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Arrecadação não deve mais voltar Em 2016, deve ficar claro que a Fernando Rezende
à excepcional fase pré-crise global arrumação da casa só virá em 2019 Professor da FGV/Ebape,
ex-presidente do Ipea
Fim da
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N E S TA E D I Ç Ã O
Instituto Brasileiro de Economia | Janeiro de 2016
J a n e i r o 2 016 | C o n j u n t u r a E c o n ô m i c a 3
Fundador
Richard Lewinsohn
Editor-Chefe
Luiz Guilherme Schymura de Oliveira
4 C o n j u n t u r a E c o n ô m i c a | J a n e i r o 2 016
Nota do Editor
A mudança no comando da retração desde que a série do IBGE começou a ser di-
equipe econômica, com a vulgada, em 2003. O setor de serviços, que vinha “se-
ascensão de Nelson Barbosa gurando” uma retração maior do PIB, também já deu
como ministro da Fazenda, não deve ser vista como um mostras de exaustão, como já havíamos antecipado na
elemento capaz de tirar o país, no curto prazo, da grave edição de julho do ano passado.
situação econômica em que se encontra. Embora exista Para piorar o quadro, a China, maior importado-
uma forte pressão dos aliados do ex-presidente Lula para ra de commodities do mundo, e nossa principal par-
que medidas sejam adotadas para a retomada do cres- ceira comercial, pode crescer menos do que os ana-
cimento, “não tem coelho na cartola”, como anunciou listas vinham prevendo, o que afetará diretamente a
o ministro da Casa Civil, Jaques Wagner, descartando a economia brasileira.
adoção de novos pacotes para impulsionar a economia. Embora seja cedo para tirar conclusões, começa a
O que foi enfatizado pela presidente Dilma Rousseff, no ser delineada a estratégia do governo para este ano,
dia seguinte, em café da manhã com jornalistas. que passa pela busca do reequilíbrio fiscal, sem grandes
A tarefa do novo ministro da Fazenda será árdua. choques ou apertos, mas gradualmente, como forma de
Todos os indicadores apontam para um ano igual ou combater a inflação. Apesar das pressões, a adoção de
pior do que 2015, agravado pelo aumento da taxa de pacotes para estimular a economia, na linha do que foi
desemprego que pode chegar a uma média anual de feito nos dois últimos anos, parece estar fora do radar,
11,7%, segundo estimativas do Boletim Macro IBRE, no momento. Ou seja: o esforço será concentrado, de
praticamente o dobro da média anual de 6,8% regis- um lado, para que os indicadores econômicos não fi-
trada no final de 2014. quem piores do que estão, e do outro, iniciar uma agen-
A indústria deve continuar seu calvário, com queda da de trabalho de reformas, como a da Previdência, en-
de produção: em novembro do ano passado, último tre outras, apesar das pressões que isso poderá trazer.
dado disponível até o fechamento desta edição, a pro-
dução industrial teve sua sexta queda seguida. Em re- Claudio Conceição
lação a novembro de 2014, encolheu 12,4%, a maior claudio.conceicao@fgv.br
Sumário
Carta da Conjuntura Capa – Emprego
6 Arrecadação não deve mais voltar à excepcional 32 Fim da resistência – Solange Monteiro
fase pré-crise global – Luiz Guilherme Schymura
Máquinas e Bens de Capital
Ponto de Vista 44 O túnel é longo e escuro – Chico Santos
10 Em 2016, deve ficar claro que a arrumação da Governança
casa só virá em 2019 – Samuel Pessôa 54 Como aprimorar a regulação – Solange Monteiro
Macroeconomia Petróleo
12 Foi-se 2015; viva 2016? – Nelson Marconi 58 O dever de casa para 2016 – Lavinia Hollanda
14 Ano novo – vida velha? – Fernando de Comércio Exterior
Holanda Barbosa 62 Formar cadeias – Solange Monteiro
Entrevista 64 Com a TPP o Brasil vai ficando para trás
18 Fernando Rezende – Solange Monteiro, Claudio Marcos Cintra
Conceição e Vilma da Conceição Pinto
Índices
Imposto de Renda I Índices Econômicos
24 Efeitos contraditórios – Solange Monteiro X Conjuntura Estatística
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CARTA DA CONJUNTURA
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CARTA DA CONJUNTURA
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CARTA DA CONJUNTURA
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CARTA DA CONJUNTURA
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PONTO DE VISTA
O ano terminou bem pior do que o IPCA este ano acima de 10%), es-
o esperado. Em função das dificul- tava ancorada em torno de 5,5%.
dades políticas, a agenda legislativa O Banco Central conseguia impedir
para encaminhar os problemas fis- que a grande elevação da inflação de
cais estruturais andou muito deva- 2015 impactasse a de 2016. Adicio-
gar. As dificuldades políticas, por nalmente, o IPCA de 2017 caminha-
sua vez, tiveram três causas: os im- va para a meta, de 4,5%.
pactos da Operação Lava Jato sobre A convergência para a meta da
o sistema político; a profundidade inflação é importante porque sinali-
do estelionato eleitoral, que tornou za o fim do ajuste cíclico da econo-
muito difícil a aceitação pela socie- mia e o início do momento de redu- Simulações conservadoras co-
dade do ajuste fiscal; e, finalmen- ção das taxas de juros. Níveis mais meçaram a sugerir que o limite de
te, as cicatrizes de uma campanha baixos de juros estimulam o cresci- 70% do PIB seria ultrapassado na
eleitoral particularmente virulenta, mento pela elevação da demanda, virada de 2016 para 2017. Para
especialmente da parte do governo, principalmente do investimento, 2018 já se enxergava – e esta é a
que inviabilizaram qualquer conver- iniciando um novo ciclo de cresci- situação atual – dívida bruta atin-
sa mais produtiva com a oposição. mento, com a economia ajustada. gindo 80% do PIB. A perspectiva
Para piorar a situação, o buraco O ajuste cíclico do ministro Levy de trajetórias explosivas como esta
fiscal que o primeiro mandato da desandou no início do terceiro tri- pressionou o risco país e, com ele,
presidente Dilma legou para o se- mestre, quando o mercado percebeu a taxa de câmbio. A forte depre-
gundo foi de 1 a 1,5 ponto percen- que o governo não conseguiria pro- ciação, por sua vez, contaminou as
tual (p.p.) maior do que o imaginado duzir superávit primário que estabi- expectativas inflacionárias. O ajus-
no final de 2014. Enquanto o mer- lizasse a dívida pública em qualquer te cíclico desandou.
cado acreditou na construção de um horizonte à frente. A total descrença A partir daí, desenrolou-se uma
superávit primário que estabilizasse na capacidade política da presiden- série de fatos negativos: a constata-
a dívida pública, o ajuste cíclico do te de enfrentar o desequilíbrio fiscal ção da total incapacidade de se pro-
ministro Levy caminhou. O princi- estrutural, bem como de produzir a duzir qualquer número positivo de
pal sinal era que a expectativa do curto prazo elevação da carga tribu- resultado primário; o rebaixamento
boletim Focus para a inflação em tária, sinalizou que a dívida bruta da economia pela S&P, com perda
2016, apesar da fortíssima correção iria crescer como bola de neve nos de grau de investimento, no início
dos preços represados (que colocou próximos anos. do terceiro trimestre de 2015; a
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PONTO DE VISTA
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MACROECONOMIA
Todos querem esquecer o ano de 2015. ram 35,5%). É um ajuste relevante. Já As despesas com custeio são for-
Não é para menos, os indicadores eco- as despesas previdenciárias elevaram- temente pressionadas pelos gastos
nômicos mostram uma queda abrupta se na mesma base de comparação. com educação e saúde, e muitos de-
do nível de atividade e da taxa de in- Logo, as despesas com investimen- les são obrigatórios, como sabemos.
vestimento, associada à inflação ele- tos foram um dos principais focos No curto prazo, investir em mecanis-
vada e perspectivas pessimistas para desse ajuste. Reduzi-las ainda mais mos que possibilitem uma melhoria
2016. Porém, nem tudo está perdido; implicaria um reforço à queda do ní- da qualidade do custeio operacional
ajustes importantes no campo fiscal e vel de atividade e da arrecadação. Por nessas áreas seria um importante ca-
externo, dois fortes desequilíbrios de outro lado, as chamadas “outras des- minho a ser trilhado para a continui-
nossa economia, tiveram início e po- pesas de custeio”, item que engloba dade do ajuste fiscal.
derão criar espaço para a retomada as despesas diretamente associadas às Para o longo prazo, a reforma da
do crescimento, dependendo do rumo atividades operacionais do governo, Previdência é imprescindível, como
que lhes for atribuído, e da melhoria continuam apresentando variação po- mostra a evolução dessas despesas; a
do cenário político. sitiva (2,5%, sempre na mesma base insistência da equipe econômica em
Os números do Tesouro Nacional, de comparação). Sua redução causa relação a este ponto é correta. Essa
consolidados na tabela 1, mostram impacto negativo menor sobre o inves- reforma, associada a uma revisão do
que de fato o governo fez um esforço timento privado (podendo até mesmo modelo de gestão e controle de resul-
para reduzir as despesas. Porém, como ser positivo, como mostram diversos tados das políticas públicas (incluin-
sabido, a queda do nível de atividade estudos) e o nível de atividade. Parece do as despesas com pessoal), visan-
também diminuiu a arrecadação, pro- ainda existir espaço para a sua dimi- do a sua racionalização, contribuiria
porcionalmente mais, e implicou re- nuição sem implicar uma indesejável para sinalizar o alcance de um equi-
sultados primários negativos. O fato a paralisia na oferta de serviços. líbrio estrutural necessário para a re-
ressaltar na tabela 1 é a diferença entre
as despesas intituladas do Tesouro e as
destinadas aos benefícios previdenciá- Tabela 1 – Receitas e despesas do Tesouro Nacional
rios. As primeiras caíram de forma Var % dos valores acumulados em 12 meses corrigidos pelo IPCA
significativa, implicando uma rever-
são da tendência entre o final de 2014 Dezembro 2014 Outubro 2015
e outubro de 2015 (nos dados acu-
Receita líquida -3,7 -8,1
mulados em 12 meses, corrigidos pela
inflação), com destaque para a queda Despesa total 6,1 -1,6
das despesas com abono e seguro-
desemprego e outras despesas de ca- Despesas do Tesouro Nacional 7,8 -4,7
pital (estas últimas correspondem aos Benefícios da Previdência 3,8 3,4
investimentos – incluindo o Programa
Minha Casa, Minha Vida –, que caí- Fonte: Tesouro Nacional, com cálculos próprios.
