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Curso de Eletrodinâmica Clássica I. 2005.

1 Departamento de Fı́sica - UFPE 1

Aula 01 - 15/03/2005.

Eletrostática no Vácuo (1)

Ref: Jackson §1.1-1.6

Objetivo:

• Estudar os conceitos de Força de Coulomb, Campo Elétrico, Lei de Gauss e


Potencial Eletrostático.

Conceito de Eletrostática

Estudo dos fenômenos envolvendo distribuições de cargas elétricas e de campos elétricos,


cujos valores e posições são independentes do tempo em relação e um referencial inercial,
observados em escala macroscópica.

Escala macroscópica: o tamanho das cargas é muito menor que a escala espacial dos
fenômenos observados (tamanho caracterı́stico onde as variações das grandezas medidas
são relevantes). Ou seja, as cargas são tomadas como pontos e o valor dos campos estão
associados a um ponto do espaço.

Força de Coulomb: Força sobre a carga q1 provocada pela carga q2 .

F~1,2 ~x1 − ~x2


F~1,2 = κq1 q2 (1)
q1 |~x1 − ~x2 |3
b

~x 1 − ~x 2 • κ: Constante de proporcionali-
dade. Depende do sistema de
q2
b ~x1 unidades.
~x2 • Inversamente proporcional ao
quadrado da distância.
c
b
0 • Diretamente proporcional ao pro-
duto das cargas.
Observações experimentais:

• A força é atrativa entre cargas opostas e repulsiva entre cargas de mesmo sinal.
• Princı́pio da Superposição: a força produzida por uma conjunto de cargas é a resul-
tante da soma vetorial das forças produzidas por cada carga isoladamente.
• Validade: para cargas no vácuo ou em meios com susceptibilidade dielétrica de-
sprezı́vel.
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Campo Elétrico: Campo vetorial cujo módulo é igual ao módulo da fôrça eletrostática
sobre uma carga de prova q0 > 0 dividido pelo valor da carga q0 , e cuja direção é igual à
direção da força eletrostática.
~ x)
E(~
q0 ~ x) = 1 F~0,1 = κq1 ~x − ~x1
E(~ (2)
b q0 |~x − ~x1 |3
~x 1
~x −
q1 • κ: mesma constante de propor-
b ~x cionalidade.
~x1 • Inversamente proporcional ao
quadrado da distância.
bc
0 • Diretamente proporcional ao
valor da carga.
Obs:
• Experimentalmente o campo é medido no limite de cargas de prova q0 cada vez
menores (q0 → 0).

• Graficamente o campo elétrico é representado por linhas de força que são localmente
perpendiculares às linhas equipotenciais.
Princı́pio de Superposição para o Campo Elétrico:

(a) Para um conjunto de n cargas discretas (pontuais) {qi }, i = 1...n

n n
~ x) =
X
~ i (~x) = 1 X ~x − ~xi
E(~ E qi (3)
i=1
4πǫ0 i=1 |~x − ~xi |3

(b) Para uma distribuição de cargas contı́nua descrita por uma função densidade de cargas
ρ(~x).

~ x)
E(~ 1
Z
~x − ~x′
~ x) =
E(~ ρ(~x′ ) dx′3
4πǫ0 V |~x − ~x′ |3

~x
′ (4)
ρ(~x′ ) ~x − A integral é realizada sobre o volume
onde ρ(~x′ ) 6= 0.
~x Uma distribuição discreta de cargas
~x′ pode ser escrita como uma distribuição
V 1 contı́nua de cargas usando-se a função
bc
δ de Dirac.
0
X
ρ(~x′ ) = qi δ(~x′ − ~xi ) (5)
i
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Obs:
δ(~x − ~xi ) = δ(x′1 − xi1 )δ(x′2 − xi2 )δ(x′3 − xi3 ), (6)
1
onde (x1 , x2 , x3 ) são coordenadas cartesianas .

