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Acórdãos TRL Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa

Processo: 269/10.2TTVFX.L1-4
Relator: NATALINO BOLAS
Descritores: PERÍODO EXPERIMENTAL
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 09/28/2011
Votação: UNANIMIDADE
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO
Sumário: I - À contagem do tempo referente ao período experimental não é
aplicável a norma constante do art. 278.º al. b) do Código Civil.
II – Se o trabalhador iniciou a execução do contrato em
21.09.2009, tendo faltado um dia em Outubro (falta que não é
considerada para efeitos do período experimental), e a ré
denunciou o contrato de trabalho no dia 21.12.2009, fê-lo no 91.º
dia do período experimental (10 dias em Setembro + 30 dias em
Outubro + 30 dias em Novembro + 21 dias em Dezembro);
III – A cessação do contrato de trabalho por denúncia do
empregador, após decorrido o período experimental, tem de ser
entendida como um despedimento sem justa causa.
(Elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Parcial: Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa

I – Relatório

A instaurou, em 07/04/2010, a presente acção declarativa sob a


forma de processo comum contra
«B, LDA..»,
pedindo que seja declarada ilícito o seu despedimento e,
consequentemente, seja a Ré condenada a pagar-lhe as
retribuições, vencidas e vincendas, desde a data do despedimento
até ao trânsito em julgado da presente decisão; a quantia de €
2.395,08 a título de retribuições vencidas (€ 282,60 por conta de
férias e subsídio de férias referente ao tempo de serviço prestado
no ano 2009 e € 2.112,48 relativo a trabalho suplementar prestado
entre 01/10/2009 e 18/12/2009); e ainda, € 1.695,63 a título de
indemnização por antiguidade, tudo acrescido de juros de mora,
à taxa legal, desde o vencimento até integral e efectivo
pagamento.
Para tanto, alega que foi verbalmente admitido para, sob a
autoridade, direcção e fiscalização da Ré, exercer, a partir de
21/09/2009, as funções de motorista de
pesados mediante o pagamento de € 565,21 mensais, acrescido de
€ 220,00 a título de ajudas de custo e subsídio de alimentação, e
que entre 01/10/2009 a 18/12/2009, pese embora tenha sido
acordado um período de trabalho de 40 horas semanais, a prestar
de 2ª a 6ª, sempre trabalhou das 03h00 às 19h00, trabalho
suplementar cujo pagamento reivindicou à Ré e ao que esta, em
21/12/2009, lhe comunicou a denúncia do contrato, invocando o
n.º 2 do artigo 114º do Código do Trabalho, sendo certo que o
período experimental de 90 dias havia cessado há dois dias.
Contestando, a Ré nega que tenha acordado o pagamento de €
220,00 a título de ajudas de custo e subsídio de alimentação,
esclarecendo que somente foi acordado o pagamento de € 100,00
a título de subsídio de alimentação e uma quantia variável a
pagar em função do trabalho suplementar ou nocturno prestado,
horas de trabalho que pagou ao Autor e que incluiu nos recibos
sob a rubrica “ajudas de custo variáveis”, negando contudo que o
Autor haja realizado 15 horas de trabalho diárias.
Por fim, alega que apesar da denúncia do contrato ter ocorrido
no 92º dia após o início da prestação de trabalho, fê-lo em prazo
porquanto o Autor faltou ao trabalho nos dias 23/10/2009 e
20/11/2009, sendo certo que a falta de aviso prévio de 7 dias não
fere de ilícita a cessação.

