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o fragmento da imagem
gabriel martinho
espelho
o fragmento da imagem
O óbvio é genial;
ser genial não é ser óbvio.
03
Quando me entojo
no espelho das águas,
sou mar devastador
em priori perfeição,
sou espalhado
para o outro se ver
à minha interpretação,
pois sou espelho destilado.
10/08/2007
Escorre indecente,
distraída...
como sem começo,
evapora.
Um espectador mudo,
aceito de graça
a judiação imatura
dessa criança,
que passeia sozinha pela noite
e sequer me sacia.
12/09/2006
17/09/2006
08
Quero dissolver no ar,
poluir o incerto,
experimentar ozônio,
vagar pelos hemisférios,
encontrar o nada esperto,
seco, a me esperar.
05/03/2007 AVESSO
Seja eu o homem
seja ela também
seja ela o homem da história
seja a história invertida
seja eu uma coisa ou outra.
Serás, de partida,
o avesso da vida.
06/01/2007
10
Oh, Anfitrião Sublime,
Após esse enxame de insetos
decerto não quererás voltar
para contar
esta história da besta
ou de eclipse lunar.
Não mais guiarás as ovelhas
e teu pasto será divdido,
como foi e será;
mas não haverá guerra pelo senhor,
não haverá mente de doutor,
dr. Sabe-Tudo que rege mandamentos
em troca de sofrimentos de milênios.
Onde estás, oh Luz?
Na caverna de Osama
ou eternamente na cruz?
Como uma praga,
estás em toda parte
e, por isso, os insetos
e, por isso, desafeto.
Meu coração é grande,
mas não te faz caber.
Nos deixe em paz,
lembre-te que já foi
e agora jaz.
08/10/2007
11
DUELO
Licença poética
se faz sem pedir licença,
entre o gramático e o poeta
que o melhor vença.
29/01/2007
em San Marcos, Califórnia
12/07/2006
12
Sou um porra de um mentiroso,
pois falo de mil coisas,
digo-as como verdade invariável...
digo que sou e por isso já minto;
foda-se que isso admito,
continuo a ser um babaca,
talvez idiota,
por me preocupar à toa com minha falácia.
Peço que cortem meus dedos,
fritem com minhas guelas
e nomeiem o prato de "abobrinhas sedentas".
Ainda assim, continuarei a pensar
em como morrer sem ser execrado
pela falta de utilidade indizível
e limitação apreciável.
06/02/2007
em Nova Orleans
13
A angústia é uma sensação indigna
que, por latejar inquieta,
acaba por entorpecer
emagrecer
e enrijecer.
De nada adianta arredondar vozes
em dó maior ou lá menor,
se a cabeça já não mais aguenta
o sino desafinar
e chorar gorjeta.
É tanta besteira
que o mal-estar almeja,
que levanto da sarjeta
e assobio à renovação:
a canção da sinceridade.
29/08/2007
14
Olá, meu nome é covarde.
Espero que tudo se vá
para enfim lamentar
e mais tarde contigo sonhar,
destemido de prazer.
Tudo se foi,
ou não foi,
mas passou,
passou tarde,
enganou todavia...
na verdade,
meu nome não varia.
25/09/2006
15
PARTO NO CÉU
Te vi nascer
te vejo
Te peço
te esconda
Te seco
te esqueço
Te durmo
te amanheço
30/12/2006
em São Pedro da Aldeia
(observando um belo nascer do sol)
16
DOCE MANHÃ
Venha, doce manhã,
me acorde pelos olhos
e puxe-me pelos pés.
És doce, sei que és,
pois tens gosto refinado de sobremesa
temperada pelo orvalho amargo,
no forro que traz ao estômago com seu afago.
És doce ao amanhecer,
pois vens da madrugada serena,
carinhosa por demais -
diz-se na roça, assim que o galo cante -
e logo te tornas arrogante.
Como toda autoritária,
sacrifica a vida de quem a contraria -
teus súditos trabalham o dia inteiro,
enquanto permaneces acordada.
Tens sono e te fraquejas ao adormecer...
É festa grega à luz da vigia de prata,
charmosa, que ousa engordar para enfeitiçar
toda a tropa de guerreiros.
