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SILUO R. A. SALINAS
Univenidade de São Puttlo
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e a des-
constituldo por partículas em movimento, govornadæ pelas leis da mecânica, I
2. As leis da termodinâmica
A termodinâmica pode ær formulada em tennos de duas leis básicas. A primeira
lei incorpora e generaliza a idéia mecânica de conservação cla energia. O seu estabele-
cimento pressupõe a superação da teori calor não
pæsa de uma forma de energia' Esta multanea'
mente, nos trabalhos de Mayer, Joule, ores euro-
peus. Em particular, Helmholtz formula a primeira lei numa linguagem bern próxima
à da mecânica, que pode ser expressa peia equação
^ó'
= *,T ez)
onde T é a temperatura absoluta do sistema.
As leis da termodinâmica podem ser resumidas numa citação de Clausius, utilizada
por Gibbs em 1875 no frontispfcio do seu famoso trabalho sobre o equillbrio das
substâncias heterogêneas: "A energia do mundo é constante. A entropia do mundo
tende para um valor máximo."
pZ : constante, (3.1)
S=kN9n V 3KN
a NSs,
¡r2 QnT Q.2)
Lt)2mc-
äNr&'c
A partir da segunda lei de Newton, que defìne força como momento transferido por
intervalo de tempo A f, podemos obter a pressão, isto é, a força por unidade de área,
pv
1
Mais ainda, levando-se em conta a forma moderna da lei de Boyle, pV:lIkZ, vemos
que fica patente o relacionamento entre a temperatura e a energia cinética dæ par-
tículas do gás.
32 Silvio R. A. Salirws
Clausius percebe que a velocidade c é uma espécie de valor médio e que æ colisões
moleculares são muito importantes para explicar a equalização das velocidades. Em
1859 ele introduz o conceito de caminho livre médio, que é o espaço percorrido em
média entre duas colisões moleculares, para removef certæ objeções ao seu modelo.
Uma destæ objeções é o curioso argumento do perfume: se todas As partículas de um
gás viajam de um lado a outro de uma sala com a mesma velocidade c, que deve ser
muito grande, então um frasco de perfume aberto numa extremidade seria imediata'
mente percebido por um observador na outra extremidade da sala. Mas isto não acon-
tece, as partículas de perfume levam um certo tempo pafa se difundir, e as colisões
molecula¡es é que são responsáveis por este atraso. Deve-se também notar que o con'
ceito de caminho livre médio abre perspectiv¿N para um yasto prograrna de ciílculo das
ehamadas propriedades de transporte: condutividade térmica, difusão de partículas,
viscosidade, etc. . .
A noção matemática de uma funçÍio de distribuição das velocidades das partículas
de um gás surge claramente num trabalho de Maxwell, publicado em 1860. Maxwell
é capaz de reescrever a expressão (4.2) para a lei de Boyle na forma
pv=lxm<i'>, Ø.3)
f (1') dl
<1,2> :1tr2 , (4.4)
tfo) db
em que f (i)é' a funçäo de distribuição das velocidades, isto é, f(l )d/ dáonú'
mero de partlculascomvelocidade i : (vx,vy,v) tal que rrrestánointervalo
eîttevx e vx + dvr,v, no intervalo entre rrt ,y*dv, e vrnointervaloentr€
"
vz e vz * dvz.Usando argumentos de isotropia no espaço das velocidades, Maxwell
observa que f ( t ) obedece "a mesma fórmula com que os erros são distribuidos
na teoria dos mfnimos quadrados". Temos então a famosa distribuição de Maxwell-
Boltzmann, dada por
lkr),
1
não estão correlacionadas - esta é a hipótese do caos molecular, que será depois uti
lizada por Boltzmann.
(ii) Maxwell mostra que o coefìciente de viscosidade de um gás independe da den-
sidade (o que não é nada intuitivo) e é proporcional à raiz quadrada da temperatura.
A confirmação experimental deste fato, pelo próprio Maxwell e Posteriormente por
vários outros pesquisadores, representa um grande triunfo da teoria cinética.
