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Autor:
Fernando Cesar Negrini Minto
Dissertação de Mestrado:
Orientador:
Reginaldo Luiz Nunes Ronconi
SÃO PAULO
2009
FERNANDO CESAR NEGRINI MINTO
SÃO PAULO
2009
AUTORIZO A REPRODUÇÃO E DIVULGAÇÃO TOTAL OU PARCIAL DESTE TRABALHO, POR
QUALQUER MEIO CONVENCIONAL OU ELETRÔNICO, PARA FINS DE ESTUDO E PESQUISA,
DESDE QUE CITADA A FONTE.
E-MAIL: fernandonegrini@usp.br
2009.
223 p. : il.
FAUUSP.
Orientador: Reginaldo Luiz Nunes Ronconi
I.Título
CDU 72:37
SUMÁRIO
AGRADECIMENTOS........................................................................................................................ 4
RESUMO. ....................................................................................................................................... 6
ABSTRACT. ..................................................................................................................................... 7
1. INTRODUÇÃO. ....................................................................................................................... 8
1.1 A Arquitetura em seu contexto. .................................................................................. 14
1.2 Quanto às escolas........................................................................................................ 17
2. ANÁLISE DE ALGUNS PRECEDENTES HISTÓRICOS. .............................................................. 23
2.1 Algumas colocações iniciais: ....................................................................................... 24
2.2 A figura social do arquiteto e suas atribuições ........................................................... 30
3. NO BRASIL. .......................................................................................................................... 59
3.1 Desde o início... ........................................................................................................... 61
4. QUANTO AO PROJETO E A CONSTRUÇÃO. .......................................................................... 69
4.1 Um capítulo à parte..................................................................................................... 72
4.2 O fazer e o pensar e a inteireza dos projetos.............................................................. 76
4.3 Breve reflexão sobre o cenário atual. ......................................................................... 83
4.4 Sobre Escolas de arquitetura: Algumas questões. ...................................................... 87
5. QUESTÕES REFERENTES AOS CANTEIROS DAS ESCOLAS DE ARQUITETURA....................... 95
5.1 Formação e ensino de arquitetura. ............................................................................. 96
5.2 Os canteiros experimentais nas escolas de arquitetura ........................................... 100
5.3 Canteiros experimentais: O que esperar?................................................................. 110
6. CONCLUSÃO (ÕES)............................................................................................................. 121
7. Referências Bibliográficas. ................................................................................................ 124
ANEXOS ..................................................................................................................................... 129
ENTREVISTA: Prof.ª Érica Yukiko Yoshioka– FAUUSP. ............................................................... 135
ENTREVISTA: Prof.ª Anália Amorim – FAUUSP.......................................................................... 149
ENTREVISTA: Eduardo Salmar Nogueira e Taveira – FAUUNIMEP ............................................ 168
ENTREVISTA: Maria Amélia Devitte Ferreira d’Azevedo Leite – PUCCampinas ........................ 188
ENTREVISTA: Yopanan Rebello – UNIVERSIDADE SÃO JUDAS .................................................. 208
AGRADECIMENTOS.
alguns.
Agradeço ao professor Reginaldo Ronconi que, além de ter sido incansável orientador,
Aos professores e amigos, João Marcos Lopes e Érica Yoshioka, pelos conselhos na
Isadora, José Eduardo, Pedro, Paula, Taís e Mário, pela ajuda e pelo companheirismo.
Agradeço aos meus pais e irmã, por sempre permanecerem torcendo e apoiando,
Agradeço à minha querida Laura, por estar ao meu lado, haja o que houver!
O que eu ouço, esqueço
Confúcio
RESUMO.
Pensar e fazer arquitetura são ações concomitantes da criação que tem como resultado
um objeto construído. Este objeto, seja ele perene ou efêmero, se comunica com o ambiente e
traduz os desejos e valores daqueles que o construíram. O autor da obra deve ter o domínio e
a habilidade de executá-la com sucesso, seja nos domínios da significação, seja nos domínios
da concreção.
conhecimentos importantes em cada período da história para que estas manifestações fossem
produção das cidades que segue modelo econômico vigente. Neste processo, os currículos das
canteiro de obras como espaço privilegiado para a apreensão destes conhecimentos. Aponta
para a importância de conhecer a realidade dos canteiros de obra e dos trabalhadores que
operam em ambientes inapropriados, alienantes e que são alvos fáceis para a exploração.
Enfim, o trabalho busca trazer contribuições para a compreensão do ensino de arquitetura que
To think and to make architecture are concomitant actions of the creation that have as a
result a constructed object. This object being either everlasting or ephemeral, it communicates
itself with the environment and translates the desires and values of those who constructed it.
The author of the work must have the domain and the skill to perform it with success, whether
certain culture. The teaching of the discipline has always promoted the transfer of important
knowledge of each period of History for these manifestations to be possible. In the current
moment, the schools of architecture have been operating according to the way of production
of the cities which follow the standing economical model. In this process, the curricula of the
schools abandon the practical experimentation in job sites and concentrate their activities
In this paper, some notes will take to the reflection of the importance of retaking the
capacity of understanding architecture in its fullness, retaking the job sites as a privileged
space for the apprehension of this knowledge. It points to the importance of knowing the
reality of the job sites and of the workers who operate in an inappropriate and alienating
architecture teaching that gives emphasis to the practical experimentation in the formation of
the Architect.
Key words: Experimental Job Sites, Teaching of Architecture, Formation of the Architect
1. INTRODUÇÃO.
canteiro.
projetar. Para que ele conheça com propriedade as contingências inerentes à função
de uma dada arquitetura, basta exercitar o projeto, basta conhecer a sociedade com a
qual está trabalhando e quais os desejos e as demandas daqueles que vão usar tal
Para que o arquiteto, sujeito da ação criativa do projeto, esteja pronto para as
devidas “tomadas de decisão” no projeto, ele deve percorrer um caminho muito bem
trabalhado de maturação e de labor na sua formação. Este caminho deve levá-lo a um
estado de emancipação e equipá-lo com intuição suficiente para que suas obras
fracionamento do trabalho – e também da vida – que faz com que o homem opere,
cada vez mais, partes isoladas das atividades em momentos – tão “específicos e
inteiros” – que não se relacionam com o todo coeso. Afastado dos canteiros de obra, o
profissional vive uma espécie de isolamento nas pranchetas e nas telas de seus
a previsibilidades que, por muitas vezes, acabam por castrar sua capacidade
imaginativa. Quando colocadas frente a frente estas duas questões – o cenário atual
a inércia do hábito para provocar as transformações. Para que o homem assuma uma
postura crítica frente aos problemas e frente à vida, este deve assumir a sua
1
Sérgio Ferro, ao escrever o Programa para Pólo de Ensino Pesquisa e Experimentação da Construção,
considera que “... se a dimensão do projeto constitui hoje um autentico saber fazer (bem visível nas
escalas dos concursos, por exemplo), a construção ainda continua amplamente subestimada na formação
arquitetônica e desacreditada entre os jovens profissionais”. In: FERRO, Sergio. Arquitetura e trabalho
livre. São Paulo: Cosac Naify, 2006. Pág. 222.
materiais, equipamentos moldes e bitolas existentes no mercado. Em resumo, a
Jung quando escreveu2 seu livro “Memórias sonhos e reflexões”, percebeu que,
estava apagada de sua memória que foi sendo despertada pelo exercício. Enquanto
escrevia, sua memória passeava por novas possibilidades que se abriam no ato
daquela criação e aquele contexto lhe provocava novas descobertas. Tratou sua
redação como uma grande surpresa para si mesmo e chegou a afirmar, sobre esta
obra, que “existe no ato da criação alguma coisa de imprevisível que é de antemão
O lugar pode ser uma nova descoberta. O olhar, atento e crítico, para a cidade
a observação e o uso dos espaços públicos são tratados com cada vez mais
ingenuidade. Os habitantes usam a cidade com uma perigosa indiferença, com uma
naturalidade de quem olha sem estar atento “Do mesmo modo que a
2
Na verdade ele não escreveu este livro, mas sim o ditou a Aniela Jaffé em encontros semanais.
3
JUNG, C. J. Memórias, Sonhos e Reflexões. Rio de Janeiro: Ed. Nova Fronteira. 1996.
4
ARANTES, Otília Beatriz Fiori. O lugar da Arquitetura depois dos Modernos. São Paulo: Editora da
Universidade de São Paulo, 2000.
entender os contextos e as experiências proporcionadas por cada situação, por cada
experiência do lugar. Esta é uma das razões que faz da arquitetura algo, por muitas
vezes, única.
Desta forma, o lugar e o programa são algumas das contingências, são as cartas
dadas para o projeto e assim dá-se o tabuleiro para que as “surpresas” aconteçam. Há
construtivo. Todos eles são determinantes para uma resolução adequada que não é
tão somente um impulso imaginativo que decorre do nada, mas sim fruto da
espírito seguro do artista que o torna apto a dar as melhores respostas a tais
de sua formação que se faz possível este percurso emancipado que aguça a percepção
da não inteireza do ser, que faz com que o saber evolua de ingênuo para crítico.
arquiteto, mostrará que o canteiro de obras por muito tempo foi o espaço privilegiado
arquiteto – era atribuída pela constatação de que era capaz de conceber, gestar a
produção e erigir. Ou seja, o arquiteto era reconhecido como tal na medida em que
pudesse realmente projetar e construir alguma coisa, e que ficasse bom. É somente no
conhecer a condição do trabalhador que constrói o que foi projetado. Como afirma o
questão da casa popular” e que esta “não será nunca resolvida se não atingirmos o que
situação dos trabalhadores deve ser conhecida para que se compreenda como
funciona a divisão e a distribuição das forças que operam na construção civil. A partir
5
FERRO, Sergio. Op. Cit.
daí é que o arquiteto pode compreender – como fica explícito na crítica de Sergio
construção.
hoje.
produção que é regido pelo capital financeiro. Neste modelo, a arquitetura assume
uma função que é a de ser espetáculo para se transformar em imagens fortes que
que afirma que “A arquitetura se nos apresenta,..., como uma resposta significativa, ou
6
Para Sérgio Ferro, atualmente nos canteiros de obra há um modo de produção do trabalho que está entre
a industrialização e o trabalho do artesão – a manufatura.
seja, poética, ao problema do habitar, projetando e construindo todo o ambiente físico
Tais modos de produção, não são exclusivos do capital privado. Muitas das
estas representam, na maioria das vezes, um incremento para a cidade que passa a
receber enormes quantidades de turistas e para apreciar estas “jóias”, estas “obras de
arte”.
muito sucintamente abordados neste trabalho (inclusive o fato de que por detrás de
aquela estrutura), mas o que é mais importante para a pesquisa é compreender como
a academia pode estabelecer novas relações com a construção civil tendo como pano
são, muitas vezes, mais importantes que a própria estrutura, beleza ou programa. 8
mais emergenciais e de importância social muito maior do que na época em que este
7
GREGOTTI, Victorio. Território da Arquitetura. (tradução de Berta Waldman-Villá e Joan Villá) São
Paulo: Perspectiva, Ed. Da Universidade de São Paulo, 1975 – Pág. 49
8
“A relação clássica de forma e função expressa na tectônica do objeto arquitetônico parece estar sendo
liquefeita para que a arquitetura possa circular mundialmente com imagem de si mesma”. In: ARANTES.
Pedro Fiori. O Grau Zero da Arquitetura na Era Financeira. In: Novos Estudos. CEBRAP 80. Março
2008. Pág. 195.
imagens sem que se dê conta – muitas vezes – do que é que realmente ele está
para isso é necessário que ele eduque e aguce a sua percepção. Isto significa que o
aprendiz tem, a seu favor, contra esta fumaça que seduz o olhar, a sua intuição. É
valia no processo de sua emancipação dentro deste cenário dominado pelas grandes
arquitetura está nas cidades e isto faz do processo de formação do aluno uma
olhar crítico, desnaturaliza-o e passa a refletir sobre o seu papel real na construção da
do arquiteto-urbanista.
9
Numa entrevista à Revista da Pós da FAUUSP, o arquiteto João Figueiras Lima diz o seguinte: “(...) A
perda da intuição para o ser humano é a destruição de uma bagagem incrível, construída com tanta
dificuldade por tantas gerações, e uma coisa predominante e mais importante para o ensino de arquitetura
deveria ser estimular essa questão da percepção (...)”. in: PÓS – Revista do Programa de Pós Graduação
em Arquitetura e Urbanismo da FAUUSP/ Universidade de São Paulo. Faculdade de Arquitetura e
Urbanismo. Comissão de Pós-Graduação – v.21. São Paulo: FAU, 2007
1.2 Quanto às escolas...
alienados dos afazeres diários da obra, projetos estes que são enviados para que sejam
calculados e que tenham suas estruturas dimensionadas por engenheiros que não
executado por empreiteiras que nem sequer haviam visto o projeto antes de sua
por sua vez, ditam as tendências e programas deste espaço, enquanto o realizador/
operador final destas construções continua alienado e massacrado na base desta ‘linha
de montagem’.
inerentes a uma parte de uma cadeia produtiva na construção das nossas paisagens,
parte importante de sua autonomia. Nesse processo abriu mão, durante a sua
formação, de conhecimentos essenciais para o ofício e criou então uma falsa dicotomia
10
RONCONI, Reginaldo Luis Nunes. Inserção do Canteiro Experimental nas Faculdades de Arquitetura
e Urbanismo. São Paulo, 2002. Tese de Doutorado FAU USP. Pág. 1
Na recente publicação dos “Anais do Seminário Ensino e Arquitetura” – que
ocupar uma maior parte das cargas horárias nos currículos das faculdades. Apóiam-se
continuação deste trecho do artigo escrito pelo professor Minoru Naruto diz o
seguinte:
deve e pode resgatar a vocação original com que foi concebido e implantado nas
11
Grifo do autor, com a intenção de enfatizar a afirmativa que indica o projeto como atividade „distintiva‟
do arquiteto, sem que se mencione a construção.
12
NARUTO, Minoru. O questionamento da disciplinaridade do ateliê como fundamento para a discussão
da formação do arquiteto. In: Seminário Ensino Arquitetura e Urbanismo (2007: São Paulo) – Anais do
Seminário Ensino Arquitetura e Urbanismo/ São Paulo: FAUUSP, 2007. 151pp. Pág.13.
escolas de arquitetura: a preparação para a dimensão prática da arquitetura. Preparar
para a prática significa proporcionar aos alunos a vivência de situações reais desta
Toda a preocupação com a vivência de situações reais desta prática deve ser
traços que ele produz. É importante que ele entenda que cada traço daquele
no aluno uma visão crítica das questões relativas à construção, o arquiteto comenta:
que esse processo afastou o arquiteto do longo caminho entre o projeto e a obra
pronta”.15
13
Grifos do autor.
14
NARUTO, Minoru. Op. cit.
15
RONCONI, Reginaldo... Op. cit.
neste lugar que passa a acontecer – dentro de uma proposta pedagógica que
Porém, para que a síntese seja realmente global, deve haver a participação de
experimentais que existem hoje nas faculdades de arquitetura – além de serem muito
como se no meio das disciplinas houvesse uma ‘atividade paralela’ ou ‘extra’ que é as
experiências de canteiro. O aluno visita este espaço, trabalha um pouco, assenta uns
tijolos, concreta uma viga, acerta algumas vezes, erra outras, sorri, lava as mãos, volta
à aula.
canteiro. Esta deve ser a freqüente relação do aluno com a arquitetura, desenho e
16
Na tese de doutorado do professor Reginaldo Ronconi, existe uma tabulação onde é possível se
conhecer o quadro, na época, das escolas de arquitetura em relação à presença de canteiros experimentais
e das atividades neles desenvolvidas. Hoje em dia não difere muito, embora importantes novos canteiros
tenham sido criados, como é o caso do canteiro da USP em São Carlos, o da Federal de Santa Cactarina e
o daPUC do Rio de Janeiro.
Maria Inês Sugai, professora do Curso de Arquitetura e Urbanismo da
físico das salas de aula e ateliês, como ocorre na maior parte dos cursos de arquitetura
que se alastram pelo país afora – o que reforça uma necessária postura crítica e
reivindicadora”.17
Fica claro que para o sucesso deste trabalho de inserção das atividades de
canteiro no cotidiano dos alunos vai muito além da ação única e exclusiva dos
profissionais que atuam diretamente neste espaço. Este deve, na verdade, ser um
atuar de forma crítica na análise do sucesso (ou insucesso) do seu projeto no momento
da construção; entender como o desenho muitas vezes é responsável por certa dose
17
SUGAI, Maria Inês. O Olhar do Visitador. In: Canteiro Experimental – 10 anos na FAUUSP/
Apresentação de Reginaldo Ronconi. São Paulo, FAUUSP, 2008. Pág. 37.
Para que seja possível entender o momento atual, a atual condição em que se
ARGAN, Giúlio Carlo. Projeto e Destino. São Paulo: Ed. Ática, 2001.
2.1 Algumas colocações iniciais:
desta arte – é reconhecendo que, para cada período, são criadas novas referências e
acompanhá-las.
direcionar a construção no sentido das respostas aos anseios de uma época. Sejam
artista na realização dos seus trabalhos. Como por exemplos a criação de “ordens”,
manuais ou tratados.
como simples suportes, aqueles que indicam um caminho para uma criação coerente
com uma dada realidade. Ou então, podem ser interpretados como instrumentos de
uma contínua institucionalização, seja como summa concreta das experiências práticas
com que a arquitetura seja exatamente aquilo que algum grupo pretende que ela seja.
alguém ou de alguma classe. Estas transformações devem ser muito bem estudadas do
ponto de vista da complexidade das suas influências. Para tanto, o projeto se mune de
o primeiro, sob uma análise crítica das disposições e da eficiência nos processos de
18
GREGOTTI, Victorio.Op. cit.
construção e de criação deste projeto. O segundo, sob a análise do seu significado e de
interpretação dos dados da realidade podem ser executadas com maior eficiência se
feitos com rigor técnico e científico. Para Gregotti, o projeto pode fazer uso da ciência
controle para suas operações no que diz respeito aos resultados cognitivos ou de
significado.
como forma fechada, mas como campo possível, como forma do fenômeno em sua
flexibilidade de seu uso, na contínua contestação de si mesmo, sobre a qual ele cresce
e se afirma”. 19
19
GREGOTTI, Op. Cit.
Mas com todas estas ferramentas, dispositivos e controles, o projeto, como
pronta. O que se faz aqui não é a crítica aos modelos e ferramentas que controlam e
obra pronta.
fazer a arquitetura também deve mudar. Só que esta mudança deve considerar e levar
o que importa na arquitetura é que ela ‘mostre’ muito mais do que ‘seja’. É mais
que devem retornar muito capital para o investidor em forma de valorização de sua
imaterial com a mais tectônica das artes, “... é produzir um valor intangível
20
ARANTES. Pedro Fiori. O Grau Zero ... Op. Cit.
Na análise histórica que se segue, há muitos apontamentos que indicarão que
existiu. A diferença é que antes este tipo de estratégia adotada por líderes políticos
As escolas são hoje o local, por excelência de formação dos arquitetos. É lá que
se preparam os profissionais que serão atores nesta linha de produção dos espaços e
professora Maria Amélia Leite, “Já em sua origem no século XVII, o ensino institucional
econômicas e sociais”.21
Faculdade de arquitetura é aquela que dá o aval para que o profissional possa ou não
21
LEITE, Maria Amélia Devitte Ferreira D‟Azevedo. O Ensino de Tecnologia em Arquitetura e
Urbanismo. – Dissertação de mestrado – FAU USP – São Paulo, 1998. Pág. 01.
Portanto, se há alguma distorção que faz com que os papéis se invertam, se há a
são transferidos em cada um destes momentos é tão somente para mostrar que – na
maioria das vezes – estes modos também estão relacionados a condições sociais da
classe e a relação destes com os donos do poder. Como afirma o arquiteto Pedro
Arantes discorrendo acerca da atual ação do arquiteto que produz para o capital
terra e do capital...” 22
22
ARANTES. Pedro Fiori. O Grau Zero ... Op. cit.
2.2 A figura social do arquiteto e suas atribuições
do Antigo Império Egípcio. Não que não se tenha outros registros em cavernas do sul
cada cartaz, à arte do vale do Nilo de uns cinco mil anos atrás”.23 Em outras palavras,
Aquela região era governada por faraós, uma espécie de imperador divino, “...
reis que eram tão ricos e poderosos que puderam forçar milhares e milhares de
trabalhadores ou escravos a labutar para eles, ano após ano, a cortar pedras nas
construção das grandes pirâmides foi o poder exercido pelos faraós. As principais
posições que – no dizer da professora Maria Amélia Devitte Ferreira D’Azevedo Leite25,
23
GOMBRICH E. H. A história da arte. Rio de Janeiro: Ed. Guanabara Koogan, 1993.
24
GOMBRICH E. H.
25
Arquiteta e pesquisadora do ensino da tecnologia em escolas de arquitetura e urbanismo. A professora
será várias vezes citada neste trabalho por ter sido uma forte referencia na produção desta pesquisa.
em sua dissertação de mestrado – eram “excepcionais no contexto global de sociedade
por terem sido iniciados pelos livros sagrados”. Os arquitetos possuíam um status
esculpida, vinha dos arquitetos.27 Este é um ponto interessante e digno de nota para o
estudo aqui apresentado já que se constata que, desde tão remota data, as ações de
nenhum tipo de separação ou distinção no que diz respeito às suas funções, desde o
Naquela época o arquiteto era algo que só podia ser ‘consumido’ pela elite, mais
uma vez confirmando a assertiva feita no início deste capítulo quando se afirma que a
arquitetura, na história, está intimamente ligada aos donos do poder. No Egito antigo
havia alguns arquitetos estreitamente ligados aos faraós, estes homens eram
26
LEITE, Maria Amélia Devitte Ferreira D‟Azevedo. O Ensino ... Op. Cit.
27
Maria Amélia Leite conta que “O título „supervisor de obras‟, ou ainda, „capataz dos capatazes‟, como
se descreveu a si próprio em sua tumba Ineni, chefe das obras de Karnak, leva ao entendimento de que o
arquiteto no Egito estivesse envolvido também no acompanhamento dos trabalhos de obtenção e
transporte dos materiais, além da concepção e da construção das obras”. in: LEITE. Idem.
escolhidos para a realização de grandes obras públicas. Há registros de alguns
Mas a maioria dos registros acabou se perdendo ou então nunca foram feitos
por questões de segurança. Isto faz com que muito do que poderia se saber sobre
Conhecimentos sagrados, quase ritualísticos “como que passados de pai para filho”.
prática. Outro ponto que se deve prestar atenção, já que, além da atividade
Já numa outra civilização, a da cultura helenística na Grécia, que teve o seu auge
entre os séculos V a.C. e I a.C., a classe dos arquitetos, do ponto de vista social –
embora a sua procedência fosse das classes mais abastadas – não teve o mesmo
destaque que tiveram os iluminados arquitetos egípcios. Por causa disso, também são
escassas as informações sobre os arquitetos da Grécia Antiga. Desta vez, não por
Esta civilização tinha uma concepção de mundo muito mais voltada para a
construções. Criaram, para isso, as chamadas ordens. Estas ordens constituem uma
erigir algo, demonstrando claramente que aquilo faz parte de uma determinada classe,
aquele apontado por Gregotti, mas tão somente uma espécie de acordo comum para o
Com o estabelecimento destas ordens, já era possível saber o que haveria em cada
edifício, qual seu exato programa e qual a disposição ideal das partes deste programa.
