, muito
especialmente na faixa da educação fundamental obrigatória.
74
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
Em conseqüência dessa indefinição de papéis, resulta um sistema - na realidade
uma diversidade de sistemas - de atendimento educacional que deixa muito a
desejar, sobretudo no que diz respeito à qualidade da educação oferecida. De fato,
se é verdade que em termos quantitativos, notadamente no que se refere à
escolaridade obrigatória, o país avançou significativamente, a dispersão de esforços
dos três níveis de governo gerou heterogeneidade da qualidade do atendimento
escolar.

Vê-se que o problema não é novo e sempre esteve, de algum modo, nas
preocupações do governo federal e nas preocupações dos governos estaduais.

Certamente que à oscilação autoritarismo x Estado de Direito não correspondeu


linearmente dirigismo curricular x liberdade de criação. Mas é notório que o "vigiar"
de modo mais direto a estruturação de currículos e programas e a criação de livros
didáticos se aproximam mais dos regimes fechados. Sabe-se que nestes o
detalhamento é mais uma forma de verticalismo homegeneizador do que um respeito
às diferenças. E, nos regimes politicamente mais.abertos, o programa dos currículos
nacionais unificados é mais flexível e propositivo. Espera-se, pois, destes últimos
maior sensibilidade e respeito à diferença.

Essa característica de regimes abertos, contudo se defronta com dois eixos


fundamentais: a questão federativa e a questão da participação dos sujeitos
interessados na formulação dos conteúdos ante as diferentes concepções que os
inspiram e mesmo ante as metodologias existentes em relação às ciências naturais e
sociais.

A questão federativa sempre deve merecer um enfrentamento cuidadoso. Como


vimos, a tradição descentralizada criou culturas institucionais na escola pública que
variam de unidade federada para unidade federada. Dentro delas as regiões e as
disparidades oferecem outras heterogeneidades, isto sem falar nos "capitais
culturais" distintivos de classe sociais.

Logo, uma discussão sobre "parâmetros curriculares nacionais" deve desaguar na


obediência à constituição através de um conhecimento profundo dessas diferenças
75
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
no :interior da escola pública através do caminho próprio defendido pelos grandes
nomes da educação: o diálogo.

E, nesse diálogo, e talvez tão importante quanto ele, é preciso saber da "radiografia"
das escolas realmente existentes, suas peculiaridades, seus ethos. As escolas
brasileiras não são iguais. Suas condições de funcionamento são extremamente
diversificadas por regiões, por classes, não sendo desprezível a presença de uma
pluralidade étnica e cultural.

É preciso partir dessa "radiografia " para imaginar um método criativo, de tal modo
que a unidade nacional pretendida seja unidade, não uniformidade, na medida em
que essa unidade passa pelo enfrentamento da diversidade.

Por outro lado, algo semelhante se passa com os métodos. Estes variam muito no
âmbito das ciências naturais e sociais, fazendo com que emerja essa outra diferença.
De novo o diálogo é o caminho para se evitar tanto uma homogeneidade
metodológica como uma síncrese distante da análise científica.

O problema que hoje se coloca em face dos parâmetros é que a sociedade brasileira
se "ocidentalizou " muito nas últimas décadas. E o mesmo se pode dizer da
educação escolar. O ensino fundamental está bem próximo da universalização
quantitativa, o ensino público cresceu no âmbito do ensino médio e a expansão do
ensino superior, sobretudo no interior da rede particular, foi muito expressiva.

A pós-graduação está conseguindo formar pesquisadores e estudiosos que,


institucionalmente, vêm investigando áreas de conhecimentos e fazendo intercâmbio
internacional. E uma das áreas de atuação é justamente o estudo de currículos e de
história de disciplinas escolares. As associações científicas, por seu lado, criam,
dentro de seus grupos de trabalho, a alimentação contínua deste e de outros temas.
Além do que não só pode ignorar que o currículo das quatro primeiras séries envolve
o ato pedagógico da alfabetização, pelo qual o acesso à leitura e à escrita dá ao
educando mais um modo de ler o mundo:

76
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
E para além das faculdades de educação, o tema de ensino de... vem chamando a
atenção de mais e mais pesquisadores através de estudos e propostas.

A bibliografia não é pequena. Surgem livros, publicam-se pesquisas, dissertações e


teses. As revistas se multiplicam. O mercado editorial apresenta, não sem uma
variedade qualitativa, um espectro enorme de publicações.

Também os docentes se organizaram em associações profissionais, seja em frentes


salariais, seja em frentes voltadas para a questão pedagógica.

Conclusão

Uma discussão sobre "parâmetros curriculares nacionais" não pode ignorar o quanto
esta complexidade exige uma radiografia e uma auscultação da realidade
multifacetada da escola pública brasileira e nem o tanto de dever cabível ao
Executivo federal em efetivar o mandamento constitucional do art. 210.

E, ao passar do mandamento para a proposta de "parâmetros curriculares nacionais"


para o ensino fundamental, é preciso reconhecer uma tradição que joga não só com
a tormentosa questão federativa, mas com toda essa gama de realidades novas
surgidas nas últimas três décadas.

Que síntese se pode retirar dessa memória histórica?

A questão federativa se impõe pela modalidade de República Constitucional que o


Brasil adota desde 1889. O Brasil é uma só entidade soberana pela união de suas
entidades federadas. Logo, a federação deve tanto conter laços de união e de
unidade entre as unidades federadas, quanto a autonomia destas últimas', no quadro
da Constituição Federal. Essa autonomia dos membros federados inclui processos
descentralizados de iniciativas concernentes à administração e gestão da coisa
pública.

No caso da educação escolar de ensino fundamental, firmou-se toda uma tradição


jurídica que, desde o Ato Adicional, a atribuía aos membros federados. A

77
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
administração e gestão desse serviço público nessa modalidade de ensino coube, e
continua cabendo, aos estados e municípios.

Entretanto, dada a situação lamentável e dispersa do ensino primário nos estados,


lutou-se muito para que a União, por ter maiores fundos financeiros e por ser o ponto
da soberania e da unidade na diversidade, se obrigasse a interferir também na
educação escolar primária visando a superação de lacunas e a assinalação de uma
identidade nacional em todo o cidadão. Um nível de explicitação foi aquele relativo
aos princípios educacionais, sobretudo àquele do direito à educação primária,
gratuita e obrigatória.

Outro nível, porém, de exercício da união nacional foi o do estabelecimento de


disciplinas escolares. Aí a evidência maior fica por conta das oscilações em torno da
laicidade. O Estado "negativo" afirma laicidade, enquanto o Estado interventor a
nega. E, lentamente, vai ocorrendo um crescimento de intervenção nessa matéria.

A Revolução de 30 impôs, por decreto, que o Conselho Nacional firmaria "diretrizes


gerais" para o ensino primário. Essas "diretrizes", com o avançar dos anos, nem
sempre ficaram por aí. É que a elas se adicionou um conjunto de disciplinas
obrigatórias para toda a nação, como ficou explícito em 1946, através da Lei
Orgânica do Ensino Primário, que fala claramente em "programas mínimos". Isto
também parece ter firmado tradição, apesar do caráter mais liberal-descentralizador
da lei 4.024/61. Essa tradição se vê legalizada pela lei 5.696/71 e confirmada pelo
Parecer 853/71 do Conselho Federal. Diretrizes Gerais e Programas Mínimos se
sintetizam na concepção de "Núcleo Comum" dos currículos nacionais.

Duas observações agora se impõem: a União sempre se acautela adjetivando os


currículos ou programas ou diretrizes de "mínimos" ou "gerais". Pode-se aplicar aqui
o princípio da lógica formal de que "quanto menor a compreensão, maior a
extensão". Uma diretriz mínima torna-se mais geral porque, exatamente por ser
mínima, pode ser estendida a um maior número de entes federados. E os elos
mediadores dessa dimensão nacional - respeitada a autonomia dos estados e
municípios em legislar sobre o assunto - serão formalmente o Conselho x Nacional
(ou Federal) de Educação e, em certo sentido, o livro didático.
78
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
Finalmente, na Constituição Federal de 1988, a idéia de "diretrizes gerais"
adequáveis aos conteúdo dos currículos nacionais foi constitucionalizada e sua
tradução, sábia e prudente, no corpo da Lei Maior, foi a de uma "fixação". Essa
"fixação", no âmbito jurídico significando determinação, limitação, estabelecimento,
se limita aos "conteúdos mínimos". O mínimo é que deve ser fixado, limitando-se a
União a essa tarefa imperativa ao menor grau de uma grandeza maior. E seu
conteúdo indica o que está contido em outra coisa que lhe serve de continente. Esse
continente é, de um lado, o processo ensino/aprendizagem, onde se realiza a relação
pedagógica, e, de outro, aquela grandeza (certamente maior que o mínimo) que
compete aos entes federados (e que se ampliaram com a Constituição Federal de
1988 pela inclusão dos municípios).

Restam os problemas a respeito de que tamanho devem ser essas grandezas. Qual
sua conexão com o processo de ensino/aprendizagem?

A relação implícita no pacto federativo supõe a resolução de questões e pendências


pelo "contrato" democrático entre União Federada e unidades federadas. Já a
conexão com o processo ensino/aprendizagem se faz pelo "contrato social" e
democrático entre dirigentes e dirigidos, cujo âmago é a capacidade de participação.

Ora, a participação se inclui no processo de "ocidentalização" da sociedade brasileira


e, em especial, da organização dos educadores. A vida sócio-cultural brasileira,
desenvolvida no âmbito da sociedade civil, vem se tornando cada vez mais complexa
e plural. Ao lado de partidos, sindicatos e outras modalidades de "aparatos privados"
de hegemonia, deve-se registrar a organização de educadores e intelectuais em
torno de associações profissionais e científicas.

É delas que provém um saber com sabor de prática e com suor da pesquisa. É de
ambas que se pode esperar uma participação efetiva e fundamentada para que a
relação dirigentes/dirigidos se aproxime cada vez mais do ideal de uma "vontade
geral" consensual.

É no interior dessa complexidade que se pode compreender as proposições mais ou


menos pendulares ora em torno dos dirigentes, ora em torno dos dirigidos, ante a
79
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
questão de como efetivar tais "-conteúdos mínimos" .Daí a necessidade de que uma
proposta concreta de Parâmetros Curriculares Nacionais seja encaminhada sem
pressa e com diálogo. Sem pressa, a fim de que a necessária administração eficiente
do mandato constitucional não se converta em posturas verticais, sobretudo no que
se refere à formação de professores. Com diálogo, a fim de que a pluralidade de
setores competentes no assunto, individuais e sobretudo coletivos, possa suscitar
pelo debate um razoável consenso em torno de questão tão fundamental para o ato
pedagógico e para um federalismo democrático.

A educação nacional só tem a ganhar na medida em que possa assinalar um


caminho diferenciado para sua democratização e para a democratização da
sociedade brasileira.

CARLOS ROBERTO JAMIL CURY é professor na Faculdade de Educação da


Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Doutor em Filosofia da Educação
pela pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).É membro do Conselho
Nacional de Educação. Escreveu entre outras obras: CURY, Carlos R.J., (1978).
Ideologia e educação brasileira: católicos e liberais. São Paulo: Cortez & Moraes.

REFERÊNCIAS

AZEVEDO, Femando et alli., (1932). A reconstrução educacional no Brasil (ao povo e


ao governo): manifesto dos pioneiros da escola nova. São Paulo: Companhia Editora
Nacional.

CÂMARA DOS D EPUT ADOS, ( 1995 ). Proposta de emenda à Constituição n°


233/A.. Mensagem n. 1078/95; .

CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL, (1989). Brasília: MEC.

BOBBIO, Norberto, (1986). O futuro da democracia: uma defesa das regras do jogo.
Rio de Janeiro: Paz e Terra.

CAMPANHOLE, A., CAMPANHOLE, H.L., (1976). Todas as constituições do Brasil.


São Paulo: Atlas.

CHIZZOTTl, A., (1996). A Constituinte de 1823 e a educação. In: FÁVERO, Osmar


(org). A educação nas constituintes brasileiras: 1823-1988. São Paulo: Associados.

80
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
CONSELHO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, (1963). Parecer 121/63. Documenta, 14,
mai.

_________, (1971). Parecer 853/71. Documenta.

CURY, Carlos Roberto Jamil, (1992). A educação na revisão constitucional de 1925-


26. Relatório de pesquisa. Belo Horizonte: UFMG. Mimeo.

_________, (1993). Ensino religioso e escola pública: o curso histórico de uma


polêmica entre Igreja e Estado no Brasil. Educação em Revista, 17, Belo Horizonte,
UFMG

HORTA, José Silvério Bahia, (1993). O ensino religioso na Itália fascista e no Brasil-
1930-1945. Educação em Revista, 17, Belo Horizonte, UFMG.

MARIANI, Clemente, (s/d). Exposição de motivos ao projeto de Lei de Diretrizes e


Bases da Educação Nacional apresentado à Câmara dos Deputados. In: NOBREGA,
V .L.N. Enciclopédia da legislação do ensino. Rio de Janeiro.

MARQUES JR., Rivadávia, (1967). Política educacional na República: o ciclo da


desoficialização do ensino. Tese de doutoramento. Faculdade de Filosofia, Ciências
e Letras da Universidade Estadual Paulista - Araraquara.

MOACIR, Primitivo, (1944). A instrução e a República. Rio de Janeiro: Ministério da


Educação e Saúde / Imprensa Nacional, vol. 5.

NAGLE, Jorge, (1974); Educação e sociedade na Primeira República. São Paulo:


Edusp/EPU.

NUNES, Clarice (org.), (1989). Cadernos ANPEd, n° 2.

PEREIRA, Amarildo G., (1995). O livro didático na educação brasileira. Tese de


mestrado. Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais.

RODRIGUES, Lêda Boechat, (1968). História do Supremo Tribunal Federa/ -1899-


1910: defesa do federalismo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira.

SAVIANI, Dermeval (org.), (1990). Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.


Texto aprovado na Comissão de Educação, Cultura e Desporto da Câmara dos
Deputados, com comentários de Saviani et al. São Paulo: Cortez/ ANDE.

SCHUCH, Vitor Francisco (org.), (1976). Legislação mínima da educação do Brasil.


Porto Alegre: Sagra.

TANURI, Leonor M., (1981). A administração do ensino no Brasil: centralização x


descentralização. Revista Didática, 17, São Paulo.

81
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
TEIXEIRA, Anísio, (1952). Estudo sobre o projeto de Lei das Diretrizes e Bases da
Educação Nacional. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, vol. 18, n° 48, Rio
de Janeiro, out./dez.

(Texto divulgado na Revista Brasileira de Educação da Associação Nacional de


Pós-Graduação e Pesquisa em Educação-ANPEd, Mai/Jun/Jul/Ago 1996, N.º 2,
4-17p.)

82
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
ENSINO RELIGIOSO SEM PROSELITISMO. É POSSÍVEL?

Dora Incontri
Pós-doutoranda FEUSP
Apoio Fapesp
Alessandro César Bigheto
Pedagogo

Se entendermos a religiosidade como autêntica dimensão humana, cujo cultivo é


necessário para a plena realização do homem, então será óbvia a necessidade de
contemplarmos também este aspecto na proposta de sua educação.

Presentes em todas as culturas, entre todos os povos, de todos os tempos, e


assumindo diversas formas de devoção, doutrinas e princípios éticos, buscando o
sentido da vida e a transcendência em relação à morte, as religiões têm suas
especificidades, mas têm também um patamar comum de moralidade e busca
humana, onde é possível e urgente estabelecer um diálogo respeitoso e solidário. O
reconhecimento de uma raiz comum, profundamente humana e, por isso mesmo,
divina, é vital para que o diálogo se projete além de uma conversa cordialmente
superficial, para se tornar uma vivência enriquecedora.

Diz um autor contemporâneo que ―a única esperança real por uma tolerância
verdadeira está em descobrir o que ‗nós‘ temos em comum e também em respeitar a
diversidade‖ (LYON, 1998:117).

A Constituição Brasileira garante a liberdade de culto e a nova Lei de Diretrizes e


Bases abre espaço para um ensino religioso interconfessional (Art.33). Nova redação
foi dada a esse artigo, em 20/12/96, para assegurar ―o respeito à diversidade cultural
religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo‖. No âmbito estadual, a
resolução de 27/7/2001, do conselho Estadual de Educação, regulamenta este artigo
e propõe um programa aberto:

―O ensino religioso nas escolas deve, antes de tudo, fundamentar-se nos princípios
da cidadania e do entendimento do outro. O conhecimento religioso não deve ser um

83
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
aglomerado de conteúdos que visam evangelizar ou procurar seguidores de
doutrinas, nem associado à imposição de dogmas, rituais ou orações, mas um
caminho a mais para o saber sobre as sociedades humanas e sobre si mesmo.‖

Assim, conhecer o universo religioso, delimitando as próprias crenças, em relação às


crenças diferentes, admitindo que todas elas têm valor intrínseco, e procurar um
diálogo saudável entre as diversas tradições pode fazer o homem situar-se no
mundo de forma muito mais segura e fraterna. Saber que as respostas e os cultos da
fé que integram a nossa identidade têm eco entre outras identidades religiosas pode
aumentar a nossa própria fé e ao mesmo tempo nos fazer mais compreensivos e
empáticos com a riqueza e a beleza das religiões do planeta. Como diz Berkenbrock:
―É importante que o diálogo inter-religioso seja impulsionado pelo desejo de um
melhor entendimento humano (…) que contribua para uma melhor convivialidade
humana.‖ (BERKENBROCK, 1996: 327). Mas também: ―O encontro com o diferente
pode apontar para a própria identidade e levar a perguntar justamente sobre o
específico dela.‖ (BERKENBROCK, 1996: 320)

Assim, o ensino religioso, sem nenhum propósito doutrinante de uma determinada


visão religiosa, de maneira respeitosa e reverente para com o domínio de cada culto
e de cada doutrina, deve incentivar e desencadear no aluno um processo de
conhecimento e vivência de sua própria religião, mas também um interesse por
outras formas de religiosidade.

Poderíamos, pois, teorizar que o ensino religioso deveria ter como objetivos
orientadores: 1) despertar e cultivar a religiosidade do aluno; 2) levá-lo à
compreensão da importância do fenômeno religioso em sua própria vida e na história
humana; 3) trazer conhecimento sobre as diferentes formas de religiosidade, dentro
de seus respectivos contextos culturais e históricos; 4) criar um espírito de
fraternidade e tolerância entre as diferentes religiões; 5) sensibilizar o aluno em
relação aos princípios morais, propostos pelas religiões, promovendo ao mesmo
tempo uma reflexão sobre eles.

Sendo a religião um fenômeno humano abrangente, que está entranhado em todas


as áreas da cultura, suas diversas facetas permitem perfeitamente a
84
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
interdisciplinaridade no seu tratamento. Assim, ao mesmo tempo que o ensino
religioso serve para ampliar o universo cultural do aluno, este ensino se torna muito
mais consistente, enraizando-se nas múltiplas áreas do conhecimento. Cumpre-se
assim a proposta do Forum Nacional Permanente do Ensino Religioso:

―…a abordagem didática se dá numa seqüência cognitiva, possibilitando a


continuidade das aprendizagens que deve considerar: a bagagem cultural religiosa
do educando, seus conhecimentos anteriores; a complexidade dos assuntos
religiosos, principalmente devido à pluraridade; a possibilidade de aprofundamento.‖
(Forum, 1998:39)

Da teoria à prática

Tudo isso é muito bonito e desejável, mas será factível?

A abolição da dimensão religiosa na escola laica não foi mera obra de ateus
endurecidos, mas fruto da justa indignação contra o domínio das consciências. Ainda
hoje, em diversos setores religiosos do mundo ocidental e oriental, há
remanescentes poderosos dessa tendência doutrinante que as religiões sempre
tiveram. A discriminação contra outras formas de crença que não a sua ou mesmo
contra os descrentes; a pressão do grupo para adotar determinadas idéias, práticas e
compor-tamentos; a obrigatoriedade de se participar de ritos ou práticas religiosas da
maioria; e acima de tudo, a permanente violência que as maiorias e as ortodoxias
praticaram sobre as minorias e as heresias — tudo isso traumatizou de tal forma as
consciências livres, que o tema do ensino religioso provoca fortes reações em
algumas pessoas e pode fazer parecer o programa esboçado acima como ingênua
utopia. Dizia Voltaire, no século XVIII: ―É verdade que esses horrores absurdos não
mancham todos os dias a face da terra; mas foram freqüentes, e com eles facilmente
se faria um volume bem mais grosso do que os Evangelhos que os reprovam‖.
(VOLTAIRE, 1993: 127)

Dessa utopia, porém, já participaram grandes educadores do passado, que


projetaram idéias avançadas, até hoje não cumpridas no roteiro da nossa civilização.
Por exemplo, Comenius, pacifista e ecumenista, em pleno século XVII, ao lançar o
85
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
primeiro livro didático ilustrado do mundo o Orbis Sensualium Pictus — aliás, um livro
interdisciplinar e em várias línguas simultâneas — dedicou alguns capítulos às
religiões mais importantes, entre elas o Cristianismo, o Judaísmo e o Islamismo.
Rousseau dizia no Emílio: ―O culto essencial é o do coração. Deus não rejeita
nenhuma homenagem, quando sincera, sob qualquer forma que lhe seja oferecida.‖
(ROUSSEAU, 1967:627). Pestalozzi, em seu Instituto de Iverdon, no começo do
século XIX, quando ainda protestantes e católicos se ressentiam de longas e
violentas lutas recentemente aplacadas, praticou também uma educação ecumênica,
afirmando que os traços principais do seu método eram:

―Conservação dos sentimentos piedosos da criança; elevação à Religião e à virtude


com plena consciência e conhecimento de seus deveres; estímulo a uma alegre
atividade autônoma da criança; estímulo à pesquisa e à reflexão pessoal e através
de tudo isso, promover a aprendizagem do conhecimento e das qualidades que a
vida exige.‖ (PESTALOZZI, 1980: 59)

A trilha aberta por esses educadores foi até agora pouco seguida, seja por
preconceito, falta de coragem ou preparo. É grande o desafio do diálogo e do
respeito mútuo quando se trata de religião.

Alguns pontos cruciais devem ser vencidos na mentalidade que vigora no seio das
religiões, para que sejam possíveis uma convivência mais amistosa e a existência de
educadores capazes de atuar nesse delicado terreno, sem violentar consciências. O
primeiro fantasma que se deve afastar é o do preconceito. Como a própria palavra
exprime, o preconceito é um conceito a priori, pré-estabelecido antes de análise,
estudo e reflexão. O medo do diferente, discriminações socialmente propagadas e
opiniões distorcidas podem formar em nossa mente idéias errôneas e julgamentos
apressados, generalizações simplistas e rigidez de pensamento.

Essa atitude — que pode se exprimir em associações do tipo: ―crente-fanático‖;


―espírita-macumbeiro‖; ―adepto do candomblé-adepto do demônio‖; ―católico-carola‖;
mais recentemente ―muçulmano-terrorista‖ — cria uma barreira mental que nos
impede de enxergar as riquezas e as nuanças da realidade.

86
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
O educador que se preze deve se despojar de tais viseiras e passar a olhar o outro,
(mesmo o outro diferente), com o olhar da compreensão humana e do interesse de
aprender. O melhor antídoto do preconceito é o conhecimento. Pode haver muito que
nos choque e nos desagrade na religião alheia, mas sem nenhuma dúvida haverá
muito que nos encante e nos fale ao coração. É no terreno dos encontros que
devemos fixar o nosso olhar e achar o fio condutor do diálogo.

A segunda tentação a se vencer (e isso implica às vezes numa reflexão que envolve
a nossa própria fé) é a de julgarmos as pessoas aptas ou não aos processos de
salvação ou redenção, segundo os critérios dogmáticos da nossa religião.
Raciocinava Rousseau com muita propriedade:

―Ou todas as religiões são boas e agradáveis a Deus ou, se existe alguma que Ele
prescreve aos homens e Ele pune os que a desprezam, Ele lhe deu sinais certos e
manifestos para que fosse distinguida e conhecida como única verdade. Esses sinais
são de todos os tempos e de todos os lugares, igualmente acessíveis a todos os
homens, grandes e pequenos, sábios e ignorantes, europeus, indianos, africanos,
selvagens. Se houvesse uma religião sobre a Terra fora da qual só houvesse penas
eternas, e que em alguma parte do mundo um só mortal não foi convencido dessa
evidência, o Deus desta religião seria o mais iníquo e o mais cruel dos tiranos.‖
(ROUSSEAU, 1967:609)

Em outras palavras, nada mais nocivo e injusto do que dizer: ―fora da minha religião,
não há salvação‖. Quem pensa assim se arroga uma competência de julgamento,
que só pertence a Deus e não está muito longe da mentalidade inquisitorial do
passado. Partindo-se desse princípio, não há diálogo possível.

Além desses dois pontos a se evitar, há outros dois pontos a se recomendar, para
promovermos uma educação religiosa, sem proselitismo, nas escolas públicas e
particulares. O primeiro é a necessidade do educador ser um pesquisador (e isso
vale para todos os campos do conhecimento como também para a religião). Ele tem
de buscar e conhecer para não se perder no meio da avalanche de idéias e
informações que vagam nesse mundo. Aprofundar, vivenciar e seguir em primeiro
lugar a própria fé é o dado fundamental. Se enumeramos como objetivo do ensino
87
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
religioso o despertar da religiosidade na criança, essa religiosidade tem de estar
presente, e fortemente sentida, no educador. E, ao mesmo tempo, compete-lhe
buscar informações e conhecimento preciso a respeito das outras religiões, com que
se defrontará na sala de aula.

O segundo ponto é a valorização da Ética, como patamar máximo de encontro das


religiões. Não a Ética entendida como conjunto de regras e proibições, mas como
imanência na consciência humana, como lei natural que se manifesta em meio a
todas as culturas e povos e que as diferentes religiões captam, de formas diversas.

Se pudermos fazer isso, estaremos mais próximos da proposta de Comenius e


Pestalozzi. Toda essa proposta não exclui evidentemente o ensino religioso
confessional. Ou seja, as crianças de famílias católicas, dentro ou fora da escola,
deverão fazer a sua catequese, as judaicas receberão as instruções de sua fé, as
espíri-tas, evangélicas, muçulmanas, igualmente. Mas pode haver um espaço inter-
religioso, para troca, diálogo e convivência, onde se trate o tema de forma ecumênica
e onde se entenda a religião como um fenômeno humano autêntico, além das
próprias religiões.

Uma experiência

No final da década de 90, realizamos uma experiência nesse sentido, com alunos de
pré-escola e ensino fundamental de uma escola particular na zona norte de São
Paulo, Colégio Nova Era.

Duas atividades bem-sucedidas podem servir de exemplo prático à discussão deste


artigo. Uma foram as aulas de religiões comparadas que demos na 5ª série.
Começamos por levantar entre os alunos quais as dúvidas e curiosidades que eles
tinham a respeito de temas religiosos. As perguntas foram as mais variadas. ―O que
é Umbanda?‖ ―O demônio existe?‖ ―Como são as religiões indígenas?‖ ―O que é
obsessão (dentro do espiritismo)?‖ ―O que é protestantismo?‖ ―O que é
ressurreição?‖ ―Existe vida após a morte?‖ etc. etc.

88
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
As discussões, pesquisas e produções feitas em sala de aula foram no sentido de
responder a todas as questões levantadas e as atividades suscitaram tal interesse e
envolvimento, que chegaram aos ouvidos dos catequistas que estavam preparando
algumas crianças para a primeira comunhão.

Apesar de toda a atividade se desenvolver dentro do máximo respeito a todas as


posições religiosas (tomávamos o cuidado de explicar sempre: segundo a Igreja
Católica, segundo o Islamismo, segundo o Budismo, além de promover entre os
alunos a pesquisa nas próprias fontes), o preconceito entrou em ação. Os
catequistas de alguns alunos levantaram a lebre, questionando o fato das aulas
serem coordenadas por uma professora não-católica e assumidamente espírita
kardecista. A coisa virou polêmica dentro e fora da escola. Mas, felizmente, o
episódio teve um bom final, porque os pais (católicos) das crianças envolvidas,
afirmaram com toda a ênfase a confiança em nosso trabalho sério e não-proselitista.

Outra vivência concomitante a essas aulas e que envolveu a mesma polêmica, com
final feliz, era um culto ecumênico semanal, que fazíamos com toda a escola. As
crianças de todas as séries eram convidadas na hora do intervalo do almoço e a
presença era voluntária. Foi criada uma ―comissão da prece‖ composta de um
católico, de um evangélico e de um espírita (porque essas eram as religiões
representadas na escola). Essa comissão estava incumbida de trazer orações,
trechos de livros de suas respectivas religiões, mas que não ferissem os princípios
das outras participantes. Por exemplo, não orávamos a Maria, para não desgostar os
evangélicos; não orávamos aos Espíritos protetores, para não ofender católicos e
evangélicos. O Pai-nosso, as orações a Jesus, que eram aceitos por todos, eram
usuais. Depois da leitura ou da prece pronunciada por um dos membros da
comissão, todas as crianças podiam participar, fazendo orações espontâneas,
pedindo bênçãos, saúde ou ajuda para si ou para algum familiar ou amigo ou algum
pedido especial.

Algumas coisas incríveis, às vezes, surgiam, como certa vez o pedido de um menino
de 7 anos, o Pedrinho, que orou: ―Que sempre tenhamos fé!‖ Ou as preces por paz
no mundo, paz na escola e reconciliação entre os que haviam se desentendido. Às

89
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
vezes, havia alguns bagunceiros que atrapalhavam, mas eram contidos pelos outros.
E, muitas vezes, sentimos forte emoção, onde se apalpava quase a presença de
Deus. Não será isso a melhor forma de convivência fraterna: pessoas que crêem de
forma diferente, sentirem em fraternidade a presença divina?

O desafio de tal empreendimento não deve nos assustar, pois quem tem fé sabe que
podemos esperar a ajuda de Deus, entendendo:

―que os verdadeiros deveres da Religião são independentes das instituições


humanas, que um coração justo é o verdadeiro tempo da divindade, que em todos os
países e em todas as seitas, amar a Deus acima de tudo e o próximo como a si
mesmo é o resumo da lei, que não há religião que dispense os deveres da moral,
que não há outros verdadeiramente essenciais a não ser estes e que o culto interior
é o primeiro desses deveres e que sem a fé, nenhuma verdadeira virtude existe.‖
(ROUSSEAU, 1967, P. 632)

REFERÊNCIAS

BERKENBROCK, Volney J. A atitude franciscana no diálogo inter-religioso. (in:


MOREIRA, Alberto da Silva (org.) Herança Franciscana. Petrópolis, Vozes, 1996.)

Forum Nacional Permanente do ensino religioso. Parâmetros curriculares nacionais.


Ensino Religioso. São Paulo, Ed. Ave-Maria, 1998.

Lei de Diretrizes e Bases da Educação, 1997.

LYON, David. Pós-modernidade. São Paulo, Paulus, 1998.

PESTALOZZI, Johann Heinrich. Sämtliche Werke und Briefe. Kritische Ausgabe.


Zurique, Orell Füssli, 1927-1980. Vol. 25, Haupgrundsätze der Methode.

Resolução de 27/7/2001 que regulamenta o Artigo 33 da Lei 9394/96. São Paulo,


Conselho Estadual de Educação, 2001.

ROUSSEAU, Jean-Jacques. Œuvres Complètes. Vol. 4. Paris. Gallimard, 1967.