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CONJUNTURA MACROECONOMIA
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MACROECONOMIA
A recessão brasileira que começou se a administração das finanças, seja pulista este processo de impedimen-
no segundo trimestre de 2014 vai de uma família, de uma empresa, do to constitui-se em golpe. Eles são os
muito bem obrigado. Em 2015 o município, do estado ou do governo verdadeiros democratas que defen-
produto interno bruto (PIB) deve federal tivesse qualquer conotação dem as instituições. Uma das prin-
ter uma redução entre 3,5 e 4,0%. ideológica. O ministro Nelson Bar- cipais características da democracia
A projeção para 2016 é uma queda bosa, inspirado nestas ideias, deno- é a tolerância e a aprendizagem que
do PIB no intervalo de 2,5-3,0%. A minou a política econômica da época implica o reconhecimento do erro.
taxa de inflação em 2014 ficou pra- Palocci, no primeiro mandato do ex- Afinal de contas, por que estamos
ticamente no teto da meta (6,4%). presidente Lula, de política neolibe- nesta crise política, econômica, ética
Em 2015 chegou aos dois dígitos ral. Infelizmente, no momento atual e moral? Quem foi responsável por
(acima de 10%) e as projeções para não existe opção: ou o ministro Nel- estes desmandos? Antigamente a cul-
2016 indicam uma taxa de inflação son converte-se ao neoliberalismo pa era do FMI e (ou) do imperialismo
acima de 6,5% ao ano. Os títulos ou estamos todos perdidos. americano. Hoje, a crise foi produzi-
da dívida pública brasileira já fo- Os autodenominados movimen- da domesticamente, tem nome, so-
ram rebaixados por duas agências tos sociais em suas manifestações brenome, e qualquer pessoa de bom
de risco para o nível de títulos de pedem o fim da política econômica senso analisando os fatos certamente
alto risco (junk bonds). que tenha como objetivo colocar as descobrirá os responsáveis.
Ano novo vida nova? Infelizmente finanças em ordem. O segundo desa- Não vou tratar de todos estes
não. Este cenário econômico é fruto fio do ministro Nelson Barbosa será temas neste artigo. Escolhi apenas
de erros de política econômica do go- convencer este pessoal que seis é di- um, a política monetária. O Brasil
verno da presidente Dilma Rousseff ferente de meia dúzia. adotou em 1999 o sistema de metas
que o ex-ministro Joaquim Levy não Os neopopulistas são maniqueís- de inflação que é bastante simples
foi capaz de consertar. O casamento tas e estão sempre do lado do bem. O de ser operado. O governo fixa uma
do Levy, um economista treinado na mal está com aqueles que deles dis- meta de inflação, com um interva-
sabedoria convencional, que domina cordam. O artigo 85 da Constituição lo predeterminado, para acomodar
100% dos países que deram certo, Brasileira, no seu inciso VI, estipula choques imprevisíveis. Toda vez
com o neopopulismo não poderia dar que “São crimes de responsabilidade que a taxa de inflação fica acima
certo e deveria terminar em divórcio. os atos do presidente da República do centro da meta o Banco Central
Aqui no Brasil a esquerda de ins- que atentem contra a lei orçamentá- aumenta a taxa de juros do merca-
piração marxista denominou a ad- ria”. A presidente Dilma está sendo do interbancário, que é a taxa de
ministração responsável das finanças acusada de atos cometidos que ferem juros básica da economia. Quando
públicas de política neoliberal, como este dispositivo legal. Para o neopo- a taxa de inflação fica abaixo do
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CONJUNTURA MACROECONOMIA
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ENTREVISTA
“Temos que
focar a origem do
problema fiscal”
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ENTREVISTA Fernando Rezende
disso. Obrigatório virou sinônimo de A Constituição de 1988 piorou esse verá que ele enumera uma série de di-
prioritário, e discricionário virou sinô- quadro? reitos sociais. Entre eles a previdência,
nimo de irrelevante. Isso não é assim. Ela foi um marco importante porque a saúde e a assistência, mas também o
Temos uma crise institucional, pois a ampliou – e muito – as responsabili- transporte, a habitação, a segurança,
principal instituição fiscal de qualquer dades do Estado. Uma série de novos o lazer. Criou-se um regime especial e
Estado, o orçamento, deixou de ser re- direitos foram criados. De novo, não garantias financeiras para o grupo que
levante há muitos anos. estou discutindo mérito. A ampliação integra a seguridade social: a previdên-
E isso só vem piorando, porque dos direitos sociais certamente era im- cia, a saúde e a assistência, ampliando
essas escolhas nunca foram discuti- portante naquele momento. Mas em o que os antigos institutos de previdên-
das no Brasil. Vêm se acumulando 1988 não discutimos como as novas cia faziam para o pessoal que estava no
num processo quase arqueológico de responsabilidades do Estado seriam mercado formal de trabalho. A ideia
camadas sobre camadas. A primeira repartidas entre os entes. Discutiu-se é boa. Universalizar o acesso a esses
grande escolha de decisão política de maneira ampla, e no plano federa- serviços. Mas, em assim fazendo, ao
sobre orçamento – sem discutir méri- tivo apenas focou-se a repartição das longo do tempo foi-se expulsando os
to – foi lá na Guerra do Paraguai, de outros direitos. Não é por acaso que a
pensões para filhos de militares que crise urbana está aí, o saneamento pú-
faleceram naquela guerra. De lá para blico está ameaçando a população com
cá se somou a Lei Elói Chaves, que doenças que já tinham sido extintas, e
criou o regime de previdência (em
A Constituição discutiu outras novas que estão surgindo.
1923), a unificação dos institutos
de previdência, as vinculações para as responsabilidades do Talvez também não se tenha pen-
educação, para saúde. Tudo isso sado no efeito demográfico, no im-
foi sendo feito sem rediscutir como Estado de maneira ampla, e pacto da expansão da população
o orçamento público ia acomodar na política de benefícios previden-
todas essas escolhas. Enquanto foi no plano federativo apenas ciários e outros...
possível acomodar as pressões pela Sim, e não apenas do ponto de vista
expansão do Estado, isso se manteve a repartição das receitas, do tamanho da população, mas da
sob controle de alguma maneira. A concentração espacial da população
cada momento de crise, entretanto, mas não a repartição das em grandes centros urbanos, microrre-
a situação se torna difícil de manejar. giões, sem que houvesse planejamento.
O que aconteceu nos últimos anos? responsabilidades Isso está na raiz da grave crise de finan-
De novo, uma dificuldade de enfren- ciamento do saneamento, da habita-
tar uma discussão mais aprofundada ção, do transporte. Porque repetimos
do problema, o que levou à adoção na área da habitação o que o antigo
de uma série de expedientes. Há pelo governo militar fazia com o BNH. Vai
menos 20 anos o Brasil se viciou em receitas, mas não a das responsabili- construir onde? O setor privado se en-
receitas extraordinárias. Se olhar os dades. Claro que isso tem implicações carregou de construir os conjuntos ha-
dados desse tipo de receita, ela cai cuja discussão podemos aprofundar bitacionais no programa Minha Casa
um pouco no momento em que a do ponto de vista da qualidade da ges- Minha Vida, mas na periferia, onde a
economia melhora, mas volta a su- tão pública. Não é por acaso que se terra é mais barata, e depois o estado
bir para um patamar de 1% a 1,5% gasta razoavelmente um bom dinheiro e o município não têm condições de le-
do PIB nos últimos anos. É um vício em educação, não obstante a qualida- var água, saneamento, transporte.
difícil de largar. É como se o Brasil de da gestão seja péssima. Para compensar isso, o governo
estivesse se comportando como her- Houve ainda outro problema im- federal passou a estimular os estados
deiro de uma família rica, vendendo portante. Se você olhar a redação do e municípios a se endividarem pelo
patrimônio até ele acabar. artigo sexto da Constituição Federal, BNDES, pela Caixa Econômica e Ban-
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ENTREVISTA Fernando Rezende
co do Brasil, para financiar investi- era para administrar despesas para as to. E não basta falar sobre a reforma
mentos na área urbana e social. E esse quais você não consegue liberar o re- da previdência. Não é que ela não seja
estímulo ao endividamento foi acom- curso no calendário fiscal. Uma con- necessária, mas que sozinha não elimi-
panhado de um processo de nova cen- ta de luz de dezembro que vence em nará nossa dificuldade de caminhar.
tralização de poder. Os ministérios que janeiro. O que aconteceu nos últimos Temos que discutir a previdência no
foram criados para manejar essa situ- anos, foi que se expandiu o conceito âmbito do debate da qualidade dos
ação – Cidades, Turismo, Integração, de restos a pagar, somando pouco serviços públicos, que por sua vez tem
Esportes – hoje administram os cha- mais de R$ 200 bilhões – mais ou me- a ver com o orçamento.