Procedeu-se a julgamento, tendo a matéria de facto sido decidida


sem reclamações.
Foi proferida sentença cuja parte dispositiva se transcreve:
“Pelo exposto, o Tribunal julga a acção parcialmente procedente e,
em
consequência, decide:
1. Declarar ilícito o despedimento de «A»..
2. Condenar «B,, LDA..» a pagar a «A» o valor correspondente às
retribuições que deixou de auferir entre a data do despedimento e o
trânsito em julgado da presente decisão, deduzidos os montantes a
que alude o n.º 2 do artigo 390º do Código do Trabalho e as
quantias obrigatoriamente devidas ao Fisco e à Segurança Social, a
quem devem ser entregues, acrescida da quantia devida por conta
de juros de mora, à taxa de 4% ao ano, desde a data de vencimento
de cada uma das prestações em dívida até integral e efectivo
pagamento.
3. Condenar «B, LDA..» a pagar a «A» a indemnização de
antiguidade no valor de € 1.695,63 (mil seiscentos e noventa e cinco
euros e sessenta e três cêntimos), acrescida da quantia devida por
conta de juros de mora, à taxa de 4% ao ano, desde a citação até
integral e efectivo pagamento.
4. Absolver «B, LDA..» do demais peticionado por «A».
5. Condenar «A» e «B, LDA..» no pagamento das custas
processuais, na proporção do respectivo decaimento, que se fixa em
1/2 para o primeiro, sem prejuízo da dispensa de pagamento de que
beneficia.”

Inconformada com a sentença, veio a Ré interpor recurso de


apelação para este Tribunal da Relação, apresentando doutas
alegações, com as seguintes conclusões:
(…)

O Autor contra-alegou, pugnando pela manutenção da decisão


recorrida.

Admitido o recurso na forma, com o efeito e no regime de subida


devidos, subiram os autos a este Tribunal da Relação.
O Exmo. Magistrado do Ministério Público emitiu douto parecer
nos termos legais.
Nada obstando ao conhecimento da causa, cumpre decidir.

O âmbito do recurso é limitado pelas questões suscitadas pelos


recorrentes nas conclusões das alegações (art.ºs 690º e 684º, n.º 3
do Cód. Proc. Civil) , salvo as questões de conhecimento oficioso
(n.º 2 in fine do art.º 660º do Cód. Proc. Civil).
Assim, a questão essencial a que cumpre dar resposta no presente
recurso consiste em saber se a denúncia do contrato foi efectuada
dentro do período experimental

II - FUNDAMENTOS DE FACTO
Os factos considerados provados são os seguintes:
1. O A. foi admitido para trabalhar por conta e sob a direcção da
R., nas instalações desta de Vialonga, Vila Franca de Xira, no dia
21 de Setembro de 2009, mediante contrato de trabalho verbal e
sem termo, para exercer as funções de motorista de pesados.
2. Foi acordado entre A. e R. que o salário mensal do A. ascendia
a € 565,21, acrescido de subsídio de alimentação.
3. Em 21 de Dezembro de 2009 a R. entregou ao A. a
comunicação da denúncia do contrato de trabalho com base no nº
2 do artº 114º do Código do Trabalho, onde ainda referiu ao
mesmo que no final do mês de Dezembro lhe seriam pagos os
duodécimos correspondentes a férias, subsídio de férias e dias
trabalhados, visto já ter recebido o subsídio de Natal.
4. Uma das viaturas conduzidas pelo A. no período que trabalhou
para a R. tem a matrícula 00-00-00 e dispõe de um sistema de
leitura de cartão magnético onde cada motorista coloca o seu
próprio cartão a fim de ser controlado o período de condução.
5. A outra viatura conduzida pelo A. com a matrícula 11-11-11
dispõe de um sistema de tacógrafo, onde cada motorista introduz
um disco por forma a ser controlado o respectivo período de
condução.
6. O A. conduziu a viatura referida em 4. nos dias e períodos
referidos a fls. 61-108, atribuídos ao cartão magnético inserido
com o nº ....
7. O A. recebeu da R. a título de ajudas de custo variáveis os
montantes de € 180,71, € 389,38 e € 210,25 relativamente aos
meses, respectivamente, de Setembro, Outubro e Dezembro.
8. Nas ajudas de custo variáveis a R. incluía o pagamento de
horas extraordinárias, de subsídio de alimentação e do prémio de
cargas e descargas, sendo este último variável em função do
número de serviços efectuados.
9. O A. faltou ao trabalho um dia em Outubro de 2009.
10. A R. pagou ao A., em Dezembro de 2009, o montante de €
141,30 a título de subsídio de Natal.

