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AVALIAÇÃO DO EFEITO DA GERAÇÃO DOS GASES CO E CO 2 NA


TRANSFERÊNCIA METÁLICA POR CURTO-CIRCUITO NO PROCESSO DE
SOLDAGEM MIG/MAG

P.C. Caetano, V.A. Meneses, W.P. Martins, V.S. Leal, C.C.F. Nascimento
Departamento de Mecânica e Materiais – IFMA – Instituto Federal do Maranhão.
Campus Monte Castelo.
Av. Getúlio Vargas, nº. 04. Monte Castelo. CEP:65030-005. São Luís/MA.
paulocaetano.pc@gmail.com

RESUMO: Diversos trabalhos têm mostrado a influência de parâmetros e gases de


proteção sobre a geração de fumos em soldagem MIG/MAG, mas pouco tem sido
mostrado sobre a emissão de gases tóxicos e asfixiantes. Este trabalho tem como
objetivo avaliar o efeito da composição do gás de proteção sobre os níveis de
emissão de gases em soldagem MIG/MAG, utilizando CO2 puro e misturas de
Argônio com CO2, mantendo uma mesma corrente média. Verificou-se que os
valores de geração de CO2 nos dados aquisitados em ensaios com gás de proteção
100%CO2 variaram com desvios acima dos limites permissíveis da NR-15 e OSHA.
Já os desvios dos dados referentes a geração de CO2 durante ensaios com
Ar+25%CO2 não ultrapassaram esses limites. Para a geração de CO, testes com
tensão de 19V não ultrapassaram os limites da NR-15 e OSHA, para ambos os
gases de proteção, com exceção nas tensões de 21V e 23V.

Palavras-chave: monóxido de carbono, dióxido de carbono, tensão, gases de


proteção, curto-circuito.
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1. INTRODUÇÃO

(1)
Segundo Wainer, Brandi e Melo , os processos de soldagem à gás (Gas
Metal Arc Welding) utilizam de diferentes misturas de gases de proteção a fim de
conferir características distintas ao arco elétrico, modo de transferência metálica e
aos cordões de solda, no que se diz respeito a geometria, penetração, diluição e
porosidades. Ainda, segundo os autores, pode-se obter diferentes características
geométricas nos cordões de solda a partir das diferentes concentrações de gases
inertes e ativos.
Antonini et al. (2), relataram que certos gases podem ser formados durante os
processos de soldagem e podem afetar a saúde respiratória de soldadores. Os
gases de proteção usados durante o processo MIG/MAG podem aumentar a
radiação ultravioleta produzida no arco, levando à formação fotoquímica de gases
potencialmente prejudiciais, tais como óxidos de nitrogênio e ozônio (O3). Ainda de
acordo com os autores, o dióxido de carbono (CO2) pode ser reduzido e convertido
em monóxido de carbono (CO), um gás altamente tóxico. Além disso, a oxidação de
vapores a partir de agentes desengordurantes que às vezes são utilizados para
limpeza de metais de base na soldagem, podem produzir gases altamente tóxicos
(por exemplo, o fosgênio).
(3)
De acordo com Marques, Modenesi e Bracarense , os vapores de zinco na
soldagem, geram dor de cabeça intensa e febre e os vapores de cádmio são fatais.
Ainda segundo os autores, com relação aos gases de proteção como misturas de
Argônio e CO2, ou CO2 puro, quando utilizados em espaços confinados, geram
deslocamento do ar, por serem mais pesados, o que gera asfixia e morte, sendo
importante a circulação de ar durante os processos de soldagem, apartir do uso de
exaustores e ventiladores e também o uso de máscaras de proteção representa um
fator de grande importância para os soldadores.
(4)
Segundo Meneses, Leal e Scotti , o uso de misturas com CO2 e CO2 puro
como gases de proteção emitem significante quantidade de CO 2 e CO, capazes de
gerar asfixia e intoxicação, respectivamente. Ainda de acordo com os autores, a
geração desses gases não tem dependência direta com a estabilidade do arco e
comprimento de arco, na mesma proporção em que a geração de fumos é sensível a
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esses fatores, sendo maior a geração de CO2 e CO de acordo com o aumento do


percentual de CO2 na mistura utilizada como gás de proteção.
(5)
De acordo com a Legislação Brasileira , a norma regulamentadora NR-15
(Atividades e Operações Insalubres) define que os elementos Dióxido e Monóxido
de Carbono são caracterizados como agentes químicos insalubres, tendo limite de
tolerância para 48 horas semanais de exposição em uma faixa de 3900 ppm para
CO2 e 39 ppm para o monóxido de carbono. Já de acordo com a norma americana
(6)
OSHA , que define os limites permissíveis de exposição (PELs) para
contaminantes no ar, através da tabela 1910.1000 TABLE Z-1, para uma média
ponderada de tempo de exposição de 8 horas, os limites de exposição para CO 2 são
5000 ppm e para CO são 50ppm.