(iii) Clausius estabelece o "teorema da equipartição da energia" e calcula o cÍuor
específico dos gases. Aqui surgem alguns problemas que só serão resolvidos de maneira
satisfatória mais tarde, com o advento da mecânica quântica. Por exemplo, o teolema
da equipartiçâo prevê que a relação entre os calores específìcos a pressão constante e
a volume constante é 5l3 e 4/3 respectivamente para os gases monoatômicos e diatô'
micos. Embora tenha havido boa concordância exPerimental com as medidæ para os
gases monoatômicos (que foram isolados na última década do século passado), a re-
lação entre os calores específicos do ar, que é um gás essencialmente diatômico, dava
com boa segurança o valor 1,4*7 15, bem longe da previsão teórica'
Há quem afìrme que o desenvolvimento da teoria cinética, aliado à influência das
teorias de Dalton na qufmica, contribuiu decisivamente para reabilitú o conceito
de átomo flsico, atacado no final do século por ffsicos e fìlósofos de formação posi'
tivista. O átomo ganha uma nova realidade e se desprende dos liames com a metaff-
sica. Através das medidas dos coeficientes de transporte, que são escritos em termos
do caminho livre médio, estimam-se diâmetros e massas atômicæ. Calcula-se também
o número de átomos num centímetro cúbico de um material - assim é que se produ-
zem os números de l,oschmidt e Avogadro.
A distribuição de Maxwell em si começa a ser verifìcada apenas na década de 20
cdrn æ experiéncias de Stern. Em 1955, Miller e Kusch realizam experiências de gran-
de precisão que confirmam a distribuição de Maxwell-Boltzmann de forma altamente
satisfatória.
trabalho inicial de Boltzmann é muito criticado, inclusive por Clausius, e cai logo no
esquecimento.
Pouco depois desta primeira tentativa, Boltzmann aparentemente lê os trabalhos
de Maxwell e se convence da utilidade da função de distribuição das velocidades
f(t ) e da necessidade de levar em conta os choques moleculares para produzir uma
evolução do sistema para o equilr'brio. Datam deste perlodo alguns trabalhos em quo
Boltzman¡r amplia as idéiæ de Maxwell e consegue novamente escrever uma expressão
analftica para a funçíÍo entropia. Finalmente, em 1872, ele publica o primeiro traba-
lho que contém uma equação para a evolução temporal da função de distribuição das
velocidades das partfculæ de um gás. Esta é a famosa equação de transpofte de
Boltzmann.
Considerando um gás distribufdo uniformemente no espaço, em que só ocorrem
colisões binárias entre as partículas, a variaçlio temporal da função Í pode ser (f)
estabelecida a partir do estudo de duæ partículas com velocidades y'1 e i2 Que colidem
e têm æ suæ velocidades mudadæ pa:.a li
e ili. Admitindo-se durante o choque
a conæwação do momento,
e da energia cinética,
I I
I*r.I*, 2
mli2 + a
nrl (s.2)
e supondo-se que ar¡ velocidades não são correlacionadæ (hipótese que já havia sido
utilizada por Clausius e por Maxwell e que fìcou conhecida como "Stosszahlansatz"
ou "caos molecular'), isto é, que
4lçs
dt
(s.6)
a função f não depende do tempo e deve ser da forma (4.5). Por outro lado, com o
auxllio da função fI, mostra-se também que dilldt: 0 implica uma função / indepen-
dente do tempo, dada pela fórmula de Maxwell. Isto significa que a distribuição de
Maxwell-Boltzmann é uma condição necesMria e suficiente para o equilrtrio termo-
dinâmico. Além disto, pode-se mostra¡ que no equilÍbrio a entropia de -um gás ideal
é dado por -kH.
Aparentemente neste ponto o programa de Boltzmann estava encerrado. Diga-se de
passagem que a equação (5.4) deu enæjo a um grande progresso no cálculo dæ pro-
priedades de transporte e que ainda é,utihzadapraticamente na sua forma original. No
entanto, começam a surgir certas objeções ao trabalho de Boltzmann. É exatamente
a discussão destas objeções que dá origem rà formulação moderna da mecânica estatfs-
tica.
6. Paradoxo da reversibilidude
I¡schmidt, colega de Boltzrnann na Universidade de Viena. {ìrme defensor do ato-
mismo, alega numa discussão em 1876 que æ leis da mecânica são reversíveis no tempo
e que, portanto, não poderiam produzir uma função do tipo da entropia. para todo o
processo em que a entropia aumenta, existe um processo análogo, com as velocidades
dæ partículas invertidæ, em que a entropia diminui. Isto signifìcaria que o aumento
ou a diminuição da entropia dependem apenas dæ particulares condições iniciais dos
sistemas.
Para responder a esta objeção, Boltzmann é levado a esclarecer e enfatizar o caráter
estatístico da sua teoria - ele está usando distribuições estatísticas e supondo que as
velocidades das partlculas não estejam correlacionadas (hipótese do "caos molecular").