Boêmios cumprem religiosamente
seu dever de aparição ao bar,
ou a um lugar que possam namorar o céu
e pedir à cadente que a noite volte
para sempre...
mais doce que a manhã.
06/02/2007
em Nova Orleans
17
...o velho cachimbo
grudado nos lábios do senhor,
um antigo contador de história.
Espia o desenho livre da fumaça
extraída do velho oco de madeira,
compete com um incenso
corroído pela metade,
repousado no canto da janela
para espantar os mosquitos.
insetos voadores aniquilados
sobrevivem por pouco tempo.
Dedos amolecidos,
unhas falecidas...
eis que coça sua barba branca,
lento, arrasta alguns passos,
uma baforada opaca,
e calmo estaciona assentado,
perante ao paisagístico Nada.
O Nada monocromático que o emociona,
faz-se, pois, necessário olhá-lo sem pudor,
romântico, descrente de um tempo iminente,
prestes a mudar de cor
e de semântica...
esfria com seu balanço firme,
estica as mangas de seu casaco,
apoia seu braço na cadeira,
morno, com sono,
dorme...
13/09/2006
18
Se é por castigo,
me intrigo ao respirar pelas ventas,
indeciso de tanto mastigar.
Mastigo sim,
mastigo o vento,
que sobe e borbulha,
borbulha em bolhas de ar,
e ainda assim eu tento,
mas não cabe,
eu não consigo exprimir
o meu vazio.
Crio, então, idéias,
idéias tias, primas, sobrinhas,
parentes de meu penar;
o sangue quente,
ainda em bolhas de ar,
fermenta o que é doce.
Antes fosse
esse
o gosto da saudade.
23/12/2006
19
POEMA PRIMÁRIO
o mato está seco
o vento está frio
o sol está fraco
a lua está sumindo
o céu está o mesmo
o rio está correndo
o mar está calmo
o som está sem assobio
a natureza está má...
RELATO DO POETA o tempo está sadio.
DESESPERADO
29/01/2007
em San Marcos, Califórnia
Socorro,
perdi minha pena,
perdi minha tinta,
como quem nega
e navega sem vela.
Socorro,
sem ela,
minha poesia,
eu morro.
13/07/2006
imagem de Carla Dutra
20
O palhaço não pode sorrir,
tem de gargalhar,
mesmo rouco
no inverno de moscou,
onde o frio jamais hesitou
em zombar.
12/07/2006
ADULTÉRIO
31/07/2006
21
SANIDADE INÚTIL
O velho gemeu.
Gemeu porque era velho, senão gritava,
pudera, pura visão de insanos.
27/10/2005
com João Maia
imagem de Renan Barbosa
22
AULA DO POETA
Saberei;
aí, sim,
serei.
15/07/2007
em São Pedro da Aldeia
24
Quando eu fico doido,
tento desmembrar o que é por ser,
tento explicar o agora esquecido.
Basta um trago
para que o vago
seja outorgado.
28/10/2006
26
O tempo todo,
eis que me deparo
na fronteira intrínseca
entre ser e viver.
Quando reparo, pois,
o tempo
passou os dois.
25/02/2007
Se catarse esgarçasse,
arrebentaria
por falta de espaço no exagero,
ao acaso.
11/12/2006
27
Ouço mais um clarear do meu Rio,
o riacho inteiro que não é meu
só porque nele habito.
Madrugada essa orvalhosa de frio
sendo que na passada
fora fervorosa de janeiro.
Até os grilos se agitam a cantar,
significa que as idéias estão no ar
cheirando a chuva que veio da dança
sonsa e mansa.
Discreto, na janela,
o El Niño está a passar
longe de pasárgada,
em minha terra,
onde sonho o gorjear.
24/07/2007
28
DAMA DA NOITE
Hoje é dia,
na Lapa já é noite.
À luz do luar,
o murmúrio dos cantos,
nos cantos escuros,
encantai-vos, eufóricos,
queridos boêmios.
No tocar das palmas,
tristes melindrosas
sambais o novo milênio;
gostosas de carne e osso.
Aos que viveis em esboço,
dentro de sacos, aconchegante leito,
protegidos pelos arcos,
fugis ao nosso respeito.
Sobrevivei-vos!
Charmosa de encantar,
abusais do sereno,
deturpando o clima ameno de faces esquisitas,
alimentando o cerne de pestes parasitas,
e aconchegais no gorjear.