mados convênios, que são outra forma nos duas vezes o que tem na chamada Veja o caso da saúde. Se formos
de repassar recursos a estados e muni- despesa discricionária. olhar a Constituição, um dos dispositi-
cípios para financiar aquelas atividades vos transitórios aponta que esta deverá
que não têm recursos vinculados – além Isso se agravou com a recessão? contar com 30% das receitas da segu-
das que têm recursos vinculados, como Hoje você está empurrando o proble- ridade. Essa lei nunca foi discutida. E
saúde e educação, que recebem repasses ma na expectativa de que a melhora de lá para cá a saúde foi sendo expulsa
por fora. O governo federal foi estabe- do espaço da seguridade. Hoje, a saúde
lecendo normas, regulando a ação dos deve ficar com no máximo 10% des-
estados e municípios a ponto de que sas receitas. À medida que previdência
hoje em dia você tem o que chamaria e assistência foram se expandindo, a
de antítese de um regime federal. Isso
Minha Casa Minha Vida saúde foi buscar outra garantia. Pri-
impõe de cima para baixo regras que meiro foi uma emenda constitucional
definem quanto e em quais programas constrói casas na periferia, de 2000 que estabeleceu que o Estado
os estados e municípios devem aplicar deveria gastar em saúde pelo menos
seu dinheiro. Lembro-me de uma con- onde a terra é mais o montante do ano anterior corrigi-
ferência na Índia da qual participei em do pelo PIB. Mais recentemente, uma
2005, em que o lema era Unidade na barata, e depois o estado nova emenda, nova lei, estabeleceu
Diversidade. No Brasil, nós criamos a que o Estado deve gastar um certo
Uniformidade na Diversidade. É algo e o município não têm percentual da receita líquida. O que
que não condiz e é ineficiente, porque isso significa? A saúde está buscando
entre outras coisas o gestor público condições de levar a água, o outros mecanismos de garantia, por-
que está encarregado de administrar que a garantia da seguridade social já
qualquer serviço de prestação à comu- saneamento, o transporte não atende aos seus interesses de finan-
nidade desconhece seu fluxo de caixa. ciamento. Mas esse assunto nunca foi
Nem o federal, nem o estadual, nem o objeto de debate político, e esse é um
municipal. Ele sabe que eventualmente ponto que estou tentando enfatizar na
terá um crédito orçamentário, mas não hora de discutir Estado: que os direitos
sabe se vai receber, quando, e se terá da situação econômica vai resolver o sociais são amplos, mas o acesso não é
tempo de cumprir com toda a burocra- problema fiscal, e isso é um equívoco. de fato universal. E não é igual.
cia para executar o gasto. Na melhor das hipóteses, se a econo-
Esse é um lado do problema. O go- mia voltar a crescer, aliviará a situação. Isso passa pela questão do pacto
verno federal estimulou os estados a se A crise volta, a economia desacelera, e federativo?
endividarem. Mas tem outro lado, que ele aparece de novo. Precisamos colo- Sim, mas não gosto dessa expressão.
é o engavetamento de despesas, que no car em debate a reforma orçamentária. Tenho conversado com representantes
jargão orçamentário se chama restos a Isso não significa discutir uma nova lei dos estados, e busco mostrar que a op-
pagar. A figura dos restos a pagar foi do orçamento público, mas discutir o ção de manter o conflito interestadual
criada na lei orçamentária de 1964, Estado, pois as responsabilidades do centrado numa disputa pelo ICMS é
que foi antes do governo militar. Mas Estado já não cabem neste orçamen- um equívoco total. O problema é que
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ENTREVISTA Fernando Rezende
o ICMS não tem futuro. É um im- de mudar a perspectiva do debate quela música sobre o salão de gafieira:
posto em progressiva decadência, por orçamentário? “Quem está fora não entra, quem está
razões muito simples. As principais Antes de discutir o instrumento, temos dentro não sai”. Como conseguir es-
bases do ICMS estão sendo erodidas. que começar discutindo as raízes do paço para acomodar todo mundo que
A tecnologia das comunicações está problema: como essas escolhas foram ficou do lado de fora? Essas questões
minando as telecomunicações. E cada feitas, como foram ocupando o espaço têm que ser expostas. O que tem sido
vez que se quer aumentar a alíquota, orçamentário. Se quer aumentar verba feito na Europa desde a crise de 2008 é
como se fez agora, isso gera problema. para saúde, terá que conter a expan- um trabalho aprofundado de discussão
Os combustíveis fósseis enfrentam a são dos gastos da previdência; se quer política da despesa, baseado na reali-
pressão ambiental. A indústria caiu manter a expansão dos programas de zação de uma expenditure review, de
a menos de 10% do PIB nas últimas transferência de renda para as famílias análise programa a programa de gover-
estimativas. Aí nos resta o consumo e mais pobres, isso implica certo conflito no, quais consequências, quem está se
as importações que, na atual situação, entre saúde, previdência e assistência. beneficiando, quais problemas está tra-
estão em queda, comprometendo a re- Se quiser resolver os graves problemas zendo. Esse é o caminho. Eu não vejo
ceita dos estados. possibilidade de sairmos disso tentan-
Quando eu falo em discutir a Fede- do fazer apenas proposições técnicas.
ração, é dar um passo atrás e voltar a
1988, quando o tema da descentraliza- Hoje, entretanto, além dos gastos
ção de poder era dominante na Cons-
Nos últimos anos orçamentários, temos outros gastos
tituinte, pois vinha de uma reação à que não conseguimos ver de fato, de
centralização promovida durante o go- expandiu-se o conceito de benefícios financeiros, creditícios,
verno militar. Só que a discussão se limi- gastos tributários, entre os quais o
tou a como se distribuiriam as receitas, restos a pagar, somando Simples. Qual sua avaliação?
em um processo em que o trabalho das Primeiramente, o importante é recupe-
comissões corria em paralelo. A comis- mais de R$ 200 bilhões – rar o conceito da despesa tributária (na
são da ordem social criou a seguridade expressão em inglês, tax expenditure).
e as receitas próprias, e a comissão da mais ou menos duas vezes Voltando à novilíngua, aqui no Brasil
tributação simplesmente dividiu os im- o transformamos em despesa fiscal.
postos. Mas, ao longo do tempo, a se- o que tem na chamada Dessa forma parece ter efeito positivo,
guridade social atropelou a Federação. uma renúncia do governo para estimu-
O primeiro marco disso foi a crise de despesa discricionária lar a atividade econômica. Mas é uma
1998. Dez anos depois da Constituinte, despesa tributária. Por trás de uma des-
o Brasil quebrou, e de uma hora para pesa, de uma lei que confere determina-
outra teve que fazer superávit primário da vantagem, tem sempre um interesse.
de três e poucos por cento do PIB. E E esses interesses que se acumularam,
se faz superávit em cima do quê? Das urbanos, também terá que se abrir es- como no salão de gafieira, estão muito
contribuições, porque se fosse com os paço no orçamento, e não só via finan- bem organizados politicamente. Então
impostos, teria que fazer o dobro para ciamento e expansão da dívida. é preciso expor a quem está do lado de
poder gerar o mesmo resultado. Cada Em geral, todos acham que a discus- fora do salão como é que tem que se
vez que você faz esse tipo de manobra são é muito ampla. Eu venho dizendo organizar para se seus interesses sejam
você simplesmente adia a discussão o contrário: os problemas hoje em dia atendidos. Esse é o debate que a gen-
sobre o enfrentamento do problema, são tão grandes e tão complexos, que a te está precisando fazer. Não que seja
que é estrutural. única maneira de encontrar um espaço fácil, mas caberia a nós, que estamos
para encaminhar um debate político é lidando com esses números, mostrar
A proposta de voltar a um orça- pôr esses problemas na mesa. A ima- dessa forma. E o Simples Nacional é
mento plurianual seria uma forma gem do nosso orçamento é como na- um elemento importante disso. Você
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ENTREVISTA Fernando Rezende
conversa com representantes do setor não estamos dirigindo nossa atenção As decisões que foram tomadas ao
privado, e vê que eles não têm nenhuma para as origens e raízes do problema. arrepio da Lei de Responsabilidade
esperança de ver uma reforma tributá- Estamos tentando encontrar medidas Fiscal nada mais são do que uma ma-
ria decente. Então, se não conseguem tópicas, emergenciais, para uma situ- nifestação da falta de empenho em
melhorar a qualidade do imposto, ra- ação que não é emergencial, no sen- discutir o problema. Não estou ven-
ciocinam que é melhor reduzir o custo tido de que ocorre por conta de uma do como sair. Claro que é preciso to-
das obrigações acessórias. recessão econômica. A recessão des- mar algumas medidas emergenciais,
nuda o problema, mas não corrige. mas isso não é suficiente. Penso que
Qual sua avaliação sobre a iniciativa Isso é o que preocupa no debate. A precisaríamos montar uma equação
de reforma da PIS/Cofins? Ela está gente continua vendendo uma ilusão, capaz de combinar duas ou três ini-
coerente com a realidade brasilei- de que as coisas são passageiras. De ciativas importantes para evitar que
ra, em que 70% do PIB são gerados que, se fizermos uma correção agora, o problema se agrave, mas dispos-
pelo setor de serviços? em 2017 a economia volta a crescer e tas dentro de uma vestimenta maior,
Acho que não. Os meus amigos não a gente pode esquecer. para abrir o debate.
concordam comigo, e quase estão fi-
cando meus inimigos. Tenho pensado Quais seriam essas iniciativas?
muito sobre isso, principalmente com Falamos aqui que o governo acumu-
base em leituras sobre a nova econo- lou compromissos, optou por ven-
mia digital. É uma economia que não Os problemas hoje em der patrimônio para ganhar receitas
é física, que se baseia em coisas difíceis extraordinárias, expandiu a dívida
de você atribuir valor. Não é tão sim- dia são tão grandes e tão e isso não foi suficiente para evitar
ples fazer crédito tributário para coisas que a situação continuasse se agra-
cuja valoração é um pouco abstrata. É complexos que a única vando. Como podemos desembarcar
diferente do tempo em que a produção dessa atitude? Agora poderemos ter
de um bem baseava-se essencialmente maneira de encontrar um a “visita da velha senhora” (referên-
em transações físicas. Ainda não quero cia à obra de Friedrich Dürrenmatt),
fazer afirmações taxativas, mas acho espaço para encaminhar a CPMF. Eu não gosto da ideia. Mas,
que precisamos discutir qual o sistema se ela tiver que vir, deveria ser com-
tributário do século 21. No caso do um debate político é pôr binada com um processo de revisão
ICMS, por exemplo, não endossaria de prioridades.