VOLTAIRE, Tratado sobre a Tolerância. São Paulo, Martins Fontes, 1993.

90
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
ESTRATEGIAS DE SUPERAÇÃO DA DISCRIMINAÇÃO ÉTNICA E
RELIGIOSA NO BRASIL
Roseli Fischmann*

"Não se trata de duvidar da miséria humana - do domínio que as coisas e os maus exercem sobre o
homem (…). Mas ser homem é saber que é assim. A liberdade consiste em saber que a liberdade
está em perigo. Mas saber ou ter consciência é ter tempo para evitar e prevenir o momento da
inumanidade." Emmanuel Levinas - Totalidade e Infinito

Um tema forte e delicado

Tratar da temática da discriminação étnica e religiosa é tratar de identidade,


autonomia, alteridade, valores, tradições, símbolos, indivíduos, coletividades,
singularidades, pluralidades. É tratar também de fronteiras, relações intra e inter-
grupos, inclusões, exclusões.

O cuidado que se pode observar, no rol de categorias apresentadas, de não usar


conectivos, aditivos ou alternativos, é devido à complexidade dos vínculos que se
estabelecem entre eles.

A propósito, a própria categoria ―vínculos‖ tem sentido especial, assim como a idéia
de que ―se estabelecem‖, ou seja, algo que é um construído e não um dado. Vínculos
entre indivíduos e seus grupos - étnicos, religiosos - de origem têm tal força, que
dificilmente se encontra quem os conteste. Podem ser mais ou menos valorizados,
plenamente aceitos ou absolutamente rejeitados - jamais serão um dado neutro na
vida de alguém.

Por etnias e religiões fazem-se guerras, como tem demonstrado a História Mundial
em todos os tempos. Por isso, tratar da discriminação religiosa e étnica e tratar da
possibilidade da Paz. Como lembra Javier Péres de Cuellar, "a cultura da paz, da
democracia e dos direitos humanos constitui um todo evidentemente indivisível,
assim como os direitos civis e políticos e os direitos econômicos, sociais e
culturais"[1]

91
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
De fato, é absolutamente insuficiente a perspectiva da paz como ausência de guerra.
De certa forma, a humanidade está ainda parcialmente imersa no que Raymond Aron
denomina "paz de impotência", onde não se dá a guerra pela perspectiva de
extermínio mútuo, frente às armas de que o inimigo também dispõe[2].

Talvez o sobressalto do Absurdo, somado à barbárie quotidianamente espalhada


pelas ruas das grandes metrópoles e, mais ainda, por todo o Terceiro Mundo traga o
despertar definitivo, não mais só de alguns, para a imperiosa necessidade de
alcançarmos a "paz de satisfação": "as unidades políticas deveriam, antes de mais
nada, deixar de ambicionar a extensão de sua soberania a territórios ou países
estrangeiros (...). Além da satisfação, nascida do respeito por um princípio de
legitimidade, deve haver a suspensão da rivalidade em termos de terras e de
homens, de forças, de idéias e de amor-próprio"[3].

É interessante observar que o mundo acadêmico não diretamente relacionado às


discussões referentes à Política e ao Direito Internacional também tem dado atenção
a esta problemática, a partir de diferentes enfoques, em geral plenos de perplexidade
e indagações. São alertas, implantados aqui e ali, como buscando tirar aqueles que
se dedicam à descoberta, elaboração e divulgação do conhecimento científico, de
sua rotina auto-centrada.

É interessante observar que diferentes autores, de diferentes áreas, têm - e já há


algumas décadas - clamado por que se dê atenção aos rumos que a Humanidade
vem tomando. Vejamos alguns.

O arqueólogo Grahame Clark, em seu livro A Identidade do Homem[4] afirma: "Para


uma abordagem mais positiva do futuro necessitamos, sobretudo, de uma percepção
contemporânea do que significa ser humano. Só assim poderemos definir os valores
que precisamos sustentar se quisermos reter o nosso 'status' adquirido por
antepassados predominantemente pré-históricos, no transcurso de muitos milhares
de gerações. Da perspectiva inaugurada pela arqueologia e suas disciplinas
associadas, o nosso problema não consiste em como absorver ou processar mais
materiais, ou mesmo como dividi-los em porções mais iguais. É, antes, como manter,

92
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
em face de crescentes ameaças, uma qualidade de vida sem paralelo para a nossa
própria espécie"[5].

Apresentando uma crítica à postura adotada pelos cientistas, que, ao rejeitarem


religiões e ignorarem preocupações básicas de leigos, abandonam a questão básica
da identidade - "o que significa ser humano" - que persegue desde sempre a
Humanidade. Afirma, assim: "Por muito útil e válido que possa ser, para fins de
laboratório, descrever um ser humano em termos de seus componentes químicos
contidos numa fórmula ou mesmo, em um nível superior, como uma organização de
protoplasma sensível, isso é totalmente inútil para uma pessoa em busca de sua
identidade"[6].

Feito o alerta ao mundo científico, Clark dirige-se à análise da organização


econômica e seus reflexos nas sociedades, particularmente levando em conta a
aceleração do ritmo de mudança e lembrando que muitos avanços tecnológicos, hoje
alcançados em minutos, dependeram de descobertas ancestrais, cultivados ao longo
de gerações, por culturas que, em si, desapareceram.

Comparando o empobrecimento do banco genético provocado pela extinção de


espécies animais e vegetais, à homogeneização da cultura humana que hoje
vivemos, a qual "desafia a nossa própria identidade como homens", Clark pondera:
"um dos dilemas das sociedades pós-industriais, por enquanto só parcialmente
percebido, consiste em como reconciliar as tendências homogeneizantes de um
mundo cada vez mais organizado na base da tecnologia mecânica, racionalidade e
ciência natural, com a diversidade de valores humanos que sintetizam a história dos
homens"[7]

Como se observa, já não se coloca a questão apenas em termos de organização


política, mas há um esforço para ponderar acerca da interferência da organização
mundial na vida cotidiana dos seres humanos, em especial no que se refere a como
preservam sua própria dignidade.

Talvez possamos lembrar, aqui, ainda que brevemente, da análise do filósofo Jean
Baudrillard, ao apontar a relação existente entre aquilo que tem sido servido como
93
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
"alimento cultural", de maneira geral, propiciando o fim do social, transformado em
quase irrestrita massificação. Contudo, esse trabalho escrito originalmente em 1979,
previa que, ao contrário da percepção vigente que indica uma passividade extrema
das massas, as reações que poderão ainda advir são, em verdade, imprevisíveis[8].
Nessa análise, Baudrillard lança mão do conceito de massa em Física, mostrando,
então, que tudo que é endereçado às massas humanas é recebido, porém, não
passivamente; dá-se, segundo sua análise, assimilação e processamento, uma
elaboração inconsciente, não visível, e, por isso, incontrolável. Além disso, a forma
de "devolução" dos conteúdos assimilados pode ser esperada: o que não significa, é
claro, que se possa saber 'o que' esperar[9].

Assim, o que é identificado por Clark como uma busca de afirmação de dignidade,
que pode resultar, não raro, em conflitos violentos[10], é complementado, por
Baudrillard, analiticamente, a partir de outra perspectiva teórica, afirmando a não-
passividade das massas e, sim, a imprevisibilidade quanto ao momento e qualidade
de sua ação.

Neste ponto, a discussão assume concretude imediata. Podemos, por exemplo,


entender a eclosão de guerras étnicas em vários pontos do mundo, assim como os
movimentos de afirmação de identidade étnica, em suas diversas manifestações.
Frente a um mundo homogeneizador, onde a violência do preconceito e da
discriminação étnica, embora injustas é apenas parte do processo, a reação possível
- em busca da dignidade dada pela identidade definida, clara, assumida, valorizada -
apenas começa a se manifestar. Contudo, quais os rumos que tomarão, ou poderão
tomar, tais manifestações?

O rumo da violência e do confronto é o mais direto e, de certa forma, mais simples,


porém o menos humano, no sentido em que Grahame Clark nos relembra, em
termos das conquistas alcançadas desde nossos ancestrais pré-históricos, para nos
constituirmos como espécie.

Aqui, um autor que oferece a contribuição mais carregada de um forte "pathos"


humanitário é Konrad Lorenz. Considerado "pai da Etologia", ciência que estuda o
comportamento animal, prêmio Nobel de Medicina em 1972, Lorenz tem uma vasta
94
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
obra, cuja contribuição mais marcante é a análise da espécie humana
comparativamente a outras espécies animais, a qual conclui, surpreendentemente,
que nós, seres humanos, estamos em desvantagem, por nossas próprias escolhas.

Lorenz afirma que a espécie humana é a única, dentre as espécies, que usa seu
diferencial em relação às demais contra si mesma, e não em busca de preservação e
aprimoramento. Assim, o raciocínio abstrato, formal, e a linguagem verbal levaram,
por um lado, a um aprimoramento tecnológico jamais imaginado em outros tempos
pelo ser humano. Por outro lado, concorreram para o desenvolvimento de
sentimentos de posse, promoveram deslocamentos de consciência, disseminaram
doutrinação e passividade.

Os resultados facilmente visíveis dessa situação encontram-se nos resultados da


seleção intra-específica, no caso humano, dada pela concorrência generalizada. Em
outras espécies a seleção feita pela via intra-específica mostra-se cheia de
armadilhas para o próprio processo de evolução, onde nem sempre o que seria
melhor para a espécie é o que vence. Ora, seres humanos dotados de razão,
assistimos e, muitas vezes, promovemos essa linha de "evolução", em verdade
demolidora da espécie.

Frente a uma análise como essa, Lorenz vê saída: a imprevisibilidade característica


de todos os seres vivos - inegável, apesar da tendência humana de procurar dominar
a teleologia - é uma garantia de possibilidade de mudança de rumo. Mais ainda,
lembra que a cultura é criação humana, podendo, portanto, ser alterada por quem a
desenvolveu.

Ora, se a imprevisibilidade é o que garante a liberdade, indicando-nos, portanto,


limitações quanto ao que podemos conhecer e prever, por outro lado é essa mesma
liberdade que nos permite programar ações visando reverter o quadro em que se
encontra, ainda no momento, a espécie humana. E, para isso, é reservado papel de
destaque para a educação.

Citando André Malraux, Péres de Cuellar lembra que o mundo da cultura "não é o da
imortalidade, é o da metamorfose"[11]. A solidão que vivemos nós, seres humanos,
95
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
neste final de milênio é a de quem contempla a si; contemplando-nos, em nossas
imagens, perfeitamente adequadas às exigências externas[12], vemos esmaecer,
distante, nossa identidade, nossa dignidade. Metamorfose é menção de esperança,
lembrando que já trazemos em nós o que poderemos ser. É transformação que não
se faz ao acaso, mas é cheia, sim, de busca e intencionalidade, como nos ensina
Lorenz. E onde a educação é instrumento privilegiado.

Nesse sentido, a própria acepção da educação é ampliada, ao contemplar a questão


das minorias, assim como se aprofunda o sentido universal dos Direitos Humanos.
Vejamos.

A vida humana, enquanto ação e reflexão, distingue-se de todas as demais formas


de vida. Em uma perspectiva evolucionista, diferentes espécies desenvolveram
diferentes respostas às circunstâncias do meio ambiente, como forma de
sobreviverem a elementos hostis. Os seres humanos, com sua racionalidade,
criaram sistemas de cultura, diversificando-se entre si mais a partir de diferentes
cosmologias, que a partir de diferenças biológicas, expressas em características
físicas, como cor da pele, formato dos olhos, textura dos cabelos, etc.

Um dado que corrobora a afirmação dessa diferenciação feita pela cultura, refere-se
aos processos de aculturação imposta a imigrantes, em diferentes partes do planeta,
em diferentes momentos históricos. Muitas vezes, perdido o solo original, e
freqüentemente deparando com sentimentos de xenofobia (ainda que difusos, ou
encobertos), o ser humano vê-se na iminência de adaptar-se, ou fenecer, quando
não lhe é dada a alternativa de evadir-se. A metáfora do camaleão sobre a manta
escocesa, expressa por Woody Allen em Zelig, daquele que é capaz de se adaptar
de forma incondicional, no tempo exato, para sobreviver, fala também de certa
esquizoidia, distante da desejável integridade do ser humano.

O jogo de submeter o estrangeiro[13], tem sido suficientemente forte, na história da


humanidade, a ponto de se constituir esse termo - ―estrangeiro‖ - em referência
metafórica freqüentemente adotada na literatura, no cinema, nas artes em geral.
Morte em Veneza, O Estrangeiro, são alguns exemplos dessa referência.

96
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
Já não apenas como metáfora, encontra-se o jogo de submissão operando sobre
aquele que se encontra indefeso - a inocência, a ingenuidade, e, sobretudo, toda
forma de exclusão, frequentemente são interpretados como fraqueza e
incompetência, certo tipo de ―displacement‖, alguém que está deslocado como um
apátrida, frente a um mundo no qual a competitividade exacerbada ensina a tentar
sempre vencer a qualquer custo - vitória que tem, então, o significado de sobrepor-
se, de forma autoritária, aos vencidos.

Convém lembrar que a derrota em uma guerra significou, por diversas vezes na
história, a vivência da escravidão, como conseqüência. Os perdedores, vistos como
mais fracos, ou supostamente menos competentes, viam-se escravizados, em uma
prática reconhecida e legitimada naqueles tempos. Paulatinamente, a barbárie da
escravidão ganhou tal aceitação, que já não era necessário vencer a guerra -
bastava comprar o escravo que traria o direito ao ócio e ao reconhecimento de
prestígio social - a guerra fora ganha por outros meios.

Da mesma forma, a legitimação da desigualdade, pelas estruturas de senhor e servo,


príncipe e súdito, passou a ser matizada pela expansão do capitalismo moderno, na
definição da posse dos meios de produção. Exacerbada a desigualdade entre
indivíduos e grupos humanos, nosso século assistiu guerras que colocaram o tema
da dominação entre Estados, assim como a retomada intensa e dramática de lutas
internas, por motivos étnicos e/ou religiosos, e ainda a luta pela hegemonia sobre
territórios, na definição de fronteiras.

A barbárie do Holocausto, de Hiroshima e Nagasaki, na Segunda Guerra Mundial,


deixaram o terrível registro de até onde o ser humano é capaz de chegar. Com a
morte de milhões no genocídio perpetrado de forma brutal, e a criação científica
posta a serviço da morte, a humanidade pode olhar-se a si, e perceber quão
incontroláveis são as tendências humanas à destruição e à violência.

* Pedagoga, mestre, doutora e livre docente em Educação pela Universidade de São Paulo, sendo
professora no Programa de Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Educação da USP, onde
também coordena o projeto ―Discriminação, preconceito, estigma: relações de etnia em educação‖,
assim como a implantação, em cooperação com a UNESCO - Unidade da Tolerância e da Paz, Paris -
, da Rede Científica das Américas e Caribe para a Tolerância e Solidariedade. Recentemente
designada pelo Conselho Executivo da UNESCO para integrar o Grupo de Trabalho Especial sobre

97
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
Educação para Direitos Humanos, como representante regional da América Latina e Caribe, em nome
do Brasil. Fellow de The John D. and Catherine T.MacArthur Foundation, Chicago, no período de 1994
a 1997, junto ao Programa de População.
[1] Cuéllar, Javier Peres de - "Um Plano Marshall para a cultura e o desenvolvimento", in: Folha de
São Paulo, 19/02/1994, p. A-3. Esta discussão inicial baseia-se, parcialmente, no capítulo 1 de
―Transformação de Narciso: Percursos, Diálogos, Reflexões em Educação‖, Tese de Livre Docência
apresentada à Faculdade de Educação da USP em agosto de 1994.
[2] Em substituição à "paz de potência", como por exemplo a "Pax Romana", onde o império se
preserva sem questionamento, por impossibilidade dos submetidos. Sem dúvida haverá quem
identifique, ainda, uma hegemonia norte-americana tal, que preferiria esta categoria àquela que indico
acima. Contudo, é minha compreensão que o fato de o aparato bélico, incluindo arsenal nuclear, estar
muito disseminado por diversos países, torna vital o equilíbrio nas relações internacionais. Contudo,
está claro que essa classificação não é tão simples. Citação ref. Aron, Raymond - Paz e Guerra entre
as Nações, 2ª ed., Brasília, EdUNB, 1986
[3] Aron, Raymond - op.cit., pp. 231-232
[4] Clark, Grahame - "A identidade do homem - Uma exploração arqueológica", Rio de Janeiro, Jorge
Zahar, 1985 - (original, 1983)
[5] Idem, ibid., p.15
[6] Idem, ibid., p.21
[7] Idem, ibid.,pp. 22-23. Ver capítulo 6 deste trabalho
[8] De certa forma, os acontecimentos ocorridos no Leste Europeu, incluindo a queda do Muro de
Berlim, pioneira no suceder de fatos, corroborou a análise prospectiva de Baudillard.
[9] Baudrillard, Jean - "À sombra das maiorias silenciosas - O fim do social e o surgimento das
massas", São Paulo, Brasiliense, 1985
[10] Citando Clark: - "A força das raízes culturais de tais convicções (que têm na diversidade cultural
elemento constitutivo da dignidade humana) pode ser vista nas reivindicações de autonomia local, não
raras vezes escoradas na violência, por parte de grupos afogados por alguns dos Estados mais
avançados da Europa ocidental" - Clark, G. - op.cit., p.155
[11] Péres de Cuellar, J. - op.cit.
[12] A respeito, é sempre oportuno lembrar o indispensável Goffman, E. - A representação do eu na
vida cotidiana, Petrópolis, Vozes, várias edições
[13] Hannah Arendt trabalhará a questão do estrangeiro como sendo certo sentimento comum, que
partilhamos em nossa condição humana, de não nos sentirmos ―nem em casa, nem à vontade no
mundo‖, tema recorrente ao longo de sua obra.

Barrington Moore Jr.., em seu livro Injustiça - as bases sociais da obediência e da


revolta - lembra que é necessário haver normas básicas, que sobrevivam à
necessidade de a sociedade estar refazendo a cada vez seu contrato social. A
obediência a tais normas constitui-se, nesse caso, num gesto de maturidade, pela
adesão aos valores da sociedade específica em que se vive. Haveria, aqui, incluídas
na normatização e no contrato, formas de coerção social previstas, assim como de
punição, consideradas por todos como justas.

Por outro lado, existem alguns elementos, como a opressão e a injustiça, que, uma
vez surgidos, podem significar uma ruptura do contrato social, frente a qual é próprio
da maturidade não mais obedecer, mas resistir. Moore Jr. destaca, então, que o
98
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
perigo está nas sociedades onde se encontraram formas de controlar toda
resistência, onde a injustiça é vista como inevitável, e portanto se sufoca na base
toda indignação e ira moral geradas pelo sentimento de injustiça.

Mais ainda, com freqüência desenvolvem-se argumentos de justificação da situação,


significativos de experiências de auto-anulação, como na citação de Octávio Paz, ao
lado de certo ―orgulho na resignação‖ [1], que de fato é estratégia para tornar
tolerável suas vidas. Adorno e Horkheimer, por sua vez, tratam de certa atitude que
denominam metaforicamente de ―mentalidade ciclista‖: aquele que calca o que está
embaixo, enquanto se curva ao que está acima.

É sobretudo frente a ordens injustas ou a uma ordem opressiva que se revelam a


autonomia moral e a coragem moral. Barrington Moore Jr. identifica três qualidades
da autonomia moral:

―A primeira qualidade pode ser chamada de coragem moral, no sentido de uma


capacidade de resistir a poderosas e ameaçadoras pressões sociais para a
obediência a regras ou ordens ‗opressivas‘ ou ‗destrutivas‘. A segunda qualidade é a
capacidade intelectual para reconhecer que as regras e as pressões são de fato
opressivas. (...). A terceira capacidade, a inventividade moral, é mais rara (...). É a
capacidade de criar, a partir das tradições culturais vigentes, padrões historicamente
novos de condenação ao que existe.‖[2]

Tratando dos efeitos do poder de pressão do grupo sobre o julgamento expresso por
um indivíduo, com base em experimentos de Asch, Moore Jr. enfatiza que ―um único
aliado pode fornecer suficiente apoio para capacitar uma pessoa a elaborar um
julgamento correto‖[3]. A mesma conclusão resultou do famoso experimento de
Stanley Milgran, envolvendo cobaias humanas pseudo-submetidas a choques por
ordem de pseudo-experimentadores a agentes que demonstraram sua capacidade
de resistir a ordens cruéis, ou, ao contrário, de extrapolá-las. Nesse experimento, a
oferta de apoio social foi a mais eficaz variante no solapamento da autoridade cruel e
sádica do ―experimentador‖.[4]

99
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
Entre outras conclusões do longo e denso estudo de Barrington Moore Jr.., a
capacidade de identificar a opressão e a injustiça é tratada como sendo central na
busca da construção de uma situação social mais justa a cada vez. Da mesma
forma, o desenvolvimento do sentido de inevitabilidade como sendo ilusório - ou seja,
a compreensão de que há certas condições desumanas, dolorosas ou degradantes
das quais não se necessitam, não se podem e não se devem suportar.

A reversão do sentido de inevitabilidade significa que as pessoas possam


compreender que a dificuldade na alteração de certa situação dolorosa vigente não
significa que a mesma integre a ordem ―natural‖ das coisas, sendo por isso
inevitável, mas que essa dificuldade talvez diga respeito a outras dificuldades, como
tradições arraigadas ou outros interesses, que não a melhoria da qualidade da vida
humana.

Nesses processos pelos quais se desenvolve a capacidade de identificação da


opressão e da injustiça, e de solapamento do sentido de inevitabilidade, a informação
desempenha um papel crucial, assim como o debate aberto e esclarecido[5], que
possa servir como o apoio social, de que tratou Moore Jr.., capaz de fortalecer o
discernimento facilitador do sentimento de injustiça, dando suporte à capacidade de
resistência.

Neste ponto evidencia-se a relevância da escola, seja como favorecedora de


informação, seja como facilitadora de processos que conduzam à formação da
capacidade crítica, bem como de habilidades de expressão de opinião e, sobretudo,
de resistência à opressão.[6]

No âmbito social, as minorias têm representado a personalização da possibilidade de


se colocar em discussão os processos humanos de dominação, muitas vezes por
seu sofrimento, como já vimos. Theodor Adorno e colaboradores desenvolveram em
sua obra Personalidade Autoritária uma série de reflexões com base em pesquisas
empíricas quantitativas e qualitativas, que são de extrema relevância para essa
temática. Devido aos limites deste trabalho, procurarei destacar alguns mais
especificamente ligados à temática educacional.

100
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
Adorno constatou em suas pesquisas que quanto mais submisso um indivíduo, maior
sua tendência ao autoritarismo - submete-se, porque legitima o que o outro faz, e se
estivesse em seu lugar, faria igual ou pior. Assim, constatou que existem traços
presentes na personalidade autoritária, que tendem a apresentar atitude
preconceituosa e a legitimar formas várias de discriminação de minorias, aí incluídas
nós mulheres, os homossexuais, todos aqueles que integram etnias ou religiões não
dominantes, além das crianças. Essa formas de discriminação incluem
comportamentos violentos, agressivos, excludentes.

Da mesma forma, são personalidades que submetem-se em campo público a toda e


qualquer autoridade, ainda que arbitrária, enquanto submetem, freqüentemente de
forma violenta, aqueles com os quais convive no domínio privado da família.

Um dos principais méritos do trabalho de Theodor Adorno é operar esse vínculo


entre a temática das minorias e o fortalecimento da democracia. Aquilo que pareceria
interesse de alguns, na verdade coloca-se como a evidência da relevância da
proteção ao espaço público, às relações igualitárias, as quais podemos chamar de
emancipadoras, ao respeito a todo e qualquer indivíduo, como base da democracia.

É interessante observar que a Declaração dos Direitos das Minorias Nacionais ou


Étnicas, Lingüísticas ou Religiosas proclamada pela Assembléia Geral das Nações
Unidas em dezembro de 1992, incorpora essas conclusões, destacando que a
pluralidade cultural (aí incluindo todas as especificações citadas na Declaração) é a
base visível do pluralismo político. Enquanto esse pode, em algumas circunstâncias,
apresentar-se de forma excessivamente vaga e abstrata, a preservação, proteção e
promoção das identidades e tradições diversas de uma comunidade nacional podem
significar o constante mirar da pluralidade. Ou seja, de fato interesse de todos, e não
de alguns.

No trabalho de Adorno, a questão de medidas voltadas para a superação do racismo,


da discriminação étnica e religiosa em geral, é apresentada como pauta para a
sociedade que se quer construir e manter de forma democrática. Em especial, uma
pauta para a educação de todos, uma vez que seria, em sua análise, uma forma
eficiente de prevenir o surgimento de personalidades autoritárias, que viessem a
101
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
fundamentar, em suas vidas cotidianas, o surgimento do autoritarismo e do
totalitarismo, no nível da organização política.

Da mesma forma, uma pauta para a educação é a elaboração de propostas que


visem enriquecer a capacidade argumentativa [7]. Nesse sentido, o ponto mais
fundamental refere-se à possibilidade de formação de indivíduos capazes de escapar
à tentação maniqueísta. Novamente aqui, a existência da diversidade étnica,
religiosa, cultural é crucial, porque ensina a relativizar afirmações, bem como a
desenvolver a consciência de que existem tantos sistemas humanos, quanto nos é
impossível conhecê-los a todos. Ou seja, passamos a entender que nosso
conhecimento - e portanto nosso julgamento - é necessariamente limitado, o que nos
obriga a uma tolerância efetiva para com a diversidade, para com o outro, base da
negociação democrática.

Ainda propõe Adorno, como medidas preventivas ao surgimento do totalitarismo,


mesmo reconhecendo a inutilidade de receitas nesse campo, trabalhos que evitem
clichês, tão ao gosto de ditadores, mesmo os camuflados, que falam em nome da
democracia. No mesmo sentido, desenvolver flexibilidade, capacidade e gosto para
lidar com mudanças, servirão para evitar a rigidez e a constância quase obsessivas,
características da personalidade autoritária. Nesse sentido, na escola, revezar
papéis, a possibilidade de assimilar contribuições da comunidade são dados
essenciais para o desenvolvimento da permeabilidade e flexibilidade.

Às propostas de Adorno podemos somar as de Barrington Moore Jr.., do papel da


educação no desenvolvimento da autonomia moral[8], mesmo quando se considera
que essa autonomia é muito limitada pelas circunstâncias. Apoiando-se em Freud,
destaca a importância de que as crianças tenham modelos adultos com os quais
possam assumir compromissos morais, base do adensamento da autoridade (não
autoritarismo) na sociedade. Em suas propostas destaca-se a manutenção da
capacidade de se indignar frente à injustiça e à opressão, portanto da capacidade de
resistência ao arbítrio, o questionamento do consenso criado e aceito dos processos
de dominação.

102
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
Retornando a Konrad Lorenz, a base de suas propostas para a educação será a
valorização do ser humano, enquanto criador, como sujeito sócio-cultural, e enquanto
ser dotado de capacidade de compaixão. Atente-se que a noção de compaixão que
traz à reflexão não guarda relação com a visão piegas do termo, mas sim com seu
sentido etimológico ―compaixão‖, a capacidade de ―sentir com‖, de ―mobilizar-se por‖.
Entende Lorenz que a educação tem o papel de desenvolver a sensibilidade e a
consciência, de promover uma revalorização dos valores. Mais ainda, ao oferecer
conhecimento, deve fundamentar-se em uma perspectiva epistemológica que se
funde na aceitação dos limites do conhecimento do ser humano, sujeito, sempre e
necessariamente, aos interesses do conjunto da humanidade. Ao colocar esse tema
ético, volta-se ao universal kantiano, de que o limite da ação humana é o de que
cada ser humano seja tratado como fim em si, jamais um instrumento de outro ou de
seus interesses.

Pressupostos teórico-metodológicos da temática[9]

Diz Levinas que "a ética, 'já por si mesma', é uma óptica". Em meu credo de
pesquisadora completo: "a ética é uma óptica", instaura a conduta, define a direção
metodológica.

Trabalhar com questões inerentes à condição humana é assumir um compromisso, e


em especial no caso da pesquisa educacional, estabelece premissas metodológicas
claras: a melhoria das condições básicas de vida do sujeito da pesquisa é a
finalidade da busca do conhecimento, não só como indivíduo, mas também como
partícipe de uma coletividade social. Em particular o estudo das relações de etnia -
singularidade a ser valorizada e ampliada pela participação na pluralidade, em um
processo de construção de novos paradigmas de relacionamento entre indivíduos,
entre comunidades e entre estas e a sociedade - remete à discussão do que é esse
sujeito como espécie humana, ameaçada de "demolição", como dramaticamente nos
ensina Konrad Lorenz.

Proponho, então, um trabalho que compõe pesquisa e intervenção educacional. É


Levinas que nos traz à reflexão a certeza de que o contato com o Outro e a busca do
Absolutamente Outro é o verdadeiro ensino. Assim, que melhor tema haveria para
103
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
uma intervenção educacional que a busca da compreensão objetiva de como se dá a
negação do Outro pelo preconceito, pela discriminação, pela estigmatização? Ora,
trata-se de estudar, investigar, aprender e apreender, em um processo que, ao
mesmo tempo que identifica o problema, busca alternativas para sua superação.
Nesse sentido não pode ser uma atividade solitária, mas sim solidária, tratando-se de
indispensável integração entre ações teóricas e ações práticas, em uma dinâmica de
revezamentos[10].

Por lidar com temas do cotidiano, onde há um conhecimento vulgar estabelecido.


trata-se também de superar obstáculos epistemológicos arraigados, entre outros
motivos, por inércia do espírito, pela valorização indevida de idéias, o que acaba por
se opor à circulação de valores, onde "aquilo que se julga saber claramente ofusca
aquilo que se deveria saber" [11].

A proposta, então, é a participação de representantes de movimentos e organizações


étnicas e de minorias religiosas, em interação com o mundo acadêmico, como um
investimento na possibilidade de rediscussão das fontes de autoridade na construção
do saber sobre etnias, ao mesmo tempo em que se tecem novas relações da prática
com a teoria.

Abrange o levantamento constante dos "Paradigmas do Outro", tal como se


apresentam em crianças e adolescentes das escolas, considerando o "Outro Visível"
e o "Outro Não-Visto". Este discernimento é particularmente relevante para o Brasil,
cuja composição populacional abriga cosmopolitismo peculiar e raro pluralismo,
vivido às vezes de maneira apenas virtual por parcelas da população.

Tal levantamento de "Paradigmas do Outro" busca a explicitação de características


étnicas auto-atribuídas e hetero-atribuídas, visando identificar a existência de
preconceito (latente ou patente), discriminação (implícita ou explícita) e estigma (no
sentido atribuído a este termo por Goffman).

Preliminarmente esclareço que conceituo "Paradigmas do Outro" apoiando-me em


Thomas Kuhn e Emmanuel Levinas. O termo "paradigma", tal como utilizado por
Kuhn, tem uma riqueza heurística insubstituível para nosso trabalho. Analisando a
104
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
organização do mundo científico, Kuhn ressalta que "os cientistas nunca aprendem
conceitos, leis e teorias de uma forma abstrata e isoladamente. Em lugar disso,
esses instrumentos intelectuais são, desde o início, encontrados numa unidade
histórica e pedagogicamente anterior, onde são apresentados juntamente com suas
aplicações e através delas"[12].