Hoje foi dia
e a Lapa adormeceu.
17/05/2006
29
Enfim começo
pois-então
como meço o fim?
25/10/2006
30
SALVE, SALVE!
Olhos ignorantes,
estúpidos ouvidos,
cérebros viciados
- eis a famosa teoria da conspiração,
que rima com bobo.
Claro que não...
é porque, realmente, tem de ser assim,
simpático e sorridente.
Uma discussão sem mérito,
uma alienação indiscreta,
um ciclo que tende ao infinito.
01/09/2006
31
O ignorante é feliz,
por isso finjo que sou sabido
e escrevo poesia
na foz do rio
sobre a atriz do mundo.
Na passarela em córrego,
a belíssima Hipocrisia.
29/01/2007
em San Marcos, Califórnia
Quero-quero!
Quero-quero!
Ouço sempre seu pio.
É claro,
é vero,
jamais conseguirei dormir!
Canto o encanto,
que conto
esta sonata de encontro:
quero-quero -
dissonante foi o jato -;
parou de piar
antes do meio-dia.
06/02/2007
em Nova Orleans
27/02/2007
Conquistar um amor
para depois deixá-lo
é o mesmo que me dizes
quando me calo
a pensar que sem encanto dói...
25/02/2007
33
O gato em silêncio
pensa na distância
entre a eloqüencia
e a essência.
O gato mia,
mas não pensa,
degusta com sede
o que te resta
no instante da noite:
o reflexo na poça.
Julho/2007
34
GORDA ELEGANTE
17/09/2006
Te quero, noite
Te dia, quero
Quero-te tarde.
24/07/2007
35
PAIXÃO NOBRE
Vulnerável,
a beleza exotérica de seus cachos
entorpece o coração excêntrico do senhor.
Senhor amável,
desfruta de seu poder idolatrado,
castiga um fugido qualquer,
porém carece de força
quando a morena surge.
Morena saudável,
desfruta de seu poder castigável,
conquista um qualquer,
que foge com medo de ser enfeitiçado.
Como o nobre é arrogante...
antes mesmo que mande que plante,
colhe sozinho o veneno adocicado.
Diz o tratado:
"com a mulata
de olhos castos
o senhor há de casar."
E jura que há de fazê-la enroscar,
ao cheiro de suor destilado,
no fino pano,
já rasgando,
antes mesmo desse dia raiar.
22/04/2006
em Tiradentes
36
Quero nascer
num pôr-do-sol em preto e branco,
e escolher uma cor.
02/01/2007
em São Pedro da Aldeia
37
VULGO AMOR
Se já amei?
Não me pergunte, por favor.
29/01/2007
em San Marcos, Califórnia
38
VINGANÇA LASCADA
No caminho da pedra,
tinha uma senhora, sem mira, que caíra.
Foi a pique em plena praça;
publica sua afeição fervorosa
e agora caça,
sem medo algum da raça da rocha atrevida.
24/04/2006
40
Domingo,
no momento em que a noite chega,
sinto costurar um vazio no peito,
uma estampa leviana que dói
de um jeito agressivo,
impulsivo ao meu tempo,
forçando a naturalidade cotidiana.
Não sou o único a senti-la
e compartilhá-la não diminui minha aflição,
pois dor em bifurcação se multiplica.
Domingo,
a noite vem para complicar
o controle de suas ações,
vem para alfinetar o bordado
e misturar o trio perfeito:
vazio, solidão e medo.
11/09/2006
41
SUICÍDIO
12/07/2006
DOR DE DOMINGO
Boa noite...
Péssima noite!
Domingo à noite
eu desejo a morte de todas as manhãs.
15/05/2006
42
Adormeço quando provo do veneno
e adoeço por esquecer de injetar
uma dose dupla de antígeno;
enveredo à podridão de meu sangue,
incapacitado de me curar.
Não há vírus que navegue
por este congelado,
exposto pela traição de um tecido virgem
que deixou-se abrir,
na escuridão, desprevenido.
O médico pergunta:
- como se sente?
Apenas vomito nele um dente.
31/08/2006
43
A alma calma e lenta
acalanta meus pêsames
ante aos olhos que ignoro
o que vêem;
é a morte, pois bem,
que vem sem soro
para curar ou inverter.