2. MATERIAIS E MÉTODOS

2.1. MATERIAIS

Para realização dos ensaios de medição dos gases gerados durante o


processo de soldagem, foram realizadas soldas sobre chapa, na posição de topo,
utilizando como material de base barras chatas de aço carbono com dimensões de
200mm x 50mm x 6mm (comprimento x largura x espessura) como mostra a Figura
01. Como gás de proteção, foi utilizado 100%CO2 e a mistura Ar+25%CO2, em
experimentos distintos. O processo de soldagem foi mecanizado a fim de garantir
maior repetibilidade e estabilidade dos parâmetros de soldagem.
As características do consumível (AWS/ASME SFA 5.18 ER70S-6, diâmetro
1,2mm) são apresentadas na Tabela 01. O arame sólido cobreado manganês-silício
ER70S-6, é destina a soldagem MIG/MAG dos aços não ligados, utilizando como
gases de proteção as misturas Ar + 20-25% CO2 ou CO2 puro.
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Figura 01 – (a) Limpeza pré-soldagem. (b) Nivelamento afim de garantir DBCP


(Distância Bico de Contato-Peça) fixa, variando apenas nas mudanças de faixa de
tensão. (c) Tocha em ângulo de 90 graus. (d) Solda realizada na posição sobre
chapa.

Tabela 01 – Composição química (% em peso) e propriedades mecânicas do arame


ER70S-6. (7)

Composição C Si Mn Al P S
ER70S-6 0,08 0,9 1,5 - - -
Propriedades LE LR
Alongamento
Mecânica (Ar (MPa) (MPa)
+ 20%CO2) 470 560 26%

2.2. EQUIPAMENTOS

Foi utilizada uma fonte de soldagem multiprocessos modelo IMC Inversal 600 e
ângulo de soldagem da tocha de 90º. Especificações técnicas: Corrente nominal:
320A; Corrente máxima: 600A; Corrente a 100%Fc: 320A/30V; Potência nominal:
13KVA.
Para o corte das amostras a serem soldadas foi utilizada uma serra de fita
marca S. Ramos, modelo 260; para a medição dos gases CO2 e CO em ppm, foi
utilizado equipamento portátil Delta Ohm HD21AB17. Na figura 02, temos os
equipamentos utilizados para corte e soldagem das amostras. Na figura 03, temos o
equipamento utilizado para aquisição da concentração de gases em ppm.
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Figura 02 – (a) Processo de corte dos corpos de prova de soldagem. (b) Máquina
multiprocessos utilizada durante o processo de soldagem. (c) Interface Homem-
máquina da IMC Inversal 600.

Figura 03 – Delta Ohm HD21AB17. Equipamento utilizado para aquisição da


quantidade de gases CO2 e CO em ppm. (8)

2.3. MÉTODOS

As soldagens foram realizadas na posição de topo, em ensaios de simples


deposição sobre chapa, sentido puxando e modo de transferência por curto-circuito.
A fonte de soldagem foi operada no modo “tensão constante” e ângulo de soldagem
da tocha de 90º. A fim de se obter a relação entre a tensão de soldagem e a geração
dos gases CO2 e CO, os demais parâmetros de soldagem, como velocidade de
soldagem (mm/min), velocidade de alimentação (m/min), vazão de gás (l/min), foram
trabalhados de forma constante, a fim de avaliar a influência da composição dos
gases de proteção, com a corrente de soldagem fixa dentro de uma estreita faixa de
150±5A. A DBCP (distância bico de contato-peça) manteve-se fixa, variando apenas
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nas mudanças de faixa de tensão a fim de se manter a corrente de soldagem na


faixa de 150±5A, já que essas tem relação inversamente proporcional.
Para o cronograma de ensaios, foi estipulada a realização de soldas nas
tensões de 19V, 21V e 23V, com a corrente variando em 150±5A, parâmetros dentro
da recomendação do fabricante do arame. A vazão de gás foi definida como 12l/min,
sendo a vazão recomendada para um arame de 1,2 mm de diâmetro (9).
Afim de obter maior acuracidade nos ensaios de medição dos gases, foram
realizados 3 experimentos de medições dos gases durante o processo de soldagem
para cada tensão trabalhada. Foi utilizado como gás de proteção 100%CO2 e a
mistura Ar+25%CO2, totalizando em 18 ensaios de medições de gases. Na tabela
02, temos a relação dos parâmetros de soldagem de acordo com o tipo de gás de
proteção para cada experimento. Na figura 04, temos o arranjo utilizado durante o
processo de aquisição dos dados de gases gerados em ppm. A sonda responsável
pela capitação dos gases CO2 e CO liberados durante o processo foi posicionada a
300mm acima da região do arco elétrico, a fim de simular a região de respiração do
soldador (4).