Além disto, Boltzma¡rn admite que possam existir condições iniciais que levem a uma
diminuição da entropia. No entanto, no chamado espaço de fæe, tais condições cor-
respondem a regiões muito menores do que as regiões æsociadas às condições iniciais
que aumentam a entropia.
Aliás, o caráter probabih'stico da segunda lei da termodinámica já havia sido sufì-
cientemente enfatizaclo por Maxwell através de uma série de exemplos. Num destes
36 Silvio R. A. Salinas
exemplos, Maxwell ilustra como seria possfvel, a partir de dois sistemas em equilíbrio
térmico, tomar um deles mais quente e o outro mais frio sem realizar nenhum trabalho
externo. Bastaria pqra tanto introduzir um Pequeno furo, com uma portinhola, entfe
æ paredes dos dois sistemas, e dispor de'ã doorkeeper,veryintelligentandexcetidingly
quick, with microscopic eyes": Sabendo-se que no gás em equilíbrio æ partfculæ se
distribuem com as mais variadas velocidades, de acordo com a distribuição de Maxwell,
a função deste porteiro, o "demônio de Maxwell", seria abrir rapidamente a Portinhola
para que as partfcr-rlas com maiores velocidades passassem num determinado sentido.
No outro sentido ele poderia, por exemplo, deixar passar as partfculas de velocidades
mais baixas. Claramente, neste processo o lado frio se torna mais frio e o lado quente
mais quente, sem a realização de qualquer trabalho extemo, em contradição com a
segunda lei da termodinâmica. No entanto,.não é provável que se encont¡e uma enti'
dade tão rápida e inteligente, com plena informação sobre os detalhes dæ configU-
rações moleculares.
O próprio Gibbs, na sua famosa obra sobre o equilíbrio dæ substânciæ heterogê'
neæ, traduzida para o alemâ'o por Ostwald e altamente respeitada pelos energeticistas,
afìrma que "the impossibility of an uncompensated decreæe of entropy seems to be
reduced to improbability." Esta frase mais tarde vai ser inscrita por Boltzmann na
abertura'do prefácio para o segundo volume das suas Lições sobre a teorio dos gases
e parece resumir a!¡ su¿ui idéias sobre a segunda lei.
iv!
SlIzo, flr,... ] : (7.1)
no! ntl. ..
(7.3)
?nt:*
e
8. Psradoxo da reconência
Durante os anos subseqüentes ao trabalho de 7877, Boltzmann participa de várias
discussões, principalmente com os seus colegæ ingleses, firmes defensores da teoria
cinética e do atomismo, em que o sentido do teoremallvai sendo aos poucoß esclare-
cido. Boltzmann chega até mesmo a sugerir um gráfico da função H co¡ia o tempo
- em geral H está bem próximo do seu valor mfnimo, mas pode haver alguns picos
bastante pronunciados. Uma visualização de H contta o tempo seria dad4 por exem-
plo,. pela sucessão grátfrca de árvores invertidæ, quæe todæ muito baixas, com galhos
horizontais ou quase horizontais; ocasionalmente surgiria uma árvore maior ou mais
inclinada, mas a probabilidade de ocorrência diminuiria enormemente com a sua altura.
Em 1896 surge uma dæ mais séria objeções a Boltzmann, proposta por Zermelo,
antigo estudante de Planck em Berlim. A objeção de Zermelo se bæeia num teorema
mecânico demonstrado pouco antes por Poincaré. Este teorema afirma que qualquer
sistema de partículas, com forças de interação que dependem apenas dæ posições,
sempre retorna, depois de um certo tempo r , a lm vizinhança arbitrariamente pró-
xima das suas condiçÕes de partida. A rlnica condição restritiva é que æ coordenadæ
de posição e de momento sejam limitadas (isto é, que æ partfculæ tenham uma energia
finita e que estejam contidæ dentro de um recipiente). Verifìca-se também que o teo-
rema de Poincaré só não é válido para um conjunto muito pequeno (de medida nula,
em linguagem matemática) de condições iniciais. E claro que este teorema exclui a
existência de qualquer função mecânica que tenha uma direção privilegiada no tempo.