Deste modo, sobrava pouco para que o arquiteto projetasse, não havia muitas
decisões ou escolhas de projeto. Sobrava mesmo era muito trabalho para pensar sobre
e teorias afins. Tal como no Egito, na Grécia os conhecimentos práticos também eram
o mestre.
O período de cem anos, entre 500 e 400 a.C., é marcado por um tipo de
representar a própria divindade para que ela pudesse desfrutar com integridade sua
existência após a morte, como era o caso dos egípcios, ou então as artes geravam
28
“Além das atividades administrativas, o arquiteto dirigia integralmente as ações no canteiro –
nivelamento do terreno, instalações de oficinas e depósitos, assentamentos das peças pré-conformadas na
pedreira, polimento, acabamentos – o que significava possuir, entre outros atributos, a capacidade de
comandar um verdadeiro destacamento de artesãos especializados nas diversas artes e ofícios envolvidos
com a construção na época, tais como a decoração escultórica e pintura mural.” In: LEITE, op. Cit.
29
Há alguns indícios sobre a existência de escolas privadas de arquitetura (ou ateliês estruturados para um
ensino de arquitetura) na Grécia, como a que parece ter sido conduzida por Teodoro de Samos em
Esparta, destinadas a promover a formação dos jovens pretendentes com base em monografias e tratados
escritos por arquitetos, os quais continham tanto elementos de teoria – as proporções e propriedades das
Ordens, ornamentos, etc. – quanto questões técnicas de construção.
A partir desta data, a arte passa a ser admirada pelo simples motivo de ser arte,
muito trabalho que era proveniente das ações político-militares, pois elas
deuses sagrados. E também havia os casos nos quais os arquitetos eram contratados
grande número. Há, por exemplo, na história, destaque para a construção de arcos que
construir para que ficassem evidentes os sinais das conquistas. Ou seja, durante este
muito próxima, novamente, dos donos do poder. Esta proximidade fez com que a
arquitetura nesta época fosse considerada, segundo Maria Amélia Leite, uma “arte
importância”.
30
“Embora os artistas ainda fossem olhados como meros artífices e, talvez, desprezados pelos esnobes,
um número crescente de pessoas começou a se interessar pelo trabalho deles como obras de arte e não
apenas por suas funções religiosas ou políticas”. In: GOMBRICH, op. Cit.
No Império Romano viveu um importante profissional da arquitetura – Vitrúvio
(70 – 25 a.C.). Ele escreveu a sua obra “De Architectura” (40 a.C.) na qual deixou
registradas suas orientações, tanto para a condução dos trabalhos de arquitetura para
reflexão sobre a formação do arquiteto, é que nestes livros Vitrúvio registra para o
mestres.31
conhecida como Coliseu, uma obra que mistura as três ordens clássicas num único
edifício cujas arquibancadas eram sustentadas todas sobre uma contínua sucessão de
daquela época. Os construtores daquele período usavam as técnicas que lhes eram
inerentes, tais como a estruturação de uma edificação com arcos, mas também não
tinha problema nenhum em copiar tudo o que lhes agradava na cultura helênica. Era
31
“Aparentemente havia três caminhos para atingir-se o status profissional de arquiteto no Império
Romano: uma carreira privada, constituída preliminarmente de um treinamento nas artes liberais, e
completando com o trabalho junto a um „mestre‟, aos moldes da formação encontrada na Grécia; um
treinamento militar, principiado com rudimentos de engenharia, construção e experiência com artilharia, e
a partir daí evoluindo por promoções a um posto de engenheiro /arquiteto „sênior‟; ou uma ascensão
social, através dos níveis profissionais do serviço civil imperial, sendo esta categoria, a princípio, a única
possibilidade para escrevos libertados”. In: LEITE. Op. Cit.
interessantes para o deleite de alguém. Esta prática funcionou muito bem na pintura e
adoção do uso de arcos32 como recurso para a estruturação de suas edificações, foi
abobadados.
32
“A mais importante característica da arquitetura romana é,..., o uso de arcos... Uma vez dominada essa
arte, o construtor pode utilizá-la para projetos cada vez mais ousados. Pode multiplicar os pilares de uma
ponte ou de um aqueduto, ou até fazer uso desse recurso a fim de construir um teto abobadado”. In:
GOMBRICH. Op. Cit.
Nesta época, a atividade profissional dos construtores funcionava assim: Existiam
grandes grupos de profissionais que concorriam entre si para a execução das obras.
Existia, também, o “collegium” que era uma espécie de sindicato da época, mas que
conhecimentos.
na organização da classe.
um poder no Estado”, fato este que viria a mudar o quadro geral da sociedade e por
Império Romano, é geralmente conhecido pelo nada lisonjeiro epíteto de Idade das
Trevas”.33 Isto porque todas as guerras, invasões, migrações e mudanças faziam com
na “escuridão”. Esta falta de informação e de conhecimento das pessoas fez com que
se perdessem (ou que não se fixassem) os registros e as memórias, e com eles se perde
boa parte da história. Felizmente havia algumas pessoas, homens e mulheres amantes
mosteiros. “Muitas vezes, esses monges cultos e educados, que ocupavam posições de
poder e de influência na corte dos poderosos, tentaram ressuscitar as artes que tanto
33
GOMBRICH. Op. Cit.
admiravam” 34. Graças a eles, algumas coisas se preservaram e se mantiveram. Mas a
grande maioria das obras foi destruída em saques, conseqüência das freqüentes
Naturalmente que, neste novo cenário, o principal ‘cliente’ dos arquitetos passa
a ser a Igreja.
um tratado, escrito em meados do século IV d.C. que fala das habilidades que
era o ‘Mechanikos’, uma espécie de conhecedor geral dos ofícios que se formava, ou
passou a operar suas obras sem o trabalho escravo, diferente de como ocorrera na
34
GOMBRICH. Op. Cit.
Estes profissionais se organizavam num agrupamento ao qual se denominou guildas.35.
Era uma situação social e econômica caracterizada por uma economia de transição e
construção civil contava com trabalhos menos pungentes que na época do Império
“Em resumo, desse período inicial de três séculos, entre os anos 500 e os 800,
A partir de 800 d.C., inicia-se uma nova fase na história da Europa. Depois de
uma maior consolidação das cidades. A Europa começa então a entender e estabelecer
certa estabilidade em seu território. Esta é uma mudança que propicia o aumento na
grandes o suficiente para abrigar um bom número de pessoas, mas simples como
deveriam ser devido aos modos de produção daquele período. Suas coberturas eram
35
“Imagina-se que o „collegium‟ tenha sido mais uma das heranças romanas no período medieval,
originando as guildas ou corporações de ofício como forma de organização profissional… As guildas de
pedreiros e de carpinteiros comparecem no período medieval como aparentemente os espaços principais
de aprendizado da arquitetura, onde os „mais inclinados‟ a esta arte adquiriam conhecimento e o
transmitiam às gerações subseqüentes”. GOMBRICH. Op. cit.
36
LEITE. Op. cit.
37
Para Vitruvio, as basílicas serviam para operações comerciais e atos jurídicos.
Mas neste período de consolidação, as cidades se organizavam e cresciam ao
redor dos mosteiros e abadias. Desta vez, diferente das “basílicas” estes mosteiros
com abóbadas, também de pedra. Uma tecnologia que resultava em uma tipologia
lançando as pedras sobre pedras que formavam uma casca contínua sobre formas de
formação era dentro das próprias corporações. A atenção que se deve ter para com
estes profissionais deste período, é que mais uma vez era fundamental que o arquiteto
soubesse construir.
outro tipo de obras de porte significativo no período pós-milenio D.C., deveria ser
experiente na arte de construir. Sua origem poderia ser uma educação monástica
iniciação nos segredos de ofício, tais como princípios de geometria transmitidos dentro
quando evoluíam para uma nova descoberta tecnológica que evolui para um desenho
problemas até achar uma nova solução, que por sua vez muda o desenho e a lógica
construtiva das construções e assim vai-se alterando paulatinamente, mas sem parar, a
“cara” da arquitetura.
arquitetura Gótica.
38
LEITE. Op. Cit.
Depois de se trocar as pequenas igrejas por igrejas maiores com suas coberturas
na construção das abóbadas com a invenção das nervuras; é a vez dos arquitetos
góticos criarem soluções inteligentíssimas para tornar as construções mais leves, muito
No período denominado como Gótico, o arquiteto, mais uma vez, tem prestígio e
importância, pois, mais uma vez, relaciona-se com a classe dominante. Os arquitetos
passam a ter intensos acordos de trabalho com as abadias e com a igreja em geral para
Neste período, a formação do arquiteto era completa num período de sete anos
(a partir dos quatorze) seguido por mais três anos como operário (para que adquirisse
terminar, o que comprovava que ele estava pronto para assumir a profissão de
arquiteto, era a comprovação de que ele possuía habilidades técnicas. “Para ser
habilidades”.
material era muito caro e a mão-de-obra muito barata, cabia aos arquitetos
39
“... os pilares não eram suficientes para, sozinhos, suportarem a pressão de dentro para fora... Para isso,
os construtores tiveram que introduzir os arcobotantes, os quais completam a armação externa da abóbada
gótica.” In: GOMBRICH. Op. Cit.
40
“Os arcos redondos do estilo românico, ... , eram inadequados aos objetivos dos construtores góticos. A
razão é a seguinte: Se eu quisesse uma altura maior, teria que fazer o arco mais profundo. Nesse caso, a
melhor solução não é ter um arco redondo mas unir dois segmentos de arco. Foi essa a idéia que presidiu
á criação do arco ogival”, idem.
encontrarem soluções interessantes e inteligentes que resultassem em custos finais da
obra. Cabia também aos arquitetos a preparação dos gabaritos, que era executada na
obra. Além disso ele está presente na obra, na sala de traços. Ainda é o arquiteto que
o arquiteto projeta e constrói sem fazer qualquer distinção destas atividades. “... A
dos espaços construídos, contrariando as opiniões que lhe creditam uma dissociação
subseqüente. Na Renascença.
Nos séculos XIV e XV, os italianos consideravam que tudo o que era bom e belo
na arte havia sido criado no período clássico. Os italianos sempre atribuíram aos godos
a culpa pela queda do império Romano, portanto a arte que surge no período
intermediário entre a Idade das Trevas e o período da retomada dos valores clássicos
41
LEITE. Op. cit.
Os tratados técnicos acerca da forma pautam o fazer e o desenho do arquiteto
estudo das proporções clássicas, dos ajustes do ser humano com o espaço e com as
que de maneira similar é tratado com a regularidade presente nas obras de arte e no
projeto de arquitetura.
elementos reguladores. Estes elementos não eram mais simplesmente – ou não eram
tão somente – as Ordens que serviram muito bem aos gregos e aos romanos, estes
ordens – indicavam aos arquitetos que viriam depois deles, como se faz a arquitetura.
anotações que foram escritos neste período, iniciando pelos nomes de seus autores:
raciocínio e a lógica das construções do Império Romano, vai a Roma e produz uma
descrição das ruínas, com desenhos das proporções das construções clássicas e
Alberti – Escreve seu famoso De re aedificatoria. São diretrizes para uma cidade
ideal baseadas nos escritos de Vitrúvio. Nelas, Alberti afirmava que os artífices
encarregados de executar os desenhos do arquiteto, eram apenas ‘instrumentos para
o arquiteto’.
Andréa Palladio – I quattro libri dell’ architectura, Veneza 1570 – Estes quatro
livros, ao invés de levantar informações sobre a antiguidade clássica, era uma memória
de suas próprias obras, sejam suas proporções e desenhos, sejam suas escolhas e
decisões.
Sebastiano Serlio – bolonhês escreve seis livros sobre ordens clássicas, geometria
Philibert de l’Orme (1510 – 1570) – tratadista Frances. Mais uma vez é escrito um
tratado, com inspirações vitruvianas, que visa indicar o papel e a formação da classe
dos arquitetos. Novelles inventions pour bien Batir e Premier tome de l’architecture.
Este período também é marcado pela reativação das trocas comerciais com o
de obras neste período são muito parecidas com as do período medieval. A diferença é
renascença.
dos estudos das obras da antiguidade clássica. Em viagens para Roma e outras cidades
desenho dos ornamentos e formas. Este processo desencadeou uma clara ‘divisão do
trabalho’ na época.
42
“Supõe-se... que Brunelleschi tenha consultado um amigo, o matemático Paolo Toscanelli, sobre os
problemas estáticos resultantes da construção da cúpula da catedral de Sta. Maria Del Fiore... “.in:
LEITE, Op. Cit.
43
“... assim que as cidades ganharam em importância, os artistas, como todos os artesãos e artífices,
organizaram-se em corporações. Estas eram, sob muitos aspectos, semelhantes aos nossos atuais
sindicatos. Competia-lhes zelar pelos direitos e privilégios dos seus membros e assegurar um mercado
para os seus produtos. Para ser admitido numa corporação, o artista tinha que se mostrar capaz de atingir
determinados padrões, que era, de fato, um mestre em seu ofício.” In: GOMBRICH. Op.Cit.
Média, o arquiteto como ‘capomaestro’, conduzia e liderava as diversas equipes de
no próprio canteiro, e por sua efetiva presença física na orientação e mesmo execução
‘designer’, um artista”.44
classe de construtores.
profissionais desta época deixarem claro que eles são artistas liberais. Era uma espécie
de ascensão, uma posição mais elevada. E é por isso que nesta época aparece, pela
Este é um período marcado pela livre apropriação dos elementos usados pelos
44
LEITE, Op. Cit.
45
“A Renascença, particularmente o século XVI, trouxe à cena uma figura profissional até então
desconhecida, a do arquiteto sem a construção, isto é, o arquiteto que tinha no desenho da edificação seu
trabalho principal, sua especialidade. Mais ainda, esta nova conceituação da profissão foi facilmente
absorvida pelos arquitetos pelos motivos já apontados de ascensão social, levando-os a conferir-se-lhes
uma noção de superioridade, de ascendência em relação às categorias profissionais ligadas à construção”.
In: LEITE. Op. Cit.
pilastras, arquitraves, áticos, etc.), porém, sem o preciosismo de se respeitarem as
O fato é que, com a reforma protestante, a igreja católica teve que criar uma
espécie de ‘espetáculo teatral’ com o intuito de ‘conquistar’ seus fiéis como que num
encanto pela magnitude e pela beleza. O nome “barroco”, que significa grotesco, foi
atribuído devido a esta “mistura” interpretada por críticos dos períodos que vieram
depois deste.
sugerido por este tipo de arquitetura que auferia ao edifício certo poder, a dimensão
Foram envolvidos vários arquitetos e vários anos decorreram até que o Rei Louis
Académie Royale d’Architecture, que pode ser considerada como a primeira instituição
império.
depois que estes saíam da academia, quando migravam para os ateliês dos mestres da
obras reais e – como manda o figurino – estas deveriam dar significado e dimensão ao
poder real. Não muito diferente do período atual, os arquitetos eram treinados para
produzir imagens que dissessem mais do que a própria construção. Eram treinados
O século XVIII é descrito por Maria Amélia Leite como sendo um século de
“produção de um certo tipo de massa crítica”, um período que está entre o modo de
XIX.
46
“... não é surpreendente que constituída a Académie, logo em seu primeiro ano de funcionamento
viesse a tornar-se o principal tópico de discussão „a definição de beleza em Arquitetura‟. A seguir, sempre
com base em discussões de problemas específicos e em um aprendizado abstrato de princípios de projeto,
o aluno estudava „as Ordens Romanas, obras de arquitetos famosos do passado e do presente, as
edificações reais e tratados de Arquitetura.”. in: LEITE. Op. Cit.
47
“... os engenheiros progressivamente foram afirmando-se como os responsáveis pela produção dos
ambientes construídos, apoiados por um discurso ideológico de utilidade, necessidade de mudança,
conquista da natureza, progresso social e exclusividade do saber técnico, acabando por ocupar um espaço
profissional antes exclusivo dos arquitetos”. idem.
arquitetura e de construção que era praticado. Somente após esta data, é que
pela prática. O ensino vai se tornando cada vez mais matemático e comprovado
que a viabilidade da mesma, desde então fica passível de ser certificada e comprovada
prematura.
No século XIX surge uma nova sociedade e com ela novas carências e novas
se fazer as construções e fica impossível de se ter o domínio total dos processos. Cada
materiais necessários para a construção. Por isso a “(...) manualística oitocentista tem
48
“... O modelo de ensino instituído pela Académie Royale d’Architecture permaneceu o único
relacionado à Arquitetura, e de certa forma à construção de edificações até meados do século XVIII
quando foram criadas as primeiras escolas de engenharia na França: École de Ponts et Chaussées em
1747. École Du Génie de Mezières em 1748, École des Mines em 1783; e a École Polytechnique em
1794. As três primeiras eram subordinadas a um ensino bem prático... “ in: LEITE, Op. Cit.
afrontar o problema das novas tipologias (dos mercados aos teatros, às grandes
exposições, aos edifícios públicos) e o domínio das técnicas construtivas (...) Tanto a
Não existem tratados de beleza, proporção ou forma. Nas palavras de Gregotti, “(...)
uma livre escolha entre os modelos da história”. No final do século XIX, a solução para
49
GREGOTTI. Op. cit.
experimentar novas possibilidades, com novos materiais. Foi o que aconteceu quando
inexorável de transposição de uma ação técnica para uma ação tecnológica sobre o ato
de construir”.50
A partir dos anos 1900, com o surgimento de uma nova ordem mundial e de uma
arte se força a dar as respostas ou, pelo menos, a propor manifestações que intentam
a reelaboração das estruturas sociais. “Entre 1910 e 1930, a cultura dos arquitetos
50
LEITE. Op. cit..
51
GREGOTTI, Op. cit.
“A relação inusitada do homem com um meio-ambiente mecanizado não poderia
estipulado para o ensino institucional da Arquitetura a partir do século XVII até o início
do século XX, é que apesar das heranças das práticas anteriores de aprendizado em
época seja nos cursos de Beaux-Arts, seja nos politécnicos, permanecem afastados do
situação na qual se encontrava a sociedade e propõe uma reforma. Para ele, a beleza e
riqueza das coisas estavam em seu modo de produção espontâneo e criativo. Alegava
que o atual modo de produção, com o uso das máquinas, alienava e desconsiderava o
trabalhador.
52
LEITE, op. cit.
53
Idem.
54
Idem.
Seu aluno, Willian Morris inicia um movimento de produção manufaturada e
alunos tinham que ser “autocriativos” e não podiam somente “reproduzir modelos”.
época.
Arts and Crafts é notadamente uma renovação sábia que soube aproveitar todas
ponto de vista social, foi capaz de revalorizar o trabalhador que não necessitava mais
que os valores de troca aos produtos da época. Uma das grandes bandeiras dos
movimentos de renovação cultural seguia o lema de “criar uma cultura do povo e para
o povo”.
55
“... Seguindo o modelo inglês, por toda a Alemanha proliferava a criação de pequenas oficinas privadas
que fabricavam utensílios domésticos, mobiliário, têxteis e objetos em metal. Uma das mais importantes
foi a Dresdner Werkstätten für Handwerkskunst, que posteriormente associado às Münchner Werkstätten
criaram a Deutsche Werkstätten. Mas enquanto as oficinas Arts and Crafts inglesas tinham recusado a
produção mecanizada, na Alemanha, defendia-se incondicionalmente este modo de produção”. In:
DROSTE, Magdalena. Bauhaus – 1919 – 1933. Publicado pela Bauhaus-Archiv Museum für Gestaltung.
Berlin, 1994. Pág. 11.
“A pré-história da Bauhaus remonta ao séc. XIX. Ela inicia-se com as
Do ponto de vista que mais interessa a este trabalho, a pedagogia destas escolas
”artesanato”. Além disso, é importante ressaltar que, numa espécie de contra resposta
oficinas de aprendizagem.
classe e artistas que se adequassem às novas realidades. Quando aventado para ser o
novo diretor da Escola de Artes e Ofícios, Walter Gropius declarou: “Vamos criar juntos
a nova estrutura do futuro que será tudo numa única forma. Arquitetura, pintura e
escultura.” 57
Weimar em 1919, baseada no ideal expresso por Gropius de uma academia única de
56
DROSTE, Op. Cit.
57
idem.
58
LEITE. Op. cit.
“Mas a Bauhaus queria ser mais do que a fusão de uma academia com uma
escola de artes e ofícios: a sua formação foi, pelo contrário, dominada pelo objectivo
O que fica muito nítido nesta breve descrição, é o fato de que a figura do
arquiteto sempre esteve ligada aos donos do poder. O seu “status” muda, mas a
ligação sempre existe. No Egito e na Grécia, vem das Classes ricas, no Império Romano,
vem das classes mais baixas (“embora com amplas oportunidades para ascender
socialmente por seu desempenho” afirma Maria Amélia Leite) o período medieval se
mistura com o povo das artes mecânicas. Na Renascença, auxilia a profissão a se tornar
para produzir edificações que denotem o poder e a influência política dos governantes
competiam contra a Reforma), no século XIX, junto aos engenheiros, estão ocupados
uma vez, para compor uma cadeia produtiva do espaço que é gerido pelo capital,
delas mesmas.
59
DROSTE. Op. cit.
3. NO BRASIL.
Conhecendo um pouco dos contextos históricos mundiais nos quais esteve
De maneira sucinta, neste capítulo, foram colhidas algumas informações históricas que
relatam desde a vinda dos colonizadores até os dias atuais. Neste processo, houve
deram lugar para as industriais e comerciais. O que é importante é saber que durante
estas manifestações e entendê-las a fim de, revisitando suas intenções – seja possível
desenhar um quadro ideal para o momento atual. Lembrando que todo este resgate
arquitetura e urbanismo.
3.1 Desde o início...
Sagres”, que tinha como objetivo formar homens com conhecimentos suficientes em
Estas escolas formaram homens que em seus barcos viajam pelo mundo à procura de
Pode-se dizer que estas são as escolas que inspiraram a formação dos primeiros
construtores do Brasil.
medida de proteção e para que fosse possível a extração das riquezas. A ocupação das
“... Vieram no século XVI e nos seguintes, da península à terra dos brasilienses –
especiarias – bastantes homens de rija têmpera, tão rija que somente dela tinham
invasões) nesta época era crescente, a decisão foi pela formação da classe de
qual se tem noticia ter sido o primeiro ensino da arquitetura civil no Brasil. Em 1795
60
RIOS, Adolfo Morales de los. Evolução do Ensino da Engenharia e da Arquitetura no Brasil. In:
ASBEA – Sobre a História do ensino da Arquitetura no Brasil. São Paulo: Associação Brasileira de
Escolas de Arquitetura, 1977. Pág. 10
Foram várias as reformas ocorridas até então para a melhoria na transferência
dos conhecimentos destas escolas. Porém, estas mudanças sempre tiveram o foco
Brasil e, como conseqüência, instala-se aqui a Missão Artística Francesa, em 1816. Esta
missão foi uma ação política que visava formar profissionais aptos a criar obras com
requinte da nobreza.
momento da história já passa a ser denominada Escola Nacional de Belas Artes. Neste
curso, preservou-se muito do que até então havia sido o ensino da arquitetura no
Depois desta escola, outras foram inauguradas, entre elas, na Escola Politécnica
ensino que vinham desde as origens das Escolas e com o tempo foram sendo
Motta – assim como Adolfo Morales de los Rios, como João Baptista Vilanova Artigas,
assim como o próprio Lúcio Costa, entre outros –, divide o ensino da arquitetura e do
urbanismo em duas claras correntes: Politécnica de São Paulo e Belas Artes no Rio de
Janeiro62. Em seu texto, MOTTA escreve: “O exame das condições históricas, mostra
uma originária da Escola Nacional de Belas Artes (antiga Academia Imperial), no Rio de
urbanismo instituídos pela missão francesa, enquanto a “inovação ficou por conta de
61
A criação destas faculdades pioneiras de arquitetura data da década de 40. Porém, já em 1930 foi criada
a Escola de Arquitetura de Belo Horizonte, compondo o grupo as 4 faculdades pioneiras de arquitetura
62
Também a professora Maria Amélia Leite se posiciona sobre o assunto: ”... é possível se compreender
o processo de implantação do ensino de arquitetura no Brasil como uma derivação direta da prática do
ensino de Arquitetura e Engenharia no século XIX na Europa, o qual se caracterizava por uma partição
principal entre o sistema “Beaux-arts” e o sistema “Politécnico” – grandes matizes de influência francesa
– e o ensino dos Liceus de Artes e Ofícios, considerado como uma prática de instituições marginais”. In:
LEITE. Op. Cit.