mudá-lo do jeito que estão falando, esses problemas na mesa Há uma preocupação generalizada
e é um caso pior, porque os serviços dos interesses que estão em jogo nesse
estão fora da base. Mas a PIS/Cofins momento de tentar ver como sairão
também nos apresenta problemas di- ilesos dessa. Será que estaríamos perto
fíceis de serem administrados. Não é de uma situação na qual conseguísse-
por acaso que o setor de serviços está Hoje o senhor identifica alguma mos compor algumas mudanças que
se posicionando contra esse debate. iniciativa de enfrentamento dessa em conjunto caminhem na direção cer-
questão de forma mais ampla, tal ta? O segredo está em colocar o foco
O senhor defende a definição do li- qual defende? na origem dos problemas tributários,
mite da dívida bruta da União, como Como disse antes, acho que não va- orçamentários e federativos que foram
a Lei de Responsabilidade Fiscal já mos resolver o problema com lei. A se acumulando: a decisão tomada na
previa, ou também considera que na crise fiscal é uma crise institucional. E Constituição de 1988 de instaurar o
atual conjuntura esse tema poderia bate agora numa das instituições que que venho chamando de dualidade
aumentar a percepção de risco? foi criada em 2000 com o objetivo de tributária. Ela está consagrada, de um
Pensando em voz alta, diria que é garantir a estabilidade das contas pú- lado, em impostos que estão regula-
uma medida positiva. Mas insisto que blicas, o equilíbrio macroeconômico. dos em um capítulo da Constituição, e
2 2 C o n j u n t u r a E c o n ô m i c a | J a n e i r o 2 016
ENTREVISTA Fernando Rezende
em contribuições que estão reguladas há muito deixaram de ser partilhadas das adotadas para contornar o en-
em outro capítulo, pelo artigo 195. O com os outros componentes da seguri- gessamento do orçamento, mediante
artigo 195 instituiu as contribuições dade social. E incorporar as demais o acúmulo dos restos a pagar e o re-
sociais sobre salários (que já existiam contribuições previstas nesse artigo ao curso a receitas extraordinárias.
e foram incorporadas), sobre receita e capitulo tributário da Constituição. No caso dos restos a pagar o foco
lucro. Com a crise econômica do final Qual é a vantagem dessa mudança: estaria concentrado no volume dos
da década de 1990, foi necessário ado- provocar um debate na sociedade so- gastos em saúde e educação inscritos
tar um programa de ajuste fiscal, para bre como financiar o déficit da previ- nessa rubrica. Isso tira eficácia das
evitar a derrocada do Plano Real, ba- dência durante o processo de elabora- vinculações constitucionais, porque,
seado na geração de superávits primá- ção e aprovação do orçamento. Essa pela regra dos restos a pagar, o limite
rios maiores de 3% do PIB. O aumen- medida desloca o eixo da discussão de acúmulo são cinco anos. No caso
to das contribuições sociais e a criação para as prioridades que deixarão de da educação e da saúde, não se pode
do Fundo Social de Emergência foi a ser atendidas em decorrência da deci- cancelar esses restos a pagar. Você
solução encontrada naquele momen- são sobre o quanto das receitas líqui- pode ter despesas que foram previs-
to. Na sequência, o crescimento das tas cinco anos atrás que se não foram
despesas públicas demandou sucessi- feitas naquele momento podem ter
vas prorrogações desse instrumento, se tornado desnecessárias. Mas terá
rebatizado de Desvinculação das Re- que executá-las, porque não podem
ceitas da União (DRU) para evitar o
Estamos tentando ser canceladas. Fazendo isso, limita
descumprimento das metas fiscais. a execução do que está previsto para
Mas a dificuldade em abandonar o encontrar medidas o ano. Isso é um instrumento que
vício debilita o organismo e a dose in- gera ineficiência e reduz a eficácia da
jetada já não traz qualquer alívio para tópicas, emergenciais, para própria vinculação.
o quadro fiscal. Como disse, tampou- E o terceiro passo é avançar na
co o aumento da dose da DRU para uma situação que não é consolidação fiscal, e não apenas no
30% irá resolver os problemas. Para ajuste, porque os desequilíbrios são
abandonar o vício, temos que retornar emergencial, no sentido de estruturais. Ou seja, implementar
à origem dos problemas fiscais e ver o uma regra de que receitas extraordi-
que precisa ser feito para deslanchar que ocorre por conta de nárias deveriam financiar exclusiva-
um processo de mudanças. mente gastos de capital e investimen-
Para tanto, a sugestão é puxar o fio uma recessão econômica to, além de despesas extraordinárias,
da meada que levou a um grau extre- quando houver. Mas não para finan-
mamente alto de engessamento do or- ciar gastos correntes, pois toda vez
çamento e que também acarretou a que se insistir em extrair receitas
deterioração do sistema tributário, extraordinárias para financiar des-
bem como o crescimento dos desequi- das do Tesouro serão direcionadas pesa corrente, estaremos adiando o
líbrios federativos: a dualidade tribu- para a cobertura do déficit previdenciá- enfrentamento do problema.
tária mencionada anteriormente. Isso rio, contribuindo para o debate políti- Esse é um conjunto de três pro-
significa rever o disposto no artigo co sobre as medidas que precisam ser postas complementares: a primeira,
195 da Constituição, de modo a elimi- adotadas para o equilíbrio no atendi- uma busca pelo equilíbrio na repar-
nar a distinção artificial introduzida mento das prioridades. tição de prioridades; a segunda, a
naquele momento entre impostos e busca por maior eficiência e eficá-
contribuições. Nessa revisão importa O que viria na sequência? cia das garantias constitucionais de
reconhecer o fato de que as contribui- Ao puxar o fio da meda, descortina- recursos para áreas prioritárias; e a
ções sobre os salários são fonte exclu- se também uma oportunidade para terceira, um passo rumo à consoli-
siva de financiamento da previdência e abordar as consequências das medi- dação fiscal.
J a n e i r o 2 016 | C o n j u n t u r a E c o n ô m i c a 2 3
IMPOSTO DE RENDA
Efeitos contraditórios
Especialistas defendem que, sem a volta da tributação de
lucros e dividendos, mudanças na alíquota do imposto de
renda para pessoa física poderiam aprofundar distorções
tributárias em favor dos mais ricos
2 4 C o n j u n t u r a E c o n ô m i c a | J a n e i r o 2 016
CONJUNTURA IMPOSTO DE RENDA
Total tributado exclusivo na fonte 107 149 139 163 204 192 207
Transferências patrimoniais 31 63 58 60 60 58 59
Total dos rendimentos declarados 1,37 1,66 1,68 1,81 1,98 2,06 2,13
J a n e i r o 2 016 | C o n j u n t u r a E c o n ô m i c a 2 5
CONJUNTURA IMPOSTO DE RENDA
11,4 11,5
10,8 10,9 10,9 10,7
10,2
9,6
9,1
6,9
6
% tributação sobre bens e serviços % tributação sobre renda, lucros e ganho de capital
2 6 C o n j u n t u r a E c o n ô m i c a | J a n e i r o 2 016
CONJUNTURA IMPOSTO DE RENDA
quotas efetivas, quando considera- principais países o potencial distri- de Gini, em 2,78% – percentual
mos a totalidade dos rendimentos, butivo global soma 15%, mas em abaixo do latino-americano e bem
crescem até determinada faixa de torno de 12% são atribuídos ao menor do que na média da OCDE
renda e passam a decrescer no topo gasto, restando 3% ao imposto.” –, apresentando um índice de pro-
da distribuição. Além disso, as isen- Em países como Argentina, México gressividade de 0,3632.
ções reduzem substancialmente as e Uruguai, a queda na desigualdade Levando em conta a necessidade
alíquotas efetivas mínimas e máxi- estimulada pela política tributária de aumento de arrecadação, bem
mas, colocando-as em níveis baixos é maior, variando de 3,5% a 4,8%. como uma maior participação dos
quando comparados com os vigentes Já no Brasil, a estrutura atual do tributos no esforço redistributivo
nos países da OCDE ou mesmo da IRPF – que em 2013 gerou uma re- devido à necessidade de contenção
América Latina e, por si, já limitam ceita de R$ 149,7 bilhões – reduz de gasto, os pesquisadores do Ipea
a progressividade do imposto de ren- a desigualdade, expressa no índice traçaram algumas possibilidades de
da no Brasil”, diz Orair.
Com isso, a partir da década de
1990 o país passou a viver uma Lucro e tributação antes e depois da Lei no 9.249/1995
situação paradoxal: enquanto se (em %)
avançou numa rede de proteção
Antes Depois
social que permitiu a redução da
desigualdade, a permanência de Lucro bruto 100 100
uma estrutura tributária muito
Lucro tributável 100 70
regressiva na tributação de bens
e serviços e pouco progressiva da IRPJ = 25% 25 17,5
renda acabou neutralizando par-
CSLL = 9% 9 6,3
te dos esforços distributivos. Para
ilustrar esse resultado, Gobetti cita JSCP 0 30
trabalho da Cepal que decompõe a
IRRF Capital (15%) 0 4,5
queda do índice de Gini em três de-
terminantes: pensões, outras trans- Dividendos 66 46,2
ferências, e IRPF. “Basicamente, o
IRRF Capital (15%-0%) 9,9 0
que vemos nos países da OCDE é
que ¼ da redução da desigualdade Total de imposto 43,9 28,3
é provocado pelo efeito do impos-
Lucro líquido acionista 56,1 71,7
to de renda, somando cerca de 7%.
Na América Latina, na média dos Fonte: Gobetti, S.W.; Orair, R. “Progressividade tributária: a agenda esquecida”.