Estabelecendo um paralelismo entre a organização do pensamento científico e a


organização do pensamento da vida cotidiana, proponho uma hipótese segundo a
qual as manifestações de preconceito, discriminação e estigma têm uma "unidade
histórica e pedagogicamente anterior", da qual seriam uma aplicação. Seria,
portanto, uma modalidade de "paradigma de senso comum", que por encontrar-se
articulado traduz-se em expectativas com relação ao comportamento do Outro,
configurando o que chamarei de "síndrome DPE", propiciando, frequentemente,
condições objetivas suficientes para sua confirmação, como nos processos de
"profecia auto-realizadora".

Lembra Kuhn que "na ciência (...) a novidade somente emerge com dificuldade
(dificuldade que se manifesta através de uma resistência) contra um pano de fundo
fornecido pelas expectativas"[13]. No campo da "síndrome DPE", a mudança dessas
expectativas depende - e estas são outras hipóteses: (a) do conhecimento objetivo,
pelo sujeito, do "paradigma do Outro" do qual ele é portador; (b) do contato direto e
intencional com o Outro, o qual esteja ciente do "paradigma" que norteia seu
interlocutor.

De Levinas aproveito o conceito de Outro e Outrem (em especial Levinas, 1988),


parafraseando-o, aqui, ao nomear o "Outro visível" e o "Outro não-visto",
diferenciação indispensável no estudo das relações de etnia e entre minorias
religiosas, onde freqüentemente, como já foi dito, o Outro é um contato virtual, o que
traz complexidade social e analítica.

Algumas experiências de trabalho

Os protagonistas desses trabalhos que temos desenvolvido são movimentos sociais,


por meio de ativistas e lideranças, terceiro setor, universidade, mídia, governo,
105
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
agências internacionais. Para facilitar relatos e análises do que tem sido realizado
com base nesses paradigmas, esses interlocutores aparecem um a um, assim como
na sistematização de resultados alcançados tratamos evento por evento. Contudo,
na prática, tudo se entrelaça e se compõe em um processo de interação rico e
dinâmico.

Ou seja, sem a intervenção, a pesquisa teria sido menos instigante e menos


exigente, com relação à preparação teórica, definição metodológica e busca de
resultados. Sem a pesquisa, a intervenção poderia reduzir-se a empirismo.

A urgência da temática, gerando uma atitude de prontidão desses interlocutores -


universidade, comunidades, mídia, governo -, assim como a consolidação de
vínculos de apoio internacional têm sido cruciais para que atender os compromissos
éticos assumidos com as comunidades, entre nós que partilhamos a proposta e com
agências financiadoras.

Passemos a um brevíssimo relato de algumas experiências mais significativas, em


nível nacional e internacional, do trabalho desenvolvido com base no referencial
teórico e metodológico citado, onde a valorização, respeito e presença direta de
diversos grupos de minorias, e em particular étnicas e religiosas, tem sido central.

Ensino Religioso em escolas públicas - a discussão do Estado de São Paulo

Em 1995, o tema do ensino religioso em escolas públicas constituiu-se em fonte de


cooperação entre nosso trabalho e o Governo Estadual. Tal cooperação foi tão mais
significativa, quanto mais séria a crise suscitada pela Conferência Nacional dos
Bispos do Brasil - CNBB - Seção São Paulo. O Governo do Estado de São Paulo não
aceitou sua proposta de impor ensino religioso, alegando exigência constitucional,
porém, de fato, dentro de certa concepção que feria os direitos das minorias
religiosas e de todos os alunos, por impedir a livre escolha, o que se encontra
previsto na Constituição.

A Secretaria de Educação pediu-me a cooperação, dela resultando a proposta e


efetiva criação de uma Comissão Especial do Governo do Estado, com

106
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
representantes de diversos setores governamentais, para a qual fui nomeada como
um dos membros, no caso, representante da Universidade Pública.

O trabalho da Comissão estendeu-se de julho de 1995 a janeiro de 1996, envolvendo


ampla participação das comunidades de minorias religiosas, mobilizadas por
intermédio das comunidades que participavam de nosso projeto. Foi uma lição de
cidadania, pela seriedade e prontidão das comunidades que estiveram presentes em
defesa de todas as crianças e adolescentes que estudam em escolas públicas,
reafirmando o direito de respeito e valorização, como na Declaração das Minorias da
ONU.

A mobilização significou a dedicação de muitos, que se empenharam em divulgar a


importância da liberdade de religião, da laicidade do Estado, como presente na
Constituição Federal, e, assim, a reafirmação da importância do respeito à liberdade
de consciência e de pensamento.

A imprensa e os meios de comunicação, de maneira geral, foram parceiros ativos e


decisivos para aquela que foi uma vitória, embasada em parecer jurídico da
professora Anna Cândida da Cunha Ferraz, da Faculdade de Direito da USP,
preparado por nossa solicitação.

Essa vitória repetiu-se na promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação


Nacional, em dezembro de 1996, quando essa abordagem da temática foi vitoriosa,
após debate acirrado no Congresso.

Contudo, lei complementar posterior, de julho de 1997, deu nova redação ao artigo
referente ao ensino religioso, criando uma situação de ambigüidade e ameaça aos
direitos fundamentais, que, sem dúvida, o tempo já demonstra o desacerto. Essa
nova situação, gerada como resultado de pressão da CNBB na fase preparatória da
visita do Papa João Paulo II ao Brasil em outubro de 1997, deverá ser corrigida em
prol da cidadania, uma vez que a mobilização havida em São Paulo em 1995,
demonstrou à exaustão os perigos desse tipo de exposição compulsória de crianças
à religião - sem garantias às minorias - no ambiente da escola pública.

107
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
Pluralidade Cultural como tema curricular transversal para as escolas de
ensino fundamental

O documento ―Pluralidade Cultural‖, do qual fui redatora e especialista junto à equipe


geral, é integrante dos temas transversais dos Parâmetros Curriculares Nacionais -
PCNs. É inovador, em nível nacional, porque pela primeira vez temos a temática da
pluralidade e da diversidade étnico-racial presente como política pública de educação
para todo o território nacional, em uma perspectiva que privilegia a voz dos sujeitos
desse processo, valorizando, portanto, as populações brasileiras. Foi redigido com
base em toda a experiência que desenvolvemos em nosso projeto, com a
participação de lideranças das comunidades como pareceristas da proposta
preliminar, fato inédito na história da educação brasileira.

É proposto, também, em interação com os demais temas transversais, a saber,


Saúde, Educação Sexual, Ética, Meio Ambiente, colaborando para entrelaçá-los na
abordagem que faz dos direitos humanos, da liberdade de consciência, de opinião,
dos direitos da criança e do adolescente, da temática da igualdade entre homens e
mulheres, em uma proposta que toma em consideração a realidade da sala de aula,
portanto viável, apresentada para ser efetivada. Propõe, além disso, estratégia
didática de ―intercâmbio‖, cooperando para o adensamento dos projetos pedagógicos
das escolas, pela via da interação com a sociedade e comunidades, voltando-se para
o conhecimento da diversidade regional, cultural e política brasileira.

Os valores que são ali trabalhados voltam-se para o fortalecimento da auto-estima de


professores e professoras, pessoal auxiliar e administrativo e, de forma central,
alunos e alunas, voltando-se para a valorização das origens de todos, ao mesmo
tempo em que afirma a inviolabilidade do direito individual de escolha dos rumos que
cada um escolha dar à sua vida. Trata, também, da urgência da disseminação do
conhecimento dos direitos humanos e do respeito à máxima que estabelece todos os
direitos humanos para todos.

Encontra-se em aplicação em todo o território nacional, no ensino fundamental


(oferecido no Brasil a crianças e adolescentes de 7 a 14 anos).

108
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
Manual ―Direitos Humanos no Cotidiano‖, a valorização da diversidade e do
pluralismo

A repercussão de diversas iniciativa do projeto que coordenamos, assim como do


documento de Pluralidade Cultural, levaram a outra experiência formidável de
entrelaçamento teoria-prática. O Secretário Nacional de Direitos Humanos, Dr. José
Gregori, convidou nosso projeto a colaborar com a Secretaria Nacional de Direitos
Humanos - SNDH, pedindo que concebêssemos projeto de elaboração de um
manual de direitos humanos para a sociedade, como estabelecido no Programa
Nacional de Direitos Humanos.

A familiaridade e envolvimento do Terceiro Setor, a consolidação de uma abordagem


de valorização da voz dos sujeitos do processo social, a ampliação temática da
perspectiva da diversidade - tudo se constitui em fortalecimento de estratégias de
superação da discriminação étnica e religiosa - em ação. Assim, é processo que não
se interrompe, porém gera produtos a cada novo desafio surgido, realimentando-se,
consolidando-se e diversificando formas de presença no cenário acadêmico, social,
cultural e político.

O manual, que envolve mais de 30 artistas das artes visuais, mais de 50


personalidades, como escritores, jornalistas, artistas, religiosos, mais de 60 ONGS,
além da equipe do projeto. Expressa uma abordagem efetivamente em prol da
pluralidade, apresentando, na prática, a diversidade que tanto valorizamos.

Rede Unesco das Américas e Caribe de Cientistas para a Tolerância e a


Solidariedade

Em novembro de 1997, realizou-se o Seminário Internacional ―Ciência, Cientistas e a


Tolerância‖, em cooperação com a UNESCO, Unidade da Tolerância e da Paz,
envolvendo quase todas as unidades da Universidade de São Paulo, por intermédio
de seus Programas de Pós-Graduação, trazendo cientistas de diversos países das
Américas e Caribe, assim como da Europa. Foi patrocinado pela USP, UNESCO,
FAPESP, Fundação Alexandre de Gusmão, do Itamaraty, Secretaria Nacional de
Direitos Humanos, Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, por
109
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
intermédio do Coordenador do Sistema da ONU no Brasil e pelo Consulado-Geral
dos Estados Unidos da América em São Paulo - USIS.

Estruturou-se em Grupos de Trabalho e englobou processo do qual resultou a


Criação da Rede das Américas e Caribe para a Tolerância e Solidariedade,
associada às demais redes regionais da UNESCO. A Rede das Américas encontra-
se em fase preliminar de organização, porém anuncia-se como uma grande
oportunidade de trabalho, que há de florescer. Traz a possibilidade de envolvimento
e participação efetiva de colegas de diversas áreas científicas, discutindo a temática
da tolerância, dos direitos humanos, da ética e da ciência, na perspectiva de
constituir-se em núcleo disseminador de novas iniciativas.

Alguns apontamentos sobre intencionalidade, esperança e o papel da


educação, à guisa de conclusão

Frente à situação em que se encontra a humanidade, onde a miséria de muitos faz a


riqueza de poucos, onde a ameaça da guerra persiste, e se efetiva em vários pontos
do planeta, com os riscos de aniquilação física total da espécie, onde os valores
culturais têm sido homogeneizados gradativamente, em prejuízo da preservação de
tradições às quais se liga a própria dignidade humana, o caminho ditado pela
racionalidade, pela intencionalidade e, sobretudo, pela ética, é aquele que conduz à
construção de um mundo livre, porque justo e fraterno, pela via da solidariedade.

O que poderia ser proposto, então, como relevante, quando se pensa na educação
como fator de transformação dos rumos da espécie humana? Um primeiro aspecto é
destacar, do conceito amplo e de fato indivisível de educação, a sua acepção de
Educação para Direitos Humanos, pauta que está plenamente assimilada como parte
fundamental da formação e consolidação de uma Cultura da Paz, solidificadora de
laços internacionais como os propostos na constituição das Nações Unidas. Quais as
relações entre a educação assim concebida, a temática das minorias e a
possibilidade da consolidação dos direitos humanos? Tomemos algumas sugestões
de Lorenz, combinando-as às experiências decorrentes de nosso trabalho.

110
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
Um primeiro aspecto liga-se à possibilidade da criança e do jovem experimentarem o
prazer da criação. Para tanto, uma área privilegiada é a das Artes, pelo que oferece
em termos de possibilidades criativas e de fruição do belo, elemento recomendado
por Lorenz.

De fato, o desenvolvimento do senso estético pode estar ligado, segundo esse autor,
tanto à percepção de harmonias e desarmonias, e o papel desempenhado pelo ser
humano no estabelecimento das mesmas, quanto ao desenvolvimento da
sensibilidade.

Aqui, Lorenz oferece-nos algumas das mais belas páginas de esperança na


educação e no ser humano. Limitando seu argumento, objetiva e declaradamente, ao
mundo material - não por renegar crenças, mas por considerar ser essa a única
forma de se atingir o que há de universal no ser humano - Lorenz aplica-se em
explicar o valor da compaixão para a espécie humana. Afirma, por exemplo:

"Não reneguemos as dores que nos são causadas pela compaixão. (...) O sofrimento
é incomparavelmente mais antigo do que a compaixão; o sofrimento surgiu, e nisto
não há o que se possa mudar, juntamente com a vivência subjetiva de uma criatura,
juntamente com a inevitável morte de um indivíduo qualquer que ele seja - muitos
milhões de anos antes de surgir a compaixão. (...) Essa característica de
compartilhar dos sentimentos de outra pessoa só existe, com absoluta certeza,
quando um indivíduo se sente ligado a outro por laços de amor. O amor por seres
vivos é uma emoção importantíssima, imprescindível. Pois é esta emoção que
transfere ao homem, a este ser que tudo domina, a responsabilidade pela vida no
planeta. A pessoa responsável não pode 'alijar de si' nem 'reprimir em si' os
sofrimentos de outras criaturas, sobretudo em se tratando de outras criaturas
humanas, suas semelhantes. Assim, não é nada fácil sua tarefa".[14]

Neste sentido, Lorenz acentua que uma das formas com as quais se evita a
compaixão é "desviando o olhar" - como se diz popularmente, "o que os olhos não
vêem, o coração não sente". Nesse sentido, Lorenz propõe que a educação aponte
os obstáculos que se colocam à reversão do quadro de auto-demolição em que se
encontra a humanidade, desenvolvendo nas crianças e jovens a capacidade de
111
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
resposta a esses obstáculos. Talvez possamos complementar com a abordagem do
historiador Barrington Moore Jr.., que dá à educação o papel, que me parece
complementar a essa proposta de Lorenz, de desenvolver nos indivíduos imunidades
quanto a perda da capacidade de se indignar. Com base nesses valores, a
discriminação que leva à exclusão passa a ser encarada, sempre, como alvo de
indignação, enquanto todos aqueles que sofrem a exclusão são percebidos com
compaixão, ou seja, com a capacidade de sentir como o Outro e mobilizar-se por ele.

No mesmo sentido, podemos propor, com Lorenz, uma revalorização dos valores,
onde se comece, por exemplo, por revalorizar a verdade, em contraposição a uma
linguagem que adotou a mentira como forma de obter vantagem na competição.
Sobretudo, que se possa revalorizar o ser humano, cada ser humano que vive sobre
a face do planeta, colocando a serviço da vida humana, digna e autônoma, todos os
esforços de reorganização jurídica internacional e internamente, em cada nação.

Ao tratar desses valores que aos poucos a Humanidade viu serem perdidos no
horizonte do desenvolvimento tecnológico e do ritmo frenético de mudança, Lorenz
assemelha-se a Allen Wheelis, autor que propõe retomarmos o contato com as
gerações passadas, para recapturarmos o senso de tempo - tema no qual as
tradições religiosas, em particular de minorias, têm prática acumulada.

As propostas de Lorenz podem também ser compostas com as do já citado Grahame


Clark - mostrando que a preservação de valores das diversas tradições é
indispensável à preservação da própria espécie humana. É Clark quem alerta, ainda,
que se uma mão carrega a preservação, a outra deve levar o esforço de preservá-la
de si mesma, evitando a fossilização, o que se faz, apenas, com a permeabilidade a
outras tradições e adaptabilidade aos diferentes momentos. Um desafio, portanto.

Destacamos, ainda, com Lorenz e outros autores, como Bachelard, a necessidade


de uma atitude epistemológica de humildade, frente à aceitação dos limites do
conhecimento humano. A transformação da espécie humana e a transformação do
indivíduo colocam-se, assim, como renovação, tanto para sua investigação, quanto
para sua prática da agenda educacional - algo tão antigo quanto a própria
humanidade.
112
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
É preciso lembrar que esse aspecto ligado à sensibilidade e à afetividade,
complementa-se com uma perspectiva ética. Nesse sentido, a análise de Emmanuel
Levinas é muito oportuna, porque reúne, analiticamente, o que é indissociável
eticamente, ou seja autonomia e alteridade. Sua reflexão sobre tal indissociabilidade
segue assim:

"a coletividade em que eu digo 'tu' ou 'nós' não é um plural de 'eu'. Eu, tu, não são
indivíduos de um conceito comum. Nem a posse, nem a unidade do número, nem a
unidade do conceito me ligam a outrem. Ausência de pátria comum que faz do Outro
- o Estrangeiro; o Estrangeiro que perturba o 'em sua casa'. Mas o estrangeiro quer
dizer também o livre. Sobre ele não posso 'poder', porquanto escapa ao meu domínio
num aspecto essencial, mesmo que eu disponha dele: é que ele não está
inteiramente no meu lugar. Mas eu, que não tenho conceito comum com o
Estrangeiro, sou, tal como ele, sem gênero. Somos o Mesmo e o Outro. A conjunção
'e' não indica aqui nem adição, nem poder de um termo sobre o outro".[15]

Nessa proposição que reúne, em uma mesma prioridade - porque intersecção


ontogênese e filogênese - autonomia, alteridade, compaixão, em resumo, ética e
sensibilidade, expressa como compaixão, é que podemos depositar esperança no
papel a ser desempenhado pela educação para o nosso tempo e do lugar central
desempenhado pelas minorias, em particular étnicas e religiosas, como consciência
da riqueza cultural que é a diversidade humana.

Bibliografia

Adorno, T. et alii - The Authoritarian Personality, New York, Harper and Brothers,
1950.

Adorno, T. & Horkheimer, M. Dialética do esclarecimento, 2ª ed., Rio de Janeiro,


Jorge Zahar, 1985.

Arendt, Hannah. Origens do Totalitarismo, São Paulo, Perspectiva, 1982.

Baudrillard, Jean. À sombra das maiorias silenciosas - o fim do social e o surgimento


das massas. São Paulo, Brasiliense, 1985.

Bobbio, Norberto. A era dos direitos, Rio de Janeiro, Campus, 1992

113
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
Castoriadis, Castoriadis. A instituição imaginária da sociedade, Rio de Janeiro, Paz e
Terra, 1982

Habermas, Jürgen - ―Ciência e técnica como ideologia‖, in Pensadores XLVIII, São


Paulo, Abril, 1975

Lafer, Celso. A reconstrução dos direitos humanos, 1ª reimpr., São Paulo,


Companhia das Letras, 1988.

Lorenz, Konrad. A demolição do homem - crítica à falsa ideologia do progresso, São


Paulo, Brasiliense, 1988.

Marcuse, Herbert - A ideologia da sociedade industrial - O homem unidimensional, 6ª


ed., Rio de Janeiro, Zahar, 1982

Moore-Jr.., Barrington. Injustiça - as bases sociais da obediência e da revolta, São


Paulo, Brasiliense, 1987

Weber, Max. Ensaios de Sociologia, 5ª ed., Rio de Janeiro, Guanabara, 1982.

NOTAS

[1] Moore-Jr.., Barrington. Injustiça - as bases sociais da obediência e da revolta, São


Paulo, Brasiliense, 1987, p.96.

[2] idem, ibid.,pp. 136-137.

[3] idem, ibid., p. 139. Moore Jr. enfatiza, na seqüência de sua argumentação, que há
boas razões para se considerar que o inverso também ocorra, ou seja, que basta um
único apoio para que um julgamento incorreto seja consolidado.

[4] Idem, ibid, pp. 140-144.

[5] Esclarecido, aqui, no sentido adotado por Adorno e Horkheimer. Cf. Adorno, T. &
Horkheimer, M. Dialética do esclarecimento, 2ª ed., Rio de Janeiro, Jorge Zahar,
1985.

[6] Apenas para citar alguns autores que t6em lidado com a temática, além de Paulo
Freire e teóricos que têm partilhado de seu pensamento, convém lembrar Michael
Apple, Henry Giroux, apenas para ficarmos em alguns nomes exemplificativos dessa
preocupação na educação.

[7] Esse tema também aparece em Arendt, Hannah. Origens do Totalitarismo, São
Paulo, Perspectiva, 1982.

[8] Moore Jr.. baseia-se em Piaget e Kohlberg, além do aqui citado Adorno.

114
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
[9] Essa discussão foi apresentada pela primeira vez pela autora no texto inicial do
projeto vitorioso ‖Discriminação, preconceito, estigma: relações de etnia entre
crianças e adolescentes em escolas de São Paulo e no atendimento à saúde‖, como
parte do concurso de bolsas individuais promovido por The John D, and Catherine T.
MacArthur Foundation, Chicago, processo iniciado no Brasil em novembro de 1993, e
que serviu como base para consolidar uma proposta de trabalho de um grupo que se
empenha coletivamente na temática, em campo social, desde 1990.

[10] Deleuze, in Foucault,1984: 69-70

[11] Bachelard, 1984: 166

[12] Kuhn, 1987: 71

[13] Kuhn, 1987: 91

[14] Lorenz, K. - op. cit., pp.199-200. Uma análise da questão da identidade,


incluindo a ação do indivíduo e da escola, está no capítulo 4.

[15] Levinas, Emmanuel - "Totalidade e infinito", Lisboa, Edições Setenta, 1988, pp.
26-27.O aprofundamento desta proposta, incluindo implicações epistemológicas, é
assunto do "apêndice prospectivo" deste trabalho.

* Roseli Fischmann é doutora e livre docente pela USP, professora da Pós-


Graduação em Educação da USP. Foi visiting Scholar da Harvard University.
Presidente do Júri Internacional do Prêmio UNESCO de Educação para Paz, Paris
(1999-2002). Expert UNESCO para a Coalizão de Cidades contra o Racismo, a
Discriminação e a Xenofobia.

115
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
Revista Latino-Americana de Enfermagem
versión impresa ISSN 0104-1169
Rev. Latino-Am. Enfermagem v.4 n.1 Ribeirão Preto ene. 1996
doi: 10.1590/S0104-11691996000100007

PENSANDO A ESPIRITUALIDADE NO ENSINO DE GRADUAÇÃO


I
Maria Antonieta Benko ;
II
Maria Júlia Paes da Silva
I
Enfermeira.
Técnica Especializada Nível Superior do Departamento de
Enfermagem Médico-Cirúrgica da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo
II
Enfermeira.
Professora Doutora do Departamento de
Enfermagem Médico-Cirúrgica da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo

RESUMO

O presente trabalho teve como objetivo verificar a opinião dos docentes de


enfermagem sobre a espiritualidade e a assistência espiritual no ensino de
graduação, identificando sua presença no ensino atual e propondo aspectos para a
sua abordagem junto aos alunos. Foram entrevistados 24 docentes durante o mês de
novembro de 1994 e 95,8% responderam considerar o homem um ser espiritual,
citando diferentes maneiras de como essa dimensão altera e influencia seu dia-a-dia;
66,6% referiram ser importante o ensino da assistência espiritual na graduação.
Frente a diversidade dos conceitos e respostas ficou evidenciada a necessidade de
reflexão conjunta.

Descritores: espiritualidade, assistência espiritual

ABSTRACT

This article aimed at identifying the opinion of nurses' teachers about spirituality and
spiritual assistance within their education program, as well as its presence in courses
and their suggestions about spiritual aspects to be included. 24 teachers were
interviewed during November 1994; 95,8% of them thought the human being to be a
spiritual being, mentioning ways this dimension alter and influences daily life; 66,6%
of the teachers thought about the importance to include spiritual assistance within
116
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
their educational program. In the light of the variety of answers the authors
emphasize the importance to reflect about this subject.

Descriptors: spirituality, spiritual assistance

RESUMEN

El presente trabajo tuvo como objetivos verificar la opinión de docentes de


enfermería sobre la espiritualidad y la enseñanza de la asistencia espiritual en los
cursos de pre-grado, identificando su presencia en la enseñanza actual y
proponiendo aspectos para su abordaje con los alumnos. Fueron entrevistados 24
docentes durante el mes de noviembre de 1994 y 95,8% consideran el hombre cómo
un ser espiritual, citando diferentes maneras de cómo esa dimensión altera e influye
en su día a día, 66,6% hicieron referencia a la importancia de que la asistencia
espiritual sea abordada en el pre-grado. Frente a la diversidad de los conceptos y
respuestas se hizo evidente la necesidad de reflexiones conjuntas.

Descriptores: espiritualidad, asistencia espiritual

" Ensino é o nosso modo próprio de viver e o corpo é a expressão do espírito dentro do tempo"
Leonardo Boff

INTRODUÇÃO

O conceito espiritualidade continua sem uma definição aceita por todos, apesar de
nos últimos anos encontramos cada vez mais bibliografias e fóruns de discussão
sobre o tema. Muitos profissionais de saúde procuram estudar e implementar este
conceito enquanto outros ainda são céticos e acham que esta não é uma questão
científica. A enfermagem sempre teve na suas prática a preocupação de assistir o
cliente nas suas necessidades espirituais, porém tem tido dificuldade em diferenciar
a espiritualidade dos aspectos religiosos e psicossociais do indivíduo (ATKINSON &
MURRAY, 1985; DANIEL, 1983).

A tendência crescente da enfermagem em ver o indivíduo numa perspectiva holística


gera questionamentos sobre sua assistência nessa dimensão. O preceito básico do
117
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
holismo pe que o todo individual (corpo, mente e espírito) é mais do que a soma de
suas partes, essas dimensões interagem e assim, tratando uma delas, as demais
serão afetadas. Embora esta interdependência exista, as intervenções de
enfermagem são escolhidas e implementadas segundo as alterações associadas a
cada dimensão.

A dimensão espiritual é uma parte integrante do indivíduo, sendo importante para os


enfermeiros avaliá-la e nela intervir quando necessário. Entretanto, essa dimensão
deve ser diferenciada do aspecto religioso do indivíduo e do seu comportamento
psicossocial. Para diferenciar esse aspecto é importante que hajam estudos que
definam a espiritualidade através de reflexões onde sua especificidade seja levada
em conta.

Segundo DIAZ (1993), possivelmente a maior ameaça para a ampla aceitação da


saúde espiritual, como uma área de estudo legítima, é o impacto do cientificismo nas
disciplinas de saúde. A visão de mundo que prevalece nas disciplinas de saúde tem
raízes no empirismo e nas ciências naturais, que tem como base metodológica, de
alguma forma, o naturalismo (a visão de que todos os fenômenos podem ser
explicados com base nas leis e nas causas naturais). Esse autor relembra que, de
acordo com a metodologia naturalista, a ciência nem confirma, nem nega questões
metafísicas, tais como o conceito de espiritualidade.

Em resumo, as metodologias científicas atualmente são legitimamente


fundamentadas no naturalismo metodológico; entretanto, dando-se muita ênfase
nessa visão de metodologia científica, existe o risco de excluir outras epistemologias
as quais podem servir de um legítimo ponto de partida para o estudo das realidades
espirituais. Consideramos que, talvez seja a hora dos profissionais de enfermagem
ajudarem a abrir esses caminhos para uma nova epistemiologia, e que reconheçam
a possibilidade de uma realidade metafísica que não limita na verificação apenas por
meios empíricos.

Enblem apud HANSEN (1993) mostrou que na literatura da enfermagem,


espiritualidade e religião são usadas como sinônimos, porém os dois não tem
necessariamente as mesmas características. Religião é uma crença no sobrenatural
118
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
ou numa força divina que tem poder sobre o universo e comanda a adoração e a
obediência, um código abrangente de ética e filosofia; espiritualidade é uma
qualidade mais ampla do que religião. Uma pessoa não tem que pertencer a uma
religião organizada para alcançar o espiritual. Podemos definir espiritualidade como
uma força unificadora que não tem como propósito aumentar a vida de uma
pessoa, mas facilitar seu desenvolvimento, dar uma orientação à realidade na
vida diária e um significado para a sua existência, independente de sua
profissão religiosa. (HANSEN, 1993)

De qualquer modo, parece mais fácil para os enfermeiros discutir o aspecto espiritual
quanto há uma doutrina religiosa concreta e identificada, em vez de uma rede
abstrata e obscura guiando essa dimensão dos indivíduos. Pode parecer que,
satisfazendo rituais associados a uma religião particular, os enfermeiros estejam
atendendo plenamente as necessidades espirituais do cliente.

A formação do enfermeiro reforça a ênfase nessa hipótese, provendo uma introdução


superficial dos ritos e crenças religiosas na maioria dos livros de fundamentos de
enfermagem. A conseqüência disto, é que conhecendo as práticas específicas de
várias religiões, os enfermeiros consideram entender a natureza espiritual dos
indivíduos julgando-se habilitados para atender as necessidades espirituais. O
mesmo pode ser dito da política hospitalar e de procedimentos como batismo,
comunhão, dieta alimentar, entre outros. (HANSEN, 1993)

Quando a dimensão espiritual é considerada apenas no contexto religioso, as ações


dos enfermeiros tornam-se padronizadas e não necessariamente individualizadas
para as necessidades do cliente. Essa maneira de cuidar torna-se problemática
quando o mesmo não é ligado a uma religião e nem acredita em Deus, num ser
supremo, ou mesmo quando a sua espiritualidade não está ligada à prática da
religião. Ao igualar a dimensão espiritual com a prática de doutrinas religiosas, o
enfermeiro pode estar reduzindo a dimensão espiritual.

A dimensão espiritual pode, muitas vezes, ser incorporada a dimensão psicossocial


(mente) o que além de torná-la superdimensionada, subordina-a às teorias
psicossociais, que não contemplam totalmente o aspecto abstrato, inerente à
119
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
dimensão espiritual. A indefinição dessas dimensões pode levar a uma rejeição da
dimensão espiritual, uma vez que a interpretação das necessidades psicossociais é
fortemente influenciada pela estreita relação da enfermagem cm a psiquiatria, que
tem discutido o papel da religiosidade no desenvolvimento de várias psicopatologias.
Se a religiosidade é percebida como parte de alterações psiquiátricas do cliente, a
equipe reluta em atender essas necessidades que envolvem aspectos da assistência
espiritual (HANSEN, 1993)

Por outro lado, os enfermeiros parecem considerar esta área profundamente pessoal
e por este motivo evitam intervir. Embora relutar em discutir referências espirituais
com os clientes, não seja o mesmo que negar, o resultado é o mesmo, pois nas duas
situações nenhuma identificação clara desta dimensão é feita, como também
nenhuma tentativa para a sua compreensão.

Em resumo, a espiritualidade apesar de estar estreitamente ligada à religião e à


dimensão psicossocial do ser humano, é diferente e única. Porém, o que a torna
única não está bem elucidado. DANIEL (1983); DIAZ (1993); HANSEN (1993) E
ROBINSON (1994) são exemplos de estudiosos que se preocupam em introduzir na
área da saúde a espiritualidade como uma dimensão legítima de estudo e pesquisa.
Consideram que a falta de um consenso para a definição da espiritualidade ou saúde
espiritual deve ser visto como parte de uma evolução normal de uma área de estudo
nova e emergente não como uma deficiência significativa.