63
MOTTA, Flávio L. Subsídios para Relatório sobre ensino de Arquitetura UIA – UNESCO 1974. In:
ASBEA – Sobre a História do ensino da Arquitetura no Brasil. São Paulo: Associação Brasileira de
Escolas de Arquitetura, 1977.
São Paulo”, cujas escolas reformaram as linhas pedagógicas mudando a maneira de se
ambas. A Escola Nacional de Belas Artes traz como característica principal o traço
originário da Missão Francesa que, por sua vez, manifesta os princípios e ações
praticadas na Beaux Arts de Paris. Enquanto que na politécnica de São Paulo, a palavra
numa linha de produção que responde a uma cada vez mais crescente demanda
habitacional.
técnica esta que vinha se aprimorando nas escolas que se instalaram no país em
artístico e fabril. A instalação dos Liceus de Artes e Ofícios (Rio de Janeiro, São Paulo,
Flávio Motta considera que no momento em que houve a guinada dos meios de
arquitetura e urbanismo da USP, fundada em 1948 que se fez este novo arranjo.
64
MOTTA. Op. cit.
campo de trabalho, sem anular as áreas de interesse recíproco, necessárias a uma
traga a noção de ser social transformador das coisas da natureza em prol de um bem
propriamente ditos.
Numa descrição feita por Reginaldo Ronconi é dada a ênfase nas práticas
econômicos vigentes em cada época. Sobre as reformas ocorridas nos cursos entre as
Escolas de Engenharia. (...) Nesse movimento pela autonomia vão sendo criadas mais
65
MOTTA, Op. cit.
escolas, e lentamente, vai se instalando um setor mais organizado para o estudo e
São Paulo.” 66
princípio a expansão das universidades no Brasil67, sem que este processo gerasse
66
RONCONI, Reginaldo Luis Nunes. Inserção do Canteiro Experimental nas Faculdades de Arquitetura
e Urbanismo. São Paulo, 2002. Tese de Doutorado FAU USP. Pág. 5
67
O autor também indica como nota a lei n° 5.540 de Novembro de 1969.
68
Quanto a este assunto, manifesta-se o arquiteto João Figueiras Lima em entrevista concedida ao autor
em 2007 “(...) toda formação, do doutorado ou do mestrado, proporcionam essa oportunidade de você
desenvolver uma determinada tese, em uma determinada área, é importante. Mas a formação é
fundamental, não adianta ter uma formação complementar de mestrado ou doutorado, se você não tiver
uma formação sólida e isso, no Brasil, infelizmente está sendo muito desvalorizado no momento,
principalmente com a proliferação de faculdades de arquitetura, às vezes muito mal aparelhadas e sem
uma consciência crítica dos problemas envolvidos (...)”. PÓS – Revista do Programa de Pós Graduação
em Arquitetura e Urbanismo da FAUUSP/ Universidade de São Paulo. Faculdade de Arquitetura e
Urbanismo. Comissão de Pós-Graduação – v.21. São Paulo: FAU, 2007.
No decorrer dos anos as leis vão se tornando mais flexíveis e aos poucos vão
Centros Universitários.
Brasil é comentada por Lelé em entrevista concedida a revista PÓS: “(...) toda
ou doutorado, se você não tiver uma formação sólida e isso, no Brasil, infelizmente
69
Entrevista: João Figueiras Lima in: PÓS – Revista do Programa de Pós Graduação em Arquitetura e
Urbanismo da FAUUSP/ Universidade de São Paulo. Faculdade de Arquitetura e Urbanismo. Comissão
de Pós-Graduação – v.21. São Paulo: FAU, 2007
4. QUANTO AO PROJETO E A CONSTRUÇÃO.
As formas de produção da arquitetura, na história, mudam e se transformam,
distintas guildas, na execução criativa de seus trabalhos, houve tempos em que todos
momento presente. Para iniciar uma análise que possa criar base para este
encontra entre aquele sistema cujos trabalhadores são artesãos e criam seus trabalhos
do início ao fim – com o domínio completo das operações –, e aquele suposto sistema
máquinas são fundamentais para a realização das operações. Para ele, os canteiros de
arquiteto como produtor de uma fase do trabalho – que é o projeto. Este, o arquiteto,
espaço, até o término do projeto, até o término da obra. O trabalho do arquiteto fica
Ainda: grande parte dos arquitetos ignora o tamanho do prejuízo que significa a
dos projetos, bem como desconhecem o benefício de uma produção mais coletiva, da
obras.70
70
Quanto a esta caracterização do papel do arquiteto, Sergio Ferro escreve: “A mediação conflitante dos
negócios, no caso da manufatura, é responsável pela inércia das forças produtivas, pela conduta
estereotipada, pelo know-how imutável, e pela exploração violenta da força de trabalho. O arquiteto tem
tendência a atribuir a responsabilidade a fatores secundários, na medida em que leis irracionais ou quase
obscuras existentes, sob o ritmo cego de operações concretas, tornam-no incapaz, muitas vezes, de
detectar com clareza os disfarces do poder que domina. Quase sempre favorável à técnica em abstrato,
seu discurso não é suficiente para esconder um desconhecimento e um desprezo pela prática – o que é
reforçado objetivamente pelas formas muitas vezes obtusas das técnicas aplicadas, vítimas também da
mesma tirania. Uma falsa dicotomia se estabelece e desabrocha entre a arte e a técnica. A arquitetura,
então, faz sobressair exageradamente seus traços irracionais (a opção plástica, a escolha que vai além do
conhecimento possível) por uma espécie de vingança ou compensação; transfigura assim os seus traços
numa irracionalidade regressiva. Esta hipótese afasta a técnica ainda mais da arquitetura e reforça uma
batalha deslocada, enquanto a verdadeira causa se mantém imune”.
4.1 Um capítulo à parte
Para a compreensão de parte das dificuldades em se tratar as questões
que se fez uma severa crítica à produção arquitetônica e à forma que esta produção
tomara, diferente daquela imaginada nas décadas de 20 e 30. Esta crítica é muito
universidade.
trabalho dos profissionais. Antes dela, os artesãos que trabalhavam nas obras
com as diretrizes do projeto do arquiteto. Cada um era o criador em seu ofício. Como
cobertura, o responsável pelas escadas, idem, e assim por diante numa relação que – a
partir do movimento moderno – passa a ser mediada por desenhos técnicos. Deste
Para Artigas, a grande revolução que ocorre nos canteiros de obras no Brasil
moderno, é justamente esta transferência da capacidade criativa que sai do poder dos
artesãos e passa para a mão dos arquitetos. Porém estes, a partir de então, passam a
iniciaram com o artigo que foi publicado em 1966 na revista Teoria e Prática, n°172, era
que estaria comprometida com os interesses coletivos. Nos textos produzidos pelo
social.
desigual e combinado”;
produção dos arquitetos daquela geração73. Caracteriza a produção como sendo ela
circunscrito numa malha de ações que se retro alimentava. Sérgio atribui esta falta de
71
Grupo de arquitetos formado por Sérgio Ferro, Flávio Império e Rodrigo Lefèvre.
72
O artigo também tinha o mesmo nome: “Arquitetura Nova”
73
“... as propostas anteriores que caracterizavam a arquitetura brasileira, feitas para um desenvolvimento
que parecia provável, são retomadas com ênfase exagerada decorrente da consciência de sua
impraticabilidade presente e do desaparecimento de suas tênues bases efetivas, desaparecimento selado
pelo truncamento irracional do nosso lento processo social”. In FERRO, Op. Cit.
significado à distância da possibilidade de transformação. Para ele, os sinais são
mercado cultural fez com que aquilo que era um conhecimento coletivo se tornasse
examinamos”.74
atual condição do mercado da construção civil no Brasil. Com este texto, anotações de
aulas que ministrava na FAU USP. O texto descreve as características e os efeitos dos
processos e dos meios de produção da casa feita para a classe média no Brasil. Sua
da construção civil. A análise final da casa produzida em grande escala pela indústria
construção e que tem importante valor de uso, porém baixíssimo valor de troca.
74
FERRO, Sergio. Arquitetura e trabalho livre. São Paulo: Cosac Naify, 2006.
Posteriormente o texto se volta para a caracterização da produção das casas burguesas
que são uma espécie de alta-costura da construção civil, usadas com parcimônia (para
que não seja depreciada), e possuem altíssimo valor de troca (por isso mesmo a
preocupação e o zelo pelo patrimônio). Por último é que se faz a análise da casa de
classe média que é aquela realmente produzida pela indústria da construção e que é
mão de obra, onera o proprietário e diminui a taxa de mais valia. Daí a importância em
sociais. Os arquitetos que vinham tratando estas questões em sua produção foram
calados e inibidos durante a ditadura militar. Este recuo provocou os arquitetos deste
separação resultante do desenho e das novas atribuições que este desenho passa a ter
Trocando em miúdos...
há a “satisfação de desejo”.
Cada uma destas artes tem um tempo ou uma “distância” entre o desejo (a
instâncias podem ser desde simultâneas, como é o caso de algumas criações musicais,
dificultador quando o desejo da concreção da obra vem dos donos do capital cuja
necessitava crescer rápido, num tempo em que foi necessária uma enorme quantidade
centros urbanos, o que se esperava da arquitetura era rapidez para que se tivesse uma
resposta ágil aos investimentos feitos em tais estruturas. O dinheiro empregado tinha
recebem a arquitetura pronta para ser calculada. Desde então, não há – na maioria dos
projetos que opera como parte de uma ‘linha de produção do espaço’ desconsidera
75
GREGOTTI, Victorio. Território da Arquitetura. (tradução de Berta Waldman-Villá e Joan Villá) São
Paulo: Perspectiva, Ed. Da Universidade de São Paulo, 1975. - Pág. 12
Na tese do arquiteto Luís Saia, apresentada ao concurso para provimento da
arquitetônico.
arquiteto e de seu envolvimento completo para o sucesso da obra. Num percurso que
parte do macro (tese) para o micro (elementos que constituem o programa), Saia
descreve todo o complexo caminho que precede (ou que forma, compõe) o fenômeno
entes ao qual se está sujeito. Apresenta e discorre acerca dos componentes da criação
na arquitetura e suas relações entre si e com o produto final, a obra pronta. Sempre
necessárias de uma e de outra criando uma grande trama onde “tudo se completa e
dissertação que define este processo como simultâneo e irreversível onde "... tudo
todo.”. O autor afirma ainda que a tese seja uma “forma abstrata de inteligência” e
que sozinha não se basta para assumir o papel de entidade de arquitetura, para tanto,
deve assumir uma ligação intrínseca e particular com o objeto, algo que seja próprio
Para que o arquiteto conheça o todo e o detalhe, numa obra onde tudo se
fases do processo.
É evidente, então, a importância no trabalho do arquiteto durante o projeto e
para a construção da obra. Mas há que se entender aqui o papel do projeto e o papel
deixa de ser uma ferramenta para ser o produto final. Nas palavras de Gregotti: “..., no
certas conotações a tal ponto complexas e precisas que acabaram por se converter
numa operação (ou melhor, numa fase de operação arquitetônica) dotada de uma
assim que esta atividade corresponde de qualquer modo a uma precisa função
Esta afirmação provoca a reflexão das contradições que existem entre algumas
construída é que o projeto ainda não é objeto da ação, mas o mediador, o que está
76
GREGOTTI, Victorio. Território da Arquitetura... Op. cit.
entre. O projeto é tão somente uma somatória de símbolos técnicos que podem
transferir para o executor, informações que se tornarão ações e que por fim
O fato é que o projeto – e o arquiteto – está cada vez mais isolado em relação à
concreção e à obra pronta. O projeto, que por muitas vezes é o produto final do
trabalho do arquiteto, virou algo que não é mais os apontamentos necessários para
que ele com a equipe de trabalhadores e artesãos construam a obra aos moldes de
divididas que dita para o executor como deve ser cada operação. A figura do arquiteto
se distancia da obra e fica cada vez mais ligada a imagem do arquiteto de escritório
que se preocupa com minúcias e nuances das indicações de seu projeto. Algo diferente
do que esperava Artigas ao declarar que “... arquitetura é obra feita. O arquiteto devia
ser o homem que construísse a sua própria obra, se possível com suas próprias mãos,
77
ARTIGAS, João Baptista Vilanova. Caminhos da arquitetura; organização José Tavares Correia de
Lira, Rosa Artigas. São Paulo: Cosac Naify, 2004. Pág. 205
‘fragmenta’ e se ‘divide’, ficando o profissional à deriva de suas intelecções de
atelier. Quando o arquiteto constrói, ele intui e trabalha outras intelecções e junções.78
em ato que acontece junto com o pensar do projeto: “Fazer com as próprias mãos o
que pensava, e ao fazer, instruir o pensar (...) ‘o momento do fazer, tanto na pintura
arquitetura não é bem assim: o desenho surge como mediação entre o pensamento do
arquiteto e o fazer do operário, pois há uma cisão que impede a contigüidade entre o
fazer e o pensar...”.79
obra. Mas o que se espera é o domínio destas linguagens e destas tecnologias por
de tais obras, espera-se – já que a arquitetura se difere das outras artes pela grande
78
Em seu texto “Programa para o Polo de Ensino, Pesquisa e Experimentação da Construção”, Sérgio
Ferro defende a necessidade da não disjunção das operações de praticar e pensar: “Hegel, Leroi-
Ghourhan, Prouvé e muitos outros insistiram na estrita imbricação que liga fazer e conceber, praticar e
pensar, experimentar e antecipar. Hoje, essa idéia é conhecida, aceita e preconizada em toda parte... O
saber teórico e a simulação, certamente indispensáveis, são, entretanto, insuficientes para alimentar,
apoiar e inspirar a criação. A qualidade pensada do edifício é indissociável de sua qualidade realizada e,
necessariamente, nessa área, a compreensão do conceito parece também da compreensão do fazer”.
79
ARANTES, Pedro Fiori. Arquitetura Nova: Sergio Ferro, Flávio Império, e Rodrigo Lefèvre, de
Artigas aos mutirões – São Paulo: Ed. 34, 2002. Pág. 53
arquitetura possa operar em conjunto, usando os desenhos como elemento de
momento histórico.
dos Faraós; na Grécia Antiga, os templos sagrados; no Império Romano, foi a vez das
pelo capital industrial – até chegar na época atual quando a arquitetura favorece a
Antes de continuar com o texto, cabe aqui a reflexão sobre algumas categorias.
que o objeto nos diz). “É, portanto, a partir da figura que podemos descobrir o sentido
80
ARANTES, Otília Beatriz Fiori. O lugar da Arquitetura depois dos Modernos. São Paulo: Editora da
Universidade de São Paulo, 2000.
constitutivos, de sua proposta” 81. Isolando este aspecto fundamental da projetação (o
arquiteto na operação da produção do objeto arquitetônico, nunca muda, seja qual for
Em outras palavras, pode-se afirmar que a relação entre as partes de uma obra
sociedade.
do capital.
necessidade de fazer da obra apta a desenvolver seu papel midiático, contrastam com
81
GREGOTTI, Victorio. Território da Arquitetura. (tradução de Berta Waldman-Villá e Joan Villá) São
Paulo: Perspectiva, Ed. Da Universidade de São Paulo, 1975 - Pág. 28
formas como garantia de uma renda de monopólio. Ou seja, a produção da arquitetura
se basta, ou se garante, tão somente na produção de uma imagem exclusiva e que não
tende agora a uma incrível exposição de formas inusitadas que – porque novas e
Não se vê mais a arquitetura, pois esta está diluída em pacotes de miragens produzias
para se estabelecer relações diretas com marcas. Numa frase encontrada na obra de
superfície”.83
que a obra enquanto significado traduz não só a intenção final, mas também culturas
82
“... Os arquitetos da era financeira, ao contrário dos modernos, não procuram soluções universalistas,
para serem reproduzidas em grande escala – o que anularia o potencial de renda monopolista da
mercadoria. O objetivo é a produção da exclusividade, da obra única, associada às grifes dos projetistas e
de seus patronos. O sucesso estrondoso de algumas obras e seus arquitetos, contudo, acaba estimulando a
repetição das mesmas formulas projetuais, reduzindo a cada “duplicação” de volumetrias similares sua
competência em gerar “rendas de exclusividades”. A arquitetura de marca tem assim, um limite comercial
que a obriga a adotar soluções inusitadas e sempre mais chamativas: se diversas cidades almejarem uma
obra de Frank Gehry, por exemplo, perderão progressivamente a capacidade e capturar riquezas por meio
de projetos desse tipo.”in: ARANTES, Pedro Fiori. “O grau zero...”. Op. cit.
83
ARANTES, Otília Beatriz Fiori. O lugar da Arquitetura depois dos Modernos... Op. cit.
Para que a imagem criada pela obra arquitetônica seja forte, precisa ser inédita,
não seriada, não repetível. Para isso, a arquitetura de ponta busca, nas suas criações, o
“limite físico” dos materiais para a concreção de formas inusitadas e novas. Procura-se
o limite da técnica e dos materiais sem qualquer tipo de restrição. A questão que surge
aqui é saber como devem ser os canteiros de obra nos quais se opera esta tecnologia
de ponta, donde se extrai tamanha solicitação material e física, onde tudo é novo e
inventado... Uma das questões principais é ainda a questão das relações de trabalho
construção civil. Segundo Sérgio Ferro, mesmo com toda a tecnologia empregada a
mais valia nos canteiros. A arquitetura de ponta contribui para que se apaguem as
marcas do trabalho já que o que se vê são as “peles” e não as estruturas. A visão que
construtiva.
Com toda esta distorção das reais funções da arquitetura, ou, melhor dizendo,
Nessa lógica, o arquiteto pode ser visto como mais um elemento duma cadeia
dinheiro. Por uma renda daquela marca – que por exclusiva – é monopolizada.
4.4 Sobre Escolas de arquitetura: Algumas questões.
muitas vezes ‘cuspe e giz, e a prática de projeto se resume a desenhar papel. Qualquer
possuem os títulos e periódicos essenciais e muitas vezes nem mesmo aqueles que são
computadores...” 84
O quadro descrito é fruto de uma linha histórica marcada por um ensino que
escolas (a maioria dela instaladas no sul e sudeste do país) sem o respectivo acúmulo
no canteiro de obras, no contato com o real. O arquiteto convivia com seus mestres e
até a obra, o estoque, conhecia os valores de cada um e o trabalho que se tinha para a
84
CEAU- Comissão de Especialistas de Ensino de Arquitetura e Urbanismo. Amorim, L. M. E.; Claro,
A.; Meira, M. E.; Silveira, R. P. G. Ensino de Arquitetura e Urbanismo, Condições & Diretrizes. Brasília:
SESu/MEC, 1994.
extração, e por isso mesmo percebia a necessidade de se adotar uma ou outra técnica
de fato “um arquiteto” acontecia quando ele era capaz de conceber, conduzir a
necessário que se faça uma reavaliação destas instituições. E para uma reformulação
escolas de arquitetura por estados. Não por acaso os números revelam uma maior
concentração de escolas no estado de São Paulo – com números menores, porém com
Paraná e Rio de Janeiro. Mesmo com uma considerada massa de pessoas ocupando as
85
Este trabalho, datado de 2002, traz o número fornecido pelo Ministério da Educação e cultura de 2001
que contava 130 escolas de arquitetura no Brasil.
áreas urbanas, ainda assim existem estados com insuficientes números de escolas de
arquitetura.
Mais do que simples números, estes dados são a constatação da relação direta
estados com mais obras, proporcionalmente. É digno de nota que numa escala
mas não muita qualidade. A questão é que os números podem enganar um pouco.
e posteriormente, cruzando estes dados com a relação entre escolas públicas e escolas
exercem a arquitetura.
Muitas das escolas particulares de arquitetura fazem parte de grupos
empresarias de ensino que desejam aproveitar este filão para comercializar o seu
pela pesquisadora, ainda em fase de mestrado, pode-se observar que “em pelo menos
metade dos currículos analisados não havia menção explícita de tais recursos
didáticos. Por outro lado, nos currículos onde constavam referências a ‘aulas de
Este quadro problemático mostra que a maioria das escolas não possui o mínimo
86
LEITE, Maria Amélia Devitte Ferreira D‟Azevedo. A aprendizagem tecnológica do arquiteto. – Tese
de doutorado – FAU USP – São Paulo, 2005. Pág. 14
se espera é que as escolas tenham um mínimo de aparato em suas instalações para
sensibilização que partisse dos próprios arquitetos. Para ele “(...) Seria muito
qualidade dessas escolas e seus compromissos com a sociedade, pois o país, ao abrigar
questões do desenvolvimento social, já que parte dessa resposta deverá ser construída
87
RONCONI. Op. cit.. Pág. 17
tecnológica do arquiteto são certamente considerações que abonam a discussão
projetista que está distante da construção, faz com que se crie um isolamento invisível
Para ela, a fragmentação dos conceitos e princípios adquiridos nas aulas de estruturas
disciplinas. Mesmo que estas interfaces sejam todas estabelecidas com sucesso, ainda
assim há uma cisão que divide as “aulas teóricas” das “aulas de canteiro”. Esta
dissociação é muito perigosa, pois cria a imagem errada de uma disjunção entre as
duas atividades, sendo que, como já se viu, o fazer e o pensar devem ocorrer juntos,
como que numa espécie de jogo. O projeto e a obra são comprovações um do outro.89
88
Estes parágrafos se referem aos apontamentos contidos em: LEITE, Maria Amélia Devitte Ferreira
D‟Azevedo. A aprendizagem tecnológica do arquiteto. – Tese de doutorado – FAU USP – São Paulo,
2005.
89
Paulo Freire aponta diversas vezes a necessidade da relação dialógica entre a prática e a teoria, e chega
a afirmar que: “A reflexão crítica sobre a prática se torna uma exigência da relação Teoria/Prática sem a
qual a teoria pode ir virando blábláblá e a prática, ativismo”.
90
Seminário Ensino Arquitetura e Urbanismo (2007: São Paulo) – Anais do Seminário Ensino
Arquitetura e Urbanismo/ São Paulo: FAUUSP, 2007. 151pp.
didático-pedagógico para o aprendizado da tecnologia. Em vários dos artigos se fala
em teoria e prática, mas curiosamente esta teoria e prática para nas paredes dos
Maria Amélia, em seu texto, expressa ainda uma queixa que tem como
outubro de 2002. Sua queixa é de que foram priorizadas as preocupações com setores
ensino.
privilegiados para o ensino e experimentação desta prática. Este último, será o foco
91
“Embora o temário mostre, por vezes, o preconceito, é em toda atitude artística que encontraremos a
significação mais profunda. O neoclassicismo correspondia assim à organização social daquele período,
marcado pela distância entre o pensar e o fazer. Um se recolhia no idealismo; o outro, confinados aos
aspectos negativos do trabalho, nos desvios econômicos, na mecanização do homem, na coisificação do
trabalhador, na orientação, não raro, repressiva e predatória. Assim, a sociedade exibe, objetivamente, a
dicotomia entre o pensar e o fazer, o que vale dizer, embora de forma radical, a distinção entre o poder e o
trabalho”. In: MOTTA, Flávio L. Subsídios para Relatório sobre ensino de Arquitetura UIA – UNESCO
1974. In: ASBEA – Sobre a História do ensino da Arquitetura no Brasil. São Paulo: Associação
Brasileira de Escolas de Arquitetura, 1977. Pág. 25.