Sistemas de Unidades: (ver Apêndice do Jackson, pg. 775)

1. Sistema de unidades eletrostáticas (esu): κ=1


ǫ0 = 1, µ0 = c−2
• Carga: 1 statcoulomb = carga que exerce uma força de 1 dyna sobre idêntica
carga localizada a uma distância de 1 cm.
• Campo elétrico: statvolt/centı́metro.
• Corrente: statampère
• Potencial: statvolt

2. Sistema Internacional (SI): κ = (4πǫ0 )−1 = 10−7 c2


c = 299 792 458 mseg−1
ǫ0 = 8.584 × 10−12 (I 2 t4 m−1 l−3 ) e µ0 = 4π × 10−7 (mlI −2 t−2 )
• Carga: (C) 1 Coulomb = 3 × 109 statcoulombs
1
• Campo elétrico: Volt/metro = 3
× 10−4 statvolt/cm
• Potencial elétrico: (V) 1 Volt = 1/300 statvolt.

3. Sistema Gaussiano: κ=1


ǫ0 = 1 µ 0 = 1
• Carga: 1 statcoulomb = carga que exerce uma força de 1 dyna sobre idêntica
carga localizada a uma distância de 1 cm.
• Campo elétrico: statvolt/centı́metro.
• Corrente: statampère
• Potencial: statvolt

Lei de Gauss:

Fluxo do Campo Elétrico produzido por uma carga q (pontual).

Fluxo em um elemento infinitesimal de área:


~ · n̂da = 1 q q
dΦE = E 2
cos θda = dΩ, (7)
4πǫ0 r 4πǫ0
1
Sobre a Função δ-Dirac, ver Apêndice II do livro de Cohen-Tannoudji, Quantum Mechanics vol.II,
pg. 1468 ou o §5.2 do livro de Byron-Füller, Mathematical of Classical and Quantum Physics, vol.I, pg.
224.
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~
E

θ

da

b
dΩ
q
S

Figura 1: Superfı́cie Gaussiana arbitrária contendo um carga pontual q no interior.

Obs: onde usamos dS = cos θda = r2 dΩ, sendo n̂ o versor normal à superfı́cie apontando
para fora, da é o elemento infinitesimal de área sobre S, dΩ é o elemento infinitesimal de
~ e n̂.
ângulo sólido e θ o ângulo entre E

Fluxo Total através de uma superfı́cie Gaussiana arbitrária S.




I I
q  q/ǫ0 , se q estiver no interior de S;
ΦE = ~ · n̂da =
E dΩ = Lei de Gauss
S S 4πǫ0 

 0, se q estiver fora de S.

(8)
Fluxo Total através de uma superfı́cie Gaussiana arbitrária S que contém uma distribuição
de carga limitada em uma região V .

I Z
ΦE = ~ · n̂da = 1
E ρ(~x′ )dx′3 Lei de Gauss (9)
S ǫ0 V

Forma Diferencial da Lei de Gauss

Considerar o Teorema Divergente2

I Z
~ · n̂da =
A ~ · Adx
∇ ~ 3 (10)
S V

1
2
Ver, por exemplo, §1.5 do livro de Reitz-Milford, Foundations of the Electromagnetic Theory, 2nd
edition, pg. 13.
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~ = A(~
onde A ~ x) é um campo vetorial e (∇·)
~ é o operador divergente.

Forma Diferencial da Lei de Gauss:

Aplicando o teorema divergente (10) ao lado esquerdo da equação (9) teremos:

I Z Z
~ · n̂da =
E ∇ ~ 3= 1
~ · Edx ρ(~x′ )dx′3 → ∇ ~ x) = 1 ρ(~x)
~ · E(~ (11)
ǫ ǫ0
S
|V {z 0 V
}
Comparando os integrandos

ou 1a Equação de Maxwell (no vácuo).

Potencial Escalar Eletrostático no vácuo.


