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Técnicas de Gravação de Áudio II

Processamento do Sinal

Sérgio Izecksohn

Nos estúdios, os sons recebem um tratamento todo especial. Em busca de qualidade, nitidez,
presença, peso e coerência com o estilo, usam-se variados processadores de sinal. Por
exemplo, a voz gravada dentro do estúdio não deve conter as reflexões sonoras (reverberação)
da sala de gravação. Caso contrário, toda música gravada nesse estúdio teria o mesmo tipo de
reverberação, fosse uma bossa nova, que combina com pequenos ambientes, ou um heavy
metal, típico de grandes clubes e estádios. Por isso, o tratamento acústico das salas abafa as
reflexões o suficiente para deixar o som natural, porém seco. Artificialmente, aplica-se a
reverberação. Conhecer os tipos de processadores, seus usos e as formas de conectá-los aos
demais equipamentos é fundamental para se gravar bem.

Processamento “fantasma”. O som de uma voz ou instrumento pode ser gravado já


processado, com reverberação e equalização, por exemplo. Ou pode-se gravá-lo seco, e ele ser
processado somente para a monitoração, durante a gravação dos outros sons, e para a
mixagem, quando os sons recebem o tratamento definitivo. Desta forma, ouve-se o efeito
“fantasma”, mas ele não é gravado. Grava-se o som seco, mas ele é ouvido com os efeitos.
Exemplo: o cantor ouve sua voz reverberada no fone de ouvido, mas o reverber não está
sendo gravado, só a voz. Assim, na primeira fase da gravação, o operador se preocupa apenas
com a captação do som. Se ele gravasse o som com excesso de efeitos, não poderia corrigir o
problema, a não ser gravando novamente. Na mixagem, quando se regrava em outra fita
estéreo tudo o que foi gravado na fita multipista, o operador se concentrará no
processamento definitivo de cada sinal.

Isto é possível porque dois canais da mesa são usados para cada som gravado: um para a
entrada (input) do sinal - que vem do microfone ou instrumento e vai para a fita (ou HD etc.) -
e outro para a monitoração (audição) e posterior mixagem do som gravado, que retorna à
mesa. (Fig. 1) As ligações são: microfone > canal de entrada da mesa > saída submaster > input
do gravador e output do gravador > canal de monitoração da mesa (ou “volta do gravador”).
Como o canal de entrada fica antes do gravador e o canal de monitoração fica depois, basta
deixar o som entrar flat (seco, não tratado) na fita e ouvi-lo com os efeitos, equalizadores etc.
no canal de retorno. O som vai seco para a fita e é tratado na volta.

Para se gravar o som já processado, usam-se os efeitos, EQ etc. do canal de entrada da mesa,
antes do gravador. Assim, o processamento é gravado na pista do gravador, junto com o sinal
da voz ou instrumento. No canal de monitoração (“volta”) da mesa, pode-se deixar o som flat
ou processá-lo novamente, se necessário.
Processadores se dividem em dois grupos, pelo seu uso individual ou coletivo e pela maneira
de serem plugados à mesa. Os efeitos (“FX”), como o reverber, o delay ou eco, o chorus e
outros, podem ser usados por vários canais ao mesmo tempo, em diferentes intensidades,
como um mesmo reverber, que pode ser regulado mais forte no canal da voz e mais discreto
no violão. Nos controles auxiliares dos canais da mesa, dosam-se as intensidades do efeito
para cada canal. O outro grupo é o dos processadores individuais, que modificam inteiramente
um sinal, não se controlando a intensidade, e que são usados cada um por um único canal. É o
caso dos equalizadores, noise gates e compressores.

Conexões. Efeitos e processadores individuais são conectados à mesa de formas totalmente


diferentes.

Os efeitos são conectados às saídas (“aux send”) e entradas (“aux return”) auxiliares da mesa,
também conhecidas como “mandadas” e “voltas” dos efeitos. (Fig. 2) As ligações são: Aux Send
(“mandada do efeito”) da mesa > input do efeito e output do efeito > Aux Return (“volta do
efeito”) da mesa. A mandada pode ser mono ou estéreo, usando-se um ou dois cabos de ¼”,
ou banana. Na mesa, em cada canal, controla-se a intensidade do efeito para aquele canal. A
volta costuma ser estéreo, com dois cabos de ¼”. A intensidade de saída do efeito fica no
máximo, e é controlada por um botão do tipo “aux return” na seção master da mesa. Já o nível
de entrada no efeito é controlado no próprio efeito, num botão do tipo “input level”.

Os processadores individuais são plugados na mesa ao “insert” do canal. O “insert” é um


conector do canal da mesa que usa um único plug (banana estéreo) para o sinal sair, ser
processado e voltar pelo mesmo lugar. (Fig. 3) O som do canal sai e volta pelo mesmo plug do
“insert”, que tem um cabo em “Y”, com as outras duas pontas (banana mono) do cabo
entrando e saindo do processador. A ponta do cabo que tem o plug estéreo não é para som
estéreo: as duas vias de sinal são usadas, uma para saída da mesa e outra para entrada
(retorno). Os cabos de “insert” não são facilmente encontrados no mercado, você terá de fazê-
los. Quando se quer gravar o som já processado, usa-se o “insert” do canal de entrada.
Quando se prefere deixar o processamento para a mixagem, usa-se o “insert” do canal de
monitoração. Outras formas de se conectarem processadores individuais, quando não há
inserts na mesa: entre a saída da mesa e a entrada do gravador (grava-se o som processado),
ou entre a saída do gravador e a entrada da mesa (o processamento é apenas monitorado,
podendo ser modificado na mixagem). Estas ligações trazem os mesmo resultados que o uso
dos inserts. O som vem da saída direta (“direct out”) do canal ou do submaster da mesa, passa
pelo processador e vai para o gravador. Ou então, grava-se o som flat e ele sai do gravador,
passa pelo processador e vai para o canal de monitoração da mesa.

Certos instrumentos devem ser gravados já processados em definitivo, outros podem ser
melhor tratados na mixagem. A guitarra e o baixo elétrico costumam ser gravados com os
timbres já equalizados, embora ainda se possam ajustá-los de novo na mixagem. Certos efeitos
da guitarra são gravados junto com ela, como o distorcedor, o chorus, o flanger e outros. Já a
reverberação e o eco podem ser equilibrados na mixagem, para se ambientar os diversos
instrumentos e vozes, todos na mesma hora. Grava-se, geralmente, a voz ou instrumento com
eco ou reverber “fantasma”, isto é, apenas no canal de monitoração. É comum, com bons
microfones, deixar-se o timbre da voz intocado, sem usar equalizadores, mesmo na mixagem.
Os teclados muitas vezes também são gravados e mixados sem nenhum processamento
adicional.

Não exagere ao usar processadores. Às vezes, o excesso de efeitos pode ser fatal para uma
gravação. Da mesma forma, um som muito seco ou sem brilho parecerá artificial. Ao gravar e
mixar, imagine o ambiente desejado para os sons e regule os efeitos para criar esse ambiente.
Ouça outras músicas, de vários CDs. Depois, ouça de novo sua mixagem. Mexa nos
processadores e nas mandadas auxiliares quanto for preciso, sempre ouvindo o resultado.
Aproveite a disponibilidade de tempo, que seu próprio estúdio proporciona, para
experimentar. Quando tudo estiver bom, grave esta mixagem na fita estéreo. Tire cópias: é o
seu produto final.

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