III – FUNDAMENTOS DE DIREITO


A questão colocada nos autos consiste em saber se a ré fez cessar
o contrato de trabalho no período experimental.
A sentença recorrida entendeu que a ré/recorrente despediu o
autor ilicitamente porquanto fez cessar o contrato de trabalho no
91.º dia sendo certo que o período experimental era de 90 dias.
Contudo a recorrente, defendendo que à contagem do período
experimental se aplica o art. 279.º al. b) do CCivil, que estabelece
que, “Na contagem de qualquer prazo não se inclui o dia (…) em
que ocorrer o evento a partir do qual o prazo começa a correr”,
afirma que a ré fez cessar o contrato no 90.º dia, ou seja no último
dia do período experimental.
Vejamos os factos.
O autor foi admitido ao serviço da ré no dia 21 de Setembro de
2009, mediante contrato de trabalho verbal e sem termo, para
exercer as funções de motorista de pesados.
Em Outubro de 2009 o A. faltou ao trabalho um dia.
Em 21 de Dezembro de 2009 a R. entregou ao A. a comunicação
da denúncia do contrato de trabalho com base no nº 2 do artº
114º do Código do Trabalho.
Entre 21 de Setembro e 21 de Dezembro decorreram 92 dias (10
dias em Setembro + 31 dias em Outubro + 30 dias em Novembro
+ 21 dias em Dezembro) – tempo de duração do contrato.
Vejamos, então, se o contrato foi denunciado no período
experimental conforme defende a ré/recorrente.
Os art.s 111.º a 114.º do Código do Trabalho na redacção
introduzida pela Lei 7/2009 de 12.02, aplicável ao caso dos autos
dado que a relação laboral se iniciou em Setembro de 2009 e
terminou em Dezembro do mesmo ano, regulam o período
experimental do seguinte modo:
Artigo 111.º
Noção de período experimental
1 — O período experimental corresponde ao tempo inicial de
execução do contrato de trabalho, durante o qual as partes
apreciam o interesse na sua manutenção.
2 — No decurso do período experimental, as partes devem agir de
modo que possam apreciar o interesse na manutenção do contrato
de trabalho.
3 — O período experimental pode ser excluído por acordo escrito
entre as partes.

Artigo 112.º
Duração do período experimental
1 — No contrato de trabalho por tempo indeterminado, o período
experimental tem a seguinte duração:
a) 90 dias para a generalidade dos trabalhadores;
b) 180 dias para os trabalhadores que exerçam cargos de
complexidade técnica, elevado grau de responsabilidade ou que
pressuponham uma especial qualificação, bem como os que
desempenhem funções de confiança;
c) 240 dias para trabalhador que exerça cargo de direcção ou
quadro superior.
2 — No contrato de trabalho a termo, o período experimental tem a
seguinte duração:
a) 30 dias em caso de contrato com duração igual ou superior a seis
meses;
b) 15 dias em caso de contrato a termo certo com duração inferior a
seis meses ou de contrato a termo incerto cuja duração previsível
não ultrapasse aquele limite.
3 — No contrato em comissão de serviço, a existência de período
experimental depende de estipulação expressa no acordo, não
podendo exceder 180 dias.
4 — O período experimental, de acordo com qualquer dos números
anteriores, é reduzido ou excluído, consoante a duração de anterior
contrato a termo para a mesma actividade, ou de trabalho
temporário executado no mesmo posto de trabalho, ou ainda de
contrato de prestação de serviços para o mesmo objecto, com o
mesmo empregador, tenha sido inferior ou igual ou superior à
duração daquele.
5 — A duração do período experimental pode ser reduzida por
instrumento de regulamentação colectiva de trabalho ou por acordo
escrito entre partes.
6 — A antiguidade do trabalhador conta-se desde o início do
período experimental.

Artigo 113.º
Contagem do período experimental
1 — O período experimental conta a partir do início da execução da
prestação do trabalhador, compreendendo acção de formação
determinada pelo empregador, na parte em que não exceda metade
da duração daquele período.
2 — Não são considerados na contagem os dias de falta, ainda que
justificada, de licença, de dispensa ou de suspensão do contrato.