A NANDA (North American Nursing Diagnosis Association) é uma organização de


enfermagem que desde 1982 tem buscado identificar, validar e classificar as
entidades clínicas nas quais o enfermeiro intervem. Ela aborda diretamente o
aspecto espiritualidade no padrão de resposta humana VALORAR. Nesse padrão o
único diagnóstico de enfermagem já identificado e aceito para testes clínicos e o de
"Angústia Espiritual". Um conceito de espiritualidade emerge da definição desse
diagnóstico que é: "o princípio de vida o qual permeia todo o ser de uma pessoa,
íntegra e transcende sua natureza biológica e psicossocial" (FARIAS et al, 1990).

Quando uma pessoa é confrontada com uma crise ou doença, ela pode sentir
ameaçada a sua totalidade pessoal e seu bem estar. Não faz diferença a dimensão
120
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
de vida que essa alteração atinge, porque o corpo, a mente e o espírito estão unidos
de forma que, o que afeta uma dimensão, afeta também as outras. O sofrimento e a
doença freqüentemente forçam a pessoa a encarar assuntos relacionados ao
significado da vida; face à uma situação de crise, ela pode ser confrontada com a
realidade de sua existência, relações consigo mesma, com os outros, com Deus e
talvez até com sua própria morte. Confrontada com tais crises é que, segundo a
NANDA (1989), a pessoa pode apresentar sinais de angústia espiritual, pois, essas
alterações colocam à sua vista a limitação a que todo ser humano está sujeito.

Diante dos aspectos citados e pelo fato de estarmos vivenciando a reformulação do


currículo do curso de graduação da Escola de Enfermagem da Universidade de São
Paulo (EEUSP), várias questões a permearam, entre elas a necessidade da
enfermagem fundamental discutir a especificidade do aspecto subjetivo (mente-
espírito) e objetivo (corpo) do ser humano. Neste novo enfoque, a espiritualidade é a
dimensão menos estudada, pois além de não termos um fórum específico de
discussão sobre essa temática, ela é incorporada aos outros aspectos de
atendimento do paciente e não possui uma estrutura conceitual desenvolvida no
paradigma vigente.

Por não termos claro como o tema é concebido na Escola de Enfermagem, achamos
importante antes de redigir um texto básico para o aluno, identificar a concepção da
escola para que servisse de subsídios na condução do tema. Motivadas para
caracterizar alguns aspectos da espiritualidade entre os docentes da instituição, e
por considerarmos que esse tema merece uma reflexão mais profunda, é que este
estudo foi realizado, com os objetivos expostos a seguir.

OBJETIVOS

- Verificar a opinião de docentes de enfermagem do terceiro grau sobre o aspecto


espiritualidade no ser humano.
- Verificar a importância deste item para esses docentes no ensino de enfermagem e
sua existência no ensino atual.
- Propor estratégias para abordagem da assistência à dimensão espiritual junto aos
alunos da graduação de enfermagem.
121
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
MATERIAL E MÉTODO

A população deste estudo foi constituída por 24 docentes alocados nos diferentes
departamentos da EEUSP. Esse total equivale a 30% dos docentes da instituição e,
essa mesma porcentagem foi mantida nos quatro departamentos existentes. A
escolha dos docentes foi aleatória tomando-se apenas o cuidado de ter a
representação de docentes de todas as disciplinas dos diferentes departamentos.

A coleta de dados transcorreu durante a última semana do mês de novembro de


1994, através da entrega do instrumento de coleta de dados (anexo) par que o
docente respondesse na hora, preferencialmente. As autoras do presente trabalho é
que coletaram pessoalmente as informações.

O instrumento de coleta de dados (Anexo I) constou de sete questões que tiveram o


intuito de ver o posicionamento pessoal do docente frente ao tema espiritualidade a
opinião a respeito do ensino dessa temática.

APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS

Dos 24 docentes pesquisados, 17 (70,8%) referem ter religião, sendo citada a


religião católica por 12 deles (algumas praticantes, outros não), 2 citaram o
espiritismo, 1 a religião protestante, 1 a umbanda e 1 referiu que o significado de
religião é estar religada a Deus e por isso não tem seita específica. Sete (29,2%)
referiram não ter religião alguma.

Quando questionados se o homem é um ser espiritual, 23 (95,8%) afirmaram que


sim, tendo apenas um docente que considera o homem como um ser não-espiritual.
Isto, a nosso ver, configura um ambiente propício para a discussão na EEUSP a
respeito desse tema de forma que exista maior esclarecimentos e coerência na
abordagem do assunto junto aos alunos.

Ao serem indagados sobre a existência de "coisas" espirituais importantes para si


mesmo, vários questionaram o que era "coisa" espiritual, sendo explicado que o
objetivo das autoras foi deixar a pergunta bastante ampla, permitindo que cada um
se posicionasse inclusive com relação ao que, eventualmente fosse "coisa" espiritual
122
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
para si. Dos 24 docentes, 21 (87,5%) afirmaram que existem "coisas" espirituais
importantes, um (1) respondeu "não sei" e 2 responderam que não existem.

Citaram "coisas" espirituais importantes sentimentos que vivenciam no dia-a-dia a e


que identificam como sendo gerados pelo fato do homem ser espiritualizado:
solidariedade (3 citações), amor (2), fé (2), respeito ao outro (2), alegria (1), harmonia
(1). Outros docentes se referiram a "coisas" espirituais, ligando-as com práticas ou
rituais religiosos como: prática de meditação (2), missa (1), oração (1), atuação em
comunidade cristã (1) e mesmo a discussão sobre temas como origem da vida e
transcendência. Também foram citados nessa questão Deus (4), a alma (3), Cristo
(1), Nossa Senhora (1) e a explicação de que todas as situações são permeadas por
"coisas" espirituais * .

Questionados sobre como essas "coisas" espirituais os ajudam e em que situação,


11 dos docentes (45,8%), referiram que em todas as situações do dia-a-dia,
exemplificando que isso influi na forma de se relacionem com as pessoas (alunos,
família, pacientes, equipe) e pela consciência de fazer parte de um todo universal.
Outros 10 docentes (41,6%) afirmaram que em algumas situações específicas essas
"coisas" o ajudam, por exemplo, nos momentos de stress, de estar diante de um fato
novo que demanda muita energia, nas situações "difíceis", de depressão, sofrimento,
conflitos, na compreensão da morte. Dois (2) docentes referiram que essas "coisas"
espirituais auxiliam no próprio desenvolvimento pessoal, e um (1) que, na medida em
que vamos nos ligando mais a Deus, o significado de todas as "coisas", inclusive do
que é espiritualidade, se modifica.

As opiniões apontam por um lado, para a importância de não serem padronizados os


conceitos e as expressões espirituais e, por outro, nos dá a abrangência de como
vários aspectos interagem/interferem com o espiritual. A discussão sobre esses
aspectos auxiliaria o docente no desenvolvimento de uma linguagem comum que
facilitasse o debate dessa temática com o aluno - em campo ou em sala de aula -
pois os próprios docentes afirmam que essas "coisas" ajudam, de uma forma ou de
outra, no quotidiano da vida, na maneira de encará-la e vivê-la ou mesmo no próprio
desenvolvimento pessoal.

123
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
A definição do que é espírito segundo os docentes entrevistados pode ser vista no
quadro 1.

Pelo quadro 1 podemos perceber 8 referências (33,3%), com sendo a essência do


ser humano ("o que nos integra"); 7 (29,2%) como sendo "algo maior", diferente da
alma, (algo etéreo, não palpável, que transcende a matéria); 6 referências (25%),
como sendo energia ("uma força que existe nos seres vivos, que vitaliza as
pessoas"); 6 (25%) citam espírito como alma ou como algo que se desenvolve em
várias vidas, portanto imortal; 3 (12,5%) referindo ser algo sentido, um "pensar
interior que cresce em função da vivência" e se confunde com o "eu interior",
permitindo que se desenvolvam valores como respeito, humanidade pessoal; 3
(12,5%) fazem referência ao aspecto ético que é desenvolvido quando se cresce
espiritualmente, pois influencia os sentimentos e comportamentos que se têm com os
outros e desenvolve-se os valores ligados a respeito e humanidade; 2 responderam
"não sei" e houve uma resposta afirmando que espírito é estar em harmonia com a
natureza e outra, algo que a maioria das pessoas acredita. Essa diversificação na
forma de caracterizar essa dimensão do ser humano dificulta a especificação desse
aspecto no atendimento de enfermagem. Debates e discussões podem auxiliar os
docentes a se sentirem mais seguros, tornando possível o ensino do cuidado relativo
à dimensão espiritual.

124
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
Com relação a importância do ensino da assistência espiritual na Enfermagem, 16
(66,6%) consideram importante; 4 (16,6%) não consideram importante e 4 (16,6%)
não sabem se é importante essa discussão no ensino. Dos que consideram este
conteúdo importante, alguns justificam que ele nos torna mais humanos; facilita a
aproximação entre os indivíduos e torna a assistência de enfermagem também mais
humana.

Lembramos que apesar de toda a discussão filosófica a respeito da definição de


espiritualidade, a NANDA (1989) propões uma definição que pode ser ponto de
partida e que respeita a especificidade dessa dimensão, possibilitando a aplicação
do conceito na prática e conseqüentemente, estudos dessa prática. Roteiros que
avaliam a dimensão espiritual já foram desenvolvidos por vários estudiosos do tema,
entre eles podemos citar Stool apud McFARLAND; McFARLANE (1989) que focaliza
quatro aspectos específicos a serem pesquisados no cliente: seu conceito de Deus
ou Divindade; a fonte de sua força e esperança; o significado das práticas e rituais
religiosos e a relação percebida entre as crenças espirituais e se estado de saúde.
O'Brien apud McFARLAND; McFARLANE (1989) considera que no atendimento do
paciente é necessário avaliar as crenças espirituais gerais, crenças espirituais
pessoais, identificação com a religião institucionalizada, sistemas e rituais de apoio
espiritual ou religioso e déficit ou angústia espiritual.

A possibilidade do paciente receber a assistência espiritual em decorrência da


avaliação por um instrumento adequado a esta dimensão, juntamente com um
profissional devidamente sensibilizado para esse aspecto, são justificativas para o
estudo desse tema, mesmo sem uma definição amplamente aceita.

Por este aspecto da assistência de enfermagem mais citado do que exercido,


podemos inferir que isto dificulte o posicionamento do docente no seu ensino. É
importante salientar que 16,6% dos docentes não consideram importante o seu
ensino, o que a nosso ver, pode se tomar expressivo se somarmos os outros 16%
que referem não saber se é importante.

Sobre "como" ensinar, 8 referências (33,3%) são relacionadas a reflexões junto ao


aluno sobre: o que é espiritualidade e sua importância, a necessidade de despertar
125
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
no aluno esse aspecto da vida; levantar suas crenças e valores a respeito desse
assunto; sensibilizá-lo a dar abertura para que o paciente manifeste esta
necessidade, pois este aspecto pode ser importante para o doente; desenvolver o
respeito pela espiritualidade do paciente; 3 docentes referiram temas relacionados a
religião: aulas teóricas sobre as mais variadas religiões, discussão com pessoas de
diferentes religiões; e, outros 3 sugeriram a discussão com o aluno do ser humano
numa visão holística e social (interacionista); conceitos teóricos básicos sobre
espiritualidade, rever os estudos já existentes na enfermagem a respeito do tema, ou
mesmo ter uma disciplina específica na graduação sobre a questão do morrer e da
morte e a assistência de enfermagem. Dois (2) docentes, apesar de acharem
importante o ensino desse conteúdo, não saberiam como abordá-lo.

Dos outro quatro (4) docentes que responderam esta questão afirmando não saber
se este conteúdo deve ser abordado na EEUSP, um (1) o considera importante na
formação do enfermeiro; outro (1), que deve ser ministrado se tiver ressonância
direta na assistência de enfermagem; um (1) que a espiritualidade não pode ser
ensinada, pois é uma questão mais ampla, onde cada um segue um caminho, tem
um entendimento, uma vivência e, que o ensino talvez, seja unir o conhecimento
técnico-científico com o respeito ao outro; e um (1), não tinha opinião formada a
respeito.

Dos quatro (4) docentes que não acham importante o ensino da assistência espiritual
na EEUSP, 3 não justificaram o porquê e 1 docente explicou que este assunto já está
incluído no tema comunicação e "técnicas curativas internas" (exemplo, brinquedo
para criança).

Quando questionado sobre o fato de abordar este aspecto na própria disciplina


ministrada, 15 (62,5%) dos docentes abordam esse assunto e 9 (37,5%) não
abordam. Dos que abordam, 10 (41,6%) referiram ser em situação de campo de
estágio, a partir de problemas identificados no paciente ou no aluno; 7 (29,1%)
consideram que abordam o tema através da própria postura ou filosofia de vida; 2 em
situações específicas, como discussão de batismo em recém-nascido de alto risco e
na visita pré-operatória. Dos 9 docentes que afirmaram não abordar esse assunto, 4

126
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
acabaram citando situações que demonstram que, na verdade, discutem a temática
com os alunos de maneira informal, 3 quando surgem questionamento do aluno ou
paciente, e 1 na assistência perinatal e no nascimento.

DIAZ (1993) recomenda que o ensino do cuidado à espiritualidade deve ter a


precaução de não converter ou ter essa pretensão, que deveria ser mais no sentido
de guiar os estudantes ou clientes em direção ao próprio entendimento e experiência
pessoal, dentro de um paradigma da saúde espiritual. Outro aspecto seria diferenciar
entre religião e espiritualidade, considerando como ponto principal, o fato de que
espiritualidade nem exclui nem é exclusivo do religioso. Goodle e Arriola apud DIAZ
(1993) sugerem ainda, que o educador de saúde tem que: primeiro reconhecer e
respeitar a diversidade cultural do estudante e a existência de uma estrutura de
crença espiritual; e segundo, reconhecer e respeitar a diversidade de percepções do
estudante a respeito de saúde e saúde espiritual.

DIAZ (1993) identifica três argumentos para questionamentos que aparecem


freqüentemente contra a abordagem da espiritualidade no ensino e, contra
argumenta afirmando ser uma área de ensino necessária para os profissionais de
saúde. O argumento contrário a ser uma dimensão sem definição, ele contesta
considerando como etapa do desenvolvimento atual da temática e ser um problema
próprio de um conhecimento emergente. Com relação ao argumento de poder
considerar a espiritualidade como dimensão incorporada ao aspecto psicológico,
aponta para o fato que este aspecto não contempla a sua especificidade. Finalmente,
a crítica de que o ensino da espiritualidade é invasivo à separação formal Igreja-
Estado, argumenta que a espiritualidade é diferente de religião, que o objetivo não é
a conversão do aluno a uma determinada crença, mas que seja auxiliado na
identificação de seu próprio referencial teórico.

Esse mesmo autor considera importante que se analise o aspecto de uma


metodologia científica própria, onde seja respeitada a dimensão metafísica do
conhecimento em questão, pois é provável que estejamos trabalhando com um
paradigma ainda novo para o nosso atual conceito do que é ciência (DIAZ, 1993).

127
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
A existência do diagnóstico de Angústia Espiritual na classificação dos diagnósticos
de enfermagem, é outro argumento forte para que esta dimensão adquira a sua
especificidade, para evitar erros de avaliação e conseqüentemente, de intervenção
de enfermagem.

Como conclusão do questionário, foi perguntado se gostariam de registrar algo mais


a respeito do assunto e 12 (50%) dos docentes fizeram comentários relativos a:
ensino-aprendizagem da espiritualidade (10 citações), complexidade do assunto (3) e
abordagem desse aspecto junto ao paciente (2). Por considerarmos ricas as
reflexões feitas pelos docentes, transcrevemos a seguir suas falas:

- Com relação ao ensino-aprendizagem da espiritualidade:

"Caso fossem organizados grupos de discussão, ou melhor, de reflexão, (não sei que
modalidade), gostaria de estar participando para o meu crescimento".

"Discutir sobre a palavra respeito ao que sou, ao que o outro é, ou melhor, o que é
santificar, ou seja, ser e ajudar o outro a ser saudável, íntegro, isto é ser em Deus".

"Importante a iniciativa de começar uma discussão a este respeito, porque o ensino


não pode ser prescritivo e ao mesmo tempo, não pode provocar vergonha de
assumi-lo".

"Talvez fosse interessante um aprofundamento dessas questões espirituais na


EEUSP através de momento conjunto de reflexões com pessoas capacitadas para
tanto".

"Vejo a espiritualidade como um dos elementos culturais de cada ser e portanto, uma
abordagem a ela seria reconhecê-la, aceita-la, permitir e facilitar sua expressão e
nunca impor crenças ou receitas".

"Esse tema é imprescindível ao currículo de graduação em enfermagem".

"Extremamente importante no curso de graduação em enfermagem (essa temática)".

128
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
"Creio que a melhor estratégia seria a discussão com pessoas de várias religiões e
das mais diversas atuações na prática".

"Espero que, algum dia, possamos ter a espiritualidade como ponto de partida e não
como fim".

"Acredito que espiritualidade e seu ensino não fazem parte do conteúdo de ensino de
enfermagem, reconhecendo que esse é um aspecto que faz parte da necessidade de
diversas pessoas; ele deve ser levantado como problema de enfermagem, que a
enfermagem em si não precisa e nem tem condições de atender, mas pode
encaminhar. Pode ser exercido entre profissional e cliente que apresentem crença
semelhante, mas não como prática formal".

- Com relação à complexidade do assunto:

"Sem dúvida nenhuma esse foi o questionário mais difícil (que já respondi) por que
não é fácil expressar estas coisas".

"O assunto é muito complexo, não acredito ter conseguido explorá-lo nestas
questões".

"Achei muito difícil responder as questões objetivamente".

- Com relação ao paciente:

"Dependendo da situação do paciente, essa pode ser uma questão que tenha que
ser lidada".

"Tenho tido oportunidade de trabalhar estes aspectos, mesmo que parcialmente, com
doentes, mais do que com aluno".

CONCLUSÃO

É indiscutível que a população de docentes da EEUSP reconhece a dimensão


espiritual do ser humano, assim como aspectos de espiritualidade que interferem na

129
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
sua vida, condições que, inegavelmente, propiciam um ambiente adequado ao
posicionamento dessa instituição com relação ao tema.

Verificamos que 95,8% dos docentes acreditam que o homem é um ser espiritual,
citando diferentes maneiras sobre como essa dimensão altera e influencia o seu dia-
a-dia, desde no relacionamento com os outros e com a natureza até no próprio auto-
conhecimento; portanto, podemos afirmar que a espiritualidade é importante para a
população pesquisada.

Dezesseis docentes (66,6%), dos 24 entrevistados consideram importante o ensino


da assistência espiritual no curso de graduação em enfermagem, justificando esse
posicionamento com diversos argumentos e dando sugestão de como esse ensino
pode ocorrer. Dentre as propostas feitas podemos citar: reflexões junto ao aluno
sobre o que é espiritualidade e sua importância para o homem; identificar suas
crenças, valores sobre esse assunto, ministrar aulas teóricas com um panorama das
diferentes religiões, entre outras.

Quanto a existência desse tema no ensino atual, 15 docentes (62,5%) referiram


abordar o assunto de diferentes formas: em campo de estágio, através da própria
postura ou filosofia de vida, em situações específicas; porém dos 9 docentes (37,5%)
que afirmaram não abordar o assunto, 4 citam situações informais que demonstram
sua presença no ensino. Podemos inferir, portanto, que 19 docentes (79,1%)
abordam esse tema, sendo que nenhum deles referiu um momento formal para a
discussão desse assunto, o que nos leva a crer que o mesmo é abordado de
maneira assistemática e talvez não instrumentalize o aluno.

Com relação ao terceiro objetivo do trabalho, consideramos que a organização de


um fórum de discussão sobre espiritualidade possibilitaria aos docentes desenvolver
uma terminologia comum que os auxiliasse a expressar o assunto e a reflexão de
estratégias para a sua abordagem no ensino.

A assistência espiritual deve ter um momento formal de ensino, onde pe necessário o


cuidado para não se pregar a própria opinião sobre o tema, mas direcionar os
estudantes para seu próprio entendimento e experiência pessoal, dentro de um
130
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
paradigma de saúde espiritual. Uma abordagem imparcial respeita e reconhece a
diversidade cultural do estudante e a existência de uma estrutura de crença
espiritual. O docente pode (e deve) utilizar o campo de estágio para detectar essas
diferenças nos indivíduos, estimulando o aluno a expressar suas dúvidas e
percepções, pois desta forma, ambos saem acrescidos, o paciente por não ter
negado essa sua dimensão e o aluno por refletir e clarificar esse aspecto mais sutil
do atendimento.

Talvez, um dos grandes desafios da enfermagem seja o desenvolvimento de


pesquisas sobre o tema, ajudando os profissionais de saúde a abrirem caminhos
para uma nova epistemiologia, que reconheça a possibilidade de uma realidade
metafísica e que não se limita a verificações somente por meios empíricos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Existe falta de clareza também na enfermagem sobre o que é espiritualidade,


religiosidade e assistência espiritual, fato que limita os estudos sobre esse assunto.

Outro aspecto importante é que este tema provoca um questionamento pessoal no


enfermeiro com relação a sua base religiosa, sobre sua concepção de homem e o
sentido de vida; questões que geram conflitos íntimos muitas vezes não conclusivos.

Consideramos que a espiritualidade no homem não se relaciona apenas a momentos


específicos de sua vida, (por exemplo, o momento de morrer), mas envolve um
posicionamento e uma reflexão pessoal sobre o próprio significado da vida.

É necessária a discussão formal dessa temática no ensino de graduação por que o


objeto de trabalho da enfermagem é o ser humano e, nossa visão de homem se
origina no paradigma holístico - a compreensão do homem como um ser bio-psico-
sócio-espiritual. Utilizar as definições da NANDA (1989) e testar os indicadores
propostos para ela para detectar a "Angústia Espiritual" do paciente pode ser um
ponto de partida para uniformizarmos esta linguagem.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

131
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
01. ATKINSON, L. D.; MURRAY, M. E. Fundamentos de enfermagem. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 1985. Cap. 30: A necessidade de
espiritualidade. [ Links ]

02. DANIEL, L. F. Atitudes interpessoais em enfermagem. São Paulo: EPU, 1983.


Cap. 8: A assistência espiritual na enfermagem. [ Links ]

03. DIAZ, D. P. Foundations for spirituality: establishing the viability of spirituality


within the health disciplines. J. Health Educ., v. 24, n. 6, p. 324-26,
1993. [ Links ]

04. FARIAS, J. N. et al. Diagnóstico de enfermagem: uma abordagem conceitual e


prática. João Pessoa: Santa Marta, 1990. [ Links ]

05. HANSEN, T. J. The spiritual dimension of individuals: conceptual development.


Nurs. Diagnosis, v. 4, n. 4, p. 140-46, 1993. [ Links ]

06. McFARLAND, E. K.; McFARLANE, E. A. Nursing diagnosis and intervention.


St. Louis: Mosby, 1989. Cap. 11: Value belief pattern. [ Links ]

07. NORTH AMERICAN NURSING DIAGNOSIS ASSOCIATION. Taxonamy I


Revised 1989: with official diagnostic categories. St. Louis: Mosby,
1989. [ Links ]

08. ROBINSON, A. Spirituality and risk: toward an understanding. Holist Nurse


Pract., v. 8, n. 2, p. 1-7, 1994. [ Links ]

* A partir dessa resposta, o total encontrado é maior que 24 porque houve docente
que respondeu as questões com mais de um item

ANEXO I
Instrumento de coleta de dados
INICIAIS:
DEPTO:
DISCIP.
DATA___/___/___
1. Você tem religião? ___Não ___Sim. Se sim, qual?
2. O homem é um ser espiritual? ___Não ___Sim.
3. Existem coisas espirituais importantes para você? ___Não ___Sim
3.1. Se existem, quais?
3.2. Elas o ajudam? Em que situações?
4. O que é espírito?
5. Você acha importante o ensino da assistência espiritual para a enfermagem? ___Não ___Sim. Se
sim, como?
6. Você aborda esse aspecto na suas disciplina? __Não __Sim. Se sim, como
7. Quer registrar algo mais a respeito desse assunto?

132
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
CONCEPÇÕES DE ENSINO RELIGIOSO DOS DOCENTES DO
ENSINO FUNDAMENTAL DO ESTADO DO PARANÁ —
possibilidades para uma formação de professores

RODRIGUES, Edile M. Fracaro — PUCPR


VOSGERAU, Dilmeire Sant‘Anna Ramos — PUCPR
JUNQUEIRA, Sérgio Rogério Azevedo — PUCPR
Área Temática: Educação: Profissionalização Docente e Formação

RESUMO
O presente artigo apresenta os dados levantados em uma pesquisa de abordagem
qualitativa, de caráter exploratório, que teve como objetivo geral verificar a
concepção de Ensino Religioso dos professores do Ensino Fundamental do Estado
do Paraná. Cada área de conhecimento requer um curso que projete uma formação,
pressupondo um perfil profissional, pois um docente formado por uma determinada
escola de pensamento vai formar segundo esses moldes. Daí a relevância desta
pesquisa. Os autores que deram sustentação teórica para esta investigação foram
JUNQUEIRA, OLIVEIRA, FREIRE, TARDIF, MARCELO GARCÍA, entre outros. 218
documentos recolhidos no Simpósio da SEED em outubro de 2006, na cidade de
Curitiba, deram sustentação para responder a questão problematizadora da
investigação. Por se tratar de um volume grande de documentos coletados, foi
necessária a utilização de um software que possibilitasse a otimização do
levantamento dos dados. A partir dos dados coletados dos professores de
Geografia, Filosofia, Pedagogia e História, foi possível categorizar quatro
concepções de Ensino Religioso: Transmissão e desenvolvimento de valores, moral
e ética, Respostas às questões existenciais, Estudo das tradições religiosas e
manifestação do Sagrado, Área de Conhecimento. Essas concepções se enquadram
em dois modelos de Ensino Religioso: Interconfessional e Fenomenológico. A
análise dos documentos revelou uma mudança significativa para a história do Ensino
Religioso no Paraná, pois os dados sugerem uma superação das tradicionais aulas
de religião e apontam que o professores estão procurando inserir em suas aulas
conteúdos que tratem da diversidade de manifestações religiosas, seus ritos, suas
paisagens e símbolos, suas relações culturais, sociais, políticas e econômicas.

Palavras-chave: Ensino Religioso; Formação de professores; Concepções de


Ensino Religioso.

Introdução
Nos últimos tempos, o interesse dos pesquisadores tem sido o planejamento
de ensino, a avaliação da aprendizagem e do ensino, as crenças e representações
dos professores, os processos cognitivos e decisórios que orientam a ação prática,

133
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
os saberes produzidos pelos professores, suas condições de trabalho, o
envelhecimento, o desgaste profissional etc. (TARDIF e LESSARD, 2005, p.41)
Analisar e pesquisar o campo religioso dentro de sua diversidade a partir de
uma visão mais ampla, incluindo-o e tratando-o como área de conhecimento com
natureza própria como as demais áreas do conjunto curricular, tem sido o desafio do
Ensino Religioso. Grupos de estudos sobre o assunto têm surgido em algumas
regiões do país e a sua atuação tem provocado a reflexão no sentido de uma
mudança de concepção e prática do Ensino Religioso. JUNQUEIRA (1996), LONGHI
(2004), SCHLÖGL (2005); CORRÊA (2006); OLIVEIRA et al (2006), são alguns
desses pesquisadores.
A compreensão da realidade do professor de Ensino Religioso possibilita
verificar como esse profissional tem concebido essa área de conhecimento e qual a
contribuição desse saber para a reflexão pedagógica sobre um homem dotado de
razão, afetividade, inteligência, corpo e desejo. E diante desse quadro, cada vez
mais se percebe a importância da formação dos professores e que a educação, uma
das mais complexas operações humanas, possa também se ocupar da educação de
seus educadores.
Assim, a formação desse profissional da educação carece de uma leitura
crítica das realidades sociais para se buscar os referenciais para a organização e
redirecionamento do seu trabalho em sala de aula. Para Marcelo (1999, p. 11) ―a
formação de professores está a transformar-se numa área válida e complexa de
conhecimento e investigação, que oferece soluções e, por sua vez, coloca
problemas aos sistemas educativos‖.
Essa é a relevância desta pesquisa de abordagem qualitativa, de caráter
exploratório, que apresenta como objetivo geral verificar a concepção de Ensino
Religioso dos professores do Ensino Fundamental do Estado do Paraná. A pesquisa
exploratória, que pode envolver levantamento bibliográfico, entrevista com pessoas
com experiências práticas acerca do tema pesquisado e análise de exemplos que
estimulem a compreensão, tem como finalidade básica desenvolver, esclarecer e
modificar conceitos e idéias para a formulação de problemas mais focados ou
levantamento de hipóteses para pesquisas posteriores (GIL, 1999, p. 43).

134
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
O cenário da pesquisa
Por mais primitivos que sejam, todos os povos têm religião, magia, atitudes
científicas ou ciência. Para Boeing (1999), ―não há época nem espaços humanos
sem religião; não existe vácuo religioso; sua difusão é universal‖ e cada religião
busca oferecer uma orientação global que dê sentido a tudo que nos cerca. Ela cria
valores e normas, estabelece um universo simbólico que aponta para o além do
tangível, do humano e do cotidiano.
Por constituir ―parte integrante da formação básica do cidadão‖ (BRASIL,
1996), a ênfase do Ensino Religioso está na formação cidadã do ser humano,
promovendo o diálogo intercultural e inter-religioso para que seja garantido o
respeito à identidade e à alteridade1.
Mas há que se perguntar: — Precisa-se mesmo do Ensino Religioso? Para
Cortella (2006
p.17-18)
uma criança não compreende a religião, seus dogmas e princípios como
Teologia. No entanto, seu sentimento de religiosidade se aproxima ao
mágico que tem desde sempre. Um menino com 3 ou 4 anos de idade
possui um imaginário magnífico: ele se vê, se pensa, se oferece
superpoderes, lança forças de inimigos ou de amigos fantasiosos. A partir
de 6 ou 7 anos cria maiores bases de racionalidade e entende mais a
relação de causa e efeito do mundo. Ao formar conexões com algumas
questões fortes da vida, como: ―por que isso acontece‖, ―por que não?‖
Essas são formas de espiritualidade e questionamentos que, dependendo
dos pais e docentes, podem ou não ser dirigidas por um canal positivo.

Assim, o Ensino Religioso articulado com as demais disciplinas auxilia na


interação social responsável e atuante, contribuindo ―para a construção de outra
visão de mundo, de ser humano e de sociedade, considerando o religioso como uma
dimensão humana que vai além da superfície dos fatos, acontecimentos, gestos
ritos, normas e formulações‖ (OLIVEIRA et al, 2007, p. 101). Ao lado de outros
campos de saber, o Ensino Religioso pode acrescentar à visão sobre a realidade,
mais um modo de discuti-Ia, principalmente ao adotar uma metodologia pautada na
interdisciplinaridade2.

1 ALTERIDADE é a concepção que parte do pressuposto básico de que todo o homem social interage
e interdepende de outros. A IDENTIDADE é definida pela relação do indivíduo com outros indivíduos,
isto é, cada indivíduo se completa e se efetiva no relacionamento com os que estão à sua volta, em

135
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
seu convívio. Para Junqueira (2008a, p.14) ―a identidade depende de algo fora dela, de uma outra
identidade que ela não é. A identidade é relacional, a diferença é sustentada ao mesmo tempo pela
exclusão e pela solidariedade‖.
2 Segundo o que diz o PCN do Ensino Médio — Parte 1, p. 22 — interdisciplinaridade é a utilização
dos conhecimentos de várias disciplinas na resolução de um problema concreto ou a compreensão
de um determinado fenômeno sob diferentes pontos de vista.