Considerar expressão do campo elétrico (4):
Z Z  
~ x) = 1
E(~ ′
ρ(~x )
~x − ~x′
=
1 ′ ~ ~x
ρ(~x ) ∇
−1
dx′3
4πǫ0 V |~x − ~x′ |3 4πǫ0 V |~x − ~x′ |

onde usamos a identidade vetorial:

 
~ ~x −1 ~x − ~x′
∇ = (12)
|~x − ~x′ | |~x − ~x′ |3

Transpondo o operador gradiente em ~x para fora de integral (em ~x′ ), resulta:


 Z 
~ ~ 1 ′ 1 ′3 ~ x)
E(~x) = −∇ ρ(~x ) dx = −∇Φ(~ (13)
4πǫ0 V |~x − ~x′ |

onde
Z
1 1
Φ(~x) = ρ(~x′ ) dx′3 Potencial Escalar Eletrostático no vácuo (14)
4πǫ0 V |~x − ~x |

Obs:
~ ×E
• ∇ ~ ≡ 0 desde que ∇ ~ × ∇Φ
~ ≡ 0.
~ = −∇Φ
• E ~ em decorrência do caráter central da força eletrostática (vide identidade
(12)).
• O potencial escalar pode definido a menos de uma constante (simetria de calibre,
como será visto mais adiante).
• É melhor trabalhar com Φ(~x) do que com uma função vetorial E(~~ x).
~ ·E
• ∇ ~ = ρ/ǫ0 e ∇~ ×E ~ = 0 são suficientes para especificar completamente E(~~ x).
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Interpretação Fı́sica para o Potencial Escalar


Z B Z B
W = − F~ · d~l = −q ~ · d~l
E c
b
A A B
Z B Z B
= q ~
(∇Φ) · d~l = q dφ =
A A
= [ΦB − ΦA ] = UB − UA ~
E

onde U = qΦ é, por definição, a


q c
b
energia Potencial Eletrostática. A d~l

Obs:
H
• A integral do campo eletrostático em uma curva fechada é nula ~ · d~l = 0. Pode
E
ser obtido diretamente da Lei de Coulomb.
• Considerando o teorema de Stokes para o cálculo vetorial:
I Z
~ ~ ~ × A)
A · dl = (∇ ~ · n̂da (15)
C S

~ resulta ∇
Aplicando para E ~ ×E
~ = 0.

Potencial e Campo Elétrico produzidos por uma distribuição de cargas superficial σ(~x)

Usar a Lei de Gauss e considerar uma superfı́cie Gaussiana cilı́ndrica de base S e


altura infinitesimal ǫ,
Z Z Z
~ 1 1
Φ= E·n̂da = ρdv = σda
S ǫ0 V ǫ0 S
(16)
Considerando o limite quando ǫ → 0 o
lado esquerdo de (16) fica:
Z Z Z
~ 1 · n̂da − E ~ 2 · n̂da = 1
E σda
S S ǫ0 S
(17)
Logo
1

(E ~ 1 ) · n̂ = σ
~2 − E (18)
ǫ0
ou seja,

Ocorre uma descontinuidade na componente nor-


mal do campo elétrico, cujo valor é σ/ǫ0 .
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Obs: Para algumas distribuições com propriedades de simetria é possı́vel obter o campo
~ diretamente da Lei de Gauss. Ex: placa infinita com distribuição de cargas
elétrico E
uniforme.
H
Usar a condição E ~ · d~l = 0 sobre uma trajetória retangular paralela à superfı́cie e
com altura infinitesimal ǫ0 .
I Z Z
~ ~ ~
lim E · dl1 = E1 · dl + E~ ~ 2 · d~l2 → (E2t − E1t ) = 0 ∴ E2t = E1t (19)
ǫ→0 1 2

A componente tangencial do campo elétrico é


contı́nua na superfı́cie.

Potencial Escalar em todos os pontos do espaço:

Z
1 σ(~x′ )
Φ(~x) = da′ (20)
4πǫ0 S |~x − ~x |

Obs:

• O potencial é sempre contı́nuo para distribuições de carga superficiais ou volumétricas


contı́nuas. A continuidade ocorre mesmo sobre a distribuição.
• Supor que σ=constante e tomar a origem sobre a superfı́cie de carga. Logo
Z Z
σ da′ σ rdrdθ
Φ(0) = = <∞ (21)
4πǫ0 s |~x |
′ 4πǫ0 S r

• Para distribuições de carga lineares ou pontuais o potencial é singular sobre a dis-


tribuição! Exemplo: Campo de um dipolo pontual p~ localizado em ~x′ 3 .