A respæta de Boltzmann a 7ærmelo foi imediata - o teorema H não é puramente
mecânico, æ leis estatísticas são fundamentais para explicar o comportamento dos ga-
Hßtória da ltlectînico Estatística 39
ses. Boltzmann também apontou que o período ¡ é muito grande, da ordem da idade
do universo para um gás de pãrtículas. Este é aliás um ponto bastante sutil, pois há
sériæ objeções ao tipo de cálculo que leva a este enorme valor de r . No entanto, expe-
riênciæ numéricas recentes, com "gases" de discos ou esferas rígidas, parecem apoiar
inteiramente esta suposição de um r muito grande. Nesta época há uma troca de arti-
gos entre Boltzmann e Z,ermelo sobre æ características do teoremal/. Apesar do apoio
dos seus contemporâneos ingJeses, Boltzmann está claramente na defensiva. No conti-
nente europeu a influência dos energeticistas é extremamente poderosa e todos os fun-
damentos da teoria cinética são postos à prova. O próprio Zernrelo está até mesmo dis-
posto a abandonar triunfos da teo¡ia cinética, como os c¿ílculos dos coefìcientes de
transporte. Não se deve esquecer também que havia problemas, como a aplicação do
teorema de equipartição da energia aos calores especfficos dos gases, que permanecia
como um ponto vulnerável da teoria (embora já se apontasse que a estrutura intema
das moléculas, revelada átravés das raias espectrais, deveria ser muito mais rica do que
se poderia supor na época). Dentro deste clima é que Boltzmann abandona pela primei-
ta vez a sua postura realista diante do mundo físico e introduz uma hipótese cosmo-
lógica, de caráter subjetivista, para explicar o teorema 1L Boltzmann sugere que a en-
tropia do univeno pode ser mdxima, mas que há flutuações e que ocasionalmente po-
dem ocorrer vales profundos em que a entropia é um mfnimo. A vida só seria possível
no fundo destes vales, subindo em direção aos máximos da entropia. Portanto, para ÍN
civilizações existentes, a entropia aumenta e a direção do tempo é totalmente subjetiva,
dependendo da nossa localização no Universo. Hipóteses desta natureza sobre a seta
do tempo vão surgir freqüentemente na ciência, mesmo nos anos mais recentes.
Uma das explicações mais brilhantes sobre a îatureza do teorema .11 foi dada por
Paul e Tatiana Ehrenfest, na primeira década do século, com a introdução do chamado
"ûrodelo da urna". Vamos considerar duæ urnas contendo 100 bolas, numeradæ de I
a 100. Num certo instante inicial a urna A contém Po : 90 bolas e a urna B contém
'Qó : l0 bolas. Sabe-se perfeitamente quais æ bolæ que estão localizadas em cada
urna. Vamc supor agora que se disponha de uma'roleta, com números de I até 100, e
que a roleta é posta em funcionamento cada 30 segundos, por exemplo (A t : 30s).
Cada vez que sai um número na roleta a bola correspondente é removida de uma dæ
urnas e colocada na outra. Podemos então construir um gráfico do módulo lPr-Q.
em função do tempo t: r Lf, onderéuminteiro.Éclaro que se obtémumaseqüên-
ll
cia de pontos cujas alturas sucessivas diferem de duas unidades. Começando com o
valor I Pe -Qo I : 80, os pontos da curva tendem acair e ase situarnasvizinhanças
do "equilfbrio" I P -Q I : 0. Pode haver picos ou valores muito altos de I P-Q l. No
entanto, após cada pico a curva tem a tendência de cair novamente. Com este modelo
os Ehrenfest rcalizun uma série de cálculos probabilfsticos que apóiam as idéias de
Boltzmann sobre a evolução de um sistema para o equihbrio. Mais recentemente, Mark
Kac propôs um outro modelo, conhecido como modelo do anel, que contém elemen-
tos probabilísticos e que igualmente ilustra de maneira quantitativa o comportamento
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ou seþ,
go
' + Ilt,pI : 0 (e.2)
qt
ondefféahamiltonianadosistemaeosfmbolo[.,.]indicaosparênteæsdePoisson
da mecânica clássica. Numa situação estacionária temoe
{p,XtI: O . (9'3)
S= k În O . (9.5)
F= -kT Qn Z (e6)
BIBLIOGRAFIA BÁSICA:
(1) S.G. Brush, Kfneflc Theory, v' 1, Pergamon, I 965 ; v. 2, Pergamon, 1966.
(2)M.J. Klein,PaulEhrenlest, theM¿kingof øTheoretìcalPhystcist, North-Holland, 1972'
(3)E.G.D. e \ü. Thining, editores,'Tl¡e Boltzmann Equatton, Theory and Applicatlons, springer,
t973.
(4)p. e T. Ehrenfest, The Conceptuøl Foundations of the Statistlcal Approach ín Mechanìcs,
t¡ad. M.J. Moravicsik, Cornell U' P., 1959.