Tabela 02 – Parâmetros de soldagem de acordo com o tipo de gás de proteção.


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Figura 04 – (a) Arranjo utilizado para aquisição dos dados de concentração de


gases. (b) Layout de posicionamento dos equipamentos. A área foi isolada com 3
biombos de solda. (c) Sonda posicionado a 300mm acima da peça soldada.

Para o processo de medição dos gases gerados, foi realizado monitoramento


em 3 intervalos: 1 - um minuto sem arco elétrico aberto (com apenas vazão de gás);
2 - durante o processo de soldagem com a abertura do arco elétrico, durante um
período médio de 1 minuto; 3 - após o processo de soldagem durante um período de
3 minutos, equivalente ao tempo em que os gases se dissiparam do ambiente. Foi
realizada aquisição dos dados em intervalos de 5 segundos.
Para as análises gráficas e estatísticas dos dados de gases gerados, foi
realizada a média aritmética dos dados aquisitados com a mesma tensão de
soldagem, já que para cada ensaio foram realizadas réplica e tréplica, sendo
realizada essa metodologia para os gases de proteção 100%CO2 e Ar+25%CO2. Na
figura 05, temos as soldas realizadas com gás de proteção 100%CO 2. Na figura 06,
temos os ensaios realizados com o gás de proteção Ar+25%CO2.

Figura 5 - Cordões de solda resultantes da soldagem com gás de proteção


100%CO2.
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Figura 06 - Cordões de solda resultantes da soldagem com gás de proteção


Ar+25%CO2.

3. RESULTADOS E DISCUSSÕES

A partir dos dados de geração de CO2 e CO aquisitados nos experimentos com


tensão de 19V, 21V e 23V, usando gases de proteção 100%CO2 e Ar+25%CO2,
observou-se um aumento na geração dos gases CO2 e CO à medida que a tensão
aumentou, mantendo os parâmetros de velocidade de soldagem (mm/min),
velocidade de alimentação (m/min), vazão de gás (l/min) constantes e a DBCP (mm)
também constante, variando apenas nas mudanças de faixa de tensão afim de se
manter a corrente de soldagem na faixa de 150±5A. Na figura 07, temos boxplot
referente aos percentuais de CO2 e CO gerados durante os processos de soldagem
com gás de proteção 100%CO2 e Ar+25%CO2.

Figura 07 - Boxplot dos dados de geração de CO2 e CO durante soldagem com


gases de proteção 100%CO2 e Ar+25%CO2.
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Na figura 08, temos o comportamento da geração de CO2 e CO com o uso de


100%CO2 como gás de proteção, durante 1 minuto de arco fechado,
aproximadamente 1 minuto de arco aberto e 3 minutos de pós-soldagem (tempo em
que os gases se dissiparam). Na figura 09, temos o comportamento da geração de
CO2 e CO com o uso de Ar+25%CO2 como gás de proteção, durante 1 minuto de
arco fechado, aproximadamente 1 minuto de arco aberto e 3 minutos de pós-
soldagem.

Figura 08 - Geração de CO2 e CO durante processo sem arco, com arco e pós-
soldagem com gás de proteção 100%CO2.

Figura 09 - Geração de CO2 e CO durante processo sem arco, com arco e pós-
soldagem com gás de proteção Ar+25%CO2.

Para a análise estatística dos dados aquisitados, foi utilizado o método de


análise de variância (ANOVA) e teste de Tukey, afim de identificar se existiu
(10)
variação significativa entre os dados . Para isso, foram comparados os dados de
geração de CO2 e CO, em dois grupos: um referente aos testes com gás de
proteção 100%CO2 e outro referente aos testes com gás de proteção Ar+25%CO 2.
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Para a realização desta análise, foi utilizado o software OriginLab. Na figura 10,
temos a tabela da ANOVA juntamente com o teste de Tukey, para os dados de
geração de CO2 e CO, respectivamente, na solda com gás de proteção 100%CO2.
Na figura 11, temos ANOVA e teste de Tukey para os gases CO2 e CO,
respectivamente, para soldagem com Ar+25%CO2.