5. QUESTÕES REFERENTES AOS CANTEIROS DAS ESCOLAS DE
ARQUITETURA.
experiência”. 92
92
ARGAN Giulio Carlo. Projeto e Destino. São Paulo: ed. Ática, 2001. Pág. 21
5.1 Formação e ensino de arquitetura.
assunto principal tratado pelo pedagogo Paulo Freire em sua obra “Pedagogia da
educadores que formarão a composição humana para viver neste novo modo de
produção que tem como principal foco o mercado financeiro no qual o grande
suas principais obras, Paulo dinamiza e entrelaça sucintamente os conceitos para ele
93
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários a prática educativa. São Paulo: Paz e
Terra. 1996. Pág. 47
enciclopédia da prática do docente, explica os preceitos e as qualidades esperadas
é movida pelos interesses do capital, ele deve estar preparado para as “armadilhas”
que tendem a torná-lo um objeto de produção. Um sujeito pronto para o treino e para
gerações de arquitetos que se formam nestas últimas duas décadas, tendem a ter seu
repertório chapado com preceitos e fórmulas que direcionam seu veio criativo para
privilegiados para o livre exercício da sua intuição. Necessita preparar seu aparato
prever as contingências e criar soluções pelo “faro”. Ana Maria Araújo Freire, escreve
para o ser humano é a destruição de uma bagagem incrível, construída com tanta
dificuldade por tantas gerações, e uma coisa predominante e mais importante para o
não é somente o arquiteto que sofre com este problema de precarização da formação.
94
Assim escreveu Ana Maria Araújo Freire na orelha do livro “Pedagogia da Autonomia” de Paulo
Freire.
95
Entrevista: João Figueiras Lima in: PÓS – Revista do Programa de Pós Graduação em Arquitetura e
Urbanismo da FAUUSP/ Universidade de São Paulo. Faculdade de Arquitetura e Urbanismo. Comissão
de Pós-Graduação – v.21. São Paulo: FAU, 2007
Os participantes da construção civil têm a sua formação capacitada para compor a
mais que compõe a cadeia produtiva que leva à criação das cidades como elas estão
Daqui, partimos para uma discussão acerca dos precedentes vitais para que não
conhecimento.
com contextos ou aplicações. Aqui entende-se o enfoque ideológico que é dado aos
perguntas.
respeito do pensamento crítico é mais uma justificativa para que se discuta com mais
trabalho fazem sentido, fica evidente que esta emancipação – da qual fala o professor
96
Numa entrevista concedida ao autor, o engenheiro civil Yopanan Rebelo conta: “Acabo de ler um livro,
“Minds Engeneering”, e o autor manifesta a necessidade de se repensar o ensino da prática no campo das
ciências do “bem construir”. Diz este autor, que nas escolas de engenharia estão se perdendo as maneiras
ancestrais de fazer projeto. Hoje os alunos estão até mais acostumados - nas escolas americanas como ele
dá de exemplo - a preferir fazer uma análise matemática e chegar a um resultado que por muitas vezes
não tem nada que ver com realidade do que fazer, ver como é que se faz, do que ver como foi que pensou
o sujeito que chegou a um produto. Por isso o nome “Minds engeneering”, porque ele diz que a pessoa
deve formar em sua cabeça a coisa pronta” ver anexo.
5.2 Os canteiros experimentais nas escolas de arquitetura
tem como temática principal a busca de caminhos para uma pedagogia nas escolas de
profissional fica à mercê dos apontamentos técnicos terceiros que pouco estão
envolvidos com o projeto em si. Como é o caso de calculistas que recebem os projetos
maneira a tornar insuficiente e incapaz o repertório técnico deles. Afirma ainda que
97
LEITE. Op. cit.
De fato, o ensino da arquitetura – e mais particularmente o ensino de estruturas
sinestésico do estudante que passa a viver as realidades físicas do espaço agindo sobre
João Figueiras Lima afirma que a ética na profissão ainda é a maior virtude que
envolvidos com as questões públicas como é o seu caso. Como profissional ele destaca
projetar – com todos os detalhes que o projeto pode prescindir, sejam eles desenhos,
paga por este erro é a própria qualidade da obra e o esforço redobrado dos
trabalhadores.
Em favor da sensibilidade, o arquiteto João Figueiras Lima deixa clara a sua
perdido o caráter formador, com criticidade e passou a ser uma indústria de diplomas.
existe toda uma equipe envolvida, a qual já faz com que o arquiteto e o estudante se
Ora, este trabalho em conjunto pode, sim, ser executado com os técnicos de
criando uma teoria própria e coesa para o curso. O problema é que nas faculdades de
arquitetura e urbanismo há uma danosa disjunção dos saberes que dificulta esta
prática.
ferramenta didática, deve ser revisto e aplicado com muito mais cuidado. A utilização
Urbanismo pode renovar o perfil do arquiteto que sairá da faculdade, e certamente irá
arquiteto para a construção. A intenção principal não é acabar com as aulas de ateliê e
trabalhar apenas no canteiro como único local de ensino da arquitetura, mas fazer de
do arquiteto de uma prática que foi corrente e que deve ser parte do seu fazer diário,
a construção.
98
RONCONI, Reginaldo Luis Nunes. Inserção do Canteiro Experimental nas Faculdades de Arquitetura
e Urbanismo. São Paulo, 2002. Tese de Doutorado FAU USP. Pág. 157
99
“O empreiteiro tem de ganhar dinheiro de uma forma imediatista, não pode pesquisar, De forma que
quem pode mudar o mundo, a atuação da construção civil, ainda é o poder público” in: PÓS – Revista do
Programa de Pós Graduação em Arquitetura e Urbanismo da FAUUSP. Op. cit.
estruturas, o canteiro não pode incorrer no erro de “imitar” os canteiros tradicionais.
Deve sim, ao invés disso, criar um novo modelo, uma nova maneira de se construir.
cada fabricante tem uma modulação diferente. A mesma coisa acontece com os
necessário muita pesquisa e muito tempo para que estas questões sejam superadas.
Novamente um problema do setor privado que pode ser abarcado e estudado nos
poderão entrar em contato com esta problemática e, mesmo que os padrões não se
em retrabalho.100
100
Sergio Ferro cita este problema que ocorre na construção do convento de La Tourette. Sua queixa é
quanto ao critério adotado para o desenho das janelas que levam em consideração a proporção e a forma,
e não os tamanhos de peças de vidro disponíveis no mercado: “Nas mãos de Jeanneret, elas eram
dimensionadas a partir das medidas dos vidros disponíveis, para diminuir custos de cortes e de peras.
Xenakis, ao contrário, as desenhou seguindo o ritmo das batidas de seu lápis na prancheta e com o
“modulor” ao lado. Venustas musical em vez de lógica construtiva – mas que rendeu quilos de artigos
encantados”. in: FERRO. Op. cit.
101
“(...) É certo que o Canteiro Experimental pode ser também um grande instrumento para apoiar os
relacionamentos da instituição com a comunidade externa, porém não deve ser confundido com os
Laboratórios de Habitação ou Escritórios Modelo, pois estes tendem a assumir obrigações dos prestadores
de serviço. O canteiro experimental deve priorizar a formação do arquiteto”. In: RONCONI. Op. cit.
formação do aluno. Aqui reside uma questão importante. O canteiro experimental
são, assim como o desenvolvimento empírico de novas tecnologias também o são. Não
que não possuem a escala monumental como a de teatros, museus, hospitais e prédios
prática nas escolas faz com que, muitas vezes, se provoque, se instigue a vontade de
e contribuições mútuas neste, que foi um trabalho em equipe. Se estas práticas são
estudadas e reorganizadas em ambientes de canteiros experimentais, esta revisitação
destes ambientes.
Ronconi traça o perfil de uma experiência que além de crítica, pode também ser
experimental para arquitetura não pode ser visto apenas como um local privilegiado
atingir uma escala intermediária que configure ambientes onde os estudantes possam
‘segurança’ vivenciada do seu futuro ofício. Uma segurança construída também pela
102
Quanto a este assunto, conhecer melhor os trabalhos dos arquitetos Mayumi e Sérgio Souza Lima,
Siegbert Zanettini, entre outros
103
RONCONI, Reginaldo Luis Nunes. Inserção do Canteiro Experimental nas Faculdades de
Arquitetura e Urbanismo. São Paulo, 2002. Tese de Doutorado FAU USP. Pág. 157
O ensino institucionalizado da arquitetura é fruto de uma evolução histórica que
fracionar, tornou-se um simples processo pelo qual tem que passar o profissional que
precisa de um diploma para adquirir sua certificação para o exercício da profissão, seu
CREA104. Figueiras Lima afirma que “toda a formação profissional está sendo
ensino, pela falta de laboratórios, pela falta de locais de pesquisa em que estas
técnicas que a gente usa para a construção do edifício possam ser testadas e onde os
interessantes é dar margem às contingências, que são – muitas vezes – frutos dos
fundamental relevância.
104
CREA – Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia.
105
Entrevista: João Figueiras Lima in: PÓS – Revista do Programa de Pós Graduação em Arquitetura e
Urbanismo da FAUUSP/ Universidade de São Paulo. Faculdade de Arquitetura e Urbanismo. Comissão
de Pós-Graduação – v.21. São Paulo: FAU, 2007
106
“(...) Não é raro, o estudante comentar sobre a insuficiência das informações contidas no desenho que
ele mesmo elaborou. Essa constatação abre caminho para se pensar nos diversos tipos de desenho que são
A vivência e o cotidiano de um canteiro experimental deve ser a metáfora de
uma obra real. Com a apropriação desta metáfora, o aluno se coloca no lugar do
disciplina, para que o futuro arquiteto saísse da escola com mais confiança em sua
ênfase em aulas teóricas e aulas em estúdios e ateliês para uma maior dimensão da
‘prática’ na arquitetura.
aponta para uma proposta nova de ensino mais eficaz no que diz respeito ao
necessários para construir um projeto de arquitetura que ele julgava completo e definitivo”. In:
RONCONI. Op. cit.
107
RONCONI, Reginaldo Luis Nunes. Inserção do Canteiro Experimental nas Faculdades de Arquitetura
e Urbanismo. São Paulo, 2002. Tese de Doutorado FAU USP. Página 220.
Em suma, como é possível de se observar no trabalho de RONCONI, não é
pois o profissional padrão ainda não está suficientemente apto a percebê-los. Mas é
necessidade não é exclusiva das escolas no Brasil. Ele afirma que em muitas escolas no
108
mundo inteiro – inclusive na MIT (Massachusetts Institute of Technology) – a
que se conheçam as realidades atuais nos campos de projeto, obra e suas relações.
deste trabalho, do projeto que enquanto processo para a criação necessita estar
influência no produto final, deve ser sempre presente na escola. Não é possível prever
os sentidos. Deve ser o lugar da concreção dos projetos que comprovam, ou não, as
108
Em entrevista concedida ao autor – que se encontra em anexo – Yopanan Rebelo, citando a MIT,
destaca: “Já faz anos que se está rediscutindo o ensino por lá. Na análise deles, estavam formando
profissionais que, saindo da escola, não sabiam fazer nada. Não conseguiam se inserir no mercado e já
começar a produzir, a criar coisas. Porque sabiam muito de análises matemáticas, formavam de maneira
muito intensa a questão matemática na cabeça das pessoas e ficando presos àquilo, não conseguiam
transferir nada daquilo para a realidade.”
expectativas iniciais, deve ser o lugar da construção de significados, do entendimento
de que toda obra é fruto de um trabalho e que este trabalho deve ser valorizado e
exposto para quem vê. A faculdade de arquitetura tem que ser o lugar da construção
construção, do ponto de vista das lógicas que levam à realização de muitas destas
que o aluno conheça o que lhe é amputado. Se o aluno está distante da construção na
crescentes pressões exercidas pelo mercado. Estas mesmas pressões levam as escolas
109
RONCONI, em seus apontamentos sobre os canteiros experimentais afirma que: “uma „nova‟
sensibilidade será estimulada. Talvez pelo peso do tijolo, quem sabe pelo cansaço ao misturar a
argamassa, na conversa com o técnico que auxilia o trabalho. Ou então viverá, na repetição infinita do
gesto na construção da parede, o cotidiano do outro, nunca antes imaginado. E essa sensibilidade é que
está ausente na formação do nosso jovem arquiteto (...) Portanto, ao falar de um canteiro na escola de
Arquitetura e Urbanismo, não propomos um lugar para o exercício das habilidades construtivas, apenas,
nem um laboratório para ensaios de corpos de prova. Deve ser um espaço onde o exercício da síntese
possa acontecer. Não um canteiro de tecnologia, mas sim um canteiro da arquitetura”
“metafísicas”. A prática completa a formação no sentido de, com o conhecimento das
canteiro deve ser aberto para a inventividade e para solução de equações. Os canteiros
equacionamento das questões. Mais uma vez a ênfase dada é para que se torne este
um espaço com aptidão para aguçar a intuição e a sensibilidade. Desta vez para que o
outros momentos e que podem ser usados para uma determinada atividade da qual
ele nem desconfiava que estivesse aparelhado para desenvolver. Em outras palavras, o
canteiro pode ser um espaço que sirva como disparador de conhecimentos recalcados.
técnicas só foi possível enquanto o arquiteto esteve livre para ativar a intuição.
ou então pisos de cimento queimado, estas não aguçam a curiosidade inventiva. Estas
e de técnicas que não são do conhecimento ou do repertório diário do aluno, faz com
exercício que trata de formas e técnicas inusitadas, que não são comumente
aluno.
institutos de pesquisa. O canteiro deve sim ser suporte para tais interfaces quando
deve sempre extrapolar os limites dos muros da universidade. Para que a apreensão
canteiro e trabalhar junto com os alunos para que se conhecessem ainda melhor os
trabalho e novas relações do trabalhador com a cidade. Poderia ser criado um espaço
se operar com este e quais as melhores maneiras de se gestar um canteiro que usa
estas técnicas.
Os canteiros experimentais ainda têm uma missão que não é somente teórica.
experiências que torne possível a consulta e a pesquisa. Este repertório pode vir a ser
inclusive uma boa ferramenta para a sua própria auto-avaliação. É através do acúmulo
Uma teoria que seja a sua justificativa e seu embasamento para que a atuação dos
alunos nestes espaços não se esvazie em práticas alienadas. Esta teoria é necessária
2008, foi inaugurada uma exposição que tinha como tema os dez anos de existência da
atual versão do canteiro experimental da FAU USP110. Nesta ocasião, foi lançada uma
publicação comemorativa que contava com fotos que retratavam um pouco do que
foram estes 10 anos de canteiro, e também contava com alguns textos de profissionais
Alguns trechos de alguns dos textos desta publicação foram selecionados para
que fiquem aqui registrados. Na maioria deles, os autores deixam explícitas quais são
01 “Há (...) algumas atividades nas escolas de arquitetura que não podem (e não
devem) ser reduzidas a uma das suas categorias: exclusivamente produtoras dos bens
cotidianos (martelo, anzol, cadeira, mesa) ou produtoras de palavras. São elas, aquelas
que combinam uma ação física para produzir um bem que simultaneamente são
Mas depois ele evoluiu para propor aos alunos o projeto de estruturas materializado
da cartolina, dos fios de aço, da madeira compensada, dos tecidos esticados. Como um
desenhista que precisa tirar da folha em branco o desenho de uma folha: ele tem que
110
Canteiro Experimental – 10 anos na FAUUSP/ Apresentação de Reginaldo Ronconi. São Paulo,
FAUUSP, 2008.
03 “... O “Canteiro Experimental”, não é nem uma cópia diluída dos laboratórios
de construção civil da EPUSP ou IPT, nem persegue seus objetivos: estes são a
projeto”. Idem.
apenas ensinar o drible dos lençóis freáticos ou dos veios d’água, do humo ou do
o pleno sentido espacial de uma época advirá da crítica a um vocabulário bimilenar por
Borromini. Nos três, a compreensão dos materiais, a tomada firme de partido diante
que seja envolvida numa práxis, sem que mergulhe no processo de sua transformação
campo da arquitetura efetiva. Esta é a pesquisa autêntica que deveria alimentar seu
ensino. E a experiência, no caso, não é mais somente a que verifica a teoria: passa a
têm a virtude de não ter nenhuma relação com a construção: só assim cumpre sem
Idem.
as obras executas pelos alunos percebe algo diferente... São materiais e pesquisas
debate fosse, a bem dizer, extinto. A despeito das iniciativas de alguns professores, a
recalcada na FAU, posta para fora da sala de aula. O projeto tornou-se intransitivo e
sem o seu outro, o ensino na FAU viu-se refém de uma forma autonomizada: o
desenho-fetiche”. Idem.
como o concebia Paulo Freire: pretende instituir-se como um espaço de unidade entre
17 “... o arquiteto que passa por essa formação estará apto a desnaturalizar e
social para ensaiar sua negação determinada em favor de uma possível síntese
superadora”. Idem.
historicamente, a maior camada profissional urbana) é um dos caminhos para levar até
Idem.
assim ele se constituirá, de fato, como práxis crítica, como reflexão e ação dos
Idem.
Este trabalho incita algumas questões, mas o objetivo não foi esgotar o assunto.
Ainda há muito que se estudar, o trabalho tão somente propõe que se voltem as
atenções para estas discussões. É necessário ainda que se saibam quais são e se
existem limites para estes espaços pedagógicos. Há que se procurar conhecer quais
significativas.
mundo onde vivem, se é da vontade destes seres humanos deixarem a sua marca,
assuma com maior rigor e seriedade esta importante peça que compõe a formação, e
professores.
canteiros experimentais.
O canteiro deve manter sempre uma ponte entre suas atividades e as atividades
que se compreendam com clareza as coisas das quais se fala nesta dissertação, é
mulheres enquanto indivíduos, a sua total liberdade criadora e a vontade de fazer com
ARANTES, Otília Beatriz Fiori. O lugar da Arquitetura depois dos Modernos. São Paulo:
ARANTES. Pedro Fiori. O Grau Zero da Arquitetura na Era Financeira. In: Novos
ARGAN Giulio Carlo. Projeto e Destino. São Paulo: ed. Ática, 2001.
CARVALHO Jr, José Mario. Prática do Arquiteto e conhecimento técnico. FAUUSP, São
FREIRE, Paulo. Educação como prática de Liberdade. Ed. Paz e Terra. Rio de Janeiro,
1980.
GRAEFF, Edgar. Arte e Técnica na formação do arquiteto. São Paulo: Studio Nobel/
GUATTARI, Felix. As três ecologias; 5 a. edição. Campinas, SP: Ed. Papirus 1995.
JUNG, C. J. Memórias, Sonhos e Reflexões. Rio de Janeiro: Ed. Nova Fronteira. 1996.
MORIN, Edgar. Introdução ao pensamento complexo. Porto Alegre: Sulina – 3ª. Edição,
MOTTA, Flávio L. Subsídios para Relatório sobre ensino de Arquitetura UIA – UNESCO
Paulo.
(org.). Uma nova agenda para a arquitetura: antologia teórica (1965 – 1995). São
Bibliografia Recomendada
BARBOSA, Ana Mae T. B. & FERRARA, Lucrécia & VERNASCHI, Elvira (org). O ensino das
GORZ, André. Técnica, técnicos e luta de classe, in: A divisão social do trabalho. São
NERVI, Píer Luigi. Scienzo o arte del construiré? Utet librería: Torino, 1997.
REBELLO, Yopanan Conrado Pereira. Contribuições ao Ensino de Estrutura nas Escolas
VARGAS, Milton (org). História da técnica e da tecnología no Brasil. Ed. UNESP. São
Paulo, 1994.
ANEXOS
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
FACULDADE DE ARQUITETURA E URBANISMO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO
ENTREVISTAS
SÃO PAULO
Estas entrevistas são fruto de um trabalho programado para o programa de
que estão hoje lecionando nas faculdades já compõem um quadro que é fruto
São Paulo e este recorte foi feito pela dificuldade de locomoção que acarretaria
professores que estão envolvidos nesta prática, bem como levantar quais as
prática.
111
Estas referências forma levantadas na plataforma Lattes – http://lates.cnpq.br/629426486143063.
112
Estas referências forma levantadas na plataforma Lattes – http://lates.cnpq.br/01786779883414343.
Como a professora é uma entusiasta dos canteiros experimentais como prática
uma alternativa possível de espaços para estas práticas em escolas que têm
que está instalada em Santa Bárbara d‟Oeste, interior de São Paulo, foi o
113
LEITE, Maria Amélia Devitte Ferreira d´Azevedo. O ensino de Tecnologia em arquitetura e
urbanismo. Dissertação de mestrado – FAUUSP – São Paulo, 1998, e LEITE, Maria Amélia Devitte
Ferreira D‟Azevedo. A aprendizagem tecnológica do arquiteto. Tese de doutorado – Área de
concentração: Tecnologia da Arquitetura – FAUUSP – São Paulo, 2005.
ENTREVISTA: Prof.ª Érica Yukiko Yoshioka– FAUUSP.
F.M.: Professora Érica, gostaria que você iniciasse falando um pouco sobre a sua
experiência aqui na FAU, desde o início dos trabalhos com o canteiro experimental.
E.Y.Y.: Na realidade o início de tudo foi com o Batalha mesmo, foi com o Batalha que
tudo teve início e depois veio também a Elisabeta Romano. Ela tinha sido contratada
pela FAU para trabalhar numa área mais ligada à informática – inclusive ela tem umas
publicaçõezinhas nesta área aqui pela FAU – mas, por ela ter trabalhado com o
Silvio114, na prefeitura, e por ter editado uma cartilha animada e em formato pequeno e
que, salvo engano, se chama “cartilha da terra”, veio trabalhar com a gente, também.
direcionar as nossas aulas de primeiro ano para este enfoque da prática enquanto, na
época, “mão na massa”. Então a Elisabeta acabou entrando neste processo e foi muito
bom porque ela dinamizou, ela tem um espírito muito prático, de ir tocando a toque de
caixa. Neste período, coincidiu de a FAU estar construindo o anexo, aquele triângulo.
E no triângulo, havia um espaço – uma faixa – que seria uma fatia para outros
laboratórios além do LAME. E a topografia do terreno era tal que propiciava um nível
mais elevado (com uma cobertura única em treliças espaciais) onde poderíamos
ocupar. Tínhamos, então, esta faixa de chão batido totalmente liberada com esta tal
“Ótimo, podem usar!”. Isso foi na época em que a Gilda era diretora. Isso foi no ano de
1993, 1994...
114
Silvio Barros Sawaia, atual diretor da FAUUSP.
