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Resenhas LAPLANTINE, Francois. Aprender antropologia?, EdicBes Brasliense, 1988, © professor de Etnografia Frangois Laplantine, da Universidade de Lyon Il, ‘autor de varios livros, tem agora o seu “Clefs pour Tanthropologie” (ed. Seghers- Pass-1987) tradurdo para o portugues por Mane-Agnés Chauvel e com pres ‘de Maria Isaura Pereira de Queiroz. (O livre divide-se em irs grandes partes: “Marcos para uma histria do pen- samento antropoligico”, “As principsis tendéncias do pensamento antropoisgico ‘contemporined” e “A especificidade da prétca antropolégica”. ‘Com uma linguagem clara e precisa, 0 autor, na introduséo, colocae erfica © objeto da antropologia. Levanta as difculdades que Ihe dizem respeito: em nivel das palavras, grau de Gentificidade, seu relacionamento com a hist6ria, a oscilagéo ‘entre pesquisa fundamental e aplicada, Empreende em seguida uma brilhanteexposi¢o sobre as figuras do selva- gem ¢ do civilizado 0 longo das correntes de pensamento, desde 0 século XIV, pena, segundo o psionanento fostic,o “mat slvagen wo bom iviizado™ ‘ou “o tom selvagem ao mau civlizado”. Coloca como sendo um saber pré-antro- Polfgico aquele em que, como coloca Jean de Lery, a “selvageria’ nfo 6 nem infe- ‘or nem superior a nossa civilizao, mas sim diferente, “introduvindo a vida no cedificio do pensamento europe ‘0 autor situa no século XVII a invencio do conceito de homem ¢ a apre- ens das condipdes necessérias ao nascimento da entropologia.Pois 0 projeto an ‘topolégico supe: "I~ a constrogéo de um certo nimero de conceitos, 2 ~a consti- tuigdo de um saber que nio seja apenas de reflexdo, ¢ sim de observaséo, 3 ~ uma problemdtica essencial: a da diferenga, 4 — um método de observasho a andlise: © Iétodo indutivo, “onde os grupos sociais so considerados como sistemas “natu ‘ais. Passa-se entéo da concepséo do homem como ser teol6gico, para aquela do ser “natural”. Mas 0 conceito de homem continua sendo abstratoefiloséfico, ‘Aborda 0 século XIX, com a revolugéo industrial inglesae a revolugéo pol tica francesa, com as conquistas coloniss, a partilha da Africa. A partir daf 0 co- ‘hecimento do “‘primitivo” passa a ser 0 conhecimento das nossas origens, numa perspectiva evolucionista, hoje ultrapassada. O século em questio teria como princi- ais caractersticas a intensidade do trabalho realizado e uma imensa curioidade. 'No capftulo “Os pais fundadores da etnografia” (Boas e Malinowski), Fran- ois Laplantine coloca a importincia que teve para a antropologia no inicio deste Século, a fusto do observador (viajante) ¢ do pesquisador erudito, numa 96 pessoa. © ‘trabalho de campo passa a ser consderado como indispensével. Os estudiosos Cad, Est Soc, Rocke, 4n2,p 269276, jul/dez., 1968 270 ‘mais importantes nesta linha seriam Boas ¢ Malinowski. Para Boas, no campo, tudo ‘deve ser anotado, ¢ a cultura deve ser considerada em sie nfo dentro de um trajeto cevolucionista. Malinowski busca uma compreensio por dentro, uma despersonali- ‘ago, com ele a antropologia se torna uma ‘cicia’ da alteridade que vira as cos- tas ao empreendimento evolucionista de reconstituigéo das origens da civilizacio, © ‘se dedica ao estudo das logicas particulares caracterfsticas de cada cultura”, Elabora, 4 teoria funcionalista,e propde um estudo do homem que leve em conta “a artcu- Iago do social, do psicolégico e do biolégico”. O funcionalismo, entretanto, seré uremente criticado. (© autor pass entéo aos que chamna de “prineiros te6ticos da antropologia”: Durkheim © Mauss, expondo suas tori ¢ a importincia que tiveram no peasamen- {0 antropolégico. ‘Na segunda parte: “As principals tendéncias do pensamentoantropol6pico contemporineo”, 0 autor vai abordar sucssivamente a antropologa: dos sistemas Simbotco, socal, cultural, estrtuale sistema, dindmica. Naintrodugdo, sso re- Pidareate caracterizadas a antropologia americana (diveridade das cultura, acul- {urasio, neoevoluconisno), a brtinica (antevolucionist, antdifusionista, de cam- Foy solo Koco (cba, stems de “repeat, enovao meto- ‘A antropologia dos sistemas simbélicos (sistemas de pensamento mitol6gi- ‘0s, teoldgicos, cosmolégicos), surge na Franca a partir dos anos 30 (Marcel Griau- Jp). AS priticas simbélicas s80 tidas como fundamentals. As pesquisas de Maurice Leenhardt vio neste sentido. Apesar de certos aspectos critcaveis, tal antropologia apresenta-se como fundamental eantietnocentrista. ‘A antropologia social, que também df valor aos sistemas simbéticos cons era entretanto que “as produgées simbélicas sfo simultaneamente produgbes 30 ciais que senipre decorrem de préticassociais”. A antropologia social seria uma “ <éologia comparativa” com forte