Figura 10 - (a) ANOVA e teste de Tukey para geração de CO2 com uso de gás de
proteção 100%CO2. (b) ANOVA e teste de Tukey para geração de CO com uso de
gás de proteção 100%CO2.

Figura 11 - (a) ANOVA e teste de Tukey para geração de CO2 com uso de gás de
proteção Ar+25%CO2. (b) ANOVA e teste de Tukey para geração de CO com uso de
gás de proteção Ar+25%CO2.
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4. CONCLUSÃO

Foi observado que para os valores de geração de CO 2, os dados aquisitados


durante os ensaios realizados com gás de proteção 100%CO2 variaram com desvios
acima dos limites estipulados pela NR-15 (3900ppm) e pelos limites permissíveis de
exposição da OSHA (5000 ppm). Já os desvios dos dados referentes a geração de
CO2 durante os ensaios com gás de proteção Ar+25%CO2 não ultrapassaram os
limites estipulados pela NR-15 e os limites permissíveis de exposição da OSHA. No
que diz respeito a geração de CO, os testes com tensão de 19V não ultrapassaram
os limites estipulados pela NR-15 (39ppm) e OSHA (50ppm), para ambos os gases
de proteção, ultrapassando apenas nos testes com tensões de 21V e 23V.
Em relação a análise estatística (ANOVA), foi observada diferença significativa
na geração de CO2 e CO em função do aumento da tensão de soldagem, com o uso
dos gases de proteção 100%CO2 e Ar+25%CO2. Através do teste de Tukey, foi
identificado que a diferença na geração de CO2 e CO se mostrou significativa entre
as tensões de 19V e 23V, não havendo diferença significativa entre as tensões de
19V-21V e 21V-23V.

REFERÊNCIAS

(1) E. Wainer, S. D. Brandi, F.D.H. Melo. Soldagem, Processos e Metalurgia.


Editora Edgard Blucher, Brazil, 2004.
(2) ANTONINI, J. M.; SANTAMARIA, A. B.; JENKINS, N. T.; ALBINI, E.; LUCCHINI,
R. Fate of manganese associated with the inhalation of welding: Potential
neurological effects. Neurotoxicology, Little Rock, v. 27, n. 3, p. 304-310, May
2006.
(3) Marques, P.V., Modenesi, P.J.; Bracarense, A.Q. Soldagem, Fundamentos e
Tecnologia.Editora UFMG, Brazil, 2011.
(4) Meneses, V.A.; Leal, V.S.; Scotti, A. Influence of Metal Transfer Stability and
Shielding Gas Composition on CO and CO2 Emissions during Short-Circuiting
MIG/MAG Welding. Soldagem e Inspeção, Brazil, 2016.
(5) NR, Norma Regulamentadora Ministério do Trabalho e Emprego. NR-15 -
Atividades e Operações Insalubres. Brazil, 2009.
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(6) OSHA, Occupational Safety and Health Standards. Limits for Air Contaminants
– Table Z-1.USA, 2017.
(7) Catálogo de Consumíveis ESAB. Disponível em:
<https://www.esab.com.br/br/pt/support/documentation/upload/catalogo-consumiveis-
esab.pdf> Acesso em ago. 2018.
(8) Delta Ohm Air Quality. Disponível em:< http://www.deltaohm.com/ver2012/>
Acesso em ago. 2018.
(9) AWS. Welding Handbook: Welding Science & Technology. American Welding
Society, Vol.2, USA, 1991.
(10) Montgomery, D. C. Design and Analysis of Experiments. John Wiley & Sons.
Inc, 5th ed, USA, 2001.

EVALUATION OF THE EFFECT OF CO AND CO2 GASES GENERATION IN


SHORT-CIRCUIT TRANSFER OF MIG/MAG WELDING PROCESS

ABSTRACT
Several works have shown the influence of parameters and shielding gas on the
generation of fumes in MIG/MAG welding, but few has been shown on the emission
of toxic and asphyxiating gases. This work aims to evaluate the effect of the
composition of shielding gas on the emission levels of MIG/MAG welding using pure
CO2 and argon-CO2 mixtures, maintaining the same average current. It was found
that the CO2 generation data values acquired in tests with 100%CO2 shielding gas
varied with deviations above the allowable limits of NR-15 and OSHA (PELs).
However, the deviations of the CO2 generation data during tests with Ar+25%CO2 did
not exceed these limits. For CO generation, tests with 19V voltage did not exceed the
limits of NR-15 and OSHA, for both shielding gases, except for the voltages of 21V
and 23V.

Keywords: carbon monoxide, carbon dioxide, voltage, shielding gases, short circuit.

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