O enfoque interdisciplinar, no contexto educacional, contribui para a reflexão


de uma qualificação do ensino e da pesquisa. Buscar a visão global da realidade
pode possibilitar a transformação da situação social e existencial. Num processo de
reflexão crítica sobre a práxis que estabelece significados, o estudo e a
decodificação do fenômeno religioso no contexto educativo são fatores de
crescimento e de construção coletiva para professores e estudantes.
Para Junqueira et al (2007, p.158), o Ensino Religioso propõe valorizar o
pluralismo e a diversidade cultural presente na sociedade brasileira, facilitando a
compreensão das formas que exprimem o Transcendente na superação da finitude
humana e que determinam o processo histórico da humanidade.
Procurando ampliar a visão sobre o Ensino Religioso, a SEED — Secretaria
de Estado de Educação do Paraná — promoveu um Simpósio na semana de 23 a
26 de outubro de 2006 em Curitiba (PR). Estiveram presentes mais de 350
professores que atuam nessa área do conhecimento. Com o objetivo de verificar a
concepção de Ensino Religioso dos professores do Ensino Fundamental do Estado
do Paraná, foi proposto aos participantes que elaborassem um desenho e uma frase
que expressasse o papel do Ensino Religioso na educação dos alunos.
Foi solicitado também que fossem indicados gênero, formação e tempo de
docência, possibilitando assim levantar o perfil e a formação do professor de Ensino
Religioso do Estado do Paraná.
Buscando uma ferramenta que possibilitasse a associação de texto e imagem
e que comportasse o volume de dados levantados nos 218 coletados, optou-se pela
utilização do software ATLAS.ti. Conhecido como um instrumento eficiente na
análise de questionários com questões abertas e fechadas, bem como na criação de
banco de dados e networks (teias de relações) que possibilitam um panorama eficaz

136
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
para a proposta de toda pesquisa, esse software comprovou também ser versátil na
associação de textos e imagens.

O perfil dos professores


Em relação ao gênero dos participantes desta investigação, 183 professores
informaram esse dado, sendo 22 professores e 161 professoras. Essa amostra é
confirmada por Garcia et al (2005, p. 47): ―Os docentes são uma categoria
amplamente constituída por mulheres, pelo menos no ensino básico‖.
O tempo de docência de 186 professores varia de 1 a 31 anos, sendo que 42
professores indicaram lecionar há mais de 11 anos. Já o tempo de docência no
Ensino Religioso, revela o quanto realmente é jovem essa área do conhecimento,
pois 94 dos 170 professores que forneceram essa informação estavam atuando há
menos de 3 anos no momento da coleta de dados.
A formação dos 176 professores que apontaram essa informação nos
documentos pesquisados é bem variada, não havendo uma formação específica em
Ensino Religioso. A graduação em História foi a mais indicada pelos participantes,
seguida por Pedagogia, Filosofia, Letras e Geografia. Chama a atenção só dois
professores terem formação em Teologia. A Figura 1 mostra a especialização,
extensão e pós-graduação de 31 professores, vindo a confirmar a pesquisa de
OLIVEIRA et al (2006) que diz que basicamente a oferta de cursos de formação de
Ensino Religioso acontece, em sua maioria, na Pós-graduação Lato Sensu e
Extensão.

2 meses a 2 anos 94
3 a 5 anos 55
6 a 10 anos 9
11 a 15 anos 10
15 anos em diante 2

Figura 1 — Formação dos professores pesquisados


- ER: 1
- Filosofia: 1
- ER: 4
- Pedagogia Religiosa: 5

137
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
- Pastoral de educação e ER: 1
- Antropologia Social e Interdisciplinaridade: 1
- Letras e Pedagogia: 1
- ER: 4
- Pedagogia Religiosa: 4
- Met. do Ensino de História: 1
- História e Cultura: 1
- Educação Especial: 1
- Teologia: 1
- Psicopedagia Religiosa: 2
- Língua Portuguesa: 1
- Ensino de Hist. do séc. XX e Inclusão: 1
- Hist. do pensamento político brasileiro do sec. XIX e XX e Mestrado em Educação: 1

Considerando as formações de Geografia, Filosofia, Pedagogia e História,


como licenciaturas estabelecidas pela Deliberação 01/06 (PARANÁ, 2006) para o
exercício docente do Ensino Religioso, foi feita a análise de 53 documentos
elaborados por professores dessas áreas do conhecimneto. É importante ressaltar
que se procurou estabelecer a concepção de Ensino Religioso dos professores
levando em consideração a recorrência dos indicadores e o maior número de
indicadores implicados em uma mesma categorização. As demais formações
indicadas nos documentos analisados e outros indicadores, como por exemplo, a
recorrência de determinadas figuras que necessitariam de uma análise semiótica,
não foram focos desta investigação.
Quatro concepções sobre o Ensino Religioso ficaram evidentes na análise
dos documentos: o Ensino Religioso como ―Transmissão ou desenvolvimento de
valores, moral e ética‖; ―Resposta às questões existenciais‖; ―Estudo das tradições
religiosas e a manifestação do sagrado‖ e ―Área de conhecimento‖. Na figura a
seguir, observa-se as concepções mais apontadas nos documentos analisados.
Essas concepções se enquadram em dois modelos de ER: o modelo
Interconfessional ou Inter-relacional (―Transmissão e desenvolvimento de valores,
moral e ética‖, ―Respostas às questões existenciais‖) e o modelo fenomenológico
(―Estudo das tradições religiosas e manifestação do Sagrado‖, ―Área de
Conhecimento‖). Um terceiro modelo de Ensino Religioso, o Confessional, não foi
categorizado nesta investigação, pois apenas um documento apontou o indicador
―confessionalidade‖.
138
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
CONCEPÇÕES DE ENSINO RELIGIOSO (Modelos Interconfessional e
Fenomenológico)

O modelo interconfessional toma o seu próprio grupo como o centro de tudo e


todos e os outros fenômenos religiosos são lidos, pensados e sentidos por meio dos
valores e modelos do grupo, no caso, o cristianismo. Nesse modelo, ―a idéia da
formação religiosa está voltada a fazer seguidores (reeligere) e de religar (religare) o
homem a Deus, visando torná-los mais religiosos, voltados às práticas de formação
de valores e atitudes éticas consideradas ideais‖ (CORRÊA, 2006).
Segundo Junqueira (2000), o modelo fenomenológico abrange não apenas
uma dimensão humana, mas também a vida religiosa concreta de cada grupo
(cultos, práticas e crenças e métodos de socialização), sistematizações pastorais e
teológicas e a autoridade expressa por meio de livros sagrados, normas, pessoas
(JUNQUEIRA, 1996).

As concepções de Ensino Religioso dos professores de Geografia


Seis professores de Geografia foram identificados durante o levantamento
dos dados. O tempo de docência no Ensino Religioso dos professores pesquisados
pode ser considerado pequeno, pois tem uma variação de dois meses a
aproximadamente dois anos.
A concepção de Ensino Religioso que ficou mais evidente na análise dos
documentos dos professores dessa formação foi a ―Transmissão ou
desenvolvimento de valores, moral e ética‖. Tomando como exemplo a teia (network)
da professora S 046, com 13 anos de docência em Geografia e 8 meses de
docência no Ensino Religioso, gerada pelo ATLAS.ti, é possível observar os
indicadores que possibilitaram a categorização dessa concepção, além dos que
emergiram da análise.
O Ensino Religioso pode ser percebido como uma porta para a compreensão
de parte da natureza humana (OLIVEIRA et al, 2007, p. 36), pois, ao apresentar a
religiosidade de diferentes culturas, revela a busca do ser humano para se relacionar
com o sagrado para tornar-se mais pleno. Essa plenitude coopera no

139
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
desenvolvimento do respeito, da união, do amor e da solidariedade, valores
apontados pelos professores.
Outro fator a ser considerado na compreensão dessa concepção é a
cobrança para que os professores ―cumpram funções de família e de outras
instâncias sociais, que respondam à necessidade de afeto dos alunos; que resolvam
os problemas da violência, da droga e da indisciplina [...]‖ (SEVERINO e PIMENTA
in OLIVEIRA et al, 2007, p. 12).

As concepções de Ensino Religioso dos professores de Filosofia


Dez professores de Filosofia tiveram seus documentos analisados. O tempo
de docência Ensino Religioso dos pesquisados em relação aos professores de
Geografia é maior: 1 ano a 27 anos. O mesmo acontece em relação ao Ensino
Religioso: 1 ano a 5 anos, sendo que 5 professores estão atuando no Ensino
Religioso há 3 anos.
A segunda concepção de Ensino Religioso mais indicada pelos professores
foi ―Resposta às questões existenciais‖. Ao tratarmos do Ensino Religioso nos
deparamos com as questões fundamentais oriundas do pensamento filosófico: —
Quem sou eu? Para onde vou? De onde vim? — A ciência e as diferentes religiões
buscam incessantemente por meio da investigação ou da comunicação com o
mistério, responder a cada uma dessas questões. A opinião da professora S106 está
totalmente integrada ao desenho, como se observa na Figura 4.

Figura 4 – Dados coletados S 106 — Filosofia


Texto da professora S 106: O que é Budismo? Espiritismo? Islamismo? E eu?

Para Freire e Faundez, (1985, p. 23), a inquietação dos educandos, suas


dúvidas e curiosidades sobre o desconhecido são os desafios postos para uma
experiência reflexiva e enriquecedora tanto para o professor, quanto para os alunos.
Um professor que considera todas as perguntas, incentiva a curiosidade do
educando, mesmo quando a pergunta lhe pareça ingênua ou mal colocada, pois
sempre há uma razão para aquela pergunta.

As concepções de Ensino Religioso dos professores de Pedagogia


140
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
Foram analisados dez documentos dessa área do conhecimento. Quatro
professores não informaram o tempo de docência no ER e os demais apontaram de
1 a 2 anos de experiência. Portanto, o tempo de docência no Ensino Religioso é
menor do que o apontado pelos professores de Filosofia e maior do que o apontado
pelos professores de Geografia. ―Estudo das tradições religiosas e a manifestação
do sagrado‖ foi a concepção mais apontada nos ―riscos e rabiscos‖ dos professores
de pedagogia. Na representação gráfica da análise do documento da professora S
081 percebe-se os indicadores que possibilitaram a compreender o Ensino Religioso
como ―Estudo das tradições religiosas e a manifestação do sagrado‖.
Apresentar os conteúdos de Ensino Religioso a partir das tradições dos
alunos e de seu contexto social é um aspecto que merece destaque. Firmar a
identidade religiosa do aluno e as marcas de sua cultura é importante, pois a
renúncia dessas marcas pode levar a uma desvalorização das novas culturas que
lhe apresentadas (FREIRE e FAUNDEZ, 1985, p. 17).
Entretanto, o relacionamento com o mundo é uma longa aprendizagem que
implica na descoberta do outro, de outras realidades, das marcas de outras
linguagens e de outros gestos.
Assim, a cultura se manifesta nos gestos mais simples da vida cotidiana como
as maneiras diferentes de comer, dar a mão e até mesmo relacionar-se com o outro,
e não apenas na manifestação artística ou intelectual expressa por meio do
pensamento.

As concepções de Ensino Religioso dos professores de História


Levando em consideração os 27 documentos dos professores de História que
foram analisados foi constatado que a experiência dos professores dessa área de
conhecimento é maior em relação às outras formações, tanto no tempo de docência
(1 a 30 anos) quanto na docência em Ensino Religioso (até 6 anos).
O Ensino Religioso como ―Área do conhecimento‖ foi a segunda concepção
mais indicada pelos professores dessa área do conhecimento. O indicador
―cidadania‖ foi apontado vinte e sete vezes nas frases e desenhos desses
professores.

141
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
Como área de conhecimento e fundamentado numa releitura religiosa do
cotidiano, o Ensino Religioso colabora no processo da construção de um cidadão
que compreende o seu contexto sócio-cultural, político-educacional, econômico e
religioso.
O texto e a frase da professora S 127 demonstram como o Ensino Religioso
pode contribuir como marco estruturado de leitura e interpretação da realidade.

Texto da professora S 127 — História: Direcionar o olhar do aluno para o mundo e sua diversidade,
aprendendo a respeitá-la.
Figura 6: Dados coletados S 127 — História

Tardif e Lessard (2005, p.7) afirmam que ―a criança escolarizada é a raiz do


homem moderno atual‖ e que o ―conceito moderno de cidadania é impensável sem o
de instrução‖. O exercício da cidadania e o direito da expressão religiosa podem ser
desenvolvidos na escola, já que nesse espaço de aprendizagem, trabalha-se as
regras do espaço público democrático, buscando a superação de todo e qualquer
tipo de discriminação e exclusão social, valorizando cada indivíduo e todos os
grupos que compõem a sociedade brasileira.
Na representação gráfica da análise do documento da professora S 134,
observa-se a variedade de indicadores, além dos indicadores ―conhecimento‖ e
―cidadania‖ que apontaram para a categorização do Ensino Religioso como área de
conhecimento.
O desenho remete a uma convivência e harmonia entre as tradições
religiosas. Esse respeito e harmonia são frutos de uma consciência cidadã.
Aprendendo a conviver com as diferentes tradições religiosas, vivenciando a própria
cultura e respeitando as diversas formas de expressão cultural, o educando estará
também se abrindo para o conhecimento. É cidadão de um mundo complexo, onde
se inscrevem relações em rede, não menos complexas. Porém, é um ser dotado de
capacidades criativas e talentosas, autônomo em seu processo de aprender
(JUNQUEIRA, 2008b).
O desenho da professora 131, com 22 anos de experiência na docência em
História e 4 anos em ER, e sua frase (Ninguém é igual a ninguém), é um exemplo
bem concreto do respeito à diversidade, pois pode ser feita a relação com a

142
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
funcionalidade dos dedos das mãos, Nossas mãos não teriam a mesma
funcionalidade se todos os dedos fossem iguais?
Assim, de acordo com o que Carniato (2005, p.37) afirma

Além do conteúdo estabelecido, o ER tem um tratamento pedagógico


diferenciado. Ele é mais do que só conhecimento. É preciso oferecer
atividades interativas e participativas que proporcionem experiências. E
estas por sua vez, refletidas e dialogadas, se transformem em construção
de saber, de sabedoria, e levem à educação integral da cidadania terrena e
do protagonismo na humanização e na construção de um mundo novo, de
vida para todos.

Educar para conhecer diversas religiões e compreender as culturas que lhes


dão forma, analisar a relação entre presente e passado para produzir um saber
histórico, implica em exercitar o diálogo com o diferente, baseado no respeito
profundo e no desejo de preservar a dignidade e direito de existência de cada
manifestação cultural-religiosa. Dessa forma, o aluno participa ativamente da
construção do processo da aquisição de seus conhecimentos, utilizando a dimensão
racional de seu ser, e também as dimensões sensíveis, emocionais e intuitivas.

Considerações finais
Os direitos fundamentais de liberdade religiosa e de expressão religiosa são
frutos de uma sociedade pluralista que se expressa no Estado não-confessional e
laico. A laicidade não é a negação da fé, mas protege todas as confissões de
discriminação e de forma democrática possibilita a relação entre o cidadão e o
Estado, o privado e o público.
Permitir ao outro ser sujeito de sua cultura e de seus desejos é o desafio do
contexto atual. Por isso, os debates e as reflexões prosseguem na busca para
estabelecer o Ensino Religioso como um espaço para pensar o ser humano, numa
abordagem fenomenológica que observe as diversas manifestações religiosas de
forma cultural.
A pesquisa na área da educação tem procurado estabelecer e fornecer à
formação inicial dos professores ―conhecimentos oriundos da análise do trabalho em
sala de aula e na escola‖ (Tardif, 2002, p. 290). Cada área de conhecimento requer
um curso que projete uma formação, pressupondo um perfil profissional, pois um

143
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
docente formado por uma determinada escola de pensamento vai formar segundo
esses moldes.
Os dados levantados nesta investigação apontam a concepção de ER
―Transmissão e desenvolvimento de valores, moral e ética‖, que se enquadra no
modelo interconfessional, como a mais indicada nas frases e desenhos dos
professores de Geografia, Filosofia e História (Figura 7). Porém, esse dado não
descarta a combinação de vários modelos de ação durante a sua atividade. Daí a
complexidade da ação docente implicar numa variedade de ações e interações com
os alunos.
Os dados também sugerem uma superação das tradicionais aulas de religião
e apontam que o professores estão procurando inserir em suas aulas conteúdos que
tratem da diversidade de manifestações religiosas, dos seus ritos, das suas
paisagens e símbolos, as relações culturais, sociais, políticas e econômicas de que
são impregnadas as diversas formas de religiosidade.
No entanto, há que se preocupar com um esvaziamento se esses conteúdos
forem trabalhados somente em nível de informação e curiosidade, pois é a
transformação da informação em conhecimento que proporcionará a consciência
cidadã. Assim, os conteúdos pensados e elaborados a partir de uma abordagem
fenomenológica, podem auxiliar os alunos a enfrentar os conflitos existenciais e a
desenvolver, orientados por critérios éticos, a religiosidade presente em cada um.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei de diretrizes e bases da educação nacional LEI 9394/96. Brasília:


MEC, 1996.

______. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares


Nacionais — Ensino Médio. Parte I - Bases Legais.. Disponível em:
ttp://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/blegais.pdf Acesso em: 05/05/2008.

BOEING, Antonio. O Fenômeno Religioso como Experiência Universal. São


Paulo: AEC, 1999. Disponível em: http://www.aster-
to.org.br/download/auniversalidadedofenomenoreligioso.pdf. Acesso em: 02 de
setembro de 2007.

144
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
CORTELA, Mario Sergio. Educação, Ensino Religioso e formação docente. In:
SENA, Luzia (Org.). Ensino religioso e formação docente: ciências da religião e
ensino religioso em diálogo. São Paulo: Paulinas, 2006.

CORRÊA, Bárbara Raquel do Prado Gimenez. Concepções dos professores


sobre o sagrado: implicações para a formação docente. Dissertação de
Mestrado em Educação. Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Curitiba, 2006.
Orientador: JUNQUEIRA, Sérgio Rogério de Azevedo.

GIL, Antonio Carlos. Métodos e técnicas de pesquisa social. São Paulo: Atlas,
1999.

FREIRE, Paulo; FAUNDEZ, Antonio. Por uma Pedagogia da pergunta. Rio de


Janeiro: Paz e Terra, 1985. Ed. Biblioteca Digital Paulo Freire. Disponível em
www.paulofreire.ufpb.br

JUNQUEIRA, Sérgio Rogério de Azevedo. Programa Marista de Educação


Religiosa, um ideal, um caminho, uma proposta. Dissertação de Mestrado.
Orientador: GIANETTO, Ubaldo. Pontifcia Universita Salesiana, U.P.SALESIANA,
Vaticano. Ano de obtenção: 1996.

_______; Ensino Religioso no Brasil: O processo de escolarização. Tese de


Doutorado. Orientador: TRENTI, Zelindo. 2000.

_______; RODRIGUES, Edile M. Fracaro; RAU Dédora Toniolo História, Geografia


e Ensino Religioso: Uma proposta integrada. Revista Diálogo Educacional.
Curitiba: PUC-PR, v. 7, n. 20, p. 143-165, jan./abr. 2007.

_______. História, Legislação e Fundamentos do Ensino Religioso. Curitiba,


IBPEX, 2008a (no prelo).

_______. Fundamentos Pedagógicos do Ensino Religioso. Curitiba, IBPEX,


2008b (no prelo).

LONGHI, Miguel. O ETHOS no programa de Ensino Religioso brasileiro.


Dissertação de Mestrado em Educação. Pontifícia Universidade Católica do Paraná.
Curitiba, Paraná, 2004.

MARCELO GARCÍA, Carlos. Formação de professores, pra uma mudança


educativa. Porto: Porto, 1999.

OLIVEIRA, Lílian Blanck. JUNQUEIRA, Sérgio Rogério Azevedo; GILZ, Claudino;


RODRIGUES, Edile M. Fracaro; PEROBELLI, Raquel de Moraes Borges. Curso de
formação de professores. In: SENA, Luzia (Org.). Ensino religioso e formação
docente: ciências da religião e ensino religioso em diálogo. São Paulo: Paulinas,
2006.

_______; JUNQUEIRA, Sérgio Rogério Azevedo; ALVES, Luiz Alberto Sousa; KEIM,
Ernesto Jacob. Ensino Religioso no Ensino Fundamental. São Paulo: Cortez,
2007.
145
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
PARANÁ. Conselho Estadual de Educação do Paraná. Deliberação nº 01/06-PR.
Curitiba: CEEPR, 2006. Acesso em 15/04/2008. Disponível em:
http://celepar7cta.pr.gov.br/seed/deliberacoes.nsf/7b2a997ca37239c3032569ed005f
b978/175e426ddd8613108325711d0068e646/$FILE/_88himoqb2clp631u6dsg30c9d
68o30dg_.pdf

SCHOLGL, Emerli. "Não basta abrir as janelas" - O simbólico na formação do


professor. Dissertação para o Mestrado em Educação. Pontifícia Universidade
Católica do Paraná, Curitiba, 2005. Orientador: JUNQUEIRA, Sérgio Rogério de
Azevedo.

TARDIF, Maurice; LESSARD, Claude. O Trabalho docente: Elementos para uma


teoria da docência como profissão de interações humanas. Petrópolis: Vozes. 2005.

146
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
Ministério da Educação .
GABINETE DO MINISTRO
<!ID1353522-0>
PORTARIA NORMATIVA No- 10, DE 3 DE SETEMBRO DE 2008
O MINISTRO DE ESTADO DA EDUCAÇÃO, no uso de suas atribuições e
considerando a necessidade de traduzir, no conjunto das ações do Ministério,
políticas educacionais que garantam a democratização da gestão e a qualidade
social da educação e ainda, as deliberações da Conferência Nacional de Educação
Básica - CONEB, resolve:
Art. 1º Constituir a Comissão Organizadora da Conferência Nacional da Educação -
CONAE, que se realizará no mês de abril de 2010, na cidade de Brasília, Distrito
Federal.
§ 1º Compete à Comissão Organizadora a coordenação, a promoção e o
monitoramento do desenvolvimento da Conferência Nacional da Educação, que terá
nas suas bases, estrutural e organizacional, a realização de Conferências Estaduais,
do Distrito Federal e Municipais de Educação.
§ 2º As Conferências Municipais de que trata o parágrafo anterior, serão realizadas
no primeiro semestre de 2009 e, as Conferências Estaduais e a do Distrito Federal
no segundo semestre do mesmo ano.
Art. 2º A Comissão Organizadora, cujos membros serão designados pelo Ministro de
Estado da Educação, será composta por um representante titular e um suplente de
cada uma das entidades, a saber:
I - Secretaria Executiva Adjunta do Ministério da Educação;
II - Secretaria de Educação Básica do Ministério de Educação;
III - Secretaria de Educação Superior do Ministério da Educação;
IV - Secretaria de Educação Especial do Ministério de Educação;
V - Secretaria de Educação a Distância do Ministério deEducação;
VI - Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica doMinistério da Educação;
VII - Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade do Ministério
de Educação;
VIII - Comissão de Educação, Cultura e Esporte do Senado;
IX - Comissão de Educação e Cultura da Câmara dos Deputados;

147
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
X - Conselho Nacional de Educação;
XI - Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino
Superior - ANDIFES;
XII - Associação Brasileira dos Reitores das Universidades
Estaduais e Municipais - ABRUEM;
XIII - Confederação Nacional de Estabelecimentos de Ensino CONFENEN XIV -
Associação Brasileira das Universidades Comunitárias ABRUC
XIV - Conselho de Dirigentes dos Centros Federais de Educação ecnológica -
CONCEFET;
XV - Conselho Nacional de Secretários de Educação - CONSED;
XVI - União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação UNDIME;
XVII - Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação CNTE;
XVIII - Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos
de Ensino - CONTEE;
XIX - Federação de Sindicatos de Trabalhadores de Universidades rasileiras -
FASUBRA;
XX - Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior -
ANDES/SN;
XXI - Fórum de Professores das Instituições Federais de nsino Superior - PROIFES;
XXII - Sindicato Nacional dos Servidores Federais da Educação Básica e
Profissional - SINASEFE;
XXIII - Fórum Nacional dos Conselhos Estaduais de Educação - FNCEE;
XXIV - União Nacional dos Conselhos Municipais de Educação - UNCME;
XXV - União Brasileira dos Estudantes Secundaristas - UBES;
XXVI - União Nacional dos Estudantes - UNE;
XXVII - Confederação Nacional das Associações de Pais de Alunos - CONFENAPA;
XXVIII - Representação da Comunidade Científica;
XXIX - Representação Social do Campo;
XXX - Representação dos Movimentos de Afirmação da Diversidade;
XXXI - Representação da Articulação de Movimentos em Defesa do Direito à
Educação;
XXXII - Representação das Entidades de Estudos e Pesquisa em Educação;

148
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
XXXIII - Representação das Centrais Sindicais dos Trabalhadores;
XXXIV- Representação das Confederações dos Empresários e do "Sistema S".
§ 1º A Comissão Organizadora será coordenada pelo Secretário Executivo Adjunto
do Ministério da Educação.
2º Os representantes dos órgãos e das entidades mencionadas neste artigo deverão
ser indicados ao Coordenador da Comissão Organizadora até o dia 30 de setembro
de 2008.
Art. 3º As atribuições dos membros da Comissão Organizadora serão definidas em
regulamento construído com a participação dos membros e firmado pelo
Coordenador.
Art. 4º Cabe a Comissão Organizadora:
I - Estabelecer os procedimentos a serem adotados no desenvolvimento das
Conferências Municipais, Estaduais e da Conferência Nacional.
II - Submeter ao referendo do plenário da Conferência Nacional da Educação
proposta de regimento interno.
Art. 5º A Comissão Organizadora apresentará, para debate nas Conferências
municipais, estaduais, e do Distrito Federal documento-referência sobre eixos
temáticos da Conferência Nacional.
Art. 6º O Coordenador da Comissão Organizadora resolverá os casos omissos.
Art. 7º Esta portaria entra em vigor na data de sua publicação.
FERNANDO HADDAD

149
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
DISTORÇÕES SOBRE GÊNERO E A NECESSIDADE DE FORMAÇÃO
DOS PROFESSORES EM ENSINO RELIGIOSO

KLUCK, Claudia – UNOPAR


claudiakluck@gmail.com
JUNQUEIRA, Sérgio Rogério Azevedo — PUCPR
srjunq@uol.com.br
Área Temática: Formação de Professores
Agência Financiadora: Não contou com financiamento

Resumo
A manifestação da sexualidade na escola, especialmente quando difere do padrão
aceito, são causas incipientes às múltiplas violências praticadas contra jovens e
crianças, ultimando no banimento dos ―menos iguais‖. Isso tem sido justificado pelos
valores e aspectos formativos recebidos através das famílias e das religiões no
Brasil, especialmente a cristã. Por isso sexualidade e religião devem tornar-se
pontos de reflexão, para oportunizar mudanças. A apresentação de alguns textos
sagrados a respeito da subserviência feminina e o domínio do modelo patriarcal e a-
homoerótico vem demonstrar a necessidade de conhecimento para mudança de
posicionamento. A partir da revisão de textos bíblicos sob a luz da exegese e
contextualização histórica é possível perceber as distorções havidas durante a
caminhada da humanidade. A re-elaboração de formas de convívio, passa pela
melhor formação de professores, que aptos para facilitar o processo de aquisição do
conhecimento ensejem um espaço de efetiva constituição de cidadãos que prezem
pelo respeito e liberdade, conforme princípios exarados pela LDB de 1996. O espaço
que se apresenta nos currículos escolares que melhor se presta a esta função é o
Ensino Religioso, e da formação deste docente espera-se uma mudança de
paradigmas. Formação que urge em compreender: conhecimento científico,
metolodogia de ensino, aplicação prática e pesquisa científica e a tão necessária
reflexão como forma de subsidiar novos conhecimentos. Tendo em vista a
complexidade do tema e como forma de nortear o trabalho optou-se pela abordagem
qualitativa utilizando-se, nesta fase, a pesquisa exploratória, por ser capaz de
auxiliar o estabelecimento de um instrumento de pesquisa melhor adequado a
realidade a ser pesquisada, além da análise documental que forma o estofo teórico
tão necessário para o entendimento da temática. O combate a qualquer tipo de
preconceito, discriminação e violência tem na dicotomia ensino-aprendizagem sua
mola propulsora - enquanto houver seres ensináveis haverá espaço para o
desvelamento ante ao diferente, pois promove o conhecimento de sí mesmo diante
das características que tanto podem aproximar quanto afastar.

Palavras-chave: Formação de Professores; Ensino Religioso; Gênero.

Introdução
As múltiplas violências praticadas contra jovens e crianças, especialmente
àquelas correlacionadas a manifestação de suas sexualidades na escola, não
150
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
levando em conta a riqueza de suas identidades, estão intimamente atreladas aos
valores e aspectos formativos recebidos através das religiões no Brasil. As
potencialidades e interesses acadêmicos são suplantados pelo preconceito
multiforme e por um ―fazer calar‖ que talvez ao negar pretenda fazer desaparecer.
Diante deste cenário e apesar de controversos, os temas sexualidade e religião
exigiram converterem-se em pontos de reflexão.
A violência no ambiente escolar, tanto a constantemente noticiada quanto a
silenciosamente praticada, é uma demonstração da urgente necessidade de re-
elaborar formas de convívio.
Servir-se do aparato a disposição dos professores, que tanto podem deter a
posição de facilitadores da aprendizagem ou, numa posição extrema, de
transmissores ―formais‖ de valores na escola, é reconhecer a potencialidade destes
em preencher uma lacuna no trabalho de encontro e aceitação àqueles que são
―diferentes‖ – como se neste país a diversidade não fosse a regra.
As comunidades, em todas as suas esferas cabe cumprir ao menos com os
princípios da educação, dentre outros, conforme apresentados na Lei de Diretrizes e
Bases 9394/96 (Brasil, 1996):

- princípios de liberdade e ideais de solidariedade humana;


- pleno desenvolvimento do educando e seu preparo para o exercício da
cidadania;
- igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;
- respeito à liberdade e apreço à tolerância.

Tendo em vista o momento de crescente debate quanto a gênero e orientação


sexual questionou-se em primeiro plano a influência das religiões hegemônicas
brasileiras na formação ou conformação das pessoas, especialmente para as
mulheres e os homossexuais. As respostas encontradas indicaram outro
questionamento: Como otimizar a transmissão ou a não transmissão, de valores e
princípios que contribuem/prejudiquem a efetiva permanência de TODOS no
processo educativo, sem distinções de nenhuma forma.
A bibliografia encontrada sobre sexualidade é escassa quando ligada à
temática religião. Contudo, não se pode negar a influência das Religiões na
formação de conceitos com relação ao gênero, o que resulta também na forma que
os povos exercem sua sexualidade.
151
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
Buscando relacionar a forma como se dá a vivência com os aspectos sexuais
vinculado à vivência daquilo que é sagrado, engedrou-se uma série de
questionamentos tentando identificar os pontos que influem na formação de
conceitos e da auto estima das pessoas pesquisadas, e para isso foi entrevistado
um grupo de pessoas bastante heterogêneo: na diversidade do exercício de sua
sexualidade, em idade, formação, classe social e diversidade religiosa. As respostas
elucidaram como algumas vertentes religiosas influenciaram na formação das
pessoas.
Encontram-se diferentes concepções para a palavra gênero, que pode ser
empregado tanto para diferenciar o sexo biológico, determinado pela genitália
feminina ou masculina quanto para distinguir as interações sociais.
As religiões, além de outras disciplinas históricas contribuíram para uma
distorção nas relações de gênero. Apesar de ser fato que diferenças biológicas não
sejam argumentos claros e sustentáveis para justificar as organizações desiguais
criadas para manutenção do poder na vida de algumas comunidades, são
encontrados no dia-a-dia das brasileiras e brasileiros a marca da desqualificação em
quase todos os campos, falas e comportamentos.