infléocia durkheimiana. ‘A antropologia cultural, de inspiracéo principalmente americana, vai dar én- fase a0 comportamentn dos individuos, estabelecendo forte relacéo com a psicologia 2 psicanflise. Esta se diferencia da antropologia social pois trata exclusivamente do humano. Destacam-se neste campo Margaret Mead, Ruth Benedict, Kardiner, Roger Bastde .. entre outros. Sio abordadas a variagdo cultural, as estruturas per ‘ceptivas (configuracéo cultural. “A antropologia estrutual e sistémica tena explicar a variabilidade em si da ‘cultura. Tem trés tendéncias: antropologia da comunicaso, etoopsiquiatria eestru- turalismo francés. ‘A antropologia “dinfmica” vem erguet-se contra a tendéncia de uma parte 4a antropologia que constr6i modelos ideais de cultura, abstraindo aspectos “incon- ‘venientes” como por exemplo a aco dos missionérios nas sociedades "tradicionais”. ‘Trata-se agora de reabilitar a mudanga, que deve se tornar “um dos ‘centrais da andlise do social. Origem de um neoevolucionismo baseado em Morgan, encontrado em Sahlins: trata-se de uma evolugéo plural. Balandier vai colocar as bases de uma "“antropologia da modernidade”. Bastide fala em interpenetragio das eivilizagbes. ‘A terotira parte do livro, referente& “especificidade da prética antropolégi- 2”, divide-se em capftulos curtos compostos de critica e proposigSes metodol6gi- cas. Entre as proposigSes metodolégicas, de inicio, considerando que $6 se pode cstudar © homem comunicando-se com ele, encontra-se aquela de “impregnar-se de temas obsessionais de uma sociedade, de seus ideais, de suas angGstis. O etndgrafo ‘deve ser capaz de viver nele mesmo a tendéncia principal da cultura que estuda”, Cad, Est Soc, Recie,4n2,p. 269276, juu/éez., 1968 am ‘como condicéo necesséria a compreenséo. ‘Consiera 0 autor que a abordagem etnolgicainfluenciou as outrascitocias ananascomn aac dan eigsn, argu equips obey, Dat ‘A respito da antropologia como estado da totale, Mauss é ita: “o home @ inate" ¢ "0 coe do cnciio"€"o etude compte "Fear fimetio deta no mas oo pp da Mooi, a nS tro a Francois Laplantine aborda ainda: os problemas inerentes a uma andlise ‘comparativa “as condies de produgSo socal do discurso antropolégico”, uma ext. tia da objetvidade (“A pertubacko que 0 etadlog impée através de sua preseoga Aguilo que observa e que perturba a ele proprio, longe de ser consderado un obat- ‘ello que sera conveniente neutraizar, € uma font infinitamsentefecunda de conbe ‘imeato";¢estabelece quas so as relagdea entre etologia erat. 'No limo capitulo, intitalado “as tenses comstituivas da prtica antro- polégica" 0 autor sborda suceasvamente os aspectos do “dentro e fora, da "uni- Gade e a pluralidade™. do “conereto eo abstrato”. Alguns exemplos eo trados da vivéocia do professor Laplantine no Bras. Diz por exemplo que no Brasil contem- Pordneo “a cultura popular nfo 96 resist notavelmente& cultura dominante, como {ambém, freqientemente, consegue se impor a esta, de uma mancira dificimente ‘magindvel no Ocidente™ Podem ser destacadas, dentre outras, como conclusio, as observagbes se- “O trabalho do antropélogo no consiste em fotografar, gravar, anotar, mas ‘em decidir quais so 0s fatossignficatvos,e, além dessa descrigSo (mas a partir de~ Ja) em buscar uma compreensio das sociedades humanas. Ou seja, trata-se de uma, atividade claramente te6rica de construc de um objeto que nfo existe na reali- dade, mas que 36 pode ser empreendida a partir da observacfo de uma realidade “..Uma toria centifica nunca 6 0 reflexo do real, ¢ sim uma construcéo do real”. Ou seja, “No posso ser a0 mesmo tempo eu mesmo e um outro, € no entanto, para ser totalmente eu, devo também sair de mim a fim de apreeader uma figura re- ‘alcads, mas possive, de mim. Néo posto situar-me simultaneamente dentro e fora da minba sociedade, ¢ no entanto, para compreender minha sociedade no que nunca, ‘Sz de propria porque nio.o perce, devo famst a experienc de oma deen tragho radical. Finalmente essa alteridade continua interrogando-me na prpria atividade pela qual contribuo a fabricé-la como objeto cientffco" Em conclusSo, pode-se dizer que, “Aprender antropologia” se apresenta ‘como um bom orientador pera 0 antrop6iogo iniciante, colocando-0 a par da ataali dade do discurso antropol6gico. E uma orientacfo dada nos dois campos: te6rico anmilien Se senate tania como bin agave «iterate pre 0 “etn get ps mi oy err me verse eee roe See Soyabean sateen leewreamee, imaginério, decorrentes das teses de Gilbert Durand, que justamente escapam as crf- ee rer nee oceans Sombectumee wee cuebe tree wat Sigua nein weg ec Sesto et ad, Est Soc, Recto, 42, p, 269276, juL/dex, 1968

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