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Determinismo

Para começar, podemos suspeitar que isso da «liberdade» talvez seja apenas uma ilusão que eu tenho
sobre as minhas possibilidades reais. Afinal de contas, tudo o que acontece tem a sua causa
determinante de acordo com as leis da natureza. Abro um pouco a torneira de água e vejo sair dela
algumas gotas: se eu soubesse de antemão onde se encontravam essas gotas na canalização e tendo
em conta a lei da gravidade, as regras do movimento dos líquidos, a posição do orifício na torneira, etc.,
teria podido por certo determinar que gota devia sair em primeiro lugar e qual em quarto. O mesmo
acontece com todos os factos que observo à minha volta e mesmo com a maioria dos que acontecem no
meu corpo (respiração, circulação sanguínea, tropeção na pedra que não vi, etc.). Em cada caso posso
retroceder até a uma situação anterior que torna inevitável o que aconteceu a seguir. Só a minha
ignorância de como as coisas estão no momento A justifica que me surpreenda com o que acontece
depois no momento B. A doutrina determinista (um dos mais antigos e persistentes pontos de vista
filosóficos) estabelece que se eu soubesse como estão dispostas todas as peças do mundo agora e
conhecesse exaustivamente todas as leis físicas, poderia descrever sem erro tudo o que vai acontecer no
mundo dentro de um minuto ou dentro de cem anos. Como eu também sou uma parte do universo, devo
estar submetido à mesma determinação causal que o resto do universo. Onde fica então o «sim ou não»
da liberdade?
F. Savater, As Perguntas da Vida, Dom Quixote, 2000, p. 144.

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