Desenvolvimento
Relações de poder são, por vezes, geradoras de instrumentos normativos
dentro de diferentes tradições religiosas e fora delas, e historicamente estas
relações penderam cedendo vantagens ora para mulheres ora para homens.
Houveram ainda momentos em que ambos os gêneros cooperaram e resguardaram
o valor mútuo, alicerçando sentimentos de auto-estima e dignidade na identificação
de sua posição no mundo.
A participação do feminino nas estruturas religiosas passou por diferentes
formas, desde a adoração ao princípio feminino como elemento sagrado gerador de
vida, para a negação deste como componente que conduz à sensualidade e à
morte.
As religiões, em sua diversidade, apontam para símbolos do masculino com
certa freqüência. Mas, nem sempre foi assim na história da humanidade. O feminino
já ocupou lugar de destaque no cenário sagrado. Alguns pesquisadores afirmam,

152
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
baseados em pinturas rupestres e em objetos encontrados, entre outros vestígios do
passado, que quando a humanidade vivia nos períodos pré-históricos o ícone que
apresentava o ‗elemento criador ou deus‘ seria representado pela figura de uma
mulher.
Considerando o Cristianismo no Brasil como credo hegemônico, destacam-se
alguns textos específicos que tem servido à (de)formação conceitual e afetiva das
pessoas. Isso talvez se dê por ignorância da profundidade dos mesmos, ou quem
sabe por servirem à interesses escusos.
No livro sagrado dos cristãos, a Bíblia, mais especificamente no Antigo
Testamento encontram-se duas referências sobre à criação do homem e da mulher,
em uma delas Deus criou macho e fêmea à sua semelhança (Gen. 1, 27) e em outro
texto Deus criou Adão e dele tirou uma costela, e com ela formou então a mulher.
(Gen. 2, 21-22). Estes textos, em geral, contribuem para a subserviência feminina.
O Gênesis Cristão afirma que a serpente ludibriou a mulher e fez com ela
comesse do fruto, bem como seu companheiro. A serpente na hermenêutica
judaicocristã é símbolo do mal, rasteja sobre a terra, portanto sobre o mais baixo, o
instintivo. A partir do contato da mulher, com este animal é que, como conseqüência
da desobediência da orientação divina, passa a conhecer as dores do parto,
possibilitando o nascimento, porém com dor.
Como forma de ilustrar o tratamento desigual entre homens e mulheres Bello
(2001) apresenta os seguintes trechos bíblicos, falando a respeito da purificação das
parturientes, no Livro do Levítico, em seu capítulo 12 versos de 1 a 5 (TEB) há
instruções claras a respeito:

Javé falou a Moisés, dizendo: 'Fala aos filhos de Israel e dizendo-lhes:


quando uma mulher conceber e der à luz um menino, ela ficará impura
durante sete dias; ficará impura como nos dias de sua menstruação. No
oitavo dia o menino será circuncidado; mas ela ficará ainda em casa
durante trinta e três dias com o sangue da purificação; não tocará nenhuma
coisa santa e não irá ao santuário, até que os dias de sua purificação se
cumpram. Se der à luz uma menina, ficará impura durante duas semanas,
como nos dias de sua menstruação, e ficará em casa durante sessenta e
seis dias com o sangue da purificação.

É possível identificar no trecho acima forte carga machista, pois a regra impõe
prazo dobrado de isolamento para mulheres que tenham concebido uma criança do
sexo feminino. Este trecho escrito com vistas aos aspectos ritualísticos, tem também
153
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
enfoque sanitarista por pretender tratar das causas de contaminações, tendo em
vista as precárias condições do contexto no qual foi escrito.
É interessante, neste ponto, chamar a atenção e contrapor aqui o conceito de
pureza ou impureza que as culturas imputaram ao sangue menstrual e ao sangue do
parto. Nas sociedades matriarcais, de tempos ancestrais, o sangue era sagrado e
portanto incluído nos rituais, enquanto que nas sociedades patriarcais foi tornado
impuro e a presença de mulheres ‗manchadas‘ pelo sangue afastada dos rituais.
Apesar disso é possível perceber nos primórdios do cristianismo, nas cartas
atribuídas ao apóstolo Paulo, a proclamação da libertação da mulher de sua
subserviência tradicional, sugerindo igualdade sexual em relação ao homem, já que
―em Cristo não há a distinção entre macho e fêmea‖ (Bíblia, Livro de Gálatas 3,28).
Como forma de negar a posição igualitária é encontrado no trecho bíblico de I
Coríntios 11, versos 7 a 10, indicação de diferentes posicionamentos, especialmente
sobre usos e costumes, que tinha em mente o gênero.
Ao analisar todo e qualquer texto sagrado é necessário observar o contexto
completo: a realidade da época na qual foi escrito a cultura local e a localização
geográfica, evitando assim distorções em sua interpretação, ou seja, textos fora dos
contextos que servem apenas de pretexto para dominação ou justificação de
abusos.
Neste trecho há indicação clara sobre a necessidade da mulher cobrir sua
cabeça com véu e manter os cabelos compridos. Saliente-se que Paulo – presumido
autor da carta – fala à uma cidade portuária, que recebia navios do Oriente e do
Ocidente, importante centro comercial da época. Isso fez dela uma cidade dissoluta
onde reinava a devassidão, a luxúria e a licenciosidade. A presença de marinheiros
e viajantes fez da prostituição prática comum, assim as prostitutas, também para
serem identificadas pelos homens, mantinham os cabelos cortados ou raspados.
Interessante notar que esta orientação paulina, é dirigida apenas e
especificamente para igreja de Corinto. Não há outro texto, de autoria atribuída à
Paulo para outras comunidades com esse sentido.
O foco da carta paulina é a situação das novas convertidas – inclusive
prostitutas, que eram orientadas à manter-se cobertas com o véu até que seus
cabelos crescessem, diferenciando-as das que não tinham aderido ao culto cristão.

154
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
Também muito utilizado, e especialmente nebuloso, é o trecho do livro de
Efésios, que versa sobre o homem ser o cabeça da mulher, utilizado amplamente
para desrespeitar a mulher em seus direitos e possibilidades.

As mulheres sejam submissas aos seus maridos, como ao Senhor, porque


o marido é cabeça da mulher, como Cristo é cabeça da Igreja, Ele, o
salvador do Corpo. Como a Igreja está sujeita a Cristo, assim as mulheres
estejam sujeitas em tudo a seus maridos. (Carta aos Efésios 5, 22-24).

No original Paulo quando fala em cabeça, de acordo com a língua Grega,


utilizada na época, poderia ter usado duas palavras: arché ou kephalé. Arché
denotaria autoridade, o que poderia inferir o sentido de governante. Por sua vez
kephalé significa apenas cabeça – raiz semântica da palavra cefaléia. Kephalé é
ainda um termo militar que designa ―aquele que lidera, que vai à frente‖, não como
um general, mas, sim, como o batedor que vai à frente no campo de batalha, que se
expõe primeiro ao perigo a fim de proteger e guiar aos que o seguirem. Assim a
liderança do marido como cabeça indica ele se expondo para proteger, seguindo a
ordem, que precisa ser conhecida, de seu superior (Deus).
Paulo conhecia bem as duas palavras, afinal é apresentado nas escrituras
como sendo muito instruído. Ao escolher kephalé ensina que o marido deve ser
aquele que protege indo à frente dos seus, servindo-os e dando por eles a própria
vida, como Cristo fez pela igreja1.
No caso da intolerância à homossexualidade são encontradas algumas
referências bíblicas usadas para tal posicionamento. No Livro I Coríntios, capítulo 6,
versículo 10, o autor nomeia como efeminados aqueles que não terão o direito de
herdar o Reino dos Céus. Alguns estudiosos da Palavra, defensores das práticas
homoeróticas, argumentam que a palavra grega malakós, utilizada no texto em
referência, tem seu sentido literal como ―mole, macio, suave‖. Porém algumas
versões respeitadas das Escrituras, traduzem esse termo por termos equivalentes a
homossexual. A conhecida versão King James Version apresenta o vocábulo
1 ASSUMPÇÃO s.d, s.p effeminate, e a New Internacional Version (NVI),
homosexual. No espanhol a Versión de Casiodoro de Reina emprega afeminado.
Além dos valores expressos pela cristandade, existem outros fatores que se
contrapõem a posição homossexual, preferindo utilizar-se do termo a-homossexual

155
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
por posicionamento de não aceitação da prática, preferindo-o a utilização do
―homofóbico‖, por entender diferenças entre medo irracional, que leva a
perseguição, violência e assassinato. Desta forma seria possível encontrar, na
sociedade, tanto o repúdio às relações ou comportamentos homoeróticos como aos
heteroeróticos, demonstrados na repulsa que causa aos homossexuais esse tipo de
relação.
Ao se estabelecer a relação de poder entre os gêneros inúmeras crueldades
foram sendo cometidas e na ‗idade das trevas‘ muitas pessoas foram perseguidas e
executadas injustamente em nome da fé, em nome de um deus único, que abarcava
o desejo humano de hegemonia, de supremacia, este deus estava acima de todos
os outros, portanto a morte se justificava pela manutenção da ‗fé reinante‘.

Resultados Preliminares da Pesquisa


Devido à natureza do estudo e dos objetivos propostos, optou-se por uma
pesquisa qualitativa com abordagem fenomenológica por meio da modalidade de
análise documental e exploratória.
Pode ser qualificada como Pesquisa Qualitativa, conforme apresentado por
GODOY (1995.a, p. 62), por aprsentar as seguintes características: a) tem no
ambiente natural sua fonte direta de dados; b) a figura do pesquisador o instrumento
para obtenção de dados; c) possui caráter descritivo; d) baseia-se no significado que
as pessoas dão às coisas e à sua vida; e) possui enfoque indutivo – por isso Serviu-
se no primeiro momento, além de análise documental sobre a temática, de pesquisa
exploratória, que pode ser qualificada, de acordo com Theodorson e Theodorson
(1970), como um estudo preliminar em que o maior objetivo é tornar familiar o
fenônemo que se quer investigar, de maneira que o estudo principal a seguir será
planejado com grande entendimento e precisão.
Como forma de complementar a reflexão sobre a questão de relações dos
gêneros atrelada ao Ensino Religioso, foram formuladas entrevistas para vislumbrar
o ideário a cerca do tema junto à mulheres e homossexuais de ambos os sexos,
com idades entre 19 e 72 anos.
Dar voz às vivências mostrou um aspecto especialmente desafiador por ir
além do debruçar-se sobre bibliografia específica, até por conta da escassez de

156
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
publicação unindo as duas temáticas, tentando discernir o quadro atual da temática
e suas implicações.
Em primeiro plano o repto que se descortinou é obter informações sobre a
vivência religiosa e orientação sexual, especialmente quando difere do padrão
estabelecido, a heterossexualidade, vinculada à experiência, e talvez vivência no
meio religioso.
No decorrer da pesquisa, até este ponto, foi possível identificar, na opinião
dos respondentes que a formação judaico-cristã abarca no modelo patriarcal um
meio justificável para a dominação da mulher. Já sobre a homossexualidade está
claro, no modelo vigente, ser de convívio suportável desde que reprimida e sua
prática preferivelmente abandonada.
Sobre o público atingido pela pesquisa é possível identificar a dedicação
profissional,em sua maioria, na área de humanas. O nível de escolaridade
ultrapassa os 80% com formação superior e com relação a fé praticada mais de 60%
diz professar a fé católica, porém seria necessário ponderar quanto aos conceitos de
praticantes ou não desta religião, o que remete a um aprofundamento neste quesito.
Alguns outros aspectos foram abordados que serviram para um
aprofundamento preliminar sobre a temática, conforme premissas da pesquisa
exploratória. O público consultado foi levado a descrever sua vivência religiosa na
infância e adolescência, e o grupo demonstrou que até no máximo os 18 anos,
aproximadamente 60% deles tinham uma participação ativa, ou seja freqüentavam
suas práticas religiosas por vontade própria, porém, o índice de dissidentes da igreja
foi o mesmo após a maioridade. Apenas 25% do grupo optou na fase adulta pela
religião que professa atualmente.
Ao questionar algum fato marcante dentro da instituição religiosa de origem,
menos da metade dos respondentes relata ter havido algum, sendo que foram
considerados também fatos que pudessem ter marcado negativamente.
Entre outros aspectos, no afã de entender a influência direta das religiões na
vidas das pessoas, foram argüidos ainda:
- se a religião na qual foram iniciados, quando criança, foi a assumida na fase
adulta, o que não se confirmou até este ponto;

157
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
- sobre a freqüência a um espaço físico (igreja, templo, sala de reunião, etc.) foi
encontrado um grupo que vivencia sua espiritualidade independente da freqüência a
um espaço físico;
- sobre quem seria Deus: houve recorrência em referir-se a Deus como pai, força,
ser supremo e energia. É perceptível que a grande maioria das respostas denotam a
relação com um deus distante.
- para que explicassem, a partir do cotidiano de cada um, a experiência religiosa.
Menos de um terço das respostas indicam que essa experiência tem sentido no
momento de comunhão, sempre visando o bem do outro, o que remete a um
paradigma humanitário de religiosidade.
Ao aprofundar a temática religião e gênero buscou-se entender a
interpretação de corpo e sexualidade, a partir da experiência religiosa, no grupo
entrevistado não há um consenso, o que indica a necessidade de aprofundamento.
Quando questionados se a identidade sexual e gênero influenciaram a vida
espiritual, foram encontrados indícios da cisão entre vida sexual e vida espiritual. Foi
apresentado o entendimento que é necessário equilíbrio entre as duas para alcançar
a completude do ser, dentre outras respostas uma chama atenção ao indicar a
ligação entre a espiritualidade e arte.
Ao serem levados a refletir a respeito das relações existentes entre religião,
sexo e amor, a maioria considerar temas independentes entre sí. Porém, vale a
pena destacar duas contribuições que traduzem a importância da temática: "Religião
é uma necessidade assim como o sexo, o amor é fundamental nas duas [tanto na
religião quanto no sexo]"; e "Sexo, religião e amor tudo é vida. Tudo faz parte do ser
humano."
Quando perguntados sobre a forma que a religião institucionalizada deveria
compreender e lidar com a questão da sexualidade humana, houve consenso que a
igreja enfrenta a temática, a priori, a partir da repressão e desemboca na negação
dos impulsos homossexuais. As contribuições que refletem os anseios dos
entrevistados indicam que as instituições deveriam enfocar o amor; entendendo e
discutindo a questão do prazer, conferindo liberdade às pessoas e oferecendo apoio.
Foi interessante observar a fala de um dos entrevistados "a religião trata da

158
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
sexualidade, nenhuma religião explica a homossexualidade" há implícito o desejo de
busca por explicações, e quiçá acolhimento.
O espaço do feminino nas tradições religiosas e o espaço de pessoas cuja
orientação sexual diferencia-se do convencional são apontadas de forma diferente,
pelo grupo homossexual. É possível perceber a existência do espaço do feminino,
contrariamente a participação das pessoas cuja orientação sexual diferencia-se do
convencional.
Para as pessoas entrevistadas a vida e suas possibilidades não são
excludentes da prática da vida espiritual, mas sim são causadoras desta. Em se
tratando das questões que envolvem a sexualidade, a força das instituições é
bastante marcante, na tentativa de conduzir as pessoas para comportamentos
―adequados‖. Sobre as questões que refletem acerca da homossexualidade a
maioria das mulheres se colocou a favor do respeito e da liberdade para com a
vivência sexual de cada um.
As questões são abordadas de maneira diferente, porém, pode-se notar que
as pessoas respondem por meio de sua concepção pessoal, própria maneira de ver
orientada pela sua espiritualidade ou de maneira impessoal, conforme o que
aprendeu nos ditames de sua instituição religiosa.
O universo religioso das pessoas entrevistadas foi o mais diverso possível,
isso também por conta da diversidade de credos e povos existente no Brasil. Isso se
reflete no Ensino Religioso com a necessidade premente de formação para a
diversidade, que poderá resultar em acolhimento sem distinções, só possível quando
o momento em sala for oportunidade de abertura respeitosa e encontro sem
reservas.

Considerações Finais
Apesar de ser o estado Brasileiro Laico, e consequentemente laica a
Educação praticada no país, a vergonha no meio acadêmico, que transforma a vida
de homens e mulheres em masmorras psicológicas se chama Intolerância, e alguns
indicam o Ensino Religioso como promotor de posicionamentos contrários ao bem
pensar e pensar com profundidade questões sobre as relações entre os gêneros,
tendo em vista os princípios formativo da religião no Brasil.

159
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
O preconceito, a exclusão e a discriminação vão muito além do apregoado
pelos ―defensores‖ de alguns grupos da sociedade. A falta de tolerância, ou melhor
dizendo: a falta de acolhimento se inicia na falência dos relacionamentos primeiros,
e pode ser percebida em muitos ramais da vida adulta: profissional, familiar,
educacional, social e também naqueles de cunho religioso.
O respeito ao outro e a sua diversidade está fragmentado, pois até mesmo a
formação acadêmica prefere algumas cadeiras à outras, consideradas, talvez,
menos científicas.
A influência das religiões na formação das pessoas no Brasil, especialmente a
Cristã é notória, especialmente com relação as relações de gênero. Alguns fatores
são responsáveis por isso: a) falta de conhecimento do sentido profundo das
palavras; b) desconhecimento do contexto geográfico e cultural; c) desconhecimento
do contexto histórico e suas interrelações.
A formação de mulheres e homens, com relação às religiões indica haver
necessidade urgente de criar um arsenal de pessoas livres, respeitosas e
destemidas quanto ao diferente. A respostas encontradas, como forma de otimizar a
transmissão de valores e princípios que contribuam a efetiva permanência de
TODOS no processo educativo, sem distinções de nenhuma forma, indicou o Ensino
Religioso como espaço privilegiadíssimo.
O Ensino Religioso ao discutir especialmente por meio dos textos sagrados
das diferentes comunidades os aspectos do ethos, da busca pela alteridade pode
colaborar na compreensão das orientações destes grupos, visando explicitar os
argumentos que permitam os indivíduos assumirem sua identidade em todos os
aspectos. De forma nenhuma o conhecimento, sob forma deste ou de qualquer outro
componente curricular deve servir para discriminar ou excluir pessoas.
Os princípio norteadores da educação de respeito à liberdade e apreço à
tolerância, como afirma o quarto parágrafo do artigo 3º da LDB 9394/96 – Carta
Magna da Educação vigente no país, indicou que a Educação é sim um caminho
profícuo para esta empreitada.
No momento exato em que a Educação é acusada por fomentar ações
homofóbicas, mais especificamente através da disciplina de Ensino Religioso, se faz

160
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
urgente uma reflexão criteriosa a respeito do papel da Educação na transmissão de
valores sobre a diversidade e a sexualidade.
As questões sobre orientação sexual e religião deixaram de constar nas
conversas na medida mesma em que o fenômeno da falência das instituições,
inclusive as religiosas, tem sido verificado na sociedade atual. Um dos lugares ainda
‗isentos‘ é a escola e é só através da formação do docente que será possível manter
aberto este lócus privilegiado de quebra de antigos paradigmas e produção do
conhecimento.
Além disso questionar a formação das pessoas vínculada aos aspectos
religiosos nasce da realidade, que se impõe à escola, de discutir sexualidade e as
relações dos genêros, como uma possibilidade em entender o diferente e aprender
com ele, e propõe a imersão tão necessária a um universo carregado de
simbolismos e que muitas vezes é considerado mundo da hegemonia masculina.
Servir-se do Ensino Religioso, e de outros espaços formativos, é demonstrar
uma resistência e conduzir a reflexão a respeito destes e de outros aspectos
intrigantes. Uma dessas questões é a Sexualidade, que nos dois últimos séculos
tornou-se tema privilegiado de estudo das ciências, de grupos religiosos, e de
educadores, que querem buscar levantar questões de discussão a fim de promover
o respeito e o combate à discriminação a partir do conhecimento e da
desmistificação.
O artigo 33 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação nº 9394 de 1996, com
nova redação através da Lei 9.475 de 1997, legisla sobre a disciplina da seguinte
forma:
Art.33° - O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da
formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais das
escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à
diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de
proselitismo.
§ 1° - Os sistemas de ensino regulamentarão os procedimentos para a
definição dos conteúdos do ensino religioso e estabelecerão as normas
para a habilitação e admissão dos professores.
§ 2° - Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constituída pelas
diferentes denominações religiosas, para a definição do ensino religioso.

A Lei, ampla e por isso mesmo ambígua, confere aos Conselhos Estaduais de
Ensino uma co-responsabilidade e espera que estes venham preencher os espaços

161
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
deixados, até por conta do contexto e das diferentes realidades por esse Brasil
afora.
Existe ainda a possibilidade de cada instituição escolar adaptar-se à lei
através do Projeto Político Pedagógico, o que torna o ensino ainda mais próximo da
realidade na qual a escola está inserida, desde que construído efetivamente ouvindo
anseios e vozes da coletividade.
Para a prática de um ensino religioso que respeite os princípios da lei – com
relação à laicidade do Estado e de princípios não proselitistas, é necessário tanto na
formação dos professores quanto na elaboração do projeto político pedagógico é
necessário refletir e fazer refletir que na sociedade brasileira, de formação, a
princípio, judaica-cristã, tem em seu bojo caracteres medievais, e que a bem pouco
tempo ainda atrelava as ações do estado ao controle das anotações da igreja, a
saber: casamentos, nascimentos e falecimentos.
Apesar dos avanços no sentido da laicidade do estado, é possível perceber
na constituição federal apenas três categorias para o exercício religioso: o sacerdote
católico, o judaico e o de confissão evangélica. E onde estão representadas as
religiões não cristãs na Carta Magna Brasileira?
Da mesma forma que ao incluir a maioria das expressões religiosas da
sociedade, sob a égide da lei, poderá garantir o direito a livre expressão e culto,
considerar com respeito àqueles que exercem sua sexualidade de forma diferente
do padrão dito como ―normalidade‖ pode garantir que as crianças e jovens possam
apurar o olhar, viabilizando VER com olhos sensíveis os anseios dos diferentes.
A solução passa necessariamente pela formação do professor de Ensino
Religioso, que deve contemplar ao menos três quesitos.
A dicotomia teoria-prática posta em ação conforme a Resolução CNE/CP 2,
de 19/02/02:

Art. 1º A carga horária dos cursos de Formação de, no mínimo, 2800 (duas
mil e oitocentas) horas, nas quais a articulação teoria-prática garanta, nos
termos dos seus projetos pedagógicos, as seguintes dimensões dos
componentes comuns.
I - 400 (quatrocentas) horas de prática como componente curricular,
vivenciadas ao longo do curso;
II- 400 (quatrocentas) horas de estágio curricular supervisionado a partir do
início da segunda metade do curso;

162
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
Unir na formação o exercício da reflexão vinculado à prática deve garantir um
profissional atento ao seu entorno e que traz em seu bojo o comprometimento com
outros e outras no processo. Então nisso o estágio se dá, também, como garantia de
fazer entender ao futuro profissional a tão necessária imersão na realidade para
respeitar as diferentes necessidades discentes.
As situações cotidianas deste profissional, assim como seu público atendido,
são únicas. E por vezes o melhor planejamento precisa ser ajustado em tempo real
durante uma aula ou encontro com seus alunos – que indicam naquele exato
momento uma forma de abordagem que melhor colabore para alcançar os objetivos
propostos.
É necessário criar um arsenal de conhecimentos que possibilitem uma ação
eficaz, entendendo ser impossível manter alunos e professores motivados partindo
da improvisação vazia. É necessário deter e mobilizar conhecimentos para só então
intuir, fomentar discussões e a partir daí improvisar com foco em atitudes que torne o
conhecimento cada vez mais eficaz possível.
Também por isso é indicada na formação de professores de Ensino Religioso
a pesquisa sistemática, que ofereça como frutos embasamento sólido e conclusões
que indiquem um movimento cíclico de busca e encontro no desenvolvimento dos
alunos, na compreensão da realidade e na autonomia destes para a interpretação
dos fatos de maneira isenta de tendências de qualquer gênero, assegurando assim
um ensino com autoridade do saber e da vivência, assim como apregoado no
Sermão do Monte, pelo autor da Pedagogia do Exemplo – Jesus, o Cristo.
Estas constatações não encerram o processo critico-reflexivo sobre a
formação de professores, em especial para o Ensino Religioso, também como forma
de combater qualquer tipo de preconceito, discriminação e violência. Ao contrário
indicam a urgência em encontrar um caminho diferente para as futuras gerações, ou
um ritmo diferente no passo, que dê conta de diferentes caminhantes num mesmo
caminho. É certo que na chegada todos terão visto as mesmas paisagens, alguns
deleitarão o olhar com as pedras, outros com a vegetação e outros, não terão uma
visão detalhada, saborearão apenas os odores da terra, das matas e dos outros
caminhantes.
É importante o caminhar – e o embasamento de cada novo passo!

163
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
REFERÊNCIAS

BELLO, José Luiz de Paiva. O poder da religião na educação da mulher.


Pedagogia em Foco Rio de Janeiro, 2001. Disponível em:
<http://www.pedagogiaemfoco.pro.br/mulher02.htm> Acesso em: 23.abr.2004.

BÍBLIA DE REFERÊNCIA. V. T. Thompson. Português. Bíblia Sagrada. Edição


Contemporânea. São Paulo. Vida, 1995.

BRASIL, Lei n. 9394/96, de 20 de dezembro de 1996. Lei de diretrizes e bases da


educação nacional.

BRASIL/CNE. Resolução CNE/CP 2/2002. Diário Oficial da União, Brasília, 4 de


março de 2002. Seção 1, p. 9.

GODOY, Arilda S., Introdução à pesquisa qualitativa e suas possibilidades, In


Revista de Administração de Empresas, v.35, n.2, Mar./Abr.1995a,p. 62.

NICHOLSON, Shirley (org). O novo despertar da deusa. O princípio feminino hoje.


Rio de janeiro: Rocco, 1993.

THEODORSON, G.A; THEODORSON, A.G. A modern dictionary of sociology.


New York: Crowell, 1970

TRADUÇÃO ECUMÊNICA DA BÍBLIA (TEB). São Paulo. Edições Loyola, 1994.

VIESSER, Lizete C. Um Paradigma didático para o Ensino Religioso. Rio de Janeiro,


Vozes, 1994.

Parâmetros Curriculares Nacionais – Ensino Religioso. Forum Nacional Permanente


do Ensino Religioso. 1996.

CATÃO, Francisco. O Fenômeno Religioso, São Paulo, Editora Letras & Letras,
1995.

Lei de Diretrizes e Bases, 1997.

Parâmetros Curriculares Nacionais – Ética

ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. São Paulo, Mestre Jou, 1986.

————. História da Filosofia. Vol. I a XIV. Lisboa, Editorial Presença, 1970 a 1993.

BERGSON, H. Cartas, conferências e outros escritos. São Paulo, Abril Cultural,


Coleção ―Os Pensadores‖, 1984.

COMENIO. Didactica magna. Pansophia. Firenze, Nuova Italia, 1984.

164
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
COMENIUS, Johann Amos. Pampaedia. Heidelberg, Quelle & Meyer, 1965. (Texto
em latim e alemão).

————. Selections. (Introduction by Jean Piaget). Paris/Lausanne, Unesco, 1957.

DERRIDA, Jacques, VATTIMO, Gianni et alii. A religião. Lisboa, Relógio D'Água,


1997.

ELIADE, Mircea. História das crenças e das idéias religiosas. Tomo II, vol. 1. Rio de
Janeiro, Zahar, 1979.

————, Mircea. Traité d‘histoire des religions. Paris, Payot, 1964.

FEUERBACH, L. Princípios da filosofia do futuro.Lisboa, Edições 70, 1988.

HUME, D. Diálogos sobre a religião natural. São Paulo, Martins Fontes, 1992.

JAMES, W. A vontade de crer. São Paulo, Edições loyola, 2001.

KEPEL, Gilles. La revanche de Dieu. Paris, Editions du Seuil, 1990.

LYOTARD, Jean-François. A condição pós-moderna. Rio de Janeiro, José Olympio,


1998.

MONDIN, B. Quem é Deus- elementos de Teologia filosófica. São Paulo, Paulus,


1997.

NIETZSCHE, Friedrich W. Obras incompletas. São Paulo, Abril Cultural, Coleção ―Os
Pensadores‖, 1983.

OTTO, Rudolf. O sagrado. Lisboa, Edições 70, 1992.

PENZO, Giorgio e GIBELLINI, Rosino (orgs.) Deus na filosofia do século XX. São
Paulo, Edições Loyola, 1998.

PESTALOZZI, Johann Heinrich. Sämtliche Werke und Briefe. Kritische Ausgabe.


Zurique, Orell Füssli, 1927-1980. Obras, Vol. I a XXVIII. Cartas, Vol. I a XIII.

REALE, Giovanni. O saber dos antigos. Terapia para os tempos atuais. São Paulo,
Loyola, 1999.

ROUSSEAU, Jean-Jacques. Œuvres complètes. 4 vols. Bibliothèque la Pléiade.


Paris, Éditions Gallimard, 1967.

RUSSELL, Bertrand. Science et religion. Paris, Gallimard, 1971.

SILVA, Eliane Moura da. & KARNAL, Leandro. O ensino religioso na escola pública
de São Paulo, Secretaria do Estado da Educação, Unicamp. 2002.

VATTIMO, Gianni. O fim da modernidade. São Paulo, Martins Fontes, 1996.

165
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
FÓRUM NACIONAL PERMANENTE DO ENSINO RELIGIOSO. Parâmetros
curriculares nacionais; ensino religioso. 5 ed. São Paulo: Ave Maria, 2001.

FERREIRA, Amauri Carlos. Ensino Religioso nas fronteiras da ética. Petrópolis (RJ):
Vozes, 2001.

FIGUEIREDO, Anísia de Paula. O tema gerador no currículo de Educação Religiosa


– o senso do simbólico. Petrópolis (RJ): Vozes, 2000.

______. Ensino Religioso: perspectivas pedagógicas. Petrópolis (RJ): Vozes, 1995.

GONÇALVES FILHO, Tarcizo. Ensino Religioso e formação do ser político – uma


proposta para a consciência de cidadania. Petrópolis (RJ): Vozes, 1998.

GRUEN, Wolfgang. Ensino Religioso na escola. Petrópolis (RJ): Vozes, 1995.

166
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
CONCEPÇÕES DE ENSINO RELIGIOSO DOS DOCENTES DO
ENSINO FUNDAMENTAL DO ESTADO DO PARANÁ —
possibilidades para uma formação de professores

RODRIGUES, Edile M. Fracaro — PUCPR


edile@celulas.com.br
VOSGERAU, Dilmeire Sant‘Anna Ramos — PUCPR
dilmeire.vosgerau@pucpr.br
JUNQUEIRA, Sérgio Rogério Azevedo — PUCPR
srjunq@uol.com.br
Área Temática: Educação: Profissionalização Docente e Formação
Agência Financiadora: Não contou com financiamento.