Fizemos como uma primeira experiência, com o primeiro ano, no espaço que
idéia era realmente experimentar o processo “pondo a mão na massa”. No fundo tinha
muito mesmo “a mão na massa”. A preocupação ainda não era pedagógica no sentido
de desenvolver uma cultura – acho que até já tinha de uma maneira subjacente, mas
não estava claro. Não dava para explicitar que a idéia era esta – a vontade principal
era a de liberar o aluno de alguns preconceitos. Não da parte dos alunos, mas da
professor preocupado com a coisa da mão na massa porque ninguém tem contato
com o canteiro, com o canteiro de obras, ninguém sabe como é que se amassa um
cimento, coisas assim... Ele tinha pensado que ele deveria trazer o curso do SENAI –
o curso de formação de pedreiros que tem lá no SENAI Tatuapé. A idéia era essa,
Então a idéia era essa de iniciar os alunos no contato com as obras, mas sem a
preocupação pedagógica, pelo menos não naquele momento. Era apenas um “vamos
introduzir”, “vamos fazer a meninada ter contato com obra”. Era ainda uma visão
bastante inicial. Mas, posteriormente com o Batalha nós implantamos uma nova visão,
e esta visão era uma visão – como complementação de uma visão já bastante
ensino não foi possível se levar a termos dessa maneira, pois era uma fase muito
transitória, o espaço era totalmente transitório, a gente estava sem espaço... A
primeira experiência, que está registrada numa publicaçãozinha, era com um grupo
muito grade, que foi dividido em pequenos grupos e os temas de trabalho foram
elaborados pelos professores. Fixamo-nos num material que era o tijolinho de barro
estruturante. Por ser alvenaria simples, a própria forma teria de dar conta de
que com aquela forma seria possível se construir, e que o conjunto pararia de pé.
A contribuição do aluno, dele para ele e dele para a disciplina, foi a de, a partir da
cima. Poderia trabalhar com textura, paredinhas vazadas, tramas cruzadas, até que
deu um resultado esteticamente bem interessante, bem bonito. Uns abriram buracos
redondos, tiveram que perceber como é que se constrói aquilo. A gente acaba
percebendo que o aluno possui um potencial intuitivo, que lhe proporciona uma
que no final se revela com lacunas a serem preenchidas, havia ainda questões a se
trabalhar em cima daquela proposta, daquele exercício. Foi uma primeira experiência.
Eu vivi isso de uma maneira bastante emocionante. Eu mesma participei, pus a mão
na massa, todas essas coisas que a gente gosta de fazer... Eu acho que foram
poderíamos ter chegado, mas foi um primeiro embriâozinho onde, tanto o professor –
estou agora falando em meu nome – como também os alunos, descobrimos que ali
existe um caminho, era um caminho novo, e isto ficou patente. Visualmente era um
caminho novo, ainda mais enfatizado por aquele chão de terra batida, com aquele
monte de pequenas construções surgindo. Como o calendário era limitado, chega uma
nossos radinhos e terminamos os trabalhos. Este realmente foi o embrião que revelou
No ano seguinte fizemos outra experiência onde é hoje o atual espaço do canteiro,
que era um gramado, um mato, esta segunda experiência não deu muito certo, não
deu muito resultado. Nesta época o Batalha havia falecido e ficamos somente eu e a
Elisabeta, e de fato a figura do Batalha115 era muito importante. Pelo menos no meu
Batalha era muito importante. A FAU havia conseguido outra área ali na direção da
integrado com o pessoal de projeto. Ainda me lembro que havia alguns professores: o
projeto para o canteiro experimental, em cujo programa tinha um espaço tipo o LAME,
e um espaço de experimentação, mas ainda não era o que é hoje, como proposta
da qual eu falei. Mas tudo isso valeu para que se tivesse um espaço físico, um local,
um endereço.
115
A professora Érica ministrava junto ao professor Batalha a disciplina AUT-152, cuja ementa era
materiais de construção.
Antes do Reginaldo116 vir, quem era o chefe de departamento era o Marcelo117, e eles
levantamento para ver quanto é que custaria para se fazer um espaço como se fosse
lona tencionada – e eu fiz. Tive que montar rapidinho, sem inventar muita coisa, afinal
só tinha uma semana para fazer e apresentar. O contato foi feito diretamente com a
empresa, para ter uma base de qual seria a ordem de grandeza. Estimou-se um valor
“x” para uma área coberta de tantos metros quadrados – acho que na época se
imaginava algo em torno de 300 a 400 metros quadrados – e dava uns cinqüenta mil
reais ou qualquer coisa assim, e esse foi o dinheiro que eles conseguiram no
orçamento, entrou no orçamento da FAU. Foi nesta época que houve a contratação do
separada para isso. Então daí, o Reginaldo pega isso e realmente “toca a coisa”. Aí
surge esta estrutura, a cobertura, e nesta fase o Reginaldo foi realmente a peça
chave. Trouxe inovação, não só como proposta, mas como prática, a prática de
ensino, desde o primeiro ano, a disciplina optativa, etc. Todo o resultado físico disso a
gente vê lá no Canteiro.
primórdios, são estes. Foi uma experiência de curta duração, muito em função do
Batalha ter se adoentado e não ter conseguido dar continuidade. Aí o grupo que ficou
foi desmantelado, ficamos eu e a Elisabeta, ela migrou para outra área, houve um
experiências deste tipo, e foi aí que chegou o Reginaldo. E essa vinda do Reginaldo
116
Prof. Dr, Reginaldo Luis Nunes Ronconi, atual coordenador do Canteiro Experimental da FAU USP
117
Prof. Dr. Marcelo Romero, atual vice-diretor da FAUUSP.
F.M.: Na mesma época destas experiências embrionárias, talvez um pouco antes,
com estes trabalhos aqui na FAU, ou era um trabalho novo totalmente independente?
E.Y.Y: Bom, no período em que eu vivenciei esta experiência, não tinha nenhum
vínculo, era a prática construtiva e ponto. Poderia ser para habitação de interesse
social poderia ser para uma unidade uni familiar ou para qualquer coisa. Era prática
construtiva e ponto final. Este curto período de experiência em canteiro era isso,
prática construtiva. Na verdade antes era ainda mais complicado porque nem prática
construtiva era, tinha uma disciplina que era “Materiais”, e que envolvia as
conhecimentos são inúteis, mas acho que eles têm que caminhar junto com a
nesta disciplina, nem se pensava. Tinha o pessoal da história, que tratava destas
questões, não que aqui não houvesse, mas aqui não havia nenhum cruzamento. Nem
F.M.: Faço esta pergunta porque tenho uma preocupação: Lendo os trabalhos do
118
Refiro-me aos laboratórios de habitação da Faculdade de Belas Artes e das experiências com canteiros
experimentais na UNICAMP.
119
Lefèvre, Rodrigo. Projeto de um acampamento de obra: Uma utopia. Dissertação de Mestrado, FAU-
USP, 1981.
para vocês na revista da Pós, descubro que a iniciativa privada não tem o interesse
envolvidas na produção do espaço. Para estes autores esta iniciativa deve vir das
E.Y.Y.: Esta é uma questão de difícil resposta porque ela envolve tantos aspectos...
produção de um espaço físico, onde estão embutidos vários outros conceitos – não só
conceitos mas também outros valores. No meu caso eu não tenho muita experiência
em espaço social, produção de espaços de uso coletivo, de uso social. Mas pode-se
tentando verificar que vínculo ele teria hoje, ou que poderia vir a ter nessa questão do
espaço produzido. Mas às vezes ficamos tão preocupados com a produção do espaço,
e a gente esquece que está produzindo um espaço para o uso. Afinal o uso é
importante, porque junto com o uso, existe o usuário. E nós somos os agentes disso
vários grupos. Nenhum deles maior que os outros. Um deles é realmente a questão
como técnica construtiva, mas como todo o procedimento para que se executem as
tarefas e os serviços e que aquilo resulte em uma obra enquanto edificação. Existe
todo um contexto em volta disso e nós não fazemos a mínima idéia de que contexto é
esse quando a gente sai de uma escola de arquitetura, que é o que poderíamos
simplesmente ser colocadas lado a lado e formar um pacote. A junção deve ser feita
levado a fazer este tipo de exercício, mas ele ainda é parcial, na medida em que o
aluno faz todos os esforços de simulação desta situação – inclusive até de gestão –
mas ainda é muito teórico. Isso é uma coisa que, pela prática profissional de escritório
e de canteiro de obra, onde é envolvida uma série de agentes, inclusive o usuário que
está lá no fim da linha, com toda a expectativa que ele tem, faz com que o arquiteto
seja levado a traduzir tudo isso e dar a resposta para todas as ansiedades. E estas
respostas não são explícitas, e você tem que decodificar tudo isso e traduzir em
atuação. E atuação não é sempre o traço. Quando falo em gestão, não me refiro em
gerir só o processo construtivo, não é só isso... É toda uma relação com o seu cliente,
seja ele pessoa física, ou seja, ele quem for, tem que se estabelecer uma relação.
De qualquer forma, hoje nós não temos espaço onde se possa realmente exercitar
isso, de uma forma não simulada. Inclusive a proposta que se tem hoje no caso
formação. Como exatamente isso deve ser feito, se numas experiências que estão
sendo levadas, como na disciplina optativa120, por exemplo, eu acho que ainda não
ficou claro, continua ainda sendo uma experimentação pelo grupo todo, tanto dos
professores como dos alunos. Acho que ainda tem um longo caminho a se percorrer.
Também não sei qual é que poderia ser a questão... Você me colocou uma questão e
eu estou te respondendo com a mesma questão. Ou seja, a resposta ainda não está
clara e eu não sei se existe. Mas, que há uma busca no sentido de achar uma
120
A referida disciplina optativa é a AUT 131 – Técnicas alternativas na construção.
resposta, há. E o canteiro experimental como equipamento, como meio, ele é
Na prática lá fora, lá onde os agentes são reais e não simulações, a ansiedade é real e
presente, e a gente tem que contornar e equilibrar, para chegar num resultado
Nós arquitetos, temos um papel a desempenhar, temos uma carga grande enquanto
prestadores de serviço. Ou seja, temos uma formação, um saber específico – que não
resposta. Nesse processo é que eu acho que a resposta demandada não é fornecida
inclusive uma interação desse grupo todo, tanto de um lado, de um pessoal que
demanda, com participação ou sem participação, essa realidade não é obrigatório que
ela seja trazida para este ambiente de formação. Mas se na medida do possível,
pudesse vivenciar isso, seria realmente um dos aspectos. Não considero que seja o
único.
É muito difícil de se imaginar o espaço de ensino como o canteiro, onde temos que
que, se ela não ocorrer de uma maneira direta e imediata, em tempo real, ela
dentro dela, eu acho que num tempo posterior, ele conseguirá estabelecer esta
relação com o mundo externo. Isso na seqüência. Em tempo real, significa que há uma
enquanto não for possível estabelecer um processo que realmente consiga formar, na
graduação, um profissional com tudo o que ele deva conter como valor humano, valor
social e tudo mais, não sei em que medida a gente consegue fazer uma ligação com
pode ser que este ser cresça, ou adquira determinados valores... Existe esta
pergunta. Deve ou não ter contato com o mundo externo? Não tenho ainda uma
opinião totalmente formada... Devemos na realidade direcionar para que não se perca
o foco, mas ora, para que se atinja este objetivo, de uma formação de um ser em
E.Y.Y.: Pois é, por exemplo, quando eu penso em como poderia ser, na realidade, se
conseguíssemos montar uma estrutura a mais completa possível, onde você consegue
desenvolver todo um processo do começo ao fim – como na disciplina AUT 131 –
dessa disciplina puder continuar o processo até conseguir dizer: “bom, estou me
sentindo forte o suficiente – como diz o professor Reginaldo – agora eu posso tomar
uma iniciativa a partir de uma demanda”. Este canteiro, ele é uma escola. Não que
seja auto-suficiente e que não precisamos de mais nada, não é isso. Mas é uma
estudos específicos, ela está presente. Afinal de onde é que surgem as linhas de
em questão de uma vivência desse contato que a gente tem com o mundo. E esse
mundo pode ser a história de cada um, ou toda a história de vida profissional de cada
um e a vida que está passando aí fora... Para os grupos de pesquisa que se monta por
aí, existe uma proposta que acaba se contrapondo ao „status quó‟ atual, e isso vem
é ajudar a direcionar este caminho. Isto pode parecer um pouco evasivo, mas eu acho
que está presente. Não precisa ser algo formatado. Esta carência de trabalhos surge
proposições, que podem ser sistemas construtivos, podem ser qualquer coisa. Então
eu acho que esta demanda está presente ainda nos dias de hoje. Nas pesquisas e no
A minha resposta está muito vinculada a minha realidade aqui da USP e eu não sei de
que maneira isso tudo vem formatado e como é que o canteiro – este espaço
pedagógico, mas que também é de pesquisa – como é que ele pode se vincular sem
perder seu principal objetivo que é o da formação. Temos realmente que atender a
estas tais demandas, mas sem nos sobrepor a este objetivo principal que é o de
Desse modo, quais as contribuições, na sua opinião, que este canteiro tem para as
que seja concreta para que se chegue, portanto, no espaço idealizado e que passa a
Momento de permissão para que tudo isso seja realizado. Se para ser realizado
deverão ser dados os passos vários, então o projeto estaria intrinsecamente ligado ao
projeto decidiu por uma série de contingências que o sistema estrutural é tal, mas na
isso. O canteiro passa a ser ferramenta na medida em que a ação estiver embasada
com esta proposta. E se o canteiro possui esta proposta, ele estará equipado para
Isto tudo ainda está muito abstrato, mas existem as traduções concretas, onde não
seria só fazer testes e ensaios de carga, de rompimento, etc. Mas onde se faria ensaio
aqueles elementos que vão compondo o espaço dentro deste processo todo. Então, o
experimentar todas essas situações, sem dúvida o projeto teria que estar
enquanto retrospectiva, mas na história enquanto projeção – para traz ou para frente,
mas num ponto do tempo – também acho que essas experimentações podem se
exercício no qual, de repente, o aluno inverte a posição. A referencia que era vertical,
e ele transforma em referencia horizontal. Parece ser uma mera transposição, mas por
detrás disso existe uma visão contemporânea, visão enquanto atitude contemporânea.
Não sei se são experiências que como teoria ou do ponto de vista da história, faria
algum sentido. Mas eu acho que essa transposição, essa releitura, tem sempre uma
carga de ontem ou de hoje. Essas experimentações têm uma carga histórica e de
novos conhecimentos.
não são dados meramente técnicos. Em relação ao projeto, há uma relação de projeto
muitas vezes no „acho que‟ e logo então você traça e resolve. Se pudéssemos ir ao
canteiro, fazer determinados testes, como faz o Renzo Piano – que tem um laboratório
no seu ateliê – acho que se tivesse condições ele teria feito um canteiro mesmo para a
construção de um protótipo.
Acho que a escola deveria levar em conta – a gente acaba falando da escola por ser o
tentar integrar todas essas questões e usar o canteiro como ferramenta, seria ótimo!
ENTREVISTA: Prof.ª Anália Amorim – FAUUSP
AA: Este é um assunto no qual eu venho pensando desde que eu comecei a dar aulas
de estrutura – deve fazer em torno de uns doze a treze anos – e costumo pensar
Existem duas vertentes principais, a estrutura e a tecnologia. Deve estar claro que no
futuro é o arquiteto que terá que responder pela estrutura, e respondendo pela
estrutura ele vai ter que entender de canteiro de obras. Não tem outro jeito.
mais que você aprofunde o quanto puder neste período, ela ainda é muito tênue, ela é
muito incipiente, no sentido mesmo de principiante, dentro da experiência que você vai
ter fora da universidade, na sua vida profissional. Por mais que se tenham disciplinas,
hoje, uma, duas ou três, em que se acompanhem obras, ainda assim a experiência é
com o canteiro.
bibliotecas, e então nós temos esta facilidade de poder eleger a obra e ir conhecer o
arquiteto, conhecer o engenheiro, conhecer o grupo que faz todos estes projetos, e os
não atrapalhem tanto a obra, mas que sejam somente observadores, que perguntem...
Isso ajuda muito, no processo didático, ao aluno ter uma noção e atualizar-se em o
que é que temos como uma realidade. Isso é algo que nos ocupa bastante. A escolha
das obras, por mais que preferíssemos que fossem obras muito bem acabadas, muito
bem detalhadas, para que se pudesse mais facilmente entender o processo todo
construção, mas pela escassez de obras tão bem detalhadas ou pela dificuldade de se
flanco para ter obras que não sejam tão exceção, nem tão bem detalhado para que
habilitação da mão de obra. Quando se introduz o aluno no mundo das obras de uma
maneira monitorada – Não é só ir por ir, não. Os grupos são reduzidos, as obras muito
desenvolvimentos dos assuntos em aulas, há retorno. Sempre tem uma aula que
apresenta o projeto, vem o engenheiro, apresenta a obra, depois eles descem para a
obra com estes profissionais, e isso facilita um bocado. Essa é uma das visões.
alunos que estejam cursando o quarto ou quinto ano, quando o aluno já tem a
agradável.
Este “canto da sereia” que é a tecnologia, com todos os seus solfejos, é um canto com
o qual nós temos que tomar muito cuidado, porque o nosso aluno que está com 18, 19
ou 20 anos, possui um raciocínio lógico que tem que ser orquestrado com a poética do
espaço, se não ele passa a ser um propositor tecnológico de pouca emoção. E não é
isso que nós pretendemos. O que nós queremos é que o fazer se junte à arte, e não
se justifique somente pelo fazer. Queremos que volte a ser de novo técnica e arte.
aluno tem que passar, sim, a ser responsável pela materialidade do que ele imagina. E
essa materialidade passa pelo sistema estrutural, passa pela forma e passa pelo
sistema construtivo, passa pela tecnologia. Essa conjunção nasce desde os primeiros
fato, construtiva. É possível se fazer esse tipo de coisa lá pelo terceiro ou quarto ano,
pode até ser no quinto. No TFG pode imperar esta preocupação porque o aluno tem
os seis meses, às vezes um ano, para desenvolver um projeto no qual, com certeza,
aluno tem uma vivência de cinco, seis às vezes sete anos, na faculdade e quando sai
enfrenta um mercado onde a mão de obra é pouco capacitada, pouco treinada, onde a
canteiro não mais como uma experiência que este aluno tenha que estudar o que
existe, mas muito pelo contrário, seja uma idéia propositiva de canteiro e aí retomar
material construtivo. Se fosse possível fazer uma fábrica, e esta fábrica fosse uma
fábrica-escola e se esta fábrica tivesse a conexão com a universidade. Quando eu
conheci a experiência do CTRS, com o Lelé – que é uma pessoa que realmente você
vai ter que vivenciar um pouco mais de perto, entrevistar, visitar o CTRS, pedir
que era possível mudar visceralmente a construção civil. E não estou afirmando isso
por conta da argamassa armada ou disso ou aquilo. Ele tem a capacidade de pensar
com qualquer material que seja: madeira, plástico, aço, argamassa armada, com uma
passa por toda a fabricação da peça. Se for possível aliar numa fábrica – e aí é um
aquilo ter mobilidade e viabilidade na sociedade que ele está inserido – a escola
técnica, por um lado, com alunos que nunca nem ouviram falar de arquitetura, estes
alunos que vão à escola técnica e que vão ser treinados para a marcenaria, para a
pessoas que estão neste segmento e que nem sabem direito o que é arquitetura,
sociedade que ao mesmo tempo em que o forma, o habilita a entrar numa faculdade
de arquitetura. Por quê? Porque sim. Porque não é assim tão impossível de entrar em
técnico, treinado a fazer com que as esquadrias não entrem mais água, entendam que
a impermeabilização não precisa ser refeita de ano em ano, se for extremamente bem
detalhada, porque também ela vem de uma concepção bem detalhada. Então se for
possível fazer a união destas três pontas: O aluno de arquitetura e urbanismo que está
se formando, esta ponta que vem da escola técnica, e a ponta da sociedade que
mesmo, como ensino prático e teórico, que vai da escola técnica ao nível superior, e
faz estes segmentos conviverem, este seria o canteiro ideal para um país como o
Brasil. Que fique bem claro que não é a primeira vez que se lança esta idéia, mas a
gente, na verdade nunca consegui efetivá-la. O que a gente consegue fazer é:
construir fábricas para fazer SIEPS, fazer fábricas para fazer rede SARAH, mas não
estuda a pré-fabricação do ponto de vista de ter uma fábrica que tem um respaldo, que
não é uma escola. Você, como estudante de mestrado e como estudioso de canteiro,
pode conferir que o ensino superior em uma cota de responsabilidade, mas o ensino
“homus propositor”. Teríamos a constante do homem que faz e que, ao fazer, cria, não
mesmo tempo esta proposição de estabilidade, a pessoa tem que entender que ele
tem matéria, que ele tem conexão, que tem uma resistência térmica, que tudo tem
uma beleza a transmitir e que esta beleza custa-lhe raciocínio integral que vem desde
muito rico, mas que funciona como num móbile que, quando mexemos em uma peça,
São essas, então, as três visões de canteiro que a gente pode implementar dentro da
universidade. A última, um pouco mais ousada, mas é por aí mesmo que tem que ir se
F.M.: Quando você fala sobre esta escola-fábrica, eu considero que existem dois
pontos a serem levantados. Uma diz respeito ao tempo neste espaço, e a outra a
canteiros nas escolas muito mais desenvolvida que o potencial criador de tecnologia
sua sugestão vejo o trabalho como evolutivo, ou seja, não se poderia partir do zero
toda vez que se começasse um novo semestre, mas sim, este seria um trabalho
cumulativo de resultados e por sua vez evolutivo. Ainda assim, dentro deste processo
AA: Todo objeto possui a concepção e a fabricação. Então por mais que a gente diga
que o conhecimento, ao ser fabricado, ele se mostra. Então ele tem uma didática na
própria essência, ele não é uma filosofia feita de idéias que você vai ter que estudar e
que a cada vez que você estuda exige um maior estudo para o seu entendimento. A
foguete, desmontar um computador e, desde que ele tenha os princípios, ele vai
ganhando intimidade tal qual para desmontar uma cadeira. A arquitetura pela sua
estática e no universo mecânico. A gente não trabalha com foguetes. O máximo que a
aumentando, mas o nosso fabril é de uma escala possível de ser desvendado sem
grandes caixas pretas, o que é um pouco distinto da concepção pela concepção que
você não sabe como é que o arquiteto tem seus lampejos e como é que ele acumula e
vai digerindo todo aquele universo. A parte mesmo do canteiro, tem esta
característica... Não sei se isso responde a sua questão sobre o tempo. Realmente o
Algo que você falou e que revela uma preocupação que devemos aprofundar é o
sociedade. Essa pode ser uma grande encrenca... A universidade afinal trabalha para
quem? Ele vai se remeter como lugar de consulta, ou ele vai ser como uma
EMBRAPA, que é um lugar que é particular e que é uma empresa mista? Como é que
Acho que na verdade nós teremos que redesenhar uma sociedade civil que possa
produzir conhecimento e que possa produzir riquezas. O que vai nortear tudo isso é a
natureza dos programas e as demandas que eles recebam. Não vejo nenhum
desenho que ainda vai ter que se fazer, não é nada que já se tenha montado e que se
gente vai ter que se dedicar como foram os desenhos destas sociedades civis. São
essas conjunções pelas quais já passou a EMBRAPA, o próprio PT, quando fez uma
estou vendo que você está indo para o lado da verificação, da especulação, da análise
e da crítica e ao mesmo tempo da proposição... Você não deve sair daqui sem uma
proposta, embora seja um mestrado, eu não encerraria este trabalho sem uma
proposta... Este desenho, então, ele tem que ser de algum modo questionado, pelo
menos esboçado, para que não receba uma rajada que te mate o feto antes mesmo
dele nascer, não é? A universidade tem que ser pública. E a gente tem que ter a
noção clara de que público é tudo aquilo que realmente interessa a sociedade como
questão, e não só como condição. É público porque a gente não paga. Se a gente
começar a fazer uma série de programas que dizem respeito à sociedade micro a um
ajuda do estado, porque o estado tem uma limitação financeira. E você não está no
bolso do estado, paciência, você constrói outra opção financeira, mas isto não te
impede, muito pelo contrário, pode até te impelir a uma preocupação pública de só
fazer obra que tenha o poder de fazer transformação social. E aí? Você é menos
público? Você é mais privado? Desenhar esta fábrica, de sorte a ela começar a
colocar a mão nas grandes preocupações. Nas enchentes, nas áreas de encostas... A
arquitetura tem que ter também a preocupação de criar territórios, não é só uma
preocupação em fazer belos edifícios, tem também que fazer belos territórios e
represa, qual é o impacto? Como é que a prefeitura pode interfacear com todas as
outras atividades para mover e comover de sorte que tudo aquilo adquira uma escala
humana. Temos que pensar em todas estas grandes obras, pontes, viadutos, as
grandes contenções, mostrando como é que isso adquire a escala humana. Podemos
trabalhar com edifícios, escolas... Pode até ser, tudo depende da demanda, mas
devemos nos abrir, também, a todo o tipo de construção, podemos fazer cisternas,
obras para obtenção de águas nas rodovias, e sua posterior distribuição, obras para
em canteiro, abrimos muito mais o leque, porque canteiro é tudo isso. Construção
envolve todas estas instâncias, percebemos que podemos fazer tudo isso e ainda
com prática, com leveza, com beleza, com tudo. E aí este bueiro já tem um banco,
uma jardineira, quer dizer, uma coisa que vai puxando a outra e você começa a
é um sistema de drenagem que possibilite que aquela cidade não enche de água e
você possibilita que a vida naquela cidade virar uma coisa mais fácil. Esta é a função
desta catedral.