J a n e i r o 2 016 | C o n j u n t u r a E c o n ô m i c a 2 7
CONJUNTURA IMPOSTO DE RENDA
2 8 C o n j u n t u r a E c o n ô m i c a | J a n e i r o 2 016
CONJUNTURA IMPOSTO DE RENDA
J a n e i r o 2 016 | C o n j u n t u r a E c o n ô m i c a 2 9
EMPREGO
Fim da
resistência
Recessão, inflação persistente e forte indexação
quebram defesas do mercado de trabalho e apontam a
forte alta do desemprego em 2016
3 2 C o n j u n t u r a E c o n ô m i c a | J a n e i r o 2 016
CAPA EMPREGO
J a n e i r o 2 016 | C o n j u n t u r a E c o n ô m i c a 3 3
CAPA EMPREGO
ço de ano difícil. “Sazonalmente, mais claros, com a retração da taxa da da FGV/IBRE, lembra que a queda
esse período costuma ser de deman- de ocupação (PO) em 0,1%. Até da busca por emprego nesse período
da mais enfraquecida. Agora tere- então, a média de crescimento do reflete o aumento real da renda das fa-
mos que somar a isso o acúmulo estoque de pessoas ocupadas medi- mílias registrado até então, permitindo
dos efeitos de uma política fiscal das na PME (que investiga as seis aos aposentados abdicar de atividades
mais contracionista – ou pelo me- principais regiões metropolitanas para complemento de renda, bem
nos a expectativa dela, já que temos do país) flutuava folgadamente no como a postergação da busca de em-
previsão de superávit no orçamento terreno positivo: em 2011, cresceu prego pela população jovem. “Além
do ano – além do reajuste do salário 2,1%; em 2012, 2,2%; passando disso, em 2014 programas educacio-
mínimo em janeiro. Uma correção a perder fôlego somente em 2013, nais como o Fies e o Pronatec rece-
nominal de 11% em um ambiente quando registrou 0,7%. A queda beram uma forte injeção de recursos,
de contração dificilmente perdoará em 2014 não ficou evidente na taxa atraindo o estudante para fora do mer-
o emprego”, diz. de desemprego, entretanto, porque cado de trabalho”, acrescenta. Nesse
a procura por trabalho também era ano, os gastos com o programa de fi-
fraca. “Nesse ano, enquanto a PO nanciamento estudantil saltaram para
Deterioração anunciada caiu 0,1%, a PEA (população eco- R$ 13,75 bilhões, contra R$ 7,57 bi-
A expectativa de contração do mer- nomicamente ativa) retraiu 0,7%, lhões em 2013. Já o Pronatec ampliou
cado de trabalho cresceu principal- mascarando a piora que já estava suas matrículas para 3 milhões em
mente a partir de 2014, quando em curso”, descreve Romão. 2014, contra 2,7 milhões no ano ante-
os efeitos do enfraquecimento da Fernando de Holanda Barbosa Fi- rior. Em 2015, entretanto, não só esses
atividade econômica se tornaram lho, pesquisador da Economia Aplica- programas tiveram cortes orçamentá-
6%
4%
2%
0%
2%
4%
out/08
jan/09
abr/09
jul/09
out/09
jan/10
abr/10
jul/10
out/10
jan/11
abr/11
jul/11
out/11
jan/12
abr/12
jul/12
out/12
jan/13
abr/13
jul/13
out/13
jan/14
abr/14
jul/14
out/14
jan/15
abr/15
jul/15
out/15
Fonte: FGV/IBRE.
3 4 C o n j u n t u r a E c o n ô m i c a | J a n e i r o 2 016
CAPA EMPREGO
Efeito dominó
Esse giro da PEA e da PO tampouco
afetou com tanta clareza o cenário
geral do emprego em 2015. Silvia
Matos lembra que, em certa medi- Em época de retração econômica, a população jovem é
da, isso se deveu ao forte ritmo de a mais afetada pelo desemprego
J a n e i r o 2 016 | C o n j u n t u r a E c o n ô m i c a 3 5
CAPA EMPREGO
contratações dos anos anteriores. cinco anos. “Em 2010 o Brasil teve
Tomando dados do Caged de ja- um saldo positivo de quase 750
Com a retração da renda
neiro a novembro, verifica-se que mil empregos na indústria. Daí em
a deterioração do saldo de vagas diante, desacelerou para 400 mil
em 2015 se deu mais pela redução
real das famílias verificada em 2011, 300 mil em 2012, pata-
do volume médio de admissões, mar que se repetiu em 2013. Em
18,2%, menor do que no mesmo
em 2015, jovens que 2014 teve um tombo grande, com
período de 2014, do que do au- um saldo de somente 20 mil postos
mento de desligamentos, de 9,6%.
estavam fora do mercado de trabalho. Até que, em 2015, che-
“No primeiro semestre de 2015, gou-se à perda de 433 mil postos de
observamos setores resistentes a
passaram a buscar trabalho no acumulado até novem-
iniciar um processo de demissão bro”, descreve Guilherme Mercês,
mais intenso, ainda esperando uma
trabalho, pressionando a gerente de Estudos Econômicos da
reversão da demanda, o que não Firjan. “Para se ter uma ideia, esse
se confirmou, deteriorando as ex-
taxa de desemprego montante é equivalente à perda de
pectativas com o aprofundamento uma indústria de transformação do
do quadro recessivo”, diz Rogerio estado do Rio de Janeiro inteira.
Mori, da FGV/EESP. “As empresas Em apenas 11 meses”, compara. A
passaram a encarar um cenário em alguma recuperação – mais para o indústria desse estado, por sua vez,
que o investimento despencou ab- lado da redução das importações reduziu postos de trabalho equiva-
surdamente (a estimativa do IBRE é do que aumento das exportações, lentes à soma conquistada nos últi-
de queda de 12,3% em 2015), com diga-se de passagem. Aí não houve mos três anos.
crescimento negativo do consumo escapatória, as demissões passaram Mercês destaca que a indústria
das famílias (de -3,7%, conforme a crescer”, completa Barbosa. é a primeira a reagir aos movimen-
o Boletim Macro IBRE), com ape- No caso da indústria, esse ca- tos da atividade econômica por ser
nas a balança comercial acenando minho começou a ser traçado há tomadora de preços no mercado
internacional. “Ou ela pratica o
preço desse mercado, ou os impor-
Consumo das famílias e serviços caem em 2015 tados entram no país. Foi o que
Taxa acumulada em quatro trimestres (em relação ao mesmo vimos a partir de 2012, quando a
período do ano anterior, %) balança comercial brasileira prati-
16
camente acabou com seu saldo”,
diz. Segundo estimativas da LCA,
o setor deverá ser responsável pela
12
perda de 633 mil postos de tra-
balho em 2015, do total de 1,63
8
milhão. Para 2016, a consultoria
projeta uma retração de 550 mil no
4
setor, de um total de 1,35 milhão
de postos eliminados.
0 -1,6 A construção civil foi a segunda
-1,8 a puxar a deterioração do emprego
em 2015. Até novembro, tinham
I III III III III III III III III
2008 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 restado mais de 309 mil vagas.
Serviços Consumo das famílias José Carlos Martins, presidente
Fonte: CNI, com dados Contas Nacionais/IBGE. da Câmara Brasileira da Indústria
3 6 C o n j u n t u r a E c o n ô m i c a | J a n e i r o 2 016
CAPA EMPREGO
J a n e i r o 2 016 | C o n j u n t u r a E c o n ô m i c a 3 7
CAPA EMPREGO
3 8 C o n j u n t u r a E c o n ô m i c a | J a n e i r o 2 016
CAPA EMPREGO
8%
Fator indexação
6%
Um dos elementos apontados pe-
los economistas como agravante 4%
do quadro de desemprego é o alto 2% 0,9%
nível de indexação presente na eco- -0,2%
J a n e i r o 2 016 | C o n j u n t u r a E c o n ô m i c a 3 9
CAPA EMPREGO
4 0 C o n j u n t u r a E c o n ô m i c a | J a n e i r o 2 016
CAPA EMPREGO
120 2013
99 00 01 02 03 04 05 06 07 08 09 10 11 12 13 14 15
mar jun set dez
98,8 104,1 105,9 102,3
Fonte: CNI.
J a n e i r o 2 016 | C o n j u n t u r a E c o n ô m i c a 41
CAPA EMPREGO
Sem otimismo
Evolução do índice de expectativas
81,1 82,8 82,1
77,9 75,1 77
73,7
69,6 68,4 70,6 69,9
66,5
4 2 C o n j u n t u r a E c o n ô m i c a | J a n e i r o 2 016
Pesquisas, produção
e disseminação de indicadores
fundamentais para compreensão
do desempenho econômico e social.
O Instituto Brasileiro de Economia é a unidade da
Fundação Getulio Vargas que analisa e pesquisa a economia,
impulsionando e estimulando o desenvolvimento de negócios
públicos e privados de todo o país. As estatísticas do instituto
antecipam as principais tendências de curto prazo da economia,
consistindo em excelente subsídio para projeções e tomada
de decisões estratégicas.
Atuação em 100%
das capitais brasileiras
Solidez e conhecimento da
Dinâmica de Práticas do Mercado
Alta competência
do corpo técnico
4 4 C o n j u n t u r a E c o n ô m i c a | J a n e i r o 2 016
CONJUNTURA MÁQUINAS E BENS DE CAPITAL
IBGE mostra que nos 12 meses encer- curso, de acordo com a análise do publicada na edição de novembro de
rados em outubro do ano passado a presidente da Abimaq. Seu raciocínio 2015 da Conjuntura Econômica (p.
produção de bens de capital recuou é confirmado pela série histórica do 36 a 47) com base em estudo feito
22,3%, com destaque para o tombo IBGE segundo a qual a participação pelo pesquisador Claudio Considera
de 40,6% na produção de bens para a da indústria de transformação no e pela analista Juliana Carvalho, am-
indústria da construção e de 28% na PIB brasileiro despencou de 17,9% bos do IBRE.
fabricação de equipamentos de trans- em 2004 para 10,9% em 2014. O trabalho revela que embora
portes. Não fosse um crescimento de “As marcas industriais conti- o salto dos importados em termos
7,6% na produção de bens de capital nuam aí, mas em muitos casos nem percentuais na oferta total entre
não seriados para fins industriais e as embalagens são feitas mais aqui”, 2000 e 2014 tenha sido de quase
o tombo seria generalizado entre os aponta Pastoriza, dizendo que essa sete vezes, por exemplo, no setor
nove sub-ramos em que se divide a aparente normalidade esconde do de calçados e artefatos de couro (de
indústria que sinaliza o ânimo investi- consumidor que ele está compran- 1,6% para 10,8%), nenhum setor
dor dos empresários. do, por exemplo, um eletrodomés- atingiu a marca de 37,4% de im-
Pastoriza vai buscar uma das fra- tico importado da China pensando portados exibida pela oferta de má-
ses mais populares do ex-ministro estar adquirindo um produto brasi- quinas em geral, uma escalada que
da Fazenda (1974-1979) Mario leiro daquela marca com a qual ele partiu de 16,6% da oferta domés-
Henrique Simonsen – “inflação alei- está familiarizado. tica no ano 2000. As máquinas e
ja, mas câmbio mata” – para ilus- A importação foi ao longo dos equipamentos representam, segun-
trar seu ponto de vista de que a raiz últimos anos um caminho trilhado do o presidente da Abimaq, aproxi-
do problema do setor de máquinas para o abastecimento do mercado madamente a metade da Formação
e equipamentos, e da indústria bra- brasileiro com produtos industriais Bruta de Capital Fixo (FBCF) no
sileira como um todo, estaria no em geral, como mostrou reportagem país, ou seja, dos investimentos.
longo período que o país viveu sob
juros elevados para segurar a alta
dos preços e, especialmente, com Produção de bens de capital despenca
um câmbio sobrevalorizado. “Pas- Variação (%) em 12 meses da produção de bens de capital por segmento
sando todos esses anos aleijados e (out-2014 e out-2015)
morrendo”, resumiu.