Resumo
O presente artigo apresenta os dados levantados em uma pesquisa de abordagem
qualitativa, de caráter exploratório, que teve como objetivo geral verificar a
concepção de Ensino Religioso dos professores do Ensino Fundamental do Estado
do Paraná. Cada área de conhecimento requer um curso que projete uma formação,
pressupondo um perfil profissional, pois um docente formado por uma determinada
escola de pensamento vai formar segundo esses moldes. Daí a relevância desta
pesquisa. Os autores que deram sustentação teórica para esta investigação foram
JUNQUEIRA, OLIVEIRA, FREIRE, TARDIF, MARCELO GARCÍA, entre outros. 218
documentos recolhidos no Simpósio da SEED em outubro de 2006, na cidade de
Curitiba, deram sustentação para responder a questão problematizadora da
investigação. Por se tratar de um volume grande de documentos coletados, foi
necessária a utilização de um software que possibilitasse a otimização do
levantamento dos dados. A partir dos dados coletados dos professores de
Geografia, Filosofia, Pedagogia e História, foi possível categorizar quatro
concepções de Ensino Religioso: Transmissão e desenvolvimento de valores, moral
e ética, Respostas às questões existenciais, Estudo das tradições religiosas e
manifestação do Sagrado, Área de Conhecimento. Essas concepções se enquadram
em dois modelos de Ensino Religioso: Interconfessional e Fenomenológico. A
análise dos documentos revelou uma mudança significativa para a história do Ensino
Religioso no Paraná, pois os dados sugerem uma superação das tradicionais aulas
de religião e apontam que o professores estão procurando inserir em suas aulas

167
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
conteúdos que tratem da diversidade de manifestações religiosas, seus ritos, suas
paisagens e símbolos, suas relações culturais, sociais, políticas e econômicas.
Palavras-chave: Ensino Religioso; Formação de professores; Concepções de
Ensino Religioso.

Introdução
Nos últimos tempos, o interesse dos pesquisadores tem sido o planejamento de
ensino, a avaliação da aprendizagem e do ensino, as crenças e representações dos
professores, os processos cognitivos e decisórios que orientam a ação prática, os
saberes produzidos pelos professores, suas condições de trabalho, o
envelhecimento, o desgaste profissional etc. (TARDIF e LESSARD, 2005, p.41).
Analisar e pesquisar o campo religioso dentro de sua diversidade a partir de uma
visão mais ampla, incluindo-o e tratando-o como área de conhecimento com
natureza própria como as demais áreas do conjunto curricular, tem sido o desafio do
Ensino Religioso. Grupos de estudos sobre o assunto têm surgido em algumas
regiões do país e a sua atuação tem provocado a reflexão no sentido de uma
mudança de concepção e prática do Ensino Religioso. JUNQUEIRA (1996), LONGHI
(2004), SCHLÖGL (2005); CORRÊA (2006); OLIVEIRA et al (2006), são alguns
desses pesquisadores.
A compreensão da realidade do professor de Ensino Religioso possibilita verificar
como esse profissional tem concebido essa área de conhecimento e qual a
contribuição desse saber para a reflexão pedagógica sobre um homem dotado de
razão, afetividade, inteligência, corpo e desejo. E diante desse quadro, cada vez
mais se percebe a importância da formação dos professores e que a educação, uma
das mais complexas operações humanas, possa também se ocupar da educação de
seus educadores.
Assim, a formação desse profissional da educação carece de uma leitura crítica das
realidades sociais para se buscar os referenciais para a organização e
redirecionamento do seu trabalho em sala de aula. Para Marcelo (1999, p. 11) ―a
formação de professores está a transformar-se numa área válida e complexa de
conhecimento e investigação, que oferece soluções e, por sua vez, coloca
problemas aos sistemas educativos‖.

168
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
Essa é a relevância desta pesquisa de abordagem qualitativa, de caráter
exploratório, que apresenta como objetivo geral verificar a concepção de Ensino
Religioso dos professores do Ensino Fundamental do Estado do Paraná. A pesquisa
exploratória, que pode envolver levantamento bibliográfico, entrevista com pessoas
com experiências práticas acerca do tema pesquisado e análise de exemplos que
estimulem a compreensão, tem como finalidade básica desenvolver, esclarecer e
modificar conceitos e idéias para a formulação de problemas mais focados ou
levantamento de hipóteses para pesquisas posteriores (GIL, 1999, p. 43).

O cenário da pesquisa
Por mais primitivos que sejam, todos os povos têm religião, magia, atitudes
científicas ou ciência. Para Boeing (1999), ―não há época nem espaços humanos
sem religião; não existe vácuo religioso; sua difusão é universal‖ e cada religião
busca oferecer uma orientação global que dê sentido a tudo que nos cerca. Ela cria
valores e normas, estabelece um universo simbólico que aponta para o além do
tangível, do humano e do cotidiano.
Por constituir ―parte integrante da formação básica do cidadão‖ (BRASIL, 1996), a
ênfase do Ensino Religioso está na formação cidadã do ser humano, promovendo o
diálogo intercultural e inter-religioso para que seja garantido o respeito à identidade
e à alteridade1.
Mas há que se perguntar: — Precisa-se mesmo do Ensino Religioso? Para Cortella
(2006 p.17-18)

uma criança não compreende a religião, seus dogmas e princípios como


Teologia. No entanto, seu sentimento de religiosidade se aproxima ao
mágico que tem desde sempre. Um menino com 3 ou 4 anos de idade
possui um imaginário magnífico: ele se vê, se pensa, se oferece
superpoderes, lança forças de inimigos ou de amigos fantasiosos. A partir
de 6 ou 7 anos cria maiores bases de racionalidade e entende mais a
relação de causa e efeito do mundo. Ao formar conexões com algumas
questões fortes da vida, como: ―por que isso acontece‖, ―por que não?‖
Essas são formas de espiritualidade e questionamentos que, dependendo
dos pais e docentes, podem ou não ser dirigidas por um canal positivo.

Assim, o Ensino Religioso articulado com as demais disciplinas auxilia na interação


social responsável e atuante, contribuindo ―para a construção de outra visão de
mundo, de ser humano e de sociedade, considerando o religioso como uma

169
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
dimensão humana que vai além da superfície dos fatos, acontecimentos, gestos
ritos, normas e formulações‖ (OLIVEIRA et al, 2007, p. 101). Ao lado de outros
campos de saber, o Ensino Religioso pode acrescentar à visão sobre a realidade,
mais um modo de discuti-Ia, principalmente ao adotar uma metodologia pautada na
interdisciplinaridade2.

1 ALTERIDADE é a concepção que parte do pressuposto básico de que todo o homem social interage
e interdepende de outros. A IDENTIDADE é definida pela relação do indivíduo com outros indivíduos,
isto é, cada indivíduo se completa e se efetiva no relacionamento com os que estão à sua volta, em
seu convívio. Para Junqueira (2008a, p.14) ―a identidade depende de algo fora dela, de uma outra
identidade que ela não é. A identidade é relacional, a diferença é sustentada ao mesmo tempo pela
exclusão e pela solidariedade‖.
2Segundo o que diz o PCN do Ensino Médio — Parte 1, p. 22 — interdisciplinaridade é a utilização
dos conhecimentos de várias disciplinas na resolução de um problema concreto ou a compreensão
de um determinado fenômeno sob diferentes pontos de vista.

O enfoque interdisciplinar, no contexto educacional, contribui para a reflexão de uma


qualificação do ensino e da pesquisa. Buscar a visão global da realidade pode
possibilitar a transformação da situação social e existencial. Num processo de
reflexão crítica sobre a práxis que estabelece significados, o estudo e a
decodificação do fenômeno religioso no contexto educativo são fatores de
crescimento e de construção coletiva para professores e estudantes.
Para Junqueira et al (2007, p.158), o Ensino Religioso propõe valorizar o pluralismo
e a diversidade cultural presente na sociedade brasileira, facilitando a compreensão
das formas que exprimem o Transcendente na superação da finitude humana e que
determinam o processo histórico da humanidade.
Procurando ampliar a visão sobre o Ensino Religioso, a SEED — Secretaria de
Estado de Educação do Paraná — promoveu um Simpósio na semana de 23 a 26
de outubro de 2006 em Curitiba (PR). Estiveram presentes mais de 350 professores
que atuam nessa área do conhecimento.
Com o objetivo de verificar a concepção de Ensino Religioso dos professores do
Ensino Fundamental do Estado do Paraná, foi proposto aos participantes que
elaborassem um desenho e uma frase que expressasse o papel do Ensino Religioso
na educação dos alunos.

170
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
Foi solicitado também que fossem indicados gênero, formação e tempo de docência,
possibilitando assim levantar o perfil e a formação do professor de Ensino Religioso
do Estado do Paraná.
Buscando uma ferramenta que possibilitasse a associação de texto e imagem e que
comportasse o volume de dados levantados nos 218 coletados, optou-se pela
utilização do software ATLAS.ti. Conhecido como um instrumento eficiente na
análise de questionários com questões abertas e fechadas, bem como na criação de
banco de dados e networks (teias de relações) que possibilitam um panorama eficaz
para a proposta de toda pesquisa, esse software comprovou também ser versátil na
associação de textos e imagens.

O perfil dos professores


Em relação ao gênero dos participantes desta investigação, 183 professores
informaram esse dado, sendo 22 professores e 161 professoras. Essa amostra é
confirmada por Garcia et al (2005, p. 47): ―Os docentes são uma categoria
amplamente constituída por mulheres, pelo menos no ensino básico‖.

Quadro 1 — Tempo de docência no Ensino Religioso dos professores


pesquisados
O tempo de docência de 186 professores varia de 1 a 31 anos, sendo que 42
professores indicaram lecionar há mais de 11 anos. Já o tempo de docência no
Ensino Religioso, revela o quanto realmente é jovem essa área do conhecimento,
pois 94 dos 170 professores que forneceram essa informação estavam atuando há
menos de 3 anos no momento da coleta de dados.
A formação dos 176 professores que apontaram essa informação nos documentos
pesquisados é bem variada, não havendo uma formação específica em Ensino
Religioso. A graduação em História foi a mais indicada pelos participantes, seguida
por Pedagogia, Filosofia, Letras e Geografia. Chama a atenção só dois professores
terem formação em Teologia. A Figura 1 mostra a especialização, extensão e pós-
graduação de 31 professores, vindo a confirmar a pesquisa de OLIVEIRA et al
(2006) que diz que basicamente a oferta de cursos de formação de Ensino Religioso
acontece, em sua maioria, na Pós-graduação Lato Sensu e Extensão.

171
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
2 meses a 2 anos 94
3 a 5 anos 55
6 a 10 anos 9
11 a 15 anos 10
15 anos em diante 2

Figura 1 — Formação dos professores pesquisados


- ER: 1
- Filosofia: 1
- ER: 4
- Pedagogia Religiosa: 5
- Pastoral de educação e ER: 1
- Antropologia Social e Interdisciplinaridade: 1
- Letras e Pedagogia: 1
- ER: 4
- Pedagogia Religiosa: 4
- Met. do Ensino de História: 1
- História e Cultura: 1
- Educação Especial: 1
- Teologia: 1
- Psicopedagia Religiosa: 2
- Língua Portuguesa: 1
- Ensino de Hist. do séc. XX e Inclusão: 1
- Hist. do pensamento político brasileiro do sec. XIX e XX e Mestrado em Educação: 1

Considerando as formações de Geografia, Filosofia, Pedagogia e História, como


licenciaturas estabelecidas pela Deliberação 01/06 (PARANÁ, 2006) para o exercício
docente do Ensino Religioso, foi feita a análise de 53 documentos elaborados por
professores dessas áreas do conhecimneto. É importante ressaltar que se procurou
estabelecer a concepção de Ensino Religioso dos professores levando em
consideração a recorrência dos indicadores e o maior número de indicadores
implicados em uma mesma categorização. As demais formações indicadas nos
documentos analisados e outros indicadores, como por exemplo, a recorrência de
determinadas figuras que necessitariam de uma análise semiótica, não foram focos
desta investigação.
Quatro concepções sobre o Ensino Religioso ficaram evidentes na análise dos
documentos: o Ensino Religioso como ―Transmissão ou desenvolvimento de valores,
moral e ética‖; ―Resposta às questões existenciais‖; ―Estudo das tradições religiosas
e a manifestação do sagrado‖ e ―Área de conhecimento‖. Na figura a seguir,
observa-se as concepções mais apontadas nos documentos analisados.
Essas concepções se enquadram em dois modelos de ER: o modelo
Interconfessional ou Inter-relacional (―Transmissão e desenvolvimento de valores,

172
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
moral e ética‖, ―Respostas às questões existenciais‖) e o modelo fenomenológico
(―Estudo das tradições religiosas e manifestação do Sagrado‖, ―Área de
Conhecimento‖). Um terceiro modelo de Ensino Religioso, o Confessional, não foi
categorizado nesta investigação, pois apenas um documento apontou o indicador
―confessionalidade‖.

CONCEPÇÕES DE ENSINO RELIGIOSO (Modelos Interconfessional e


Fenomenológico)
O modelo interconfessional toma o seu próprio grupo como o centro de tudo e todos
e os outros fenômenos religiosos são lidos, pensados e sentidos por meio dos
valores e modelos do grupo, no caso, o cristianismo. Nesse modelo, ―a idéia da
formação religiosa está voltada a fazer seguidores (reeligere) e de religar (religare) o
homem a Deus, visando torná-los mais religiosos, voltados às práticas de formação
de valores e atitudes éticas consideradas ideais‖ (CORRÊA, 2006).
Segundo Junqueira (2000), o modelo fenomenológico abrange não apenas uma
dimensão humana, mas também a vida religiosa concreta de cada grupo (cultos,
práticas e crenças e métodos de socialização), sistematizações pastorais e
teológicas e a autoridade expressa por meio de livros sagrados, normas, pessoas
(JUNQUEIRA, 1996).

As concepções de Ensino Religioso dos professores de Geografia


Seis professores de Geografia foram identificados durante o levantamento dos
dados. O tempo de docência no Ensino Religioso dos professores pesquisados pode
ser considerado pequeno, pois tem uma variação de dois meses a aproximadamente
dois anos.
A concepção de Ensino Religioso que ficou mais evidente na análise dos
documentos dos professores dessa formação foi a ―Transmissão ou
desenvolvimento de valores, moral e ética‖.
Tomando como exemplo a teia (network) da professora S 046, com 13 anos de
docência em Geografia e 8 meses de docência no Ensino Religioso, gerada pelo
ATLAS.ti, é possível observar os indicadores que possibilitaram a categorização
dessa concepção, além dos que emergiram da análise.

173
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
O Ensino Religioso pode ser percebido como uma porta para a compreensão de
parte da natureza humana (OLIVEIRA et al, 2007, p. 36), pois, ao apresentar a
religiosidade de diferentes culturas, revela a busca do ser humano para se relacionar
com o sagrado para tornar-se mais pleno.
Essa plenitude coopera no desenvolvimento do respeito, da união, do amor e da
solidariedade, valores apontados pelos professores.
Outro fator a ser considerado na compreensão dessa concepção é a cobrança para
que os professores ―cumpram funções de família e de outras instâncias sociais, que
respondam à necessidade de afeto dos alunos; que resolvam os problemas da
violência, da droga e da indisciplina [...]‖ (SEVERINO e PIMENTA in OLIVEIRA et al,
2007, p. 12).

As concepções de Ensino Religioso dos professores de Filosofia


Dez professores de Filosofia tiveram seus documentos analisados. O tempo de
docência Ensino Religioso dos pesquisados em relação aos professores de
Geografia é maior: 1 ano a 27 anos. O mesmo acontece em relação ao Ensino
Religioso: 1 ano a 5 anos, sendo que 5 professores estão atuando no Ensino
Religioso há 3 anos.
A segunda concepção de Ensino Religioso mais indicada pelos professores foi
―Resposta às questões existenciais‖. Ao tratarmos do Ensino Religioso nos
deparamos com as questões fundamentais oriundas do pensamento filosófico: —
Quem sou eu? Para onde vou? De onde vim?
— A ciência e as diferentes religiões buscam incessantemente por meio da
investigação ou da comunicação com o mistério, responder a cada uma dessas
questões. A opinião da professora S106 está totalmente integrada ao desenho,
como se observa na Figura 4.

Figura 4 – Dados coletados S 106 — Filosofia


Texto da professora S 106: O que é Budismo? Espiritismo? Islamismo? E eu?

Para Freire e Faundez, (1985, p. 23), a inquietação dos educandos, suas dúvidas e
curiosidades sobre o desconhecido são os desafios postos para uma experiência
reflexiva e enriquecedora tanto para o professor, quanto para os alunos. Um
professor que considera todas as perguntas, incentiva a curiosidade do educando,
174
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
mesmo quando a pergunta lhe pareça ingênua ou mal colocada, pois sempre há
uma razão para aquela pergunta.

As concepções de Ensino Religioso dos professores de Pedagogia


Foram analisados dez documentos dessa área do conhecimento. Quatro
professores não informaram o tempo de docência no ER e os demais apontaram de
1 a 2 anos de experiência.
Portanto, o tempo de docência no Ensino Religioso é menor do que o apontado
pelos professores de Filosofia e maior do que o apontado pelos professores de
Geografia. ―Estudo das tradições religiosas e a manifestação do sagrado‖ foi a
concepção mais apontada nos ―riscos e rabiscos‖ dos professores de pedagogia. Na
representação gráfica da análise do documento da professora S 081 percebe-se os
indicadores que possibilitaram a compreender o Ensino Religioso como ―Estudo das
tradições religiosas e a manifestação do sagrado‖.
Apresentar os conteúdos de Ensino Religioso a partir das tradições dos alunos e de
seu contexto social é um aspecto que merece destaque. Firmar a identidade
religiosa do aluno e as marcas de sua cultura é importante, pois a renúncia dessas
marcas pode levar a uma desvalorização das novas culturas que lhe apresentadas
(FREIRE e FAUNDEZ, 1985, p. 17).
Entretanto, o relacionamento com o mundo é uma longa aprendizagem que implica
na descoberta do outro, de outras realidades, das marcas de outras linguagens e de
outros gestos.
Assim, a cultura se manifesta nos gestos mais simples da vida cotidiana como as
maneiras diferentes de comer, dar a mão e até mesmo relacionar-se com o outro, e
não apenas na manifestação artística ou intelectual expressa por meio do
pensamento.

As concepções de Ensino Religioso dos professores de História


Levando em consideração os 27 documentos dos professores de História que foram
analisados foi constatado que a experiência dos professores dessa área de
conhecimento é maior em relação às outras formações, tanto no tempo de docência
(1 a 30 anos) quanto na docência em Ensino Religioso (até 6 anos).

175
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
O Ensino Religioso como ―Área do conhecimento‖ foi a segunda concepção mais
indicada pelos professores dessa área do conhecimento. O indicador ―cidadania‖ foi
apontado vinte e sete vezes nas frases e desenhos desses professores.
Como área de conhecimento e fundamentado numa releitura religiosa do cotidiano,
o Ensino Religioso colabora no processo da construção de um cidadão que
compreende o seu contexto sóciocultural, político-educacional, econômico e
religioso.
O texto e a frase da professora S 127 demonstram como o Ensino Religioso pode
contribuir como marco estruturado de leitura e interpretação da realidade.

Texto da professora S 127 — História: Direcionar o olhar do aluno para o mundo e sua diversidade,
aprendendo a respeitá-la.
Figura 6: Dados coletados S 127 — História

Tardif e Lessard (2005, p.7) afirmam que ―a criança escolarizada é a raiz do homem
moderno atual‖ e que o ―conceito moderno de cidadania é impensável sem o de
instrução‖. O exercício da cidadania e o direito da expressão religiosa podem ser
desenvolvidos na escola, já que nesse espaço de aprendizagem, trabalha-se as
regras do espaço público democrático, buscando a superação de todo e qualquer
tipo de discriminação e exclusão social, valorizando cada indivíduo e todos os
grupos que compõem a sociedade brasileira.
Na representação gráfica da análise do documento da professora S 134, observa-se
a variedade de indicadores, além dos indicadores ―conhecimento‖ e ―cidadania‖ que
apontaram para a categorização do Ensino Religioso como área de conhecimento.
O desenho remete a uma convivência e harmonia entre as tradições religiosas. Esse
respeito e harmonia são frutos de uma consciência cidadã. Aprendendo a conviver
com as diferentes tradições religiosas, vivenciando a própria cultura e respeitando as
diversas formas de expressão cultural, o educando estará também se abrindo para o
conhecimento. É cidadão de um mundo complexo, onde se inscrevem relações em
rede, não menos complexas. Porém, é um ser dotado de capacidades criativas e
talentosas, autônomo em seu processo de aprender (JUNQUEIRA, 2008b).
O desenho da professora 131, com 22 anos de experiência na docência em História
e 4 anos

176
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
em ER, e sua frase (Ninguém é igual a ninguém), é um exemplo bem concreto do
respeito à diversidade, pois pode ser feita a relação com a funcionalidade dos dedos
das mãos, Nossas mãos não teriam a mesma funcionalidade se todos os dedos
fossem iguais?
Assim, de acordo com o que Carniato (2005, p.37) afirma

Além do conteúdo estabelecido, o ER tem um tratamento pedagógico


diferenciado. Ele é mais do que só conhecimento. É preciso oferecer
atividades interativas e participativas que proporcionem experiências. E
estas por sua vez, refletidas e dialogadas, se transformem em construção
de saber, de sabedoria, e levem à educação integral da cidadania terrena e
do protagonismo na humanização e na construção de um mundo novo, de
vida para todos.

Educar para conhecer diversas religiões e compreender as culturas que lhes dão
forma, analisar a relação entre presente e passado para produzir um saber histórico,
implica em exercitar o diálogo com o diferente, baseado no respeito profundo e no
desejo de preservar a dignidade e direito de existência de cada manifestação
cultural-religiosa. Dessa forma, o aluno participa ativamente da construção do
processo da aquisição de seus conhecimentos, utilizando a dimensão racional de
seu ser, e também as dimensões sensíveis, emocionais e intuitivas.

Considerações finais
Os direitos fundamentais de liberdade religiosa e de expressão religiosa são frutos
de uma sociedade pluralista que se expressa no Estado não-confessional e laico. A
laicidade não é a negação da fé, mas protege todas as confissões de discriminação
e de forma democrática possibilita a relação entre o cidadão e o Estado, o privado e
o público.
Permitir ao outro ser sujeito de sua cultura e de seus desejos é o desafio do contexto
atual.
Por isso, os debates e as reflexões prosseguem na busca para estabelecer o Ensino
Religioso como um espaço para pensar o ser humano, numa abordagem
fenomenológica que observe as diversas manifestações religiosas de forma cultural.
A pesquisa na área da educação tem procurado estabelecer e fornecer à formação
inicial dos professores ―conhecimentos oriundos da análise do trabalho em sala de
aula e na escola‖ (Tardif, 2002, p. 290). Cada área de conhecimento requer um
curso que projete uma formação, pressupondo um perfil profissional, pois um
177
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
docente formado por uma determinada escola de pensamento vai formar segundo
esses moldes.
Os dados levantados nesta investigação apontam a concepção de ER ―Transmissão
e desenvolvimento de valores, moral e ética‖, que se enquadra no modelo
interconfessional, como a mais indicada nas frases e desenhos dos professores de
Geografia, Filosofia e História (Figura 7).
Porém, esse dado não descarta a combinação de vários modelos de ação durante a
sua atividade. Daí a complexidade da ação docente implicar numa variedade de
ações e interações com os alunos.
Os dados também sugerem uma superação das tradicionais aulas de religião e
apontam que o professores estão procurando inserir em suas aulas conteúdos que
tratem da diversidade de manifestações religiosas, dos seus ritos, das suas
paisagens e símbolos, as relações culturais, sociais, políticas e econômicas de que
são impregnadas as diversas formas de religiosidade.
No entanto, há que se preocupar com um esvaziamento se esses conteúdos forem
trabalhados somente em nível de informação e curiosidade, pois é a transformação
da informação em conhecimento que proporcionará a consciência cidadã. Assim, os
conteúdos pensados e elaborados a partir de uma abordagem fenomenológica,
podem auxiliar os alunos a enfrentar os conflitos existenciais e a desenvolver,
orientados por critérios éticos, a religiosidade presente em cada um.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei de diretrizes e bases da educação nacional LEI 9394/96. Brasília:


MEC, 1996.

______. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares


Nacionais — Ensino Médio. Parte I - Bases Legais.. Disponível em:
ttp://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/blegais.pdf. Acesso em: 05/05/2008.

BOEING, Antonio. O Fenômeno Religioso como Experiência Universal. São


Paulo: AEC, 1999. Disponível em: http://www.aster-
to.org.br/download/auniversalidadedofenomenoreligioso.pdf. Acesso em: 02 de
setembro de 2007.

CORTELA, Mario Sergio. Educação, Ensino Religioso e formação docente. In:


SENA, Luzia (Org.). Ensino religioso e formação docente: ciências da religião e
ensino religioso em diálogo. São Paulo: Paulinas, 2006.

178
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
CORRÊA, Bárbara Raquel do Prado Gimenez. Concepções dos professores
sobre o sagrado: implicações para a formação docente. Dissertação de
Mestrado em Educação. Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Curitiba, 2006.
Orientador: JUNQUEIRA, Sérgio Rogério de Azevedo.

GIL, Antonio Carlos. Métodos e técnicas de pesquisa social. São Paulo: Atlas,
1999.

FREIRE, Paulo; FAUNDEZ, Antonio. Por uma Pedagogia da pergunta. Rio de


Janeiro: Paz e Terra, 1985. Ed. Biblioteca Digital Paulo Freire. Disponível em
www.paulofreire.ufpb.br

JUNQUEIRA, Sérgio Rogério de Azevedo. Programa Marista de Educação


Religiosa, um ideal, um caminho, uma proposta. Dissertação de Mestrado.
Orientador: GIANETTO, Ubaldo. Pontifcia Universita Salesiana, U.P.SALESIANA,
Vaticano. Ano de obtenção: 1996.

_______; Ensino Religioso no Brasil: O processo de escolarização. Tese de


Doutorado. Orientador: TRENTI, Zelindo. 2000.

_______; RODRIGUES, Edile M. Fracaro; RAU Dédora Toniolo História, Geografia


e Ensino Religioso: Uma proposta integrada. Revista Diálogo Educacional.
Curitiba: PUC-PR, v. 7, n. 20, p. 143-165, jan./abr. 2007.

_______. História, Legislação e Fundamentos do Ensino Religioso. Curitiba,


IBPEX, 2008a (no prelo).

_______. Fundamentos Pedagógicos do Ensino Religioso. Curitiba, IBPEX,


2008b (no prelo).

LONGHI, Miguel. O ETHOS no programa de Ensino Religioso brasileiro.


Dissertação de Mestrado em Educação. Pontifícia Universidade Católica do Paraná.
Curitiba, Paraná, 2004. Orientador: JUNQUEIRA, Sérgio Rogério de Azevedo.

MARCELO GARCÍA, Carlos. Formação de professores, pra uma mudança


educativa. Porto: Porto, 1999.

OLIVEIRA, Lílian Blanck. JUNQUEIRA, Sérgio Rogério Azevedo; GILZ, Claudino;

RODRIGUES, Edile M. Fracaro; PEROBELLI, Raquel de Moraes Borges. Curso de


formação de professores. In: SENA, Luzia (Org.). Ensino religioso e formação
docente: ciências da religião e ensino religioso em diálogo. São Paulo: Paulinas,
2006.

_______; JUNQUEIRA, Sérgio Rogério Azevedo; ALVES, Luiz Alberto Sousa; KEIM,
Ernesto Jacob. Ensino Religioso no Ensino Fundamental. São Paulo: Cortez,
2007.

PARANÁ. Conselho Estadual de Educação do Paraná. Deliberação nº 01/06-PR.


Curitiba: CEEPR, 2006. Acesso em 15/04/2008. Disponível em:
179
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
http://celepar7cta.pr.gov.br/seed/deliberacoes.nsf/7b2a997ca37239c3032569ed005f
b978/175e426ddd8613108325711d0068e646/$FILE/_88himoqb2clp631u6dsg30c9d
68o30dg_.pdf

SCHOLGL, Emerli. "Não basta abrir as janelas" - O simbólico na formação do


professor. Dissertação para o Mestrado em Educação. Pontifícia Universidade
Católica do Paraná, Curitiba, 2005. Orientador: JUNQUEIRA, Sérgio Rogério de
Azevedo.

TARDIF, Maurice; LESSARD, Claude. O Trabalho docente: Elementos para uma


teoria da docência como profissão de interações humanas. Petrópolis: Vozes. 2005.

