Ricardo Nascimento Fabbrini
A ARTE DEPOIS DAS VANGUARDAS
SA_FAPESPApresentagao
Depois que a vanguarda virou establishment, pois institucionalizada pelos
grandes museus e pelas megarretrospectivas promovidas pelas bienais internacio
4 nais, podemos ordenar o campo em dispersdo da arte contemporanea em fungao
¢ do passado apropriado. Um campo que pode ser definido pela preocupacao co-
) mum com o tempo e pela nova significado que o passado, pré-vanguardista €
vanguardista, tem assumido para os artistas atuais.
Diante da producao presente, descentralizada, pulverizada, de ativagao
das diferencas (uma forma de reacdo ao viés universalista e uniformizador das
vanguardas), destacamos alguns artistas situando-os em relagao a tradigao. 0
objetivo, contudo, nao é a coleta de dados, a estocagem de informagdes eventu-
almente utilizaveis, funcdes cumpridas pela critica didria e pelas historias descri-
tivas da arte, mas a interpretacio, a partir da analise de obras concretas, da
producdo artistica apés 0 esboroamento das vanguardas, adotando como seu
termo final os meados dos anos 70.(e se quisermos fixar por conven¢ao seus
iltimos gritos, o minimalismo e o hiper-realismo), embora 0 seu calor revolucio-
nario (de sua fase herdica dos anos 10 e 20) viesse ha décadas se enfraquecendo.
Desde os anos 30, as vanguardas foram perdendo sua fungo prospectiva, seu
poder de antecipar na forma artistica e no gesto estético a nova realidade,
segundo o imagindrio vanguardista de uma sociedade baseada no capital e na
maquina, na fé dos futuristas, na comuna e na maquina, na convicgao dos
construtivistas, na critica do capital, no enguigamento da maquina, no sortilégio
anarco-dadaista. Sao difetentes desenhos de utopia que revelam, contudo, a
{ mesma confianga dos artistas de vanguarda do inicio do século no poder da arte
| de transformar a realidade, de contribuir para a mudanga da consciéncia e do
‘ impulso de homens e mulheres que poderiam mudar o mundo.
Apesar da crise desta crenca, as vanguardas néo se viram, de imediato,
neutralizadas, pois, mesmo dissociadas das idéias de revolugao e utopia, continuaram
a revolucionar os cédigos artisticos. E neste sentido que a arte modema, tanto 0
periodo das vanguardas herdicas, orientadas por esta cren¢a, como o das tardias,
dela desvinculadas, cumpriu um trabalho de, desligamentos sucessivos da tradicao,
os quais, oportunamente ligados pela critica, constituiram, no curso do tempo,
23- stulo da Tradicig
Gomo diz Octavio Paz, uma “tradigao da ruptura” — wm CaP!
Artistica,t ‘ de relagdo da arte con.
tempor Presettamos um registro dos diferentes modes TE AT atnais visz
Ymporanea com a tradi¢o, compondo egal a pelos historiadores
arte, Essa ¢numeracao, contudo, nao é exaustiva, PC
de todos os artistas e tendéncias signficativos sur
(inclu ficativa: uma indicagzo de algumas formas de
wncluindo-se, aqui, as vanguardas artisticas) que ocupou, nest i
G40 de criticos e historiaderes ‘europeus e americanos, e que a oe
despertando o interesse, até mesmo a reflexdo, dos tedricos da es lias corrente
Possivel, vinculamos essas séries as nacionalidades, procedimento al a
apés 0 declinio do cosmopoliti hanes:
tr politismo das vang a t
_0 objetivo nao é modelar 0 campo das artes contemporaneas, ™m ote s
lar as identidades inexpressas que o atravessam, desvendando a légica de seus
Nou-se necessaria a adogao de novos critérios para ordenar a producao artis’
Pois verificou-se que a pluralidade de approaches dos artistas atuais borra as
margens estilisticas, operacionais apenas para interpretar 0 periodo das vanquar-
“das. 0 préprio embaralhamento dos estilos vanguardistas, que se tornou recor
Tente, incentiva a recusa de uma classificacao. Além do que as mudan¢as continu-
as verificaveis na trajetoria de cada artista dificultam sua vinculagao a um modo
invariante e particular de produgdo. Muitos se alinham, no curso de seu Percurso
pessoal, a varias linhagens, desinteressando-se das categorias positivas da histé-
aia da arte.
Substituimos, assim, as taxionomias produzidas pelo estilo ou pelo movi-
mento artistico, pelo arranjo em séries temporais que nao se excluem nem podem
ser dispostas (diferentemente das vanguardas) numa ordem seqiiencial. Nao se
trata mais de encadear as obras numa mesma narrativa (a dos movimentos artis.
ticos, definidos pela busca incessante do choc, da Tuptura e da experimentacio
formal). 0 novo foi arquivado, segundo as interpretagées atuais do periodo
modemista, como um fetiche conceitual, historicamente motivado, inseparavel
do Conceito geral de progresso. ff 28Di8i
_ Finda a etapa vanguardista, artistas e, por conseguinte, a critica de ar‘e,
inclusive brasileira, constataram que “a arte nao evolui ou tetrocede, muda”; que
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