Segmento out/14 out/15
Segundo ele, o processo de encolhi-
mento da produção doméstica retirou Bens de capital -7,1 -22,3
da atividade industrial centenas de
Bens de capital para fins industriais -4,3 -3
pequenos fornecedores da indústria
de máquinas, desmontando uma ca- Bens de capital para fins industriais seriados -8 -6,7
deia que dificilmente será recompos-
Bens de capital para fins industriais não seriados 8,3 7,6
ta. Esse processo, na sua avaliação,
foi mascarado durante muitos anos Bens de capital agrícolas -3,3 -22,8
pelo efeito benéfico sobre o ambien-
Bens de capital peças agrícolas -9,5 -25,7
te econômico brasileiro gerado pelo
boom dos preços das commodities na Bens de capital para construção 1,2 -40,6
primeira década deste século.
Bens de capital para o setor de energia elétrica 3,5 -14,3
Com muito dinheiro circulan-
do, oportunidades de negócios e de Bens de capital equipamentos de transportes -14,7 -28
empregos se multiplicaram fora do
Bens de capital de uso misto -1,4 -21,3
ambiente industrial, mascarando o
processo de desindustrialização em Fontes: PIM-PF/IBGE e FGV/IBRE.
J a n e i r o 2 016 | C o n j u n t u r a E c o n ô m i c a 4 5
CONJUNTURA MÁQUINAS E BENS DE CAPITAL
4 6 C o n j u n t u r a E c o n ô m i c a | J a n e i r o 2 016
CONJUNTURA MÁQUINAS E BENS DE CAPITAL
86,1
82,3
80,8 80,8
67,8
vidamento ultrapassou a casa dos macroeconômica que, por enquanto, tempo e encomendas para que a in-
R$ 500 bilhões. Mas ele defende a não está visível no horizonte. dústria de máquinas e equipamentos
continuidade das regras de conteúdo Assim como espera para 2015 venha a demandar novos investi-
nacional, afirmando que as empre- uma queda de aproximadamente mentos para fazer frente à demanda.
sas que se empenharam em atendê- 12% nos investimentos, ela en- “E para termos um ciclo de inves-
las alcançaram seus objetivos. xerga também um número negati- timentos será necessário a retoma-
A economista Silvia Matos, coor- vo para 2016. Sua avaliação toma da da confiança”, acrescentou. Ela
denadora técnica do Boletim Macro como base o fato de que a indús- avalia também que a retomada dos
IBRE da Fundação Getulio Vargas, tria doméstica de bens de capital investimentos em máquinas e equi-
acha que é necessário, sim, corrigir terminou o ano passado com uma pamentos vai exigir que as empresas
as “irracionalidades” das regras de posição bem abaixo da média da projetem construir novas plantas ou
conteúdo nacional e também mo- indústria de transformação em ter- ampliar aquelas já existentes.
dificar o modelo de partilha, pelo mos de nível de utilização da capa- “Somente reposição e moderni-
menos no que diz respeito às exi- cidade instalada (Nuci). zação de máquinas e equipamentos
gências de operador único e de um Em outubro, o Nuci do setor de não são suficientes para impulsio-
mínimo de participação de 30% da máquinas e equipamentos medi- nar os investimentos de forma vi-
Petrobras em todos os consórcios do pela Abimaq estava em 66,4%, gorosa”, ponderou a economista. A
para que o setor de petróleo e gás com queda de 0,7% na comparação taxa de investimentos da economia
tenha alguma chance de retomar os com o mês anterior e de 13,4% em brasileira, que estava em 20,4% no
investimentos de modo a liderar al- relação ao mesmo mês de 2014. Ao último trimestre de 2013, caiu para
guma retomada do setor de máqui- mesmo tempo, a carteira de pedidos 19,6% no quarto trimestre de 2014
nas e equipamentos. do setor apresentava uma queda de e para 18,1% no terceiro trimestre
Silvia disse que dos dois setores 2,4% em relação a setembro e de de 2015, um número, no passado re-
com maior potencial de comandar 23,1% sobre outubro do ano ante- cente, apenas superior para o perío-
uma retomada dos investimentos, o rior. Naquele momento, o Nuci da do ao do terceiro trimestre de 2006,
de infraestrutura e o de petróleo e indústria de transformação medido quando estava em 17,5%.
gás, o segundo tem maior capacidade pela FGV/IBRE estava em 74,9% Outro caminho normalmente
de voo próprio, desde que sob regras (75% na prévia de dezembro). seguido pelos investimentos em
adequadas, enquanto o primeiro é Diante desses números, Silvia bens de capital, a importação de
mais dependente de uma estabilidade avalia que vai ser necessário muito máquinas e equipamentos, também
J a n e i r o 2 016 | C o n j u n t u r a E c o n ô m i c a 4 7
CONJUNTURA MÁQUINAS E BENS DE CAPITAL
79,1
79,1
78,7
78,4
77,6
77,6
77,3
76,8
76,7
76,5
76,4
76,3
76
75,9
75,8
75,4
75,3
75,3
75,2
75,1
75
74,9
74,6
74,6
Dez/14 Janeiro Fevereiro Março Abril Maio Junho Julho Agosto Setembro Outubro Novembro Dezembro
Fonte: FGV/IBRE.
4 8 C o n j u n t u r a E c o n ô m i c a | J a n e i r o 2 016
CONJUNTURA MÁQUINAS E BENS DE CAPITAL
J a n e i r o 2 016 | C o n j u n t u r a E c o n ô m i c a 4 9
CONJUNTURA MÁQUINAS E BENS DE CAPITAL
imbróglio político, mesmo que não uma inflexão para o consumo do-
seja pelo caminho considerado mais méstico, obrigará o país asiático a
Não vejo como crescer o
favorável aos investimentos, e a uma reduzir seus investimentos em in-
saída, que também passa pela políti- fraestrutura e, consequentemente,
ca, para que o setor de petróleo e gás
investimento público por a sua própria taxa de investimen-
volte a investir apesar da crise finan- tos que, oficialmente, passava dos
ceira e institucional da Petrobras.
este lado – da Petrobras. 35%, contraindo naturalmente a
Está na Petrobras, na queda demanda por commodities.
abrupta dos seus investimentos, uma
E também não vejo Com o câmbio desvalorizado
das principais causas tanto para a Rocha acredita que pode haver al-
crise que o país atravessa quanto
como investir pelo guma reação na “bastante razoá-
para as dificuldades de retomada vel” cadeia de produção de bens de
dos investimentos gerais, de acor-
lado orçamentário capital. Segmentos como o de má-
do com a avaliação do economista quinas agrícolas, turbinas, motores
Carlos Frederico Rocha
Carlos Frederico Rocha, professor elétricos e geradores poderiam ser
associado do Instituto e Economia competitivos. Mas o professor da
da Universidade Federal do Rio de UFRJ lembra que as exportações
Janeiro (UFRJ). brasileiras não ultrapassam a casa
Rocha calcula assim: a Petrobras disse Rocha, lamentando que não dos 10% do PIB e que por isso
vinha sendo responsável por algo haja espaço para iniciativas como não se pode contar com elas como
entre 12% e 14% do investimento a do Programa de Aceleração do motores de decisões de investir a
total do país. Com o corte de um Crescimento (PAC). Segundo ele, o ponto de interferir no agregado da
terço desses investimentos ela gerou governo havia recuperado os inves- taxa de investimentos. “Acho que a
queda de um ponto percentual no timentos públicos em dois pontos gente vai passar uns três anos bem
PIB. Como esse corte tem um mul- percentuais sobre 2006, mas per- ruins. Se a taxa de investimentos
tiplicador que se alastra por toda a deu um ponto em 2015 e perderá ficar em 18% podemos agradecer,
cadeia produtiva setorial, a conta outro ponto em 2016, voltando ao independentemente de quem venha
sobe para dois pontos percentuais. estágio anterior. a dirigir o país.”
Ou seja, a Petrobras sozinha re- Esse cenário, na visão do pro- Rocha, que foi contra a adoção
presentou uma vertente decisiva na fessor da UFRJ, coloca o país “à do regime de partilha para o pré-sal
queda dos investimentos públicos, mercê do investimento privado”, na época da sua criação, disse que a
segundo o economista, “sem pers- uma perspectiva que ele não vê com obrigação de a Petrobras ficar como
pectiva relevante no curto prazo”. otimismo, considerando a situação dona de 30% de todos os campos
Endividada e com o barril de política conturbada e a instabilida- comprometeu a capacidade de in-
petróleo valendo menos da metade de do câmbio. Quais seriam as saí- vestimentos da empresa. Ele admite
do que valia em meados de 2014, das? No quadro atual, com a crise mudanças, desde que com objetivos
a Petrobras não tem recursos para de poder minando a confiança dos claros para a economia do país.
investir e, segundo Rocha, terá que investidores privados e o setor pú- No regime de metas de conteúdo
concentrar todos os seus esforços na blico sem capacidade para investir, nacional ele vê muitos erros a serem
produção daquilo que já está desco- Rocha vê poucas. corrigidos, mas não a necessidade
berto, deixando momentaneamente Na frente externa ele considera de desmontá-lo. Uma das vertentes
de lado a exploração e o refino. pouco provável que os preços das de mudanças seria, por exemplo,
“Não vejo como crescer o inves- commodities se recuperem a médio incluir exportações como parte da
timento público por este lado – da prazo para dar fôlego à economia meta e dar um bônus para investi-
Petrobras. E também não vejo como brasileira. A mudança de rumo da mentos em P&D, estimulando o au-
investir pelo lado orçamentário”, política econômica chinesa, com mento da competitividade.