27/04/2007
44
As formigas são umas mortas de fome,
mendigas nômades a devastar restos,
de barro à doce ou catarro,
visto que tudo se come,
ora por vontade, ora por costume.
Sedentas imperativas
trabalham em silêncio na fila,
numa trilha com início, meio e fim.
03/03/2007
45
ATEU
10/08/2006
46
A lua se cansou de invadir,
de tanto persuadir a janela
a deixá-la entrar.
Deve ter ido visitar outro jardim,
ou foi dormir,
longe da esfera, à beira-mar.
Pediu licença à noite,
e a noite se esbaldou
no embalo profundo das estrelas
ao norte do sol.
Estrela-mãe do sangue quente,
inceideia os astros que dela se aproximam,
jorrando-se ao toque visceral das plantas,
outras eternas - as flores;
num plano inverso de água em chuva.
Ainda assim, sol,
antes assim, lua,
sempre assim, escravos.
04/05/2007
47
O POETA E A PROSA
O poeta rosa
envergonha-se ao despir-se à prosa,
embora sinta a pureza no volume das palavras
extensas a purezas sinestésicas.
Em sua mais perfeita essência,
estas femininas assexuadas se entrelaçam
e se integram a teus dedos vivos,
eu diria rosas,
exaustos pelo prazer.
Escravidão eterna
do simples escrivão,
o poeta ensina
proeza em prosa.
02/01/2007
em São Pedro da Aldeia
48
Preguiça que enguiça a noite,
fatalmente,
apunhala-me com uma foice.
Assobio vadio,
à luz da noite vibrante,
ao luar escoltado pelo sereno,
ao canto da viola renitente.
Salgada em minha boca,
a brisa resseca o que acompanha a preguiça,
e o que me faz imperativo
me insiste em existir.
30/12/2006
em São Pedro da Aldeia
49
Quando a cabeça está vazia,
é difícil pensar;
ela pensa sozinha.
Abril/2007
em Cabo Frio
imagem de
Renan Barbosa
CLICHÊ
Agradeço à minha idéia,
escultura,
às margens plácidas!
Metade da hora
é mais do que o suficiente.
Quando a gente mente,
confunde a mente doente,
dormida
e dormente.
Lá vem o rei Salomão, sentar-se ao trono,
com uma cocada à mão,
mandando em todos em torno.
Liga o forno e induz os irmãos:
Oh, irmãos!
Tudo extremamente calculado.
Aqui dentro do calabouço,
calado,
penso no que ouço. Até mais tarde
Escrevo mastigado, não vai ter nada de diferente,
instigado, ente de novo não!
fingindo ser bom moço. Nem ão; aguarde...
o melhor vem do covarde,
sua arte arde.
O melhor é assumir,
fazer o quê?
Melhor do que fugir.
Estático, como um faquir,
degusto um saquê.
Melancolia...
o clichê é você.
03/05/2005
51
FUSO
O fuso é outro
dinheiro é ouro
vá ao Texas
enlace o touro
e volte rico
da terra de Malboro.
29/01/2007
em San Marcos, Califórnia.
26/12/2006
53
De que maneira o navio chega ao porto,
se não pelo cais das docas?
De que maneira eu escrevo certo,
se não pelo que ouço sair de bocas?
De onde vem a graça,
se o riso não se paga?
29/01/2007
em San Marcos, Califórnia
30/05/2004
LÍQUIDO AMNÉSICO
Enfim,
dessa água não mais beberei,
no fim do copo
já não me lembro mais...
onde parei?
11/09/2006
56
ENCANTO NA FOLIA
11/02/2007
16/03/2007
57
NOITE EM NOVA ORLEANS
Venham todos!
Venham conhecer e se apaixonar,
venham servir de voodoos,
venham reconstruir...
chez moi, un petit chateau,
avec du jazz.
Tout les jours, ce soir,
pardon, tout le monde,
mais je suis en retard.
06/01/2007
em Nova Orleans
58
imagem de Paula Santa Rosa
Saudade,
não se esqueça
que tenho uma faca
e um coração de verdade.
Tens o direito de calar-te
enquanto escrevo;
atrevo-me a cavalgar
num estalo de sorte.
Um beijo, meu amor,
até a morte!
29/08/2007
sincero obrigado.
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