180
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
SITES E LIVROS PARA CONSULTAS

CITAÇÃO] As origens sociais das denominações cristãs


HR Niebuhr - 1992 - Ciencias da Religião
Citado por 35 - Artigos relacionados

[CITAÇÃO] As religiões africanas: contribuição a uma sociologia das


interpenetrações de civilizações
R Bastide - 1971
Citado por 122 - Artigos relacionados - Todas as 2 versões

[CITAÇÃO] Fenomenologia e ciências humanas: psicologia, história e religião


AA Bello - 2004 - Edusc
Citado por 64 - Artigos relacionados

[HTML] Fenomenologia e ciências humanas


[HTML] de ufmg.brC Capalbo - Fenomenologia e ciências humanas, 1996 -
fafich.ufmg.br ... Creusa Capalbo Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
Universidade Federal do Rio de Janeiro. Brasil. Ales Bello, A. (2004).
Fenomenologia e ciências humanas: psicologia, história e religião. (M. Mahfoud e
M. Massimi, Org.se Trad.s). Bauru: Edusc. ...
Citado por 68 - Artigos relacionados - Em cache - Todas as 2 versões

[CITAÇÃO] Elementos de sociologia religiosa


R BASTIDE - Ciências da Religião, 1990
Citado por 11 - Artigos relacionados

[CITAÇÃO] Na posse da palavra: religião, conversão e liberdade pessoal em dois


contextos nacionais C Mafra - 2002 - … Ciencias Sociais da Universidade …
Citado por 52 - Artigos relacionados

[PDF] Universidade Católica de Goiás


[PDF] de ucg.brC da Religião, NEC RELIGIÃO… - 2006 - tede.biblioteca.ucg.br
... DEPARTAMENTO DE FILOSOFIA E TEOLOGIA MESTRADO EM CIÊNCIAS DA
RELIGIÃO RELIGIÃO, NEGRITUDE E CIDADANIA: A EXPERIÊNCIA DO ...
MESTRADO EM CIÊNCIAS DA RELIGIÃO RELIGIÃO, NEGRITUDE E CIDADANIA:
A EXPERIÊNCIA DO ...
Citado por 2 - Artigos relacionados - Ver em HTML - Todas as 2 versões

[PDF] História das religiões e religiosidades


[PDF] de uol.com.brJ Hermann - … (org). Domínios da História. Ensaios de …, 1997
- silva.marcos.sites.uol.com.br ... do seculo XIX: a organizacao de uma ―ciencia das
religioes‖, cujo objeto era a analise dos elementos comuns as diversas religioes, ...
Mas se foi a radicalizacao da dicotomia religiao/ciência que deu a roupagem
intelectual ao embate politico entre monarquia e ...
Citado por 37 - Artigos relacionados - Ver em HTML

181
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
[CITAÇÃO] A Inquisição portuguesa ea sociedade colonial
SA Siqueira - 1978 - Editora Ática
Citado por 89 - Artigos relacionados - Todas as 2 versões

[CITAÇÃO] As ciências das religiões


G Filoramo… - São Paulo: Paulus, 1999
Citado por 66 - Artigos relacionados

[LIVRO] O uso ritual da ayahuasca


[HTML] de pucsp.brBC Labate… - 2002 - pucsp.br
... e representantes das três principais religiões ayahusaqueiras brasileiras (Santo
Daime, União do Vegetal, Barquinha). Ela reúne trabalhos apresentados no I CURA
(Congresso sobre os Usos Rituais da Ayahuasca), realizado no Instituto de Filosofia
e Ciências Humanas da ...
Citado por 42 - Artigos relacionados - Em cache - Todas as 3 versões

[CITAÇÃO] Globalização e religião


AP Oro… - 1997 - Vozes
Citado por 64 - Artigos relacionados

[CITAÇÃO] Ser e Deus: como Deus é recebido, por revelação, em nossa


experiência RS JOSGRILBERG - Ciências da Religião
Citado por 11 - Artigos relacionados

[CITAÇÃO] As lendas da criação e distruição do mundo como fundamentos da


religião dos Apapocúva-Guaraní C Nimuendajú - 1987 - Editora Hucitec
Citado por 73 - Artigos relacionados

[CITAÇÃO] Turismo religioso: ensaios antropológicos sobre religião e turismo


ES Abumanssur - 2003 - Papirus Editora
Citado por 20 - Artigos relacionados

[CITAÇÃO] O que a religião pode fazer pelas ciências sociais


O Velho - Religião e sociedade, 1998
Citado por 15 - Artigos relacionados

Pluralismo, modernidade e tradição–transformações do campo religioso


[PDF] de ufrgs.brCA Steil - Ciencias Sociales y Religión/Ciências Sociais e …,
2007 - seer.ufrgs.br Resumo.As sociedades latino-americanas se apresentam neste
final de milênio com um campo religioso profundamente transformado e
reordenado, onde diferentes formas de expressão religiosa - institucionais e não-
institucionais, tradicionais e novas, permanentes e efêmeras, ...
Citado por 17 - Artigos relacionados - Todas as 12 versões

[CITAÇÃO] Religião e política: sincretismos entre alunos de Ciências Sociais


R Novaes - Comunicações do ISER, 1994
Citado por 15 - Artigos relacionados

182
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
[CITAÇÃO] O subterrâneo religioso da vida eclesial: intuições a partir das ciências
da religião O Bobsin - Estudos Teológicos, 1997
Citado por 10 - Artigos relacionados

O futuro não será protestante


[PDF] de ufrgs.brR Mariano - Ciencias Sociales y Religión/Ciências Sociais e …,
2007 - seer.ufrgs.br
Resumo. O trabalho discute, com base no caso brasileiro, a idéia de que a América
Latina está se tornando protestante. Discorda de que a ―explo- são protestante‖ tem
potencial para transformar a cultura e modernizar a economia latino-americana.
Mostra o declínio numérico do ...
Citado por 16 - Artigos relacionados - Todas as 7 versões

Desencanto e formas contemporâneas do religioso


[PDF] de ufrgs.brP Sanchis - Ciencias Sociales y Religión/Ciências Sociais e …,
2007 - seer.ufrgs.br
Resumo. Haverá oposição necessária entre as duas partes deste título? Do
―desencanto‖ não poderiam também nascer as ―formas contemporâneas do
religioso‖? Que teriam elas, então, a ver com um eventual ―reencantamento do
mundo‖? No fundo, trata-se mais uma ...
Citado por 14 - Artigos relacionados - Todas as 10 versões

[CITAÇÃO] As religiões no Brasil: continuidades e rupturas


FLC Teixeira… - 2006 - Editora Vozes
Citado por 24 - Artigos relacionados

[PDF] Quando visões de mundo se encontram: Religião e ciência na trajetória de


formação de alunos protestantes de uma licenciatura em ciências biológicas
[PDF] de ufrgs.brC Sepulveda… - Investigações em Ensino de Ciências, 2004 -
if.ufrgs.br
Claudia Sepulveda Departamento de Educação, Universidade Estadual de Feira de
Santana (UEFS) Grupo de Pesquisa em História, Filosofia e Ensino de Ciências
Biológicas Instituto de Biologia, Universidade Federal da Bahia (UFBA) Mestrado em
Ensino, Filosofia e ...
Citado por 10 - Artigos relacionados - Ver em HTML - Todas as 4 versões

Religião na metrópole Paulistana


R Almeida - Revista brasileira de ciências sociais, 2004 - bv.fapesp.br
... Religião na metrópole paulistana. Título (Inglês): Religion in the metro area of
São Paulo. ...
Autor(es): Almeida, Ronaldo de. Tipo de documento: Artigo Científico. Fonte: Revista
Brasileira de Ciências Sociais; v. 19, n. 56, p. 15-27, out. 2004. ...
Citado por 36 - Artigos relacionados - Em cache

[CITAÇÃO] Os deuses do povo: um estudo sobre a religião popular


CR Brandão - 1980 - Livraria Brasiliense Editora
Citado por 105 - Artigos relacionados - Todas as 2 versões

183
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
[PDF] Representações e relações de gênero nos grupos pentecostais
[PDF] de scielo.brMD Machado… - Estudos feministas, 2005 - SciELO Brasil
... 1998. Tese (Doutorado em Sociologia da Religião) – Programa de Pós-
Graduação em Ciências da Religião da PUC, São Paulo. ... 2002. Dissertação
(Mestrado em Ciências da Religião) – Programa de Pós-Graduação em Ciências
da Religião, PUC, São Paulo. ...
Citado por 23 - Artigos relacionados - Ver em HTML - Todas as 7 versões

[HTML] Globalização: novo paradigma das ciências sociais


[HTML] de scielo.brO Ianni - Estudos Avançados, 1994 - SciELO Brasil
... necessariamente várias ciências. A economia da sociedade global envolve
também aspectos políticos, históricos, geográficos, demográficos, culturais e outros.
A cultura da globalização passa pela cultura de massa, indústria cultural, mídia
impressa e eletrônica, religiões e ...
Citado por 94 - Artigos relacionados - Em cache - Todas as 3 versões

[PDF] Considerações sobre a modernidade religiosa


[PDF] de ceil-piette.gov.arAP ORO - Sociedad y Religión, 1996 - ceil-piette.gov.ar
... Muitos deles se situam nas fronteiras e cruzamentos da religião com a ciencia,
arte, medicina, filosofía, ecología, psicología, formando uma "nebulosa das
heterodoxias", segundo J. ... atribuírem sentido religioso a ciencia, á política, a
arte, ao esporte, á mercaduría, á ...
Citado por 13 - Artigos relacionados - Ver em HTML - Todas as 2 versões

[LIVRO] La filosofía política moderna: De Hobbes a Marx


[HTML] de clacso.org.ar…, CL de Ciencias Sociales - 2000 - sala.clacso.org.ar
... Consejo Latinoamericano de Ciencias Sociales; DCP-FFLCH, Departamento de
Ciencias Politicas, Faculdade de Filosofia Letras e Ciencias Humanas, USP ...
Principiarei evocando algo que costuma ser desprezado, a religião do filósofo –
melhor dizendo, o papel que recebe a ...
Citado por 19 - Artigos relacionados - Em cache - Todas as 9 versões

[CITAÇÃO] História e cultura kaingáng no sul do Brasil


T Marcon… - 1994 - Universidade de Passo Fundo
Citado por 15 - Artigos relacionados

[CITAÇÃO] Mais realistas do que o rei: ocidentalismo, religião e modernidades


alternativas OG Velho - 2007 - Topbooks
Citado por 13 - Artigos relacionados

[CITAÇÃO] Religión/Ciências Sociais e Religião


C Sociales - Vol, 2000
Citado por 3 - Artigos relacionados

[PDF] As Novas Religiões Japonesas como instrumento de transmissão de cultura


japonesa no Brasil

184
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
[PDF] de pucsp.brAGS Tomita - Revista de Estudos da Religião, 2004 - pucsp.br
... EDUSC, 1999. FUJIKURA, Yumi. "Alguns aspectos de inculturação no trabalho
missionário da PL no Brasil". Dissertação de mestrado em Ciências da Religião
apresentada à Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 1992.
www.pucsp.br/rever/rv3_2004/p_tomita.pdf 101 ...
Citado por 9 - Artigos relacionados - Ver em HTML - Todas as 10 versões

[CITAÇÃO] A guerra dos deuses: religião e política na América Latina


M Löwy - 2000 - Editora Vozes
Citado por 77 - Artigos relacionados

[CITAÇÃO] O brasão eo logotipo: um estudo das novas universidades na cidade de


São Paulo CRS de Almeida - 2001 - Editora Vozes
Citado por 11 - Artigos relacionados - Todas as 2 versões

[CITAÇÃO] Religião numa sociedade em transformação


FC Rolim - 1997 - Editora Vozes
Citado por 12 - Artigos relacionados

[CITAÇÃO] RELIGIÃO (Org.)


DETECDA SOCIEDADE - Religião e transformação social no Brasil hoje. São …,
2007
Citado por 3 - Artigos relacionados

[CITAÇÃO] Ensino religioso e formação docente


L SENA - Ciências da Religião e Ensino
Citado por 9 - Artigos relacionados

[PDF] Revisitando o messianismo no Brasil e profetizando seu futuro


[PDF] de scielo.brLN Negrão - Revista Brasileira de Ciências Sociais, 2001 -
SciELO Brasil ... 120 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. ...
Vinhas de Queiroz, um dos maiores estudiosos do movimento, realmente levanta a
hipótese da gênese de uma nova religião, seguindo a seqüência da história sagrada
cristã.4 Mesmo Duglas Teixeira Monteiro (1974 ...
Citado por 13 - Artigos relacionados - Ver em HTML - Todas as 9 versões

Efeitos da secularização do Estado, do pluralismo e do mercado religiosos sobre as


igrejas pentecostais
[PDF] de pucrs.brR Mariano - Civitas-Revista de Ciências Sociais, 2007 -
revistaseletronicas.pucrs.br ... Teatro, templo e mercado: uma análise da
organização, rituais, marketing e eficácia comunicativa de um empreendimento
neopentecostal - Igreja Universal do Reino de Deus. São Bernardo
do Campo: Doutorado em Ciências da Religião, IMES, 1996. CHAVES, Mark. ...
Citado por 12 - Artigos relacionados - Todas as 3 versões

[PDF] Ciência, religião, psicologia: conhecimento e comportamento

185
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
[PDF] de scielo.brGJ de Paiva - Psicologia: Reflexão e Crítica, 2002 - SciELO Brasil
... Uma expressão clássica desse modo é fornecida pela Academia Nacional de
Ciências, dos Estados Unidos: ―A religião ea ciência são reinos separados e
mutuamente excludentes do pensamento humano, cuja apresentação no mesmo
contexto leva a mal-entendidos tanto ...
Citado por 13 - Artigos relacionados - Ver em HTML - Todas as 8 versões

[LIVRO] REVOLUÇAO CIENTIFICA, A: E AS ORIGENS DA CIENCIA MODERNA


J Henry - 1998 - books.google.com
... Maria Luiza X. de A. Borges Revisão técnica: Henrique Lins de Barros Doutor em
física e diretor do Museu de Astronomia e de Ciências Afins, MAST ... 20 (ii) O
método experimental 35 3 A magia e as origens da ciência moderna 53 4 A filosofia
mecânica 66 5 Religião e ciência ...
Citado por 67 - Artigos relacionados

[CITAÇÃO] As ciências das religiões


C Prandi… - São Paulo: Paulus, 1999
Citado por 9 - Artigos relacionados

[PDF] As ciências da religião numa perspectiva intercultural


[PDF] de est.edu.brH Brandt - Estudos Teológicos, 2006 - est.edu.br
Resumen: Este texto presenta una comparación del modo como la fenomenología
de la religión es percibida y evaluada por las ciencias de la religión en Brasil y en
Alemania. Procederé de la siguiente forma: primeramente, voy a esbozar la eva-
luación de la fenomenología de ...
Citado por 3 - Artigos relacionados - Ver em HTML - Todas as 2 versões

[CITAÇÃO] O messianismo no Brasil contemporâneo


LN Negrão… - 1984 - … de filosofia letras e ciências …
Citado por 8 - Artigos relacionados

Gênero, religião e política: as evangélicas nas disputas eleitorais da cidade do Rio


de Janeiro
[PDF] de ufrgs.brMDC Machado… - … Religión/Ciências Sociais e Religião, 2007 -
seer.ufrgs.br
Resumo. Trata-se de uma análise da participação das mulheres evangéli- cas nas
eleições de 2000 na cidade do Rio de Janeiro. Capital de um estado onde o
Governador ea vice-governadora têm identidade evangéli- ca, Rio de Janeiro tem
sido um laboratório para os estudos das ...
Citado por 5 - Artigos relacionados - Todas as 5 versões

Aparições da virgem eo fim do milênio


[PDF] de ufrgs.brCL Mariz - Ciencias Sociales y Religión/Ciências Sociais e …,
2007 - seer.ufrgs.br
Resumo. Procura-se neste artigo discutir o papel desempenhado pelas aparições da
Virgem no catolicismo do século XX. Além de promover um reavivamento da fé,
essas ―aparições‖ se destacam por seu discurso apocalíptico com críticas à

186
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
sociedade moderna e por vezes à ...
Citado por 10 - Artigos relacionados - Todas as 6 versões

Religião e saúde: um estudo sobre as representações do fiel carismático sobre os


processos de recuperação de enfermidades nos grupos de oração da RCC em …
[PDF] de uem.brDA Martins - Ciência, Cuidado e Saúde, 2008 - periodicos.uem.br
... Enfermeira. Doutora em Ciências da Religião pela UMESP-SP. ... PIERUCCI,
AF; PRANDI, R. A realidade social das religiões no Brasil: religião, sociedade e
política. São Paulo: Hucitec, 1995.
QUIVY, R.; CAMPENHOUDT, LV Manual de investigação em ciências sociais. ...
Citado por 8 - Artigos relacionados - Todas as 4 versões

[CITAÇÃO] Templo, praça, coração: a articulação do campo religioso católico


LR Benedetti - 2000 - FFLCH/USP-CER
Citado por 19 - Artigos relacionados

Religião e política nas eleições 2000 em Porto Alegre (RS)


[PDF] de ufrgs.brAP Oro - Debates do NER. Porto Alegre. Vol. 2, n. 3 (set. 2001), …,
2001 - lume.ufrgs.br
... Em terceiro lugar, ver-se-á como o êxito ou o fracasso eleitoral dos candidatos
religiosos tem diretamente a ver com a estrutura organizacional das religiões às
quais eles estão vinculados; enfim, analisar-se-á como, no segundo turno das
eleições, o ... Ciências Humanas [384]. ...
Citado por 26 - Artigos relacionados - Em cache - Todas as 5 versões

Ensino religioso na escola pública: o retorno de uma polêmica recorrente


[HTML] de scielo.brCRJ Cury - Rev. Bras. Educ - SciELO Brasil
... 3º da LDB. Ao mesmo tempo, a nova redação introduz um novo aposto: o ensino
religioso "é parte integrante da formação do cidadão". Salta à vista a inadequação
dessa introdução num assunto que toca diretamente ao direito à diferença e à
liberdade. ...
Citado por 12 - Artigos relacionados - Em cache - Todas as 11 versões

[CITAÇÃO] Fundamentos filosóficos dos valores no ensino religioso


DE dos Santos Veloso - 2001 - Vozes
Citado por 9 - Artigos relacionados

[PDF] Os parâmetros curriculares para o ensino fundamental: convívio social e ética


[PDF] de fcc.org.brLA Cunha - Cadernos de Pesquisa, 1996 - fcc.org.br
... deram-se por satisfeitos com a inclusão dos temas transversais no currículo. No
Brasil, ao contrário, a Igreja Católica continua sendo a instituição mais inte- ressada
de todo esse campo em manter uma disciplina especificamente dedicada ao Ensino
Religioso no horário ...
Citado por 33 - Artigos relacionados

[HTML] Os Parâmetros Curriculares Nacionais eo ensino fundamental

187
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
[HTML] de unb.brCRJ Cury - Revista Brasileira de Educação, Campinas: ANPEd -
nesp.unb.br
... E tal foi o vigor desses movimentos que a Revisão Constitucional de 1925-1926
tratou do tema com bastante abundância, em especial ... O ano de 1931 traz, pelo
menos, três importantes mudanças: a introdução do ensino religioso nas escolas
oficiais, a oficialização dos ...
Citado por 29 - Artigos relacionados - Em cache - Todas as 5 versões

[HTML] Ensino religioso sem Proselitismo. É possível


[HTML] de hottopos.comD Incontri… - Videtur, Salamanca/São Paulo, Arvo/USP,
2002 - hottopos.com ... participar de ritos ou práticas religiosas da maioria; e acima
de tudo, a permanente violência que as maiorias e as ortodoxias praticaram sobre as
minorias e as heresias — tudo isso traumatizou de tal forma as consciências livres,
que o tema do ensino religioso provoca fortes ...
Citado por 6 - Artigos relacionados - Em cache - Todas as 7 versões

[DOC] Estratégias de superação da discriminação étnica e religiosa no Brasil


[DOC] de interacaovirtual.com.brR Fischmann… - Direitos humanos no Século …,
1998 - interacaovirtual.com.br
... Ensino Religioso em escolas públicas - a discussão do Estado de São Paulo. Em
1995, o tema do ensino religioso em escolas públicas constituiu-se em fonte de
cooperação entre nosso trabalho e o Governo Estadual. Tal cooperação ...
Citado por 17 - Artigos relacionados - Ver em HTML - Todas as 3 versões

[PDF] O NOVO, О VELHO О PERIGOSO: RELENDO A CULTURA BRASILEIRA


[PDF] de fcc.org.brMMC DE CARVALHO - fcc.org.br
... 1 A questão da superação da chamada "dualidade" do sis- tema de ensino, na
narrativa de Azevedo, restringe-se praticamente ... enfrentado uma assembléia
apinhada de militantes da Legião Integralista, opondo-se a uma moção em favor do
ensino religioso, foi estigmatizado ...
Citado por 18 - Artigos relacionados

[HTML] Pensando a espiritualidade no ensino de graduação


[HTML] de usp.brMA Benko… - Revista Latino-Americana de …, 1996 -
revistasusp.sibi.usp.br
... com a religião institucionalizada, sistemas e rituais de apoio espiritual ou religioso
e déficit ... sensibilizado para esse aspecto, são justificativas para o estudo desse
tema, mesmo sem ... que exercido, podemos inferir que isto dificulte o
posicionamento do docente no seu ensino. ...
Citado por 19 - Artigos relacionados - Em cache - Todas as 6 versões

[HTML] Religião, Estado, modernidade: notas a propósito de fatos provisórios


[HTML] de scielo.brE Giumbelli - Estudos Avançados, 2004 - SciELO Brasil
... 9 É esse exatamente um dos temas de minha tese de doutorado (Giumbelli,
2002). ... Texto disponível na "Biblioteca Digital" da "Comunidade Virtual do Ensino
Religioso". http://www.ensinoreligioso.com.br, capturado em 13/7/2004. [ Links ]. ...
Citado por 15 - Artigos relacionados - Em cache - Todas as 6 versões

188
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
[PDF] Escolas públicas e ensino religioso: subsídios para a reflexão sobre o Estado
laico, a escola pública ea proteção do direito à liberdade de crença e de culto
[PDF] de gper.com.brR Fischmann - … –Revista Eletrônica de Jornalismo Científico,
julho de, 2004 - gper.com.br
... De fato essa relação entre o ensino religioso em escolas públicas eo direito ao
acesso à ciência já se anunciara em polêmica anterior, quando, em 1995, o tema do
ensino religioso nas escolas públicas agitou o meio educacional e acadêmico, a
partir de São Paulo. ...
Citado por 3 - Artigos relacionados - Ver em HTML - Todas as 3 versões

[CITAÇÃO] A escola teuto-brasileira católica ea nacionalização do ensino


L Kreutz… - Nacionalização e imigração alemã, 1994 - Editora Unisinos
Citado por 8 - Artigos relacionados

[LIVRO] História na sala de aula: conceitos, práticas e propostas


L Karnal - 2003 - books.google.com
... Tema polêmico, que retorna aos currículos em vários estados em 13 Page 20.
História na sala de aula função das Constituições Estaduais aprovarem ensino
religioso no en- sino, mais do que nunca urge refletir sobre o assunto e sua
importân- cia como legado histórico. ...
Citado por 44 - Artigos relacionados - Todas as 2 versões

[HTML] A escola primária como tema do debate político às vésperas da República


[HTML] de scielo.brC Boto - Revista Brasileira de História, 1999 - SciELO Brasil
... doi: 10.1590/S0102-01881999000200011. A escola primária como tema do debate
político às vésperas da República *. ... Assim julgava Rui Barbosa. A crítica ao
ensino religioso vem fundamentalmente atrelada ao contraponto da liberdade de
ensino. ...
Citado por 10 - Artigos relacionados - Em cache - Todas as 6 versões

[PDF] Ensino religioso em escolas públicas: subsídios para o estudo da identidade


nacional eo direito do outro
[PDF] de gper.com.brR Fischmann - BICUDO, Maria Aparecida Viggiani & SILVA
JUNIOR, …, 1996 - gper.com.br
... campo do ensino religioso. Nacional e internacional: alguns pontos para reflexão
Fazendo um breve interregno, a título de retrospecto analítico, e ao mesmo tempo
tangenciando questões internacionais, o século XVI tem uma importância
fundamental para nosso tema, pois ...
Citado por 4 - Artigos relacionados - Ver em HTML - Todas as 2 versões

[CITAÇÃO] Constituições estaduais brasileiras e educação


RP de Oliveira… - 1993 - Not Avail
Citado por 30 - Artigos relacionados

[LIVRO] A universidade temporã: o ensino superior da colônia à era Vargas

189
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
LACR da Cunha - 2007 - books.google.com
... Os temas das duas são distintos, mas não podem ser apartados. Diversos, sem
dúvida, mas só podem ser entendidos como referência constante um ao outro. ...
Antes, uma advertência a respeito da omissão, na análise, do ensino superior de
outras ordens religiosas. ...
Citado por 137 - Artigos relacionados - Todas as 2 versões

[PDF] Ensino confessional, laico ou inter-religioso? Qual a melhor resposta


[PDF] de gper.com.brD Incontri… - Revista de Educação CEAP, Salvador, Centro …,
2004 - gper.com.br
... tão delicado desafio? O professor de ensino inter-religioso mais indicado é o que
aceita a veracidade do fenômeno religioso e não o vê como ilusão ou alienação
(embora possa ... elas.O grande medo de se tocar no tema das religiões na escola é
o do proselitismo, ...
Citado por 6 - Artigos relacionados - Ver em HTML

[HTML] O ensino religioso ea interpretação da lei


[HTML] de scielo.brMAS Dickie… - Horizontes Antropológicos, 2007 - SciELO Brasil
... Nas séries iniciais (1ª à 4ª) os próprios professores responsáveis pela classe
ministram as aulas de ensino religioso, que foi considerado pela lei "tema
transversal", ou seja, incluído no conteúdo das disciplinas já existentes. ...
Citado por 4 - Artigos relacionados - Em cache - Todas as 6 versões

EDITORIAL
No ano de 2010 acontecerá a CONFERÊNCIA NACIONAL DE EDUCAÇÃO
BÁSICA, para preparar este importante evento o Governo Federal propõe que os
Municípios e os Estados realizem as suas Conferências Regionais, é de
fundamental importância que professores e pesquisadores preparem e participem
destes eventos. Com a intenção de colaborar com este momento é que o GPER
está preparando as turmas do Curso de Especialização de 2009, urge profissionais
com fundamentação para discutir o Ensino Religioso junto as diferentes área do
conhecimento.

NOTICIA

CURITIBA (PR) – Curso de Especialização de Fundamentos e Metodologia do


Ensino Religioso, nesta quinta-feira (09 de outubro) a Profa. Dra. Rosa Lydia
concluiu a sua disciplina CULTURA – EDUCAÇÃO – RELIGIOSIDADE, discutindo a
questão da Diversidade cutlural e o Ensino Religioso. No próximo dia 18 de outubro
iniciaremos a terceira disciplina – ESPAÇO SAGRADO com o Prof. Dr. Sylvio Fausto
190
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
Gil. Lembramos que em fevereiro iniciaremos a segunda turma deste curso. Caso
você queira ouvir um trecho da aula do dia 25 de setembro da Profa. Rosa é só
clicar: http://videoweb.grupouninter.com.br:81/ROD/Tutoria-Prof-Rosa-Correa-
250908.mp3

GPER – Grupo de Pesquisa Educação e Religião


GPER" gper@gper.com.br
www.gper.gov.br
WWW.gper.com.br
Você pode se cadastrar neste site para receber boletins com informações, cursos e
todos os
acontecimentos relativos ao Ensino Religioso, no Brasil.

Vale a pena ver:


A Série Cosmos poderá ser um material interessante para despertar a discussão dos
alunos sobre a
relação do espaço e a constante busca dos seres humanos
Episódio 1 - Os Limites do Oceano Cósmico - O 1° capítulo da série Cosmos.
http://video.google.com/videoplay?docid=-570682714735947986
Episódio 2: Uma Voz na Sinfonia Cósmica.
http://video.google.com/videoplay?docid=2891371596105765278
Episódio 3: A Harmonia dos Mundos .
http://video.google.com/videoplay?docid=-1036639776690766678
Episódio 4: Céu e Inferno .
http://video.google.com/videoplay?docid=-2294505970166364660
Episódio 5: O Blues do Planeta Vermelho .
http://video.google.com/videoplay?docid=-6005954975489781242
Episódio 6: A Saga dos Viajantes.
http://video.google.com/videoplay?docid=1629244549986128800
Episódio 7: A Espinha Dorsal da Noite.
http://video.google.com/videoplay?docid=-8780005927106334204
Episódio 8: Viagens no Espaço e no Tempo
http://video.google.com/videoplay?docid=6816313831361139078
Episódio 9: As Vidas das Estrelas
http://video.google.com/videoplay?docid=7689896500623823035
Episódio 10: O Limiar Da Eternidade
http://video.google.com/videoplay?docid=2175203109135385858
Episódio 11: A Persistência da Memória
http://video.google.com/videoplay?docid=-3893032669575996763
Episódio 12: Enciclopédia Galáctica
http://video.google.com/videoplay?docid=-9043570484663204586
Episódio 13 (Ultimo): Quem Pode Salvar A Terra?
http://video.google.com/videoplay?docid=-5500778974932463147

191
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
ORIENTAÇÕES PARA BUSCA DE ARTIGOS CIENTÍFICOS NO
SCIELO

Após a escolha do tema do TCC, pertinente ao seu curso de Pós-graduação,


você deverá fazer a busca por artigos científicos da área, em sites especializados,
para a redação do seu próprio artigo científico. O suporte bibliográfico se faz
necessário porque toda informação fornecida no seu artigo deverá ser retirada de
outras obras já publicadas anteriormente. Para isso, deve-se observar os tipos de
citações (indiretas e diretas) descritas nesta apostila e a maneira como elas devem
ser indicadas no seu texto.
Lembre-se que os artigos que devem ser consultados são artigos científicos,
publicados em revistas científicas. Sendo assim, as consultas em revistas de ampla
circulação (compradas em bancas) não são permitidas, mesmo se ela estiver
relatando resultados de estudos publicados como artigos científicos sobre aquele
assunto. Revistas como: Veja, Isto é, Época, etc., são meios de comunicação
jornalísticos e não científicos.
Os artigos científicos são publicados em revistas que circulam apenas no
meio acadêmico (Instituições de Ensino Superior). Essas revistas são denominadas
periódicos. Cada periódico têm sua circulação própria, isto é, alguns são publicados
impressos mensalmente, outros trimestralmente e assim por diante. Alguns
periódicos também podem ser encontrados facilmente na internet e os artigos neles
contidos estão disponíveis para consulta e/ou download.
Os principais sites de buscas por artigos são, entre outros:
SciELO: www.scielo.org
Periódicos Capes: www.periodicos.capes.gov.br
Bireme: www.bireme.br
PubMed: www.pubmed.com.br
A seguir, temos um exemplo de busca por artigos no site do SciELO.
Lembrando que em todos os sites, embora eles sejam diferentes, o método de
busca não difere muito. Deve-se ter em mente o assunto e as palavras-chave que o
levarão à procura pelos artigos. Bons estudos!

192
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
Siga os passos indicados:
Para iniciar sua pesquisa, digite o site do SciELO no campo endereço da
internet e, depois de aberta a página, observe os principais pontos de pesquisa: por
artigos; por periódicos e periódicos por assunto (marcações em círculo).

Ao optar pela pesquisa por artigos, no campo método (indicado abaixo),


escolha se a busca será feita por palavra-chave, por palavras próximas à forma que
você escreveu, pelo site Google Acadêmico ou por relevância das palavras.

193
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
Em seguida, deve-se escolher onde será feita a procura e quais as palavras-
chave deverão ser procuradas, de acordo com assunto do seu TCC (não utilizar ―e‖,
―ou‖, ―de‖, ―a‖, pois ele procurará por estas palavras também). Clicar em pesquisar.

194
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
Lembre-se de que as palavras-chave dirigirão a pesquisa, portanto, escolha-
as com atenção. Várias podem ser testadas. Quanto mais próximas ao tema
escolhido, mais refinada será sua busca. Por exemplo, se o tema escolhido for

195
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
relacionado à degradação ambiental na cidade de Ipatinga, as palavras-chave
poderiam ser: degradação; ambiental; Ipatinga. Ou algo mais detalhado. Se nada
aparecer, tente outras palavras.
Isso feito, uma nova página aparecerá, com os resultados da pesquisa para
aquelas palavras que você forneceu. Observe o número de referências às palavras
fornecidas e o número de páginas em que elas se encontram (indicado abaixo).

A seguir, estará a lista com os títulos dos artigos encontrados, onde constam:
nome dos autores (Sobrenome, nome), título, nome do periódico, ano de publicação,
volume, número, páginas e número de indexação. Logo abaixo, têm-se as opções
de visualização do resumo do artigo em português/inglês e do artigo na íntegra, em
português. Avalie os títulos e leia o resumo primeiro, para ver se vale à pena ler todo
o artigo.

196
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
Ao abrir o resumo, tem-se o nome dos autores bem evidente, no início da
página (indicado abaixo). No final, tem-se, ainda, a opção de obter o arquivo do
artigo em PDF, que é um tipo de arquivo compactado e, por isso, mais leve, Caso
queria, você pode fazer download e salvá-lo em seu computador.

197
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
198
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
Busca por periódicos

Caso você já possua a referência de um artigo e quer achá-lo em um


periódico, deve-se procurar na lista de periódicos, digitando-se o nome ou
procurando na lista, por ordem alfabética ou assunto. Em seguida, é só procurar
pelo autor, ano de publicação, volume e/ou número.

199
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br
É preciso ressaltar que você deve apenas consultar as bases de dados e os
artigos, sendo proibida a cópia de trechos, sem a devida indicação do nome do
autor do texto original (ver na apostila tipos de citação) e/ou o texto na íntegra.
Tais atitudes podem ser facilmente verificadas por nossos professores, que
farão a correção do artigo.

200
Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002
Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br

Você também pode gostar