5 0 C o n j u n t u r a E c o n ô m i c a | J a n e i r o 2 016
CONJUNTURA MÁQUINAS E BENS DE CAPITAL
J a n e i r o 2 016 | C o n j u n t u r a E c o n ô m i c a 5 1
CONJUNTURA MÁQUINAS E BENS DE CAPITAL
lítica para tomar decisões difíceis. exportações e mão de obra. Essas 59,7% no de transportes, 26% no M
“Neste exato momento não há con- premiações poderiam ser feitas como de equipamentos agrícolas e 34,6% Y
dições políticas para nada.” compensação de parte dos recursos no de outros bens de capital (máqui- CM
Torres também defende aperfei- dos cerca de R$ 10 bilhões em multas nas industriais e outros).
MY
çoamentos nas regras de conteúdo referentes ao conteúdo local que as Segundo Moreti, parte desse fra-
CY
local, premiando ações das empresas empresas ameaçam levar à Justiça. co desempenho deve ser creditada
CMY
5 2 C o n j u n t u r a E c o n ô m i c a | J a n e i r o 2 016
Quando sua empresa diz
não ao trabalho infantil,
muita gente pode dizer
sim para sua marca.
Uma iniciativa:
GOVERNANÇA
Um dos elementos amplamente indicados como desde o início de sua atividade. O cálculo se dá a
vilões para o ambiente de negócios brasileiro é o partir da média de três itens. O primeiro é a forma-
enfraquecimento das agências reguladoras federais ção acadêmica dos diretores. O segundo, seu nível
observado nos últimos anos. Ora vítimas de apare- de vinculação política, para o qual se analisa se há
lhamento político, ora do ativismo regulatório do filiação partidária, bem como se o histórico profis-
governo – como se deu no setor elétrico a partir de sional do diretor envolve algum cargo político. O
2012 –, as agências têm sofrido problemas de gover- terceiro é a forma como se deu a condução do di-
nança considerados daninhos à atração de investi- retor ao cargo, ou seja, se foi pelo processo regular
mentos e ao estímulo à atividade econômica. – com indicação, sabatina no Senado e posterior
Para compreender em detalhes a dinâmica que nomeação –, ou por nomeação direta da presiden-
leva a esse quadro, em 2015 o Centro de Estudos te, em caráter de interinidade.
em Regulação e Infraestrutura (FGV/Ceri) deu iní- Os resultados indicam uma forte variação do
cio a um projeto a partir do levantamento de dados desempenho de cada agência ao longo do tempo,
de nove agências reguladoras federais – a única não com altos e baixos que mostram descontinuidade
incluída é a Ancine. “Diferentemente de outros estu- no processo de evolução da maior parte desses ór-
dos apoiados em entrevistas e percepções pessoais, gãos. Joisa Dutra, diretora do Ceri, ressalta que a
buscamos uma extensa base de números para trazer piora do nível de profissionalização demonstra-
evidências empíricas ao debate”, explica o argentino da em vários casos não pode ser atribuída apenas
Sebastian Azumendi, pesquisador do Ceri. a um governo, já que cada ciclo político é mar-
A primeira tarefa assumida pelo grupo de pes- cado por avanços no desempenho de agências di-
quisa foi desenvolver um índice que mede o grau ferentes. Enquanto no segundo mandato de Fer-
de profissionalização das diretorias das agências nando Henrique Cardoso as agências que mais
5 4 C o n j u n t u r a E c o n ô m i c a | J a n e i r o 2 016
CONJUNTURA GOVERNANÇA
despontaram foram ANA, Antaq e de governo. Para isso, ainda pesa ne-
ANTT, nos dois mandatos de Lula gativamente o alto nível de contin-
se sobressaíram Aneel, ANS e Anac
Em 2015, a única
genciamento verificado pelos pesqui-
e, no primeiro mandato de Dilma sadores do Ceri em algumas agências,
Rousseff, ANP e Anatel.
agência que registra como ANP, Aneel, Anvisa e ANTT.
Em 2015, a única agência que re-
gistra o melhor nível de profissiona-
o melhor nível de
lização desde sua criação – e o mais Diretor temporário,
alto entre todas as agências nesse ano
profissionalização desde
problema permanente
– é a ANP. De um valor de 0 a 1, mar- Outro fator que tirou pontos de
cou 0,62. Azumendi aponta que entre
sua criação – e o mais alto
muitas agências foi o tempo em que
os fatores que colaboram para o bom estas estiveram sob o comando de
desempenho da ANP está a formação
entre todas as agências diretores-gerais interinos. Nesse caso,
de seus executivos. “Em geral, agên- a pior avaliada é a ANTT, que desde
cias cujo setor envolve mais comple-
nesse ano – é a ANP sua criação em 2002 totalizou 117
xidade técnica exigem maior capa- meses – quase dez anos – de gestão
citação”, diz. Entre os 100 diretores interina. “É um processo dramático,
que já passaram ou estão na ANP, porque a ANTT é a responsável pela
36 têm doutorado, 24 têm mestrado com maior grau acadêmico é a remu- regulação de setores envolvidos no
e 40, graduação. Na sequência estão neração. “Um dirigente de agência re- Plano de Investimento em Logística
Anac (com, respectivamente, 25, 25 e guladora federal ganha menos do que (PIL), e essa interinidade coincide
50) e Aneel (24, 16, 60). No caso da o salário inicial de um profissional de com o lançamento do programa”,
Anac, apesar da boa nota nesse que- nível superior nessa mesma agência. diz Joisa. Ela lembra, entretanto, que
sito, a agência registra o pior índice Isso é um incentivo perverso, encami- esse processo foi revertido no ano
geral de profissionalização em 2015 nhando as escolhas a quem tem outra passado, com a regularização do pro-
– ano marcado, entre outros fatores, fonte de renda ou esteja mirando algo cedimento de nomeação do atual di-
pela indicação política para um dos futuro”, diz, lembrando que esses di- retor-geral. Depois da ANTT, seguem
cinco postos da diretoria. retores tampouco podem ocupar car- Antaq e Anatel – essa última, com o
Joisa lembra que um dos fatores gos no conselho em empresas, como maior número de diretores interinos,
que dificultam a atração de diretores é comum entre secretários e ministros 21. “No caso da Anatel, entretanto, o
Índice do grau de profissionalização das diretorias das agências desde o início de sua atividade
0,4
0,5 0,4
0,3
0,4
Fonte: FGV/Ceri, 2015.
0,3 0,2
0,3
0,1
0,2 0,2 0,0
2006
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2009
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1998
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2001
2002
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2006
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CONJUNTURA GOVERNANÇA
regimento estabelece rodízio entre os mais sólido, fortalecendo a cultura lançado em outubro de 2015, a OCDE
diretores-gerais, o que faz o número das agências e o processo de condu- apontou que o tema está na pauta de
aumentar. Mas, se observada por me- ção das decisões. “Mas a deterioração trabalho de seus países membros des-
ses, é um período bem menor que o desses órgãos é sempre um processo de 2011. Segundo a OCDE, o período
da ANTT, com 42”, compara Joisa. possível, e levantamos os fatores que pós-crise financeira global, com restri-
Os pesquisadores envolvidos no favorecem esse processo: o contingen- ções fiscais e aumento do desemprego,
estudo buscaram identificar se o ex- ciamento, que compromete a capaci- imprimiu a necessidade de melhorias
cesso de interinidade se dava por dade de realizar tarefas; a falta de uma no marco regulatório da maior parte
alguma dificuldade do governo em remuneração digna das responsabili- dos países, para mitigar fatores de ris-
aprovar indicações feitas ao Senado, dades imputadas ao diretor; a indica- co e estimular a economia.
o que não se confirmou. “A grande ção política que enviesa a conduta; e Um dos destaques do documento é
maioria das indicações através de a ausência de um processo de seleção a necessidade de maior engajamento
mensagens enviadas pelo governo foi completo, com sabatina feita pelo Se- de todas as partes envolvidas – não
aprovada, então não se pode atribuir nado de forma efetiva, não protoco- somente reguladores e especialistas,
essa situação ao Senado. No nosso lar”, enumera Joisa. Ela reforça que mas empresas e cidadãos, em dife-
entendimento, é mais um mecanismo a seleção de uma diretoria colegiada rentes instâncias representativas. Se-
político que, aliás, já foi advertido com diretores de qualidade, de dife- gundo a OCDE, a crise econômica
pelo TCU”, diz Azumendi, referindo- rentes especialidades, é fundamental iniciada em 2008 minou a confiança
se a relatório que o Tribunal fez sobre para a complementação de competên- da população em seus governos, e um
governança das agências dos setores cias necessárias para o bom funcio- processo de maior transparência e
de infraestrutura, em 2012. namento de uma agência reguladora. abertura nas tomadas de decisão pas-
A diretora do Ceri lembra que toda “Não são cinco escolhas independen- sou a ser fundamental para garantir
ponderação está sujeita a críticas, mas tes, mas interdependentes”, diz. legitimidade nas decisões regulató-
ressalta que a análise das diretorias rias. Nesse sentido, o Outlook apon-
das agências ajuda a ressaltar como ta a ampliação de iniciativas envol-
esses fatores contribuiriam para um Mais participação vendo mídias sociais como LinkedIn,
adequado processo decisório. Joisa O tema de aprimoramento da atividade Facebook e Twitter, além de sites e
destaca que a consolidação de qua- das agências reguladoras não é desta- fóruns de discussão.
dros de servidores em cada agência que somente no Brasil. Na última edi- No estudo do Ceri, essa dimensão
vai tornando o processo de trabalho ção de seu Regulatory policy outlook, também é contemplada. Para estudá-
Índice do grau de profissionalização das diretorias das agências desde o início de sua atividade
0,6 0,6
0,5
0,5 0,5
0,4
0,4 0,4
0,3
0,3 0,3
0,2
Fonte: FGV/Ceri, 2015.
