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Assumindo a operação de uma usina de açúcar e bioetanol nas condições típicas do Centro-Sul

brasileiro, com uma moagem anual de 2 milhões de toneladas de cana, sistemas de co-gera-
ção convencionais a 65 bar e 480° C correspondem a uma capacidade instalada de geração
de 31 MW, enquanto, para sistemas otimizados a 90 bar e 520° C, essa potência passa a ser
82 MW, para operação durante a safra [Seabra (2008)]. Em que pese a possibilidade de al-
cançar significativos ganhos energéticos com a utilização de altos parâmetros de vapor nesses
sistemas de co-geração, a opção por pressões mais elevadas visando aumentar a geração
de energia elétrica excedente implica investimentos proporcionalmente mais elevados, cuja
amortização depende, entre outras variáveis, do quadro tarifário, do marco regulatório e das
perspectivas de oferta no setor elétrico, condições essencialmente externas ao negócio usual
das usinas. Não obstante, é notável a expansão da capacidade de geração das usinas de açú-
car, como bem sinaliza o caso brasileiro [CGEE (2005)].

Segundo os registros da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), em março de 2008,


a capacidade instalada para geração elétrica com base no bagaço de cana alcançava
3.081 MW, enquanto outros 460 MW estavam em construção ou aguardavam outorga para
operar [Aneel (2008)]. Considerando valores de 2006, essas centrais responderam por uma
geração de 8.357 GWh, cerca de 2% da produção brasileira de eletricidade [MME (2008)].
Apenas para o Estado de São Paulo, que responde por cerca de 60% da produção brasileira
de açúcar e bioetanol e cujas 131 usinas processaram 264 milhões de toneladas de cana na
safra 2006/2007, informa-se uma capacidade instalada de 1.820 MW, com excedentes para
a rede pública de 875 MW [Silvestrin (2007)]. Também considerando apenas esse estado, a
expansão prevista para a geração de excedentes de energia elétrica pela agroindústria cana-
vieira é significativa, como mostra o Gráfico 12. Para todo o Brasil, a capacidade de geração
de energia elétrica para a rede pública com base no bagaço poderá alcançar 15 GW até
2015, ou 15% da atual potência instalada nas centrais elétricas brasileiras. Há perspectivas de
que os resultados econômicos da produção de bioeletricidade se equiparem à produção
de açúcar nas usinas mais modernas, incluindo a produção de bioetanol, açúcar e energia
elétrica [F. O. Licht (2008a)]. Em um horizonte mais distante, considerando as demandas
previstas de bioetanol e as disponibilidades de bagaço associadas à sua produção, Walter e
Horta Nogueira (2007) estimam que, em 2025, a capacidade instalada poderia chegar a 38,4
GW (caso seja utilizado o bagaço para produção de bioetanol por hidrólise e caso as caldeiras
empreguem apenas 60% da palha disponível) ou 74,7 GW (caso todo o bagaço e 60% da
palha sejam usados para produzir bioeletricidade).

Com o provável desenvolvimento de processos para produção de bioetanol com base no ba-
gaço, ganha interesse a análise das condições de competitividade relativa dessa biomassa, ou
seja, cabe procurar as rotas de maior atratividade econômica. Nesse sentido, uma avaliação
comparativa preliminar do valor econômico entre dois produtos alternativos do bagaço – a
bioeletricidade e o bioetanol por hidrólise – é apresentada nos gráficos a seguir. No Gráfico
13, o valor econômico do bagaço é definido pela tarifa de venda da energia elétrica, consi-
derando dois valores de custo unitário da capacidade de geração elétrica. De modo análogo,
no Gráfico 14, estima-se o valor do bagaço quando utilizado para produção de bioetanol por

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hidrólise (que será mais bem discutida no próximo capítulo), assumindo uma produtividade
de 378 litros de bioetanol por tonelada de bagaço seco. Nesse caso, os valores de custo de capital
e operação da unidade industrial foram tomados da literatura, variando, conforme o nível
de maturidade tecnológica, entre US$ 0,26 e US$ 0,13 por litro de bioetanol produzido,
respectivamente, para curto prazo e para após 2010 [IEA (2007)].

Gráfico 12 – Capacidade dos sistemas de co-geração a serem instalados em usinas de


açúcar e bioetanol no Estado de São Paulo nos próximos anos

Fonte: Silvestrin (2007).

Gráfico 13 – Valor do bagaço utilizado para geração de eletricidade

Fonte: Elaboração de Luiz Augusto Horta Nogueira.

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Gráfico 14 – Valor do bagaço utilizado para produção de etanol

Fonte: Elaboração de Luiz Augusto Horta Nogueira.

Os Gráficos 13 e 14 permitem obter uma interessante conclusão. O valor de oportunidade


do bagaço para produção de energia elétrica, tendo em vista as tarifas usuais de energia
elétrica (acima de US$ 60 por kWh, a valores de 2005) e os preços de mercado do bioeta-
nol (geralmente, em torno de US$ 0,50 por litro), indica claramente a maior atratividade da
produção de bioeletricidade frente à produção de bioetanol, pelo menos no atual cenário
de preços dos vetores energéticos. Essa constatação independe, em princípio, de aspectos
estratégicos associados ao planejamento energético, que reforçam a atratividade da oferta de
eletricidade, no caso brasileiro, e de combustíveis líquidos, no caso norte-americano.

O uso de bagaço para geração de energia elétrica permite reduzir as emissões de carbono
para a atmosfera, já que substitui o óleo combustível queimado nas termelétricas convencio-
nais, mais acionadas exatamente na época da safra, que ocorre nos meses de baixa hidrauli-
cidade e menor capacidade de geração hidrelétrica. Nesse caso, a redução de emissões é da
ordem de 0,55 tonelada de CO2 equivalente por tonelada de bagaço utilizado. Tal redução
de emissões de gases de efeito estufa é elegível para a obtenção de créditos de carbono, apre-
sentando adicionalidade (a redução de emissões de gases de efeito estufa deve ser adicional
àquelas que ocorreriam na ausência da atividade) e com uma metodologia de linha de base
consolidada aprovada (Método AM0015 – “Co-geração com base em bagaço interligada a
uma rede elétrica”), para quantificação e certificação desses créditos (reduções certificadas
de emissões, RCEs), nos termos do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo – MDL (Clean
Development Mechanism – CDM), como estabelecido pelo Protocolo de Quioto.

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