F.M.: A discussão que tenho lido é a respeito da formação de desenhistas da
projetos – podemos perceber uma preocupação muito maior com o desenho que com
a construção. O que eu acho curioso é que nesta entrevista eu pude ver esta questão
desenhar...
AA: A arquitetura não deveria nunca ter sido tirada da engenharia. Deve ter sido por
uma questão estratégica, política, corporativa ou econômica, sei lá. Tenho a certeza
de que o fizeram por algum bom motivo, mas eu não consigo compreender porque é
formação em engenharia civil, e ele faz tudo o que você imaginar com a terra que ele
achar, faz sondagens, análises, etc. Um dia eu perguntei a ele se ele já tinha visto
aquele desenho do Hotel Imperial, do Frank Lloyd Wright, que foi feito em Tóquio
contra os tremores de terra, e ele me respondeu que não. Este é um dos três famosos
como era para ela aflorar do chão e encontrar com a cobertura sem que houvessem
pilares propriamente ditos, A execução do prédio não foi como projetada por motivo do
exílio do Artigas, então o Figueiredo Ferraz fez de outra maneira. Mas era o desenho
F.M.: A idéia é que não existissem pilares... A idéia era a fundação aflorando e
encontrando a cobertura...
A.A.: Exatamente. E aquele ponto de encontro onde há o movimento, os pontos de
apoio, deveria ser uma coisa de outra natureza. Aparentemente em muito semelhante
a esta, vê-se, inclusive, que eles mantiveram o friso, mas um pouco diferente. É como
se eu lhe desenhasse assim como você é, mas lhe fizesse de barro. Parece você, tem
tudo a ver com você, mas não é você. Mas de qualquer maneira, aparentemente, se
resolveu. Conclui-se com isso que devemos voltar a estudar as coisas através dos
Eu acho que exige uma maturidade não sei se isso seria uma disciplina que se daria
logo no começo, nos cinco anos... Talvez numa disciplina de pós... Por causa do tal
“canto das sereias”, que às vezes atrapalha. Como eu estou há doze ou treze anos –
já nem me lembro mais quanto tempo – estudando isso, às vezes eu vejo uns meninos
extremamente hábeis de raciocínio lógico e técnico, e que aí vão fazendo umas coisas
que são monstruosas. Muito bem arquitetadas, do ponto de vista mecânico, mas muito
cara que tem o fascínio tecnológico um pouco pronunciado, que são os tecnocratas.
Tudo tem que ser dosado, às vezes eu tenho que falar pros caras para esquecerem
um pouco tais coisas e fortalecer um pouco outros elos. Enquanto outros elos já estão
bem maturados e resolvidos, minha preocupação é com o etéreo. Por que o que
interessa realmente para a arquitetura é o que não se vê, esta luz, este espaço em
que estamos conversando, este silêncio urbano, isso é o que nos interessa! Essa
mesa nesta altura apropriada de tal sorte que a gente tenha como colocar os trabalhos
em cima e trabalhar. Mas para fazer isso você tem que dominar a matéria, de qualquer
prática nas faculdades. Você acha que existem assuntos que não são da alçada do
ambiente de canteiro? Você considera que há assuntos que só devem ser tratados em
A.A.: Eu nunca fui partidária de separar nada de nada, você já deve ter percebido que
eu gosto de pensar a coisa da maneira mais integrante possível. É claro que não é a
sociologia isoladamente que tem que resolver o problema, porque se não eles vão
sociológico das construções. A gente tem que fazer uma arquitetura em que os
entendeu isso, tanto do ponto de vista humano, como do ponto de vista do meio. Por
isso é que eu acho que você tem que focalizar como ponto nevrálgico do projeto a
é o projeto que diminui o sofrimento do trabalhador, não se tem nem a menor sombra
de dúvida quanto a isso. Mesmo que ele se dê com barro, mesmo que ele se dê com
areia, mesmo que ele se dê com madeira, um dos pontos dele é a otimização da força
Outra coisa que se deve atentar é a realidade de se trabalhar num país que tem uma
quantidade imensa de mão de obra. Como é que eu vou formar e operacionalizar este
exército – embora não se goste de usar este termo, mas é um exército de mão de obra
jamais poderia se esquecer disso. O que você não pode é ficar somente neste
discurso porque a você não compete este discurso como arquiteto. Você tem que ter o
senso crítico disso tudo, e tem que ir atrás da ponta e resolver isso, e não dizer que
isto é uma questão sociológica ou uma questão econômica, dizer que isto é o ônus da
construção civil para construção de uma sociedade e que quem morreu, morreu, e é o
preço. Não. O quanto a gente puder diminuir este tipo de enfoque, é obrigação do
arquiteto com certeza. Criar peças um pouco mais possíveis de serem içadas,
junto. Porque ele fez o seu trabalho corretamente, limpou o local, tem orgulho daquilo,
e possa responder por aquilo com a dignidade de quem fabrica e não se dana, não se
danifica. A parte humana é essencial! Não é só por parte do usuário que pagou pela
arquitetura é humanista do começo até o fim ou então ela deixou de ser arquitetura,
vai ser outra coisa. É claro que ao sociólogo cabe a crítica veemente porque é o que
ele sabe fazer, como a você cabe ser arquiteto. E aí faça o seu trabalho de maneira
F.M.: Nos canteiros experimentais que temos hoje nas faculdades de arquitetura – dos
construções ou até de estruturas sem qualquer demanda. Puro exercício. Isso, no seu
A.A.: Esta prática não é tão completa. Existem exercícios mais completos. Os
exercícios têm a característica de terem finitudes, porque eles não são vida, ainda.
Para descobrir uma determinada doença você faz uma série de exames, põe a mão
aqui, põe a mão ali, aquilo não é a experiência completa, não é o fenômeno inteiro, e
nem mesmo o usufruto, mas o exercício tem a característica da finitude, de ser finito.
Eu adoraria que o nosso canteiro fosse algo que tivesse um plano antes, mesmo que
colônias no mundo asiático, eles aprisionaram uma nau e fizeram com que os
depois disso, que os portugueses montassem a nau inteira, e eles foram observando e
desenhando. Mesmo assim eles não aprenderam, tinham dúvidas, e fizeram, de novo,
partiram. Alforriaram os caras porque com isso se passaram dez anos a construir e
desconstruir a nau... Essa talvez seja uma maneira de exercício de canteiro com uma
Mas é sempre mimético. Claro que depois de anos que você ganhar vivência, tiver a
sua vida profissional estabelecida, você tenha condições de fazer a coisa o mais
completa possível. Eu já ouvi muitas críticas sobre o canteiro aqui da FAU por não ter
desenho, por serem repetições de um monte de coisas que não tem demanda. Eu
acho que a gente tem que estar apto a, quando houver demanda, saber responder. E
para isso a gente tem que ir lá ao canteiro e fazer todos os exercícios. Os lógicos, os
ilógicos, até mesmo os aparentemente estúpidos, para quando houver demanda você
estar pronto isso é o que é difícil. Porque os exercícios não são complexos entre si.
F.M.: Uma das maiores deficiências que tenho observado nos exercícios de prática
se pretendem a ter início, meio e fim e por fim eu entendo a sistematização dos
depois, desmontando ou não, deve haver uma análise de tudo o que aconteceu lá,
gerando com isso um produto daquele exercício... Uma análise matemática, que seja...
A.A.: O arquiteto tem que voltar a trabalhar em equipe, concorda? É um trabalho tão
extenso que você vai ter que responder com um grupo, e tem que, ou capitaneando,
trabalho pode ser feito segundo todas as regras do conforto térmico e acústico, isso
seria um desastre total! Por exemplo, se fosse pelos critérios de insolação a FAU não
precisaria deste beiral, porque a orientação leste-oeste... Não importa! Você tem que
fazer aquilo, suprir aquilo e ultrapassar. Porque se você começar a fazer o mundo das
tabelas como é atualmente, a arquitetura vai ficar muito restritiva, ela tem que ter uma
beleza na qual todas estas outras coisas estejam embutidas, mas ela tem que se
expressar. Caso contrário a vida seria somente tomar banho e comer vitaminas e
norteiam os canteiros?
A.A.: É ainda uma questão muito aberta, existem muitas posições a respeito. Eu estou
ainda muito próxima por causa da fabricação da escola, mas não existe nada que está
num edifício e que era um edifício residencial e que depois passou a ser escola,
imagine a encrenca... Lá não tem espaço físico para se fazer um canteiro, infelizmente
não tem mesmo. O que a gente faz agora é o acompanhamento das obras e a largo
prazo, se tivermos uma equipe forte, fazer a história da fábrica, venho sonhando com
isso e tentando arranjar uma alternativa para que isso seja possível. A discussão foi
longa porque eles não achavam que a gente poderia ter canteiro, mas quando eu fui
pegar a lista dos canteiros era pá e picareta! Depois até doamos as ferramentas para
o MST porque não tínhamos nada o que fazer com tudo aquilo, e não era isso o
canteiro que a gente queria. Pode até ser que agora eles estejam mais evoluídos, mas
eles não têm uma palavra final, é uma questão aberta. Até porque a arquitetura não se
dá sem a construção e a construção legitima muita coisa da arquitetura, mas ela ainda
é uma parcela de tudo o que você tem que compreender entender, estudar dentro de
uma formação de cinco anos. Cinco anos é muito pouco. Seis ainda seria pouco
tempo para tamanha tarefa. Hoje eu fui pegar uma sobrinha e a irmã dela, outra
sobrinha está estudando arquitetura e ela me perguntou: “Tia, você precisou trabalhar
dias e dias para entregar um projeto?” Eu corrigi e disse que eram dias e noites. Acho
que você está certo em centrar, estudar as questões de canteiro, porque você
detectou que é ali que você pode evoluir, é ali que está o elo fraco que você quer
fortalecer, mas você nunca pode perder a idéia da corrente inteira que ele une para
fazer alguma coisa na sociedade. Ele é um segmento importantíssimo, mas ele faz
parte de um todo. Talvez seja por isso que a AsBEA não fecha um modelo único já
que eles vão ter que fazer canteiro no Acre, na Amazônia, em Rondônia, imagina que
confusão que é isso. Que confusão é resolver um modelo distinto em meio a tanta
diversidade.
cara que mais desenhou, o que mais previu, o que mais escondeu, e todas as
conquistas que ele fez foi porque ele sabia construir. Quando ele era pequeno, ele viu
a Catedral de Santa Sofia e ele entendeu que uma hora aquilo ia ter que ser coberto, e
que era um vão enorme, e que a gente não tinha mais conhecimento, pois, com o
gótico, a gente tinha parado de fazer cúpula. Ele, jovem, foi a Roma e passou sete
respondeu: “Não conto!” porque se ele contasse, qualquer um poderia fazer. Então
eles insistiram e pediram para saber como ele faria a cúpula, e então ele pediu para
que os homens daquela mesa colocassem um ovo em pé. Ninguém conseguiu deixar
o ovo em pé. Então ele pegou o ovo, quebrou um pedacinho em baixo e deixou o ovo
de pé, porque ele tinha estabilizado uma área. E então ele completou dizendo que se
ele tivesse dito como fazer para deixar o ovo em pé, qualquer um conseguiria. Então
ele é a pessoa que vai afastar o projeto do canteiro porque ele vai ser o dono do
traçado, mas todo o traçado dele é legitimado pela construção. E com isso o traçado
foi ficando tão afastado, tão afastado, a ponto de a gente afirmar que toda a
Tudo isso está junto, mas ela é muito mais filha da capacidade de ser construída. Até
mesmo porque quando nós pudemos ser assimétricos, a gente foi. E a gente só
tipo?
A.A.: Esta é uma questão que é uma esparrela. É quase um paradoxo de grande
dentro do computador na escala um para um. Então, sendo assim, ela é factível. Só
que a gente ainda não sabe com que material defini-la, nem com que conexão
muito bonita porque eles estão fazendo a forma e até agora ninguém sabe como é que
se vai fazer a forma. Esta forma, assim, tentacular, cárdica, venosa é bonita porque
ela desmonta o lote. Não dá para executar esta forma em nosso loteamento trivial,
normal. Isto eu posso afirmar que já é uma grande conquista do ponto de vista
fundiário, urbano, do desenho. O problema é que eles estão fazendo de tudo para não
transformar isso numa funilaria trivial que, quando você tira a pele, vê uma funilaria de
insipiência só que não mais por ser principiante, mas agora como ignorantes. As
F.M.: Talvez estejamos esperando um canteiro de ponta para resolver este problema e
A.A.: Frei Otto já fazia estas estruturas! Acho que o que vai sair é uma reedição das
material, mas sim das operações isto é uma evolução bonita de se ver, porque é outro
trabalhar pode dar uma beleza de capítulo. O canteiro por conta das questões políticas
se tornou uma discussão ranheta, de se discutir quem é que está explorando quem,
esforços, doenças cardiovasculares, que são questões que a gente vai ter que encarar
F.M.: Quer dizer que o salto deve se dar quando se enfatizar a tecnologia, ao invés de
A.A.: Sim, eu acho, tem que ser técnico, principalmente no ponto de vista da
capacitação. É por isso que eu insisto nas questões da finitude dos materiais, na
pergunto: Como é que podemos formar estas pessoas? Com que exercícios?
F.M.: O grande problema destas questões relevantes que tratam o meio ambiente, é
A.A.: Existem várias armadilhas, e é importante que estejamos atentos para todas
é usada para as obras eleitoreiras e políticas e por isso tem prazo extremamente
exíguo, tanto de projeto como de execução, e por isso nós estamos com a arquitetura
que indicar os problemas que elas contêm, mas o foco tem que estar centrado, não na
crítica, apenas, mas no veio principal, se não você se dilui e qualquer armadilha te
consome. O seu desafio está muito claro: Como fazer com que o aluno, o estudante
através da matéria. Saiba ler a matéria tão bem como saiba ler a alma humana e o
desejo de um cliente da sociedade. É isso, pelo que eu entendi que você quer inserir
Urbanismo da UNIMEP.
leitura, para que o estudante entenda o mundo e seus fenômenos, para que
arquitetura.
disciplinas.
F.M.: Esta escola, a UNIMEP, tem importância no cenário das escolas de arquitetura
no Brasil, pois no início possuía uma proposta pedagógica elaborada por professores
de profissionais que estudam a arquitetura que usa a terra crua como matéria-prima,
nacionais de habitação, firmando-se como um curso com uma proposta séria e voltada
Urbanismo da UNIMEP.
E.S.: Bom, hoje, 2008, ela continua sendo a mesma escola conhecida como a escola
com enfoque muito forte com tecnologias alternativas e, de sobremaneira, com as que
usam a terra crua como material de construção. Continua sendo, herança deste
passado por você citado, herança que se concretizou na forma física de laboratórios.
componentes para a realização deste laboratório teve um custo de soma grande e que
foi totalmente bancado pela instituição e o laboratório passou a ser um espaço que
desenvolver uma tecnologia se você não possui o equipo necessário. Este raciocínio
121
A proposta pedagógica do curso de arquitetura e urbanismo da UNIMEP foi elaborada pelos
professores Maxim Bucaretchi, da PUC Campinas e Domingos Batalha, da FAU USP.
122
LABSIS: Laboratório de Sistemas Construtivos.
Em primeiro momento a responsabilidade de ter usado capital para a aquisição de
profissionais, como eu, que vinha já, desde a década de 80, construindo
Esta responsabilidade foi muito bem lida pelas outras escolas de arquitetura, nas
propostas de convênio firmadas... Para você ter uma informação, no início do curso,
logo após a visita do primeiro professor convidado, o professor Pascal Odul, nós
tivemos uma espécie de uma auditoria, uma verificação das condições que a escola
relatório produzido por um francês, que era um assessor do CraTerre. Visitou obras
dos professores, estas obras foram relatoriadas e fotografadas e este relatório, que
coisas, a ênfase com os trabalhos em terra, são estas as responsabilidades que nos
arquitetura e no meio.
Tudo isto trouxe um respaldo muito forte. A sua turma, por exemplo, passou a crer em
técnicas que antes nunca tinha conhecimento, e fatalmente muitos de vocês passaram
enfrentamento que tivemos não era motivado apenas pela idéia freqüente nos anos 80
e 70, que era a idéia de entrar pelo universo das técnicas alternativas, mas sem
nenhum compromisso. Era entrar apenas para manipular, botar a mão na massa,
entrar para conhecer somente por conhecer, mas sem levar para um plano mais
Hoje, a nossa escola, de certa forma perdeu um pouco essa força, mas por outro lado,
enquanto ela perdeu a força por uma questão tática, uma questão operacional, pois
nós perdemos professores com toda essa visão, ela se mantém porque ela fez lastro.
A escola fez lastro. Com toda esta colocação inicial sua e estes novos elementos que
pontuei que nós temos fisicamente um espaço invejável por muitos professores que
vem aqui nos visitar. Então a gente fez um lastro, este lastro é visível, os alunos de
hoje muito embora não tendo participado no passado, encontram visibilidade, entram
nos laboratórios e sentem certo “status” técnico, que está colocado aí, com alguns
elementos ainda daquela época... Os alunos sentem isto! Sentem que a escola está
F.M. E quando você fala dos profissionais que faziam os canteiros de experimento na
década de 60, neste período havia uma demanda real que era voltar a entender os
os métodos e as maneiras de se fazer as coisas com maior rigor e com maior domínio
porque havia um problema a ser resolvido. O problema da falta de moradia. Hoje, aqui
na sua escola, qual é a real demanda para a produção desta tecnologia, aqui na
UNIMEP? Você acaba de falar em ensaios laboratoriais, em operação e manipulação
E.S.: Ah... A arquitetura é uma ciência que não consegue caminhar completamente
autônoma e só. Ela precisa apoiar suas patas em outras ciências e isso fatalmente e
sexo, hábitos, relacionamento, tudo. E a arquitetura não consegue ficar alheia e ser
alternativas com objetivos grandes, porque, a geração dos anos 60 é entendida por
alguns teóricos – como Fritjof Kapra, quando ele prevê em sua obra, que a geração da
década de 60 é responsável pelo que ele chama de mudança solar. Por mudança
paradigmas. E esta geração, que se inicia na década de 60 e vem vindo com estes
aportes elegendo grandes problemas como o foco das discussões. É típico, desta
energia, eram questões que estavam colocadas de uma maneira muito diferente do
que é colocado hoje. Porque, nos anos 60 e anos 70, você nota que toda a sociedade
e, de certa forma, o mundo, tem um incentivo muito grande ao crescimento do
intelecto.
ecologia? O que fazer com as brechas que deixam? A advocacia, por exemplo,
período é que esta geração viu os buracos que tudo isso criou, viu os
séria. Colocado no plano da ética e no plano jurídico. Construir mal pode dar
construção vai gerar um complicador para toda uma comunidade, mesmo que não
seja usuária direta deste produto final, são eles que estarão sofrendo as
ecológica.
A própria ciência e os cientistas se dão conta disso e, mesmo aqueles que não sujam
a botina com barro, mesmo aqueles que fazem a leitura da releitura da produção dos
energia? Ou aproveitando outras energias? Meu cliente hoje solicita esse tipo
de coisa. Se eu voltar à primeira casa que fiz em 1981, meu cliente sequer
à procura das tais reivindicações. Então esta demanda por essas coisas que
são mais do que material e mais do que técnica, mas, postura, é muito
que venho acompanhando, troco e-mails e converso muito com alemães, que
David Easton, até hoje me comunico com ele e trocamos informações. Vejo
Segundo seu depoimento, questões estas muito mais presentes nas discussões de
E.S. Este é um tema muito rico que você levanta... É um tema que eu considero
pouco estudado. Eu conversava ainda há pouco com você sobre a alegria que tive
quando li pela primeira vez uma abordagem sua sobre o assunto. Fiquei pensando em
quais os estudos que já havia lido que fazia esta costura entre os canteiros e a escola.
Quem escreve sobre isso? Acho muito interessante este enfoque tratado em primeiro
lugar porque você, de certa forma, você vai separar o homem da sua história. Ou,
seja, a gente vai se lembrar, no futuro, de cúpulas arcos e abóbadas sem precisar se
adobe sem que precisemos nos lembrar de Javier Bonifaz. Então, acho que seu
formação. A escola passa a ser a somatória das qualidades destes sujeitos e não mais
os próprios sujeitos. Acho que este enfoque é muito precioso. Este trabalho agrega
dados para possíveis discussões coletivas sobre novos planos de ensino e propostas
Por esta razão é que eu acho que, sumindo valores individuais, entra em cena a
escola! Passa a ser a USP, a UNICAMP, a PUC, a UNIMEP... E também serão dados
ligação, ou não, desta escola com o mercado, e como é que se dá esta ligação desta
escola com o mercado. A escola forma este ou aquele aluno para trabalhar como
mercado? Esta questão é o grande ganho. Este será o grande trunfo da escola.
Você então me pergunta: “E dentro da escola, como o canteiro faz isso?”, repito, o
canteiro.
desenvolve o intelecto, você joga fora questões que são fundamentais na produção da
arquitetura. Isto eu não digo sozinho, estou repetindo as palavras do primeiro arquiteto
que pisou na terra. O corpo é a nossa casa. Então, se eu partir desta premissa, eu
como arquiteto, ao projetar, e se o meu corpo é minha casa, qual a minha linha? Se
minha casa, meu corpo está bagunçada, se está sofrendo, se está poluída, se está
ruidosa, barulhenta, que tipo de arquitetura eu vou produzir? Este elemento é muito
canteiro presente na escola, ele é o elemento desse conjunto de coisas que o aluno
tem que participar com a intenção e com a descoberta. O aluno tem que se sensibilizar
ter disciplinas exaustivas, principalmente hoje, quando tudo são softwares. Mas o
aluno precisa descobrir coisas. Precisa descobrir que quando você encosta duas
vento, ao sol, ao dia, à noite, à chuva e a descoberta de tudo isso é que vai formar um
arquitetura.