0,2 0,2
0,1 0,1 0,1
0,0 0,0 0,0
1997
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CONJUNTURA GOVERNANÇA
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PETRÓLEO
5 8 C o n j u n t u r a E c o n ô m i c a | J a n e i r o 2 016
CONJUNTURA PETRÓLEO
J a n e i r o 2 016 | C o n j u n t u r a E c o n ô m i c a 5 9
COMÉRCIO EXTERIOR
Formar cadeias
Ipea e Cepal lançarão este ano matriz insumo-produto
de dez países sul-americanos, com a qual se analisará o
potencial de complementaridade produtiva da região
A América do Sul está próxima de nal na América Latina e no Caribe é aponta que os oito países já estu-
ganhar uma nova ferramenta de es- menos da metade do observado en- dados seriam capazes de substituir
tudo para identificar possibilidades tre os países da União Europeia, por entre si até 20% das importações
de criação de cadeias de valor na re- exemplo. Quando se limita o âmbito contratadas de outras economias,
gião. É uma matriz insumo-produto de análise à América do Sul, esse in- diz Renato Baumann, diretor de Es-
que abrange dez países, 40 setores da tercâmbio é ainda mais tímido. tudos e Relações Econômicas e Polí-
economia, ordenada de forma com- Entre os resultados preliminares ticas Internacionais do Ipea, líder do
patível para integração com outra já da matriz feita por Ipea/Cepal estão projeto. “É uma conta feita de forma
desenvolvida pela OCDE. Até o final confirmações de realidades já conhe- agregada, ou seja, não entra no de-
de 2015, o projeto, coordenado pelo cidas, como a concentração do foco talhe da classificação dos produtos,
Ipea em parceria com a Cepal, já ha- comercial em bens primários. Mas em especificidades como a compo-
via concluído o cruzamento de dados o levantamento também traz pistas sição de um parafuso, fundamental
entre oito deles – Argentina, Brasil, positivas. Em linhas gerais, a matriz para setores como o aeroespacial”,
Bolívia, Chile, Colômbia, Peru, Uru-
guai e Venezuela –, restando conso-
lidar as informações de Paraguai e
Equador, o que se estima que acon- Baixo intercâmbio regional
tecerá até meados deste ano. Proporção do comércio intrarregional nos bens intermediários e finais,
Uma matriz de insumo-produto em regiões selecionadas
regional mostra como as economias
conversam. Indica como é a deman- Bens finais
Bens intermediários
da, o que se exporta, importa, o que
60 59
cada setor tem de fator adicionado,
quais segmentos são estratégicos por 45 44
gerar mais encadeamentos produ-
tivos. Comparativamente a outras 28
regiões do mundo, o que se sabe até 22
19
17
agora é que, abaixo dos Estados Uni-
dos, o intercâmbio no continente é
reduzido. Dados de 2011 publicados
no relatório Perspectivas econômicas Ásia UE27 Alca EUA + Canadá
da América Latina – 2016 da OCDE Fonte: OCDE, 2015, com dados de 2011.
apontam que o comércio intrarregio-
6 2 C o n j u n t u r a E c o n ô m i c a | J a n e i r o 2 016
CONJUNTURA COMÉRCIO EXTERIOR
pondera Baumann. “Mas já faz uma nificativos. “Vale observar que não
seleção importante de quais setores estamos identificando a parcela que
Uma das constatações
demonstram potencial de comple- países de fora da matriz têm no valor
mentação, e quais devemos descartar adicionado, apenas o intercâmbio
para um estudo mais aprofundado.”
do estudo é a baixa entre os oito – em breve dez – que
são nosso objetivo”, ressalta.
participação brasileira Baumann e Flôres afirmam que al-
Pouca participação brasileira guns dos segmentos que poderão ser
Outra constatação que também
no valor adicionado de confirmados como potencialmente
emerge da matriz é a baixa partici- interessantes para a formação de ca-
pação brasileira no valor adicionado
produtos fabricados deias são o de alimentos e o químico.
de produtos fabricados por seus par- “Entre as atividades que mais obser-
ceiros sul-americanos. “As evidên-
por seus parceiros vamos ligações para trás – ou seja,
cias que temos até agora indicam que que puxam outros setores – estão
esses países conversam conosco, mas
sul-americanos complexos alimentares como carne,
nós não conversamos com eles”, diz trigos e massas, açúcar e confeitaria;
Renato Flôres, diretor do FGV/NPII, o metalúrgico; o extrativo-energético;
responsável pela coordenação técni- e o químico de base, de produtos far-
co-metodológica do projeto. Flôres uma economia mais fechada, ou pri- macêuticos e de borracha e plástico”,
explica que o tamanho da economia vilegiarmos economias maiores. O diz Flôres. Ele destaca que, em parte
brasileira impulsiona os vizinhos a fato é que até hoje nosso esforço por dessas atividades já existe uma dinâ-
oferecer produtos que precisamos, gerar conexões foi menor”, diz. mica de troca que enseja a formação
mas a iniciativa de empresas bra- Flôres destaca que, mesmo com de clusters. No caso do setor de ali-
sileiras de oferecer produtos a par- uma maior iniciativa dos países sul- mentos e químico, entre Bolívia, Chi-
ceiros regionais é menor. “Podemos americanos em buscar integração le, Peru e Uruguai; e, no de energia,
imaginar várias razões, como sermos com o Brasil, o país registra, junta- entre Chile, Peru e Uruguai. “Como
mente com a Venezuela, os valores se pode observar, é uma conversa na
mais baixos de participação dos qual o Brasil fica de fora”, diz.
outros vizinhos em seu valor adicio- Com o trabalho de confecção da
nado. “Dos 40 setores estudados, o matriz concluído, Baumann afirma
Brasil só possui três setores em que que a próxima tarefa agendada é ir a
essa participação é igual ou superior campo para identificar quais proble-
a 3%, sendo metais não ferrosos mas afastam o Brasil de uma maior
(9,3% valor adicionado sul-ameri- conexão com seus pares regionais –
cano), e produtos químicos de base sejam eles burocráticos, de idioma,
(7,1%) os mais significativos”, afir- ou infraestrutura logística, por exem-
ma. Em contrapartida, o Uruguai plo. “O distanciamento brasileiro
desponta como um dos que registra preocupa cada vez mais, porque hoje
Participação dos países latino- maior participação de outros países não estamos falando só do potencial
americanos e do Caribe no valor no valor adicionado de seus produ- das economias sul-americanas em si,
adicionado do que se produz dentro tos, com coque de petróleo e outros mas de países envolvidos na Aliança
da região é menos da metade da energéticos (com 24,9% provenien- do Pacífico, em acordos bilaterais
observada entre as economias da tes de outros países) e automóveis, que abrem frentes no mercado asiáti-
União Europeia reboques e semirreboques (24,3%, co, por exemplo. Isso torna cada vez
boa parte devido ao acordo automo- mais importante impulsionar esfor-
tivo do Mercosul) sendo os mais sig- ços de ligação”, conclui.
J a n e i r o 2 016 | C o n j u n t u r a E c o n ô m i c a 6 3
COMÉRCIO EXTERIOR
O mega acordo comercial entre os com outros blocos. Com a TPP se-
Estados Unidos, Japão e outras dez guramente haverá forte pressão para
economias do Pacífico coloca o Brasil que haja flexibilização dessa regra e o
em estado de alerta. A aprovação da Brasil deve capitanear esse processo.
Trans-Pacific Partnership (TPP) repre- Outro aspecto negativo do gover-
senta um bloco econômico que reúne no brasileiro diz respeito à priorida-
40% do PIB mundial e 793 milhões de de dada às ações junto à Organiza-
consumidores. Esse pacto, o maior da ção Mundial do Comércio (OMC)
história, visa eliminar barreiras alfan- se queixando de concorrência des-
degárias entre seus membros e a ex- leal. O foco foi reclamar do prote-
pectativa é que em 2025 o movimento cionismo de nações, principalmente
anual de bens e serviços entre as 12 dos países asiáticos, cujo efeito foi
nações atinja US$ 223 bilhões. pífio sobre a atividade doméstica,
A aprovação da TPP deixa o Bra- em vez de investir em uma dinâmica
sil em situação extremamente des- comercial global que cresce de modo
confortável. O país terá que rever acelerado. Entre 2001 e 2014 as
sua política comercial, deixando de exportações mundiais passaram de
lado aspectos de natureza ideológi- US$ 6 trilhões para US$ 19 trilhões.
ca, que ao longo dos últimos anos É certo que o Brasil terá que redu-
comandaram as ações externas, e se zir seu ímpeto em torno de medidas
pautar por questões de ordem téc- antidumping com a criação da TPP.
nica e pragmática se a opção for a imposições da Argentina. O protecio- O peso das regras do acordo do Pa-
inserção do comércio internacional nismo argentino prevaleceu e o gover- cífico deve ir além dos termos que
como fator relevante para o desen- no brasileiro se comportou de modo servem de base às análises da OMC,
volvimento econômico. passivo frente a essa situação. Além cujas normas atuais devem ser rele-
O Brasil tem adotado uma postu- disso, o país não foi capaz de liderar gadas a segundo plano.
ra absolutamente ineficaz no sentido ações para livrar o bloco de uma de Um terceiro ponto a ser ressaltado
de expandir sua participação no co- suas maiores amarras que é a obri- trata-se da Área de Livre-Comércio
mércio mundial. Um aspecto nessa gatoriedade de negociar acordos de das Américas (Alca), que o país re-
direção foi ter optado em focar no livre-comércio em conjunto. Oportu- jeitou com base em argumentos que
Mercosul com todas as suas debilida- nidades são perdidas porque há proi- foram muito mal conduzidos. Vale
des e nele se sujeitar repetidamente às bição de pactos dos países membros destacar que o governo Fernando
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CONJUNTURA COMÉRCIO EXTERIOR
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