Artigo 114.º
Denúncia do contrato durante o período experimental
1 — Durante o período experimental, salvo acordo escrito em
contrário, qualquer das partes pode denunciar o contrato sem aviso
prévio e invocação de justa causa, nem direito a indemnização.
2 — Tendo o período experimental durado mais de 60 dias, a
denúncia do contrato por parte do empregador depende de aviso
prévio de sete dias.
3 — Tendo o período experimental durado mais de 120 dias, a
denúncia do contrato por parte do empregador depende de aviso
prévio de 15 dias.
4 — O não cumprimento, total ou parcial, do período de aviso
prévio previsto nos n.os 2 e 3 determina o pagamento da retribuição
correspondente ao aviso prévio em falta.

Da noção dada pela lei do que é o período experimental e para


que serve, (corresponde ao tempo inicial de execução do contrato
de trabalho, durante o qual as partes apreciam o interesse na sua
manutenção) não restam dúvidas de que a contagem deste
período se refere à execução do contrato – período em que o
trabalhador exerce a sua actividade, e conta-se “ … a partir do
início da execução da prestação do trabalhador” (art. 113.º n.º 1).
Parece não se conceber que, para efeitos de contagem do período
experimental, o primeiro dia de execução do contrato não conte,
conforme entende a ré.
Se o período experimental se destina a apreciar o interesse na
manutenção do contrato de trabalho, não se vê qualquer
justificação para que se suprima o primeiro dia de trabalho.
Conforme se decidiu no douto Acórdão do Supremo Tribunal de
Justiça de 7 de Outubro de 1999, in CJ/III/202, o vício de
raciocínio da ré está em considerar como “prazo” um “tempo de
execução do contrato”.
Repare-se que a lei, que acima transcrevemos, em parte alguma
refere tratar-se de um “prazo”, referindo, sempre, “período
experimental” que se conta desde o início da execução.
A seguir-se a interpretação defendida pela ré/recorrente, teríamos
de contar a antiguidade do trabalhador a partir do dia seguinte
ao início da execução do contrato e, não, como determina o n.º 6
do art. 112.º ao estabelecer que “A antiguidade do trabalhador
conta-se desde o início do período experimental”(sublinhado nosso)
Permita-se-nos trazer aqui à colação um exemplo que nos parece
elucidativo de que o raciocínio da recorrente não colhe: como se
sabe, o trabalhador tem direito a um período de férias em cada
ano civil. Supondo que o trabalhador tem direito a gozar 22 dias
úteis de férias e que acorda com a entidade empregadora gozar
esse 22 dias úteis desde o início do mês de Julho. Será que a ré
também iniciaria a contagem deste período de férias socorrendo-
se do estabelecido no art. 278.º al. b) do CCivil?
Certamente que não!
Entendemos, assim, não ser aplicável ao período experimental, o
normativo invocado pela ré.
Face a esta conclusão, e tendo em conta que o autor/trabalhador
iniciou a execução do contrato em 21.09.2009, tendo faltado um
dia em Outubro (falta que não é considerada para efeitos do
período experimental), e a ré denunciou o contrato de trabalho
no dia 21.12.2009, fê-lo no 91.º dia do período experimental (10
dias em Setembro + 30 dias em Outubro + 30 dias em Novembro
+ 21 dias em Dezembro) pelo que essa denúncia tem de ser
entendida, tal como foi na sentença, como um despedimento sem
justa causa, com as consequências ali estabelecidas.
Improcedem, deste modo, as conclusões de recurso, sendo de
manter a sentença recorrida, que fez correcta aplicação do direito
aos factos provados, não violando qualquer das normas referidas
pela recorrente.

IV - DECISÃO
Em conformidade com os fundamentos expostos, nega-se
provimento ao recurso e confirma-se inteiramente a sentença
impugnada.
Custas nesta instância pela recorrente

Lisboa, 28 de Setembro de 2011

Natalino Bolas
Albertina Pereira
Leopoldo Soares
Decisão Texto Integral:

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