De mais a mais, como vem de fora uma pressão de consciência ecológica, do uso da
materiais, para poder com eles operar através de um meio que é o desenho, ou outros
que hoje já temos no mercado. É preciso compreender o corpo físico que existe entre
as linhas traçadas, entender que o que há entre este traçado contrai, retrai, aumentam
Vou além, percebo que o canteiro pode mostrar relações de mercado como as
fazem com que mudemos o rumo de uma idéia, pode-se entender os problemas
podem ser ilustradas pelo fato de que na medida em que nós voltamos uma
operacional, o que atrapalha e o que ajuda o que deve ficar à mão, o que deve
certa para cada operação. Alem disso, o canteiro traz para o aluno, uma experiência
inédita, problemas reais. Ao trazer problemas reais ele obriga o aluno a dar soluções
reais. Porque o problema grita na frente dele e ele é obrigado a ter a resposta ou
Isso tudo afasta para muito longe a idéia de que podemos ficar “riscando” arquitetura
sem saber entender o que significa fisicamente a altura que vai ter ou que tamanho é
esse ou como ela se assenta no chão... De certa forma, no canteiro, o aluno vivencia
soluções implicam em muitas vezes em posturas que estão fora do universo imediato
do arquiteto que são, por exemplo, problemas de logística. O aluno que entra no
laboratório fatalmente vai ter que pensar em logística. Ele será cobrado para isso. Se
esse aluno, por exemplo, como é muito comum no nosso caso, é mimado, quando
para que o campo de trabalho permaneça liberado para você e para o coletivo. Estas
informações que ele recebe, vai fazendo com que ele perceba que para poder fazer
palavra logística até mesmo porque o aluno começa, no canteiro, a descobrir como é
que se monta um andaime com segurança e discutir sobre isso. Onde mais ele teria
laboratório permite antever questões que poderiam ser de risco para ele no ambiente
de trabalho.
A questão da “práxis” me parece tão antiga que ao analisar as coisas que estão
voga em termos de hierarquia de importância, mas que não são maiores que as
tanto na Europa, como também aqui no Brasil e mais precisamente em São Paulo.
Neste período percebeu-se certa dicotomização entre a arte e a técnica. Para você, o
Você primeiro faz, depois o resultado faz com que você repense o feito. Isto é
A palavra arte é uma palavra ampla que implica em pensamentos que estão do outro
lado do nosso cérebro. A palavra arte precisa necessariamente estar atrelada a algo
mais sensível do ser humano, a algo mais feminino, aberto a intuição e a percepção. A
arte transita por este meio. Se por um lado a sociedade obriga o desenvolvimento da
minha lógica, obviamente por uma questão de sobrevivência abafa-se o outro lado.
Existe um provérbio clássico: “Já que de arte não se vive, que a arte nos ensine a
viver”. A arte é uma ciência global desligada do conhecimento lógico. Então arte e
resultados, como acerto e erro, na medida em que a técnica seja colocada para os
facilmente chega ao obsoleto, pelo próprio movimento que a história tem. Mesmo
no recorte, o próprio orientador não pretende nunca passar por terrenos de areia
por artigos. Todo o final de ano as universidades passam uma régua para saber o que
das questões acadêmicas visto que o anterior, ou seja, o plano geral daquele ensino
daquela escola contempla isso. Agora, se você quer saber até que ponto este
que eu vejo hoje, eu não via há um tempo. Um tempo atrás eu pensava que qualquer
meu filho a viver uma condição podre porque eu tive uma atitude destrutiva com este
ambiente. Hoje eu penso diferente. Hoje meu pensamento é uma hipótese Gaia que
grandes centros, contavam apenas com ônibus para atender ao transporte de massa.
proprietário de 100 ônibus e o prefeito que vai pagar este homem pelo serviço que ele
vai prestar. Percebe-se, com o passar do tempo, que a prestação do serviço vai,
lentamente, entrando em caos por inúmeras questões que não serão discutidas agora.
uma perua Kombi e que num belo dia resolve cobrar pelo mesmo serviço que o ônibus
cobra. São soluções criadas pela população que funcionam e que se você for à
comunidade e questioná-la: Qual a solução que você prefere? A solução que o estado
lendo os problemas e criando soluções. Hoje o que vemos nos organismos de governo
é uma inversão da década de 40, quando nós é que corríamos atrás do chefe, hoje há
uma inversão disso... Há uma corrida atrás de se tentar solucionar os problemas das
comunidades.
os cantos da cidade. Este profissional que é formado nos canteiros experimentais, ele
está preparado para este mercado? Ele faz a crítica? O canteiro faz parte desta
Sempre foi a grande expectativa dos alunos, e, diga-se de passagem, dos pais destes
alunos, o fato de que ter passado por uma universidade e ter um diploma, este fato em
si já garantiria um bom salário, uma vida digna, a capacidade de poder adquirir bens e
serviços. Esta foi a “tabula rasa” da criação das escolas, acredito eu, de todo país. O
simples fato de você ter passado por uma universidade já te eleva a uma categoria
especial. A escola sempre foi considerada assim. O que acontece de uma forma
intensa, é que o usuário da escola a cada dia que passa deixa de ser um procurador
ter um futuro tranqüilo, e, portanto você passa alguns anos sem se preocupar com o
futuro.
atender a esta aspiração, ela precisa se adequar à demanda do mercado que é veloz.
mercado, você vê a escola que lê mercado e que depois, a partir daí monta o seu
plano de ensino. Isto é muito comum. A UNIMEP, por exemplo, desde o início não se
propôs a isto, pelo menos no curso de arquitetura. Inicialmente porque teve uma figura
forte que possuía formação em outro país, que marcou profundamente a sua vida, e
suficiente para uma pessoa profissional no futuro se dar bem. Ou seja, a criação inicial
deste curso contou com estes elementos que dão importância para a formação de
coordenação desta escola, esta proposição se manteve, nós não ficamos analisando
qual é a demanda atual do mercado ou qual o tipo de gente que o mercado está
requisitando, você é parte desta escola e você viu isso. Os profissionais que
eles trabalharam com conhecimentos mais clássicos. A nossa escola tem rejeitado o
mercado enquanto força que oriente o nosso plano diretor. Diferente do que acontece
em outras instituições.
F.M.: Esta postura, então, ela não abre uma possibilidade de alienação do estudante?
E.S.: A alienação da produção atual do mercado sim, pode haver. Pode haver
dentro desta escola colocando elementos para permitir que haja uma retro-
anterior, este aluno estará sendo treinado para a análise, para que ele tenha auto-
acredito que no futuro ele teria possibilidades de não se alienar e ter posições
experimentando, é muito raro. E o que temos observado é que o próprio arquiteto que
responsabilidades ou até mesmo partes de suas obras a empresas que não são de
produto, e sabem lidar com aquele produto, e o arquiteto, por sua vez, se mutila
enquanto autor daquele projeto. O arquiteto percebe que está entregando as partes
fazer a arquitetura. O grande prazer na arquitetura é ter a certeza de que o que você
construiu e a matéria-prima que você empregou tem como selo de garantia o tempo.
Quando você faz uma laje de concreto, devidamente calculada com ferragens e traço
adequados, você entrega a sua tranqüilidade ao tempo, pois aquilo que você fez tem
comprovação histórica do tempo. Todos estes lançamentos do mercado vêm sem este
selo de garantia.
F.M.: Falando agora com o Eduardo que se doutorou em artes. Em 60 e 70, vivíamos
tentando entender como era possível ter uma taxa de mais valia alta, composições
vivemos outros títulos e outros autores, como o Harvey, por exemplo, que discutem o
canteiro.
escola reflete assim e esta discussão vem, justamente, pelo corpo docente ter uma
mercadológicas. Quando eu trabalho uma aula de projeto eu ainda faço muita força e
muita questão de que passe pela minha boca e que se costure um significado para
A análise destas grandes obras deve ser feito em todas as direções, deve ser uma
vista da construção. Concordo com você que a arquitetura é colocada, não pela
escola, mas pelo mundo e pela televisão como grandes coisas feitas por gente grande.
acredito até que os alunos esperam que o futuro deles seja isto, fazer o espetáculo.
Para mim a arquitetura tem que ser uma profissão tardia, justamente pela necessidade
administrando relações pela delícia de ter meu tempo disponível para presenciar uma
obra. Acho que minha presença aqui na escola e dos outros professores garante que
PUCCampinas
Católica de Campinas.
F.M.: Professora Maria Amélia, para conhecer melhor a sua trajetória, gostaria que
experimentais.
M.A.: Posso iniciar toda essa história pela sensação de insegurança que eu senti
ano – num período muito importante da formação do arquiteto, pois é nesta fase que
você já estudou algumas coisas, já tem algumas referências ao mesmo tempo em que
percebendo que, embora sempre tivesse tido um bom resultado acadêmico, nas
seja, aquela distância que existe entre aquilo que você desenha e como transformar
isso numa realidade construtiva. Até porque eu tive que trabalhar durante todo o
às obras e com isso, me sentia muito insegura. Inseguranças com coisas simples do
Neste período eu tive aula de estruturas com o Yopanan, no terceiro ano, de sistemas
estruturais. E neste período, sempre muito generoso como ele é, nos pedia para
desenhar para ele as formas na lousa para que as pudesse explicar, didaticamente, e
num dia depois de uma aula – acho que era uma aula de escada helicoidal – eu fui a
ele e disse: “Olha, ou o nosso QI é muito reduzido, ou você não sabe explicar, porque
a gente não entendeu nada!” E ele respondeu que com certeza se tratava da segunda
alternativa. Disse ele não saber explicar e dizia, ainda, que explicava da maneira como
havia aprendido. Em título de brincadeira eu disse a ele que nós poderíamos pensar
fazia dança e teatro, era uma época em que éramos todos meio hippies e muito
Resolvi então sanar esta pendência, decidi que não iria passar o resto da minha vida
poderia retomar aquela idéia. E foi aí que, na verdade, nós começamos a levantar as
nossas dúvidas e inquietações sobre o real aprendizado que o aluno tinha. Durante
um ano eu fiz um estágio, com ele, de aperfeiçoamento na FAU Santos, esse era um
recurso que a escola tinha, mas que nunca havia sido usado, então havia ali na
seletivo o candidato já teria um histórico. Nunca havia tido um inscrito neste processo,
eu e o Paulo nos inscrevemos e, durante um ano, nós acompanhamos as aulas de
sistemas estruturais do Yopanan. Como éramos recém egressos do curso, isso foi
muito bom, pois ao mesmo tempo que tínhamos uma vida profissional, tínhamos
professor Yopanan se dispôs a este massacre. Foi uma real anatomia da atividade
dele como professor porque nos questionávamos tudo, desde a forma como ele se
Foi um ano em que nós conseguimos fazer um diagnóstico bem superficial, mas que
pessoas que possuem memória visual mais aperfeiçoada do que outras, pessoas que
outros com experiências e conhecimentos em surf, enfim, cada um com uma bagagem
de ensino aprendizagem que fosse multifacetado, isso nos daria mais chances do que
politécnica da área de tecnologia. História esta que fica bem clara na reforma da FAU
naquela estrutura como um apêndice, um corpo estranho. Este ensino importou toda a
parte laboratorial construtiva que na verdade nunca foi muito desenvolvida na própria
maior. Percebemos, com tudo isso, que era importante termos diversas traduções do
Uma coisa que foi muito própria nossa por estarmos dispostos a aprender – aliás o
Yopanan tem uma frase que eu acho bárbara, ele diz: “A maior sacanagem de ensinar
é aprender.” – estávamos dispostos a fazer parte desta aventura, no bom sentido, pois
não era esta uma aventura incauta, de aprendizado. Nós, não só como professores,
campo que considerávamos pouco desenvolvido na escola. Daí esta idéia de, a cada
conteúdo – nós já tínhamos claro que o tempo da escola é finito e por isso não adianta
querer trabalhar cinco conteúdos – a questão não era exatamente a informação, mas
construir primeiramente de uma forma clara o problema que tem que ser resolvido, o
esta resolução. A proposta era de, a cada coisa que se fosse elaborar com os alunos
enquanto conteúdos e tópicos que eram obrigatórios – inclusive nos fizemos uma certa
movimento das informações, os esforços que estão acontecendo ali dentro, como se
fosse uma corrente sanguínea passando pela coisa. Consideramos que era de muita
trabalhar com modelos didáticos. Deveria ser possível enxergar o fato de que um dado
construtiva – que a nossa idéia era que ela fosse bem ampla, desde que você pudesse
senti-la. Nossa idéia era desenvolver uma linguagem a partir de um repertório que
sempre vai carregar? Primeiramente o seu próprio corpo, segundo, seus objetos de
uso pessoal, terceiro, os elementos naturais que estão ao seu redor. Nossa
exploração foi descobrir o que destes universos poderia ser trazido pro entendimento
dos sistemas estruturais. Como, no nosso corpo poderia ser possível entender
uma teoria que a princípio se quer verificar. E esta construção teórica pode ser
quais já se dispõe a priori. Isso passou a ser incorporado em tudo o que fazíamos,
seu redor, a observação, o apuro do olhar para o melhor entendimento do que está ao
achando que deve ser uma meta, não é só do goleiro, tem que ser também do
arquiteto. O acerto tem que ser uma meta. O acerto em arquitetura existe, a precisão
entendimento vai significar que o canteiro está sendo mais eficaz. Quanto mais se
acentua “o canteiro”, “a atividade de canteiro”, significa que ela ainda não está
financeiros, materiais e de informação. Mas esta coisa deve ser algo absolutamente
cotidiano, natural, dentro da vivência dos alunos. Eu sou muito cética a uma
possibilidades de ser gradativo dentro do curso, o que significa que a formação será
Reginaldo mostra muito isso, como as práticas do canteiro de obras surgem como
uma coisa excêntrica e de pessoas que “acreditam”. É como se fosse uma crença,
uma seita. Isso é uma distorção do que é a formação do arquiteto. Vai ao encontro da
perda de identidade que a gente tem, do que é ser arquiteto. E isso foi uma
Essa inquietação eu só resolvi com um estudo que foi muito obsessivo de entender o
que é o profissional de arquitetura. E hoje para mim eu não tenho a menor dúvida,
para mim o arquiteto é o profissional da construção. Eu tenho claro para mim que
durante milênios ele foi “o” profissional da construção. Isso começa a mudar a partir da
profissionais que ficam mais ligados às cortes e aos ateliês, a uma verve artística e o
cara que continua no canteiro, isso não acontecia anteriormente. Depois os processos
construção, inclusive por questões de novos materiais, como por exemplo, os metais,
argila e da madeira, são, aqueles, materiais que já não são mais de obtenção direta na
natureza e que precisam passar por um filtro de produção industrial e nós arquitetos
não estávamos nestes espaços de elaboração dos novos materiais e, portanto, não
conhecendo os segredos da própria composição destes materiais. Daí para frente fica
uma coisa muito complicada, encrencada. Realmente não pode haver arquiteto que
experimentação construtiva está compartilhada entre uma série de espaços. Acho que
até o que aconteceu aqui na PUC foi uma mistura entre propostas que a gente tinha
com propostas que vieram de outras áreas. Eu hoje acho até que é uma resolução
profissional.
ciclos de produção dos diversos componentes e materiais? Eles vão estar distribuídos
F.M.: Antes de entrar nas outras perguntas, eu gostaria de pegar dois ganchos desta
de fato, as práticas de canteiro de todas as outras, como se esta fosse uma atividade
paralela dentre as outras. Tudo deve ser parte indistinta de um todo. Nunca pensei
que realçar, para o estudante, a presença do canteiro poderia ser um “tiro no pé”...
M.A.: Exato. Acho que quando a gente vê de forma tão excêntrica e excepcional, isso
escola e do canteiro. Ele muitas vezes é visto quase que como um altar, e eu
material.
Essa ressignificação do canteiro ou do que se chama canteiro de obras, acho que é
uma coisa muito interessante. É quase que uma química mais fina desta coisa, isto,
particularmente sempre foi uma inquietação minha, esta reflexão sobre o papel social
da profissão de arquiteto numa visão cotidiana da vida das pessoas, para nos
arquiteto pelo outro lado, da necessidade das pessoas em relação ao arquiteto. Ele é
um cara que tem que saber construir e pronto. Eu não tenho nenhuma dúvida disso.
Arquiteto, para mim, é sinônimo de construtor. Podemos até ter outros sinônimos, mas
M.A.: E eu pergunto: Como é que você pode viabilizar esta ponte, sem sê-la?
F.M.: Outra coisa que considerei importante em sua fala é a investigação dos
entendimento dos exercícios. Nestes quase trinta anos, desde que vocês intentaram
esta prática até hoje, você conseguiu realmente e efetivamente criar um processo de
ao aprender. Ou seja, deixar claro para o aluno que ali se encontra que você é alguém
que continua aprendendo com o que está acontecendo ao seu redor. O ser humano,
as duas partes, de que tem alguém que sabe mais e de que tem alguém que sabe
menos, ou de que tem alguém que sabe e de que tem alguém que não sabe. Nesse
construção daquele conhecimento, daquilo que está acontecendo ali. Você pode até
de um conhecimento novo, dificilmente acontecerá no processo. Ela pode até vir ali
com bagagem. O Zanetini, por exemplo vem de uma família de pessoas que já
mexiam com a marcenaria, o Renzo Piano tinha o pai construtor, ou seja, os alunos
que por ventura vem de uma família de comerciantes, entendem de maneira mais fácil
a questão das trocas econômicas, e se você conseguir que o aluno disponibilize este
domínios do conteúdo que se está trabalhando. Devo ressaltar que esta é uma de
nossas fragilidades, a escola de arquitetura é feita principalmente de profissionais de
geral é muito pequeno. Há uma tendência de você reproduzir a sua prática profissional
na sala de aula, e cria uma situação onde ela pode ser muito bem sucedida se você
sempre você encontra isso numa pessoa. Apreender a arquitetura não é a mesma
não estão preparados, não conhecem arquitetura, não sabem desenhar... Estes
professores não se dão conta de que estes alunos são arquitetos em formação. Se
eles tivessem a mesma bagagem do arquiteto, não estariam ali naquela condição. A
importante que se tenha uma explicitação, na classe, de qual é a alma daquela turma.
Existem turmas que são mais expansivas, tem turmas que conseguem se relacionar
bem entre si e outras não, às vezes existem na mesma turma alunos que têm
experiência construtiva de diversas formas e que elas podem ser utilizadas a seu favor
porque elas podem porque eles têm o domínio de certos materiais ou de algumas
desenvolvido.
de certa maneira simples e que vai se ampliando em complexidade, mas sem perder
bagagem consolidada, por mais econômica que ela seja, pois é aí que se começa a
percepção de que sabe algo, porque você se defrontou com um problema, conseguiu
enxergar com clareza este problema, conseguiu construir ali um conjunto de perguntas
Inclusive com a posterior oportunidade de avaliar quão bem, quão dentro de suas
É muito importante que o professor tenha claro qual o método de aprendizado é esse.
não dizem a que vieram. Não colocam, claramente, quais são as metas de
aprendizagem que se deseja. E isto se reflete em cada disciplina. É por isso que cada
disciplina tenta reproduzir o curso inteiro em si. Todas as disciplinas acham que tem
que dar conta de tudo e então não é possível que se tenha um trabalho integrado já
F.M.: Pelo domínio que você tem do assunto, estou vendo que estas duas falas já
responderam várias das perguntas que trouxe hoje aqui para você. No seu discurso
você trata a escola – em suas partes separadas e em seu todo, no canteiro e nos
considera como parte destas atividades, para o entendimento absoluto do que é que
diferenças que eles tem, das vantagens de se trabalhar num ambiente onde se está
suscetível ao erro – pretendendo e intentando o sucesso – mas ainda assim protegido
maneira de se construir?
M.A.: Sem dúvida nenhuma! Eu, até mesmo por ter trabalhado muito tempo em
que está ao seu redor e este redor ele é adimensional, pode ser um redor próximo, ou
Estas formas podem ser muito variadas. Pode haver, compondo a experiência
são fundamentais, porque a gente tem que ter essa possibilidade de entender o que
está acontecendo ao nosso redor e entender qual é a parcela que cabe ao arquiteto,
nesta realidade. Sou muito refratária a poupar o aluno – acho que existe uma coisa um
pouco esquizofrênica nos currículos em geral que é exigir, mas ao mesmo tempo não
permitir o contato. Há uma discussão muito antiga se se deve ou não ter as disciplinas
tecnológicas desde o início do curso porque isto poderia tolher a criatividade. Eu acho
muito difícil alguém ser criativo se não domina os recursos, os meios e as técnicas
construtivas com as quais ele vai ter que realizar a sua própria criação artística. É uma
incoerência. Acredito que o aluno deva ser estimulado o tempo todo a ter um
comportamento de arquiteto, só que este comportamento irá se aperfeiçoando, ele irá
elaborados ao longo do curso que tem ali uma estrutura prevista, mas que devem
em uma realidade como a nossa que muda com muita rapidez, o Brasil ainda continua
econômica em uma velocidade impressionante. O aluno não deve ser poupado disso.
Essa idéia de um curso que é preservado numa redoma onde você ouve falar da
realidade, não é boa. De fato é de grande valia ter esta atividade extensionista de
diversas maneiras, mesmo da mais estrita, seja por convênio ou por cooperação, ou
por um puro contato, mas de maneira que o aluno entenda o que está acontecendo,
qual o problema que está sendo colocado ali e que está sendo resolvido. O aluno deve
estar o tempo todo estimulado a fazer o raciocínio entre o que ele está aprendendo e o
que é que existe ao redor dele. Eu, pelo menos, procuro exercitar isto em todas as
aulas, em todas as disciplinas em todas as áreas. Para que ele se sinta efetivamente
vivendo a vida de um arquiteto. Porem num lugar onde a resposta que ele tem que dar
será progressiva, dentro da bagagem que ele tiver acumulado. Mas ainda assim ele
terá que se sentir imbuído disso. Embora a escola deva ser o laboratório do erro – O
Ruben Alves e o Gilberto Dimenstein têm um livro que se chama “Fomos maus alunos”
– onde é possível se errar, a meta deve ser a meta do acerto, e é o que não acontece
que é uma meta de acerto e decisão está ausente. Um projeto pode ter vários
caminhos para que se chegue ao resultado desejado, mas o arquiteto deveria dispor
soluções seria mais adequada, mesmo que simule cenários. Num concurso de
parâmetros para avaliar qual deles chega mais próximo de uma realidade desejada.
eventualmente algumas atividades, mas a escola raramente tem claro que o currículo,
na verdade, é a experiência integral que o aluno tem naqueles cinco anos, ou mais, e
que ela pode ser parametrizada através de alguns estágios previstos que devem ter
curricular onde caibam fenômenos e questões que surgirão porque a escola tem uma
tendência quase original, impregnada no seu DNA que é a de ser anacrônica. Este é o
curricular que de fato forme um profissional. E no nível superior isto é ainda mais
crítico, pois a escola estará ratificando alguém que passará a intervir na realidade,
momento futuro ele esteja preparado para enfrentar aquela realidade, aqueles
fenômenos. Se pensarmos que toda a literatura é anacrônica por essência, porque ela
mais novos que você via estar recomendando ou utilizado terão ali um ano, dois anos,
e em geral a nossa literatura tem ali dez, vinte, trinta, quando não quarenta. Então
concluímos que o recurso literário já tem por si esta característica, ele será
que tem tantas possibilidades produtivas de riquezas econômicas mas que gerou uma
o real compromisso como arquiteto? É muito importante você saber que não é um
ambiente material onde as atividades acontecerão, ou não. Este dado espaço não
resolve todos os problemas, mas ele pode ser o facilitador, este espaço tem
racional dos materiais, das fontes das matrizes energéticas, dos custos, de uma
beleza que possa ser compartilhada por todos. Esta questão do anacronismo deveria
ser uma tônica para os currículos, e nesse sentido os espaços para a experimentação
construtiva, todos, que vão desde a sala de aula, devem ser explorados.