1 p~ · (~x − ~x′ )
Φ(~x) = (22)
4πǫ0 |~x − ~x′ |

Potencial de uma Distribuição Superficial Dipolar de Cargas S − S ′ :

Definição: Força de Dipolo

~ x) = D(~x)n̂ = lim σ(~x)d(~x)n̂ < ∞


D(~ (23)
x)→0
d(~

onde d(~x) é a separação entre as superfı́cies S e S ′ no ponto ~x.


Obs: Tal distribuição pode ser gerada por uma membrana de moléculas polares, por
3
ver Reitz-Milford, opus cit §2.8, 2nd ed. pg. 36
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exemplo.

Cálculo Z Z 
1 σ(~x′ ) −σ(~x′ − dn̂)
Φ(~x) = da′ + da′′ (24)
4πǫ0 S |~x − ~x′ | S |~x − ~x′ + d(~x′ )n̂|
Considerar d(~x) ≃ d e σ(~x′ − dn̂) ≃ σ(~x′ ) e expandir |~x − ~x′ + dn̂|−1 para valores pequenos
de d, isto é:  
1 1 ~ ′ 1
≃ + dn̂ · ∇ + ... (25)
|~x − ~x′ + dn̂| |~x − ~x′ | |~x − ~x′ |
Substituindo na equação (24) e tomando o limite quando d → 0, resulta:
Z  
1 ′ ~ ′ 1
Φ(~x) = D(~x )n̂ · ∇ da′ (26)
4πǫ0 S |~x − ~x′ |

Obs: O integrando é o potencial no ponto ~x produzido por um dipolo pontual cujo mo-
mento dipolo é p~ = n̂Dda′ localizado em ~x′ .
Em (26), o fator:

 
~′ 1 cos θ
n̂ · ∇ =− (27)
|~x − ~x′ | |~x − ~x′ |2
que se obtém observando a relação vetorial:
 
~ ′ 1 ~x − ~x′ 1 (~x − ~x′ )
∇ = = −
|~x − ~x′ | |~x − ~x′ |3 |~x − ~x′ |2 |~x − ~x′ |
(28)
Obs:

• θ é o ângulo entre n̂ e (~x − ~x′ )!


• dΩ é o ângulo sólido elementar que subentende o elemento de áreas da′ , a partir do
ponto (de observação) onde o potencial vai ser calculado.
• Se θ < π/2, o ponto de observação é interno, isto é acessa a parte interna (camada
negativa) da distribuição → dΩ > 0.
• Se θ > π/2, o ponto de observação é externo → dΩ < 0.
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Logo, a integral para Φ(~x) pode ser reescrita como:


Z
1
Φ(~x) = D(~x′ )dΩ (29)
4πǫ0 S

Aplicação: Se D(~x′ ) = D é constante, o potencial resulta:

D
Φ(~x) = Ω(~x) (30)
4πǫ0
onde Ω(~x) é o ângulo sólido total subentendido pela superfı́cie a partir do ponto de
observação ~x.
Descontinuidade do Potencial na superfı́cie dipolar: Considerar as contribuições de um
disco plano infinitesimal e do restante da superfı́cie dipolar. A contribuição do disco é
dada por:

• Do lado negativo:
D D
Φ1 = − (2π) = − (31)
4πǫ0 2ǫ0
• Do lado positivo:
D D
Φ1 = − (−2π) = (32)
4πǫ0 2ǫ0
• Descontinuidade:
D
∆Φ = Φ2 − Φ1 = (33)
ǫ0
As contribuição do estante da superfı́cie se anulam ao cruzar o buraco.
O valor D/epsilon0 corresponde à diferença de potencial entre os lados da superfı́cie
bipolar.

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