Milton Vargas é muito ilustrativo, quando questiona o que é a tecnologia – não se faz
Quanto antes você trabalhar com estes enfrentamentos na realidade, com a dimensão
Este é o porque de eu não gostar de afirmar esta frase de “então agora vamos para a
aula de canteiro”. Seria, para mim o mesmo que afirmar: “Vamos agora para a aula
teórica”. O que é teoria e o que é prática num processo de resolução material das
coisas? Para mim não há uma fronteira clara entre os dois, e ao deve haver por uma
aprendizagem não deve passar por essa separação. Toda vez que um aluno disser:
“Estou indo para uma aula teórica”, ou “Estou indo para uma aula prática”, é sinal de
obtidos e criados, sem que todo ano seja um novo recomeço? Fazer do laboratório um
M.A.: Nesta perspectiva da qual eu estou te falando. Este foi todo o meu esforço no
doutorado. Minha experiência no mestrado foi longa, com uma reflexão longa, de
glorioso para alguns arquitetos, mas eu acho, pelo contrário, de uma nobreza imensa.
Vivemos numa sociedade que é cada vez mais urbana e cada vez num ambiente mais
artificializado, ou seja, cada vez nós estamos trazendo pessoas para o nosso campo,
Ter sempre com o aluno, desde o primeiro dia em que você falar com ele até seu
último dia na escola, ele tem que se sentir dentro de um processo de resolução global
complexidade a partir do momento em que ele está mais instrumentalizado. Isto vai
totalmente de encontro com os processos que existem nas escolas hoje que é o de
absoluta fragmentação, quando cada disciplina em cada ano parte do zero, deixando
para traz tudo o que foi feito antes e passando a construir novas verdades. As
disciplinas refletem muito esta lógica de fragmentação porque partem desta escola
atividade eminentemente intelectual e que não tem nada com a construção. São
Seja qual for o nome que você queira dar para a disciplina, seja qual for a abordagem,
diversos conteúdos e informações que são necessários para construir o seu percurso
e o seu raciocínio, acho que você já vai estar sendo bastante competente. Um dos
direito de não se comprometer com a evolução material. Daí para frente, você pode
esquecer porque você vai formar um arquiteto deficiente. É o típico deficiente físico da
praticamente não existe de maneira rigorosa como existia. A FAU USP é uma das
poucas escolas que ainda pratica esta departamentalização rigorosa e rígida da qual
eu nem asseguraria que chegue a ter uma eficácia absoluta. Pelo contrário, eu
considero que a própria ordem econômica atual para se gerenciar uma instituição de
instituições privadas, faz com que você tenha que racionalizar as estruturas, partilhar
recursos, e me parece que a tendência atualmente tem sido muito mais de mescla de
estruturas e formas de se pensar que por si são muito boas. Não vejo problema algum
nisso. Inclusive, o arquiteto, com cada vez mais experiência e background para
trabalhar num ambiente de muitas disciplinas nos se sentirá mal neste ambiente.
Hoje se tem diretrizes curriculares como nunca antes se teve. Talvez hoje nos falte
muito mais clareza de como programar e trabalhar, já que tudo isso se tornou um ciclo
vicioso. Se você tem professores que se formaram de uma determinada forma, na sua
para a compreensão do que está ao seu redor, ele vai tentar reproduzir aquilo ou a
sua prática profissional. O projeto pedagógico do curso do qual falam é uma coisa
muito importante. Uma noção clara de currículo, seja ela qual for, deve ser explicitada.
Os estudos que fiz, mostram que as escolas em geral não o têm. Elas confundem
currículo com grade curricular que a verdade quer dizer grade de disciplinas, e não
tem nada a ver uma coisa com a outra. A escola deve ter muito mais claro o que não
fazer do que o que fazer. E primeiramente o que não fazer deveria ser esta noção de
formar um profissional que só pensa e que pensa que alguém vai fazer. O que eu não
vejo nas estruturas disciplinares é a noção da totalidade do problema com o qual você
está lidando. É algo dicotômico esquizofrênico em que cada disciplina quer ser só uma
coisa muito específica, e ao mesmo tempo quer conter todo o curso. Isso mostra
F.M.: Saindo um pouco desta linha de raciocínio, você consegue ver hoje, pelo menos
dentro do curso aqui da PUC, uma discussão ou uma ambientação para o momento
M.A.: Não posso te assegurar que a faculdade no seu conjunto de professores tenha
um pensamento único. Acho que é desejável que a escola possa identificar as suas
metrópole que tem questões urbanas e territoriais muito diferentes das que você tem,
quais me senti muito feliz, muito contente, pois entendi o que estava fazendo na minha
Hoje eu acho que as estruturas acadêmicas, talvez até pelo cumprimento muito estrito
do que o MEC hoje coloca como obrigação institucional, que começa desde a decisão
se a escola vai ser universidade, centro universitário, ou uma faculdade isolada, todo
sonho coletivo. Eu sinto os nossos alunos hoje, ingressantes, os alunos que estão ali
Tem um universo muito isolado já que o recurso de você ser um ser individual, isolado,
são muitos. Teoricamente com uma meia dúzia de periféricos você tem um poder
Rebelo se configura como uma das pessoas mais aptas a contribuir com
de Arquitetura e de Urbanismo
Sua noção aguda e suas opiniões precisas, descrevem o lugar do canteiro como
país, é de cisão entre o saber a teoria, e o saber fazer. Existe certa dicotomização
se propõem a tão somente reproduzir fórmulas feitas. Quero saber a opinião do senhor
sobre isto.
Y.R.: Bom esta discussão é muito interessante e não diz respeito só ao Brasil, não.
repensar o ensino da prática no campo das ciências do “bem construir”. Diz este autor,
projeto. Hoje os alunos estão até mais acostumados - nas escolas americanas como
que por muitas vezes não tem nada que ver com realidade do que fazer, ver como é
que se faz, do que ver como foi que pensou o sujeito que chegou a um produto. Por
isso o nome “Minds engeneering”, porque ele diz que a pessoa deve formar em sua
cabeça a coisa pronta. O aluno deve aprender a ver a coisa pronta imaginativamente,
sem precisar passar, necessariamente pelos cálculos. O autor ressalta, nesta obra, a
vai fazendo, ele tem na cabeça, “a priori” o que é que ele quer fazer e vai e faz. Não
Obviamente, não é somente este tema que deve nortear a formação. Deve existir um
equilíbrio entre estes dois grandes lados. Não se deve abandonar nenhum dos dois,
mas devemos ter cuidado com o puro cientificismo, sem a devida reflexão oriunda da
imaginação.
F.M.: A escola americana que da qual você diz que ele cita como exemplo é a MIT?
Y.R. : Isso. Já faz anos que se está rediscutindo o ensino por lá. Na análise deles,
estavam formando profissionais que, saindo da escola, não sabiam fazer nada. Não
matemática na cabeça das pessoas e ficando presos àquilo, não conseguiam transferir
Eu tenho uma visão intermediária sobre este assunto, pois eu acho que não devemos
considerar nem tanto ao céu nem tanto à terra. Para mim, a escola é o lugar da
mercado, mas também não pode se afastar da realidade do que existe. O ideal é uma
F.M.: Quando eu falei sobre a escola falei sobre a teoria e a prática, sobre a divisão e
termos de projeto. Por exemplo – Quando o artesão faz um projeto, não o faz em
termos de desenho, pelo menos não em termos de desenho formal, plantas, cortes...
Não, o artesão tem tudo isso na cabeça, e imediatamente inicia o processo da
formal como resposta para vários cálculos, o desenho mensurado por meio de
cálculos, mas que na verdade, por muitas vezes, é impossível de se realizar porque na
vida real não é possível materializar determinadas questões que teoricamente são
possíveis.
como os gregos – que saber é fazer. Desta maneira, só sabe quem faz.
arquitetura.
Y.R.: Sim, na Belas Artes... Acho que foi a primeira vez que eu ouvi falar em canteiro
experimental. Aí depois na UNICAMP, desta vez sem qualquer ligação com escolas de
gente vem lutando para manter um pequeno canteiro que temos lá, mas que pouco a
pouco está sumindo e dando lugar às invasões da própria escola. Como não
conseguimos manter aquele espaço o tempo todo em atividade – fato este causado
pela inexistência de uma disciplina voltada diretamente, o tempo todo, para canteiro –
canteiro?
Y.R.: Eu acho.
F.M.: Desde que iniciei a pesquisa sobre os canteiros experimentais, pude perceber
reforma administrativa?
Y.R.: Acho que não. Acho que todo o problema é a falta de vontade política. É preciso
que haja uma pessoa na direção, na coordenação, que enfrente tudo isso, compre a
briga, e vá em frente. No caso da São Judas, o Contier briga por isso, mas ele ainda
está em uma instância que não chega às instâncias dos cargos que realmente tem o
poder de realizar estas coisas. Ficamos apenas contando com a boa vontade do
que se refere ao funcionamento da escola, tem ainda a figura do diretor que não está
ali no dia-a-dia. Acha o canteiro bacana mas não tem a gana para fazer acontecer. É
para mim a importância destes no ensino da arquitetura. Porém, quando fui à procura
dos professores de canteiro, descobri que eram em muito poucos, parece para mim
pouco se faz para dar continuidade, há uma resistência em se trabalhar com esta
questão. Você considera isto comodismo, por estar a estrutura cristalizada, falta de
Y.R.: Não, eu acho que não. Acho que é ignorância, mesmo. Quando se vê este
monte de escolas que estão espalhadas por aí, se não me engano hoje é algo em
possibilidade. Eu acho que nestas reformas curriculares o MEC deveria dar maior
relevância ao assunto. São tantas as exigências que temos de tolerar! Por exemplo,
eu sou contra a decisão deles terem banido das escolas de arquitetura e urbanismo as
maioria das vezes elas são aulas ruins, mal dadas. O fato é que deveria estar na
arquitetura. Na verdade existe em algum lugar alguma coisa escrita que deve haver
uma descrição rigorosa de como deveria ser este espaço e como deveriam ser as
maneira efetiva.
por questões de marketing, queria ser a escola do canteiro. Isso foi um apoio para que
a coisa toda andasse. Havia também um sujeito, e este sem dúvida alguma não
podemos nos esquecer dele, que era o Joan Villá, que trazia no sangue toda esta
questão do fazer como processo de ensino e de aprendizagem. Ele sim tinha esta
gana de fazer e com isso ele conseguia arrancar apoio destas instituições. Na
UNICAMP, quando aconteceu aquela crise na Belas Artes, ele foi atrás de outras
fontes, foi quando encontrou, na UNICAMP, um sujeito que era o Carlos, que apesar
de ser um poeta, ele acreditou e muito nesta história toda e deu apoio. Então sem
dúvida uma coisa muito importante, fundamental, foi o apoio institucional. Lá na São
Judas os projetos só não vão para frente por falta de apoio da instituição. Fica tudo
dependendo da tal da boa vontade dos professores e do coordenador, o que é muito
Eu vejo como burrice a instituição não considerar estas práticas de canteiro como
marketing para a escola Acho que qualquer pai de futuro aluno, ou mesmo qualquer
futuro aluno, ficaria seduzido ao ver a propaganda de uma escola e vê as imagens das
pessoas fazendo coisas, executando coisas, mais do que estarem em salas de aula
com a convencional régua “T”. Isto traria a certeza de que aquelas pessoas estão
capacitadas a construir alguma coisa... Mas este filão não é abordado, e isto eu não
F.M.: Já que o interesse da Belas Artes era este marketing, o que foi que fez com que
os laboratórios acabassem?
mais. Talvez hoje ela tenha até medo porque pode ser um foco de novas idéias,
Na UNICAMP foi mais ou menos a mesma coisa. As pessoas que constituíam a escala
mais alta começaram a migrar para outras áreas, e realmente sufocou qualquer
contato direto com os alunos. Quando se ocupa uma posição num canteiro
projetos, modos de construir, etc. O canteiro pode de certa forma reproduzir o canteiro
convencional. Com os exercícios que são propostos não há uma linha que nos
possibilite entender o funcionamento da distribuição das forças dentro das relações de
Y.R.: Eu acho que ele não precisa fazer estas críticas, acho que o canteiro não é para
outra coisa. Para mim o canteiro é mais um material de apoio didático, Assim como os
modelos para mim são importantes, assim também o canteiro o é. A grande falha que
resume em fazer, mostrar ao aluno como foi feito, mas não se sistematiza o
conhecimento que foi apreendido – e por muitas vezes construído – ali naquele
canteiro. Falta, sim, uma sistematização. Os exercícios têm que ser fechados de
maneira científica tradicional, porque por enquanto não há outro jeito de se guardar as
processo, tem que mostrar as forças, mostrar os esforços, fazer algumas continhas,
entender porque é que rompeu, porque é que não rompeu... Para mim, a grande
crítica aos canteiros que eu vejo por aí, é isso. Os canteiros viram uma grande festa,
um grande divertimento – o que é ótimo – mas depois, não tem mais nada, se encerra
ali. Falta esta tal sistematização. De todo aquele conhecimento explorado ali naqueles
exercícios, o que deve se registrar, e como? O que daquilo é necessário saber para a
fica fora da escola, e se depender do aluno, esta ligação não será estabelecida.
Mas se o professor passar das questões do canteiro, isto vai desviar o olhar do aluno.
A função principal do canteiro não é criar ideologias, para mim é ensinar como é que
F.M.: Para podermos limpar algumas rebarbas do assunto, pode-se afirmar que o
canteiro tem áreas de atuação, mas que também tem os seus limites...
Y.R.: Sim, o canteiro não deve ser lugar de todas as discussões. Não é a função do
mercado tem muita gente que não sabe trabalhar. Eu respondi que de fato é verdade
mas por outro lado não é a obrigação das universidades formar técnicos para
abastecer o mercado imediato, formar gente que não precisa pensar e só fazer. Não é
F.M.: O canteiro tem várias funções e eu acho que uma das principais é sensibilizar o
estudante...
Y.R.: É, mas esta sensibilização precisa ser construída. Ela não é uma geração
devidos cuidados o canteiro pode sim representar uma grande festa, uma grande
brincadeira donde nada se tirou. Este é um dos grandes abismos que faz, para mim,
com que o canteiro não funcione, muitas vezes. Para mim tem que se tomar muito
cuidado para que as experiências rebatam no aluno, não acredito que isto aconteça
automaticamente. Neste caso é fundamental o trabalho do professor e a direção dos
trabalhos no canteiro.
Y.R.: Sendo bem dirigido, sistematizado, o canteiro pode gerar um ganho enorme.
Mas desde que se invista tempo, e que se rebata os resultados nos projetos. Aí o
necessários pelo menos uns cinco anos de contato com obra para que se saiba como
se faz um projeto. Caso contrário corre-se o risco de se projetar coisas que podem não
ter nada a ver com a realidade. Lidar com obras é fundamental para que o sujeito da
menor dúvida, mesmo sendo, no fundo, uma fantasia do que seria uma obra real. Uma
discussão da aprendizagem. A discussão política, por mais que a gente tente fazer,
acho que sempre será fantasiosa. Para estes posicionamentos políticos é preciso que
o aluno vá lá ver como é, ver se ele concorda ou discorda, pode até ser que ele ache
que tem que ser assim mesmo! Cada um tem a sua cabeça.
Ao canteiro da escola cabe construir referências. Depois, lá fora, o aluno tira as suas
para que lhe facilite na hora de projetar. A segunda, é algo que eu considero
praticamente inexistente nas escolas, não posso falar quanto ao canteiro da FAU, ou
reprodução. O professor faz cúpulas, faz abóbadas... Isso é ótimo, a reprodução pode
ser muito didática, ser original é voltar às origens. Mas falta ainda a experimentação. O
pedi para outro professor fazer pois a minha disciplina este semestre está muito longe
do canteiro e acabou não dando certo – O que eu quero saber é o que acontece se eu
na composição da massa, será que isso vai fazer dela uma argamassa flexível? Eu
combinação de materiais, etc. Criar neles a noção de não se resumir às coisas que
deveriam ser mais ousados em suas proposições para materiais e uso deles. Mesmo
que o experimento não dê certo, por ser um experimento já deu certo. Tem que
experimentar para ver o que é que dá! Existe uma área da psicologia que trata da
“zona de conforto” que é a tendência que o ser humano tem de atuar numa
determinada área com a segurança de que nada de ruim vai acontecer com ele. É um
desta zona de conforto. Mesmo que depois o professor proponha algo um pouco mais
ousado, um passinho além da experimentação do aluno, o aluno tem que
canteiro, até que apareceu uma turma em cujo trabalho nada deu certo. Eles deveriam
construir uma ponte com quatro metros de vão mas tudo naquele exercício deu errado.
Eles já estavam quase chorando. Posso dizer que das experiências daquele ano, foi o
melhor trabalho que tivemos, com possibilidades de mostrar tudo o que se pode ver
nas questões estruturais. Porque ali foi possível de se ver os efeitos, os esforços muito
mais claramente do que nos exercícios de sucesso. Apesar de não ter dado certo,
houve uma tentativa, e por isso eles foram bem avaliados. Não deu certo justamente
porque houve a tentativa de ousar e de ser diferente e com isso permitiu com que
F.M.: No começo do século XX, nossa história ficou marcada pela necessidade de
Y.R.: Acho que nunca na história o nosso trabalho esteve tão dividido. Eu não consigo
entender por que, nos dias de hoje, ainda existem sujeitos que dizem: “Eu só faço
concreto armado!”. Graças a Deus esta especialização absurda está para acabar! Este
especialização só apareceu para permitir, como você disse, que o trabalho de projeto
pudesse funcionar como linha de produção. Para que se produzisse mais e mais
rápido, e com certa certeza de que tudo sairia mais ou menos com a mesma
qualidade.
Um fato relevante que deve ser levantado é o de que esta nova arquitetura – ou trans-
arquitetura, arquitetura dos hiper espaços, arquitetura líquida – esta arquitetura vai
trazer de volta a necessidade de que o sujeito que está na prancheta tenha contato
com a obra, se não o projeto não sai. Ele precisa saber que no projeto dele, ele tem
que criar condições de que aquilo seja exeqüível, porque estes projetos são muito
complexos. É preciso saber como é que tudo vai acontecer. Este profissional tem que
estar muito mais perto do engenheiro de estruturas, do designer, do cara que desenha
grupo. Foram criadas muitas barreiras e estas barreiras criaram mais limites ainda a
ponto de existirem indivíduos que só fazem aço, outros que só fazem concreto.
O próprio mercado já está reagindo de maneira diferente aos novos modos de se fazer
as coisas. Se você prestar atenção, vai ver que o cara que é muito especializado em
uma só coisa não é muito bem visto no ponto de vista do mercado. O sujeito que é
capaz de ocupar uma outra função diferente daquela que ele está habituado, na
especificamente, nós ainda estamos dentro desta limitadora subdivisão de tarefas nas
quais os diálogos são muito curtos, somente se transmite uma informação sem muita
discussão, mas é uma situação que eu vejo que vai mudar. Vai mudar pela própria
Y.R.: É bom você ver um pouco do trabalho de pessoas como o Frank Ghery, por
exemplo. Existe um livrinho chamado “Digital Ghery”, por exemplo. É um livrinho bem
bacana que mostra como é o processo de projetar estas arquiteturas mais complexas,
F.M.: Mas então você acha que no canteiro experimental nós temos que substituir o
Y.R.: Isso é muito importante, mas não é bem assim que deve ser. Não é só isso. O
importante é saber como é que isso vai se realizar posteriormente lá na obra. O sujeito
que faz este tipo de projeto vai ter que ir para a obra, não tem jeito. Não tem como
projetar este tipo de arquitetura sem que se tenha o domínio completo de uma
construção, da obra. O sujeito tem que saber que para se fazer uma forma assim, tem
que se possuir um maquinário de tal forma. E após esta constatação o sujeito ainda
tem que voltar à obra para ver se não tem uma maneira de estas coisas serem feitas
com uma maior eficiência e de maneira mais rápida. O arquiteto tem que estar muito
mais equipado, não só com as questões de virtualidade, mas com as questões reais
também.
Y.R.: Algumas poucas universidades sim. Não é ainda uma coisa que é geral, tanto é
que a MIT, com toda a sua história e competência, está revendo a sua maneira de
ensinar para entender como é que se responde a este novo mercado. Isso está
acontecendo em algumas poucas escolas influenciadas por estes sujeitos tipo Peter
Eisemann, Frank Ghery, Zara Hadid, ou seja, sujeitos super teóricos e fazedores desta
que eu conheci, um chinês casado com uma brasileira, que dá cursos que duram um
ano, como professores convidados, sobre estes assuntos. Ou seja, existe o interesse
nisso, mas ainda não é uma coisa curricular e obrigatória nas faculdades. Ainda é visto
Brasil, especificamente, eu não conheço nada parecido. No Brasil, por sinal, existe um
preconceito muito grande a respeito desta área. Existem grandes arquitetos que ainda
hoje acham tudo isso uma grande bobagem. Eu mesmo achava tudo isso uma grande
bobagem, até que fui estudar o assunto. Ou melhor, conheci o assunto muito
superficialmente mas já considero que é algo muito sério, não algo assim que passa e
pronto.
No fundo esta arquitetura líquida é mais uma coisa que está acontecendo, é fato. O
tornou uma espécie de modismo, uma idéia muito mais teórica do que construída.
Depois vem o deconstrutivismo que é o berço para esta arquitetura que está sendo
feita em grande escala por aí. E com toda uma teoria interessante que a respalda, que
ortogonalidade? Por ser mais fácil de construir? Pela fácil adaptação das coisas neste
espaço? Mas e o ser humano? Será que é o melhor espaço que se produz para ele?
Será que um espaço mais orgânico e mais interativo não nos daria mais bem estar?
Agora, os canteiros das faculdades de arquitetura ainda não estão preparados para
receber este tipo de coisa, mas ele seria o lugar ideal para se experimentar estas
coisas. Como é que se faz uma forma de tal complexidade? Como se constrói isso?
Como é que se pode produzir uma forma que não seja ortogonal? Os canteiros das
escolas podem, e devem, nos dar estas respostas. No meu entender, no futuro, vai ser
Tem que estar sempre todo mundo junto, quem desenhou, quem pensou, quem orçou,
F.M.: E eu calculo que na escola também não será diferente disso, estas discussões já
Y.R..: Pois é, sem dúvida, estas questões já têm que entrar desde já na formação.
Tome como exemplo aquela empresa, a “Ove Arup”, que é a empresa que faz todas
Ito, desse pessoal da vanguarda, neste escritório, a equipe é composta por engenheiro
de estrutura, engenheiro mecânico, artistas plásticos, tudo isso só para fazer estrutura.
Então quando eles entram para conceber uma dada estrutura, é esta grande equipe
que trabalha junta para produzir estas estruturas. Imagine só você que hoje temos
artistas plásticos projetando estruturas. Isso mostra que, hoje em dia, é impossível
permanecer cristalizado em apenas uma área para que se resolvam estas questões
mais complexas. Se elas são complexas, que não significam necessariamente difíceis,
tem que ter um conjunto de profissionais de áreas distintas dando apoio para a
concorrendo para se criar algo novo. É isso que a Ove Arup usa para executar seus
na nossa história como construtores. Mesmo que tudo isso não dê em mais nada e
desapareça toda esta coisa, ainda assim vai ter deixado um rastro muito interessante.