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DESENHAR O VENTO Escrever sobre desenho é como desenhar sobre escrta, mas ‘mais init, porque o desenho nao tom exterior. € uma tipologia atistica que, 20 longo do tempo, se volo a desenvolver como uma ‘meta-prtica, um conjunto de operagbes que cobrem todo 0 campo artistico, mas que sabemos que passa paral da prtica das ates pra possuir um valor de uso préximo da fotografia ‘Assim, escrever sobre desenho é naturalmente uma tarota {que enfrenta a dficuldade primeira de identifica 0 seu objecto| e andise: quando falamos de desenho incuimos os desenhos preparatérios de artistas, os desonhos de projecto, o desenho tencarado come médium espectico, 0s esquigas de arqutecto, os oodles de canto de pagina, as paginas de cadernos escolares cheias de reprodugses de herbis de Manga, as indicagbes de direcgo que garatyiamos ou que nos do para decifrarmos numa vista a amigos remotos, os resumes de contetdos de reuni¢es, ‘08 organigramas, 0 mindmapping com que tentamos orentar 28 rnossas escolhas futuras, a escrita manual, enfim, toda a activdade inseritora e descrtora de processos de pensamento a partir de formas graticas? Se, numa primeira abordagem, este campo parece sere é) ‘demasiado amplo para poder ser tratado como se de uma unidade se tratasse (que no é), devemos entao cingitmo-nos a um campo dlimitado, cheio de regras de procedimento, cénones processus, pardmetros de avaliagdo estticos ou meramente qualtativos? do parece, sequer, cue esse campo possa ser cicunscrito, nomeadamente porque se existe, encontra-se sob 0 fogo erica {ue o cardcter dertisrio do modernismo fez abater sobre as préicas artistic, desconfiando de uma caractristica fundamental € tradicional da pratica do desenho no interior das boas ates: © vitvosismo. Se atentarmos um pouco no estatuto pecuilar do desenho no interior do ensino das artes visuas, facimente ‘compreendemos que 0 desenho possul uma semelhanga curiosa ‘em relacio a aprencizagem musical, ou ao ensino da danga em termos cldssicos. Em qualquer destes casos existe uma interna ‘nacessidade de promover uma proficiéncia que passa por ser ndo- -ideol6gica, isto 6, pretende configurar-se como uma destreza da ‘mao sem estilo, uma capacidade de representacdo desvinculada de qualquer deiasistematica sobre os mecanismos @ processos. do préprioprimado de representacdo que ihe subjaz. De facto, © desenho é normalmente ensinado como uma técnica de ‘epresentago, um sistema de recursos que implica determinadas ‘competéncias especticas, bem como 0 dominio de cédigos, {de convengées em relacao a forma como o mundo pode ser (convertido em linha. Repare-se: a sofisticago do desenho como e representagao é inerente a0 facto do desenho ser 0 | gue no exsteno nosso sistema perceptive - 0 desenho ¢ linha, |demarcario,trontera, contorno das coisas, conwencio sobre interior © 0 exterior. Esta convengdo parece “natura”, isto 6, parece estar inscrita ‘Geneticamente em nés, porque desde que somos tomados por um ‘ealismo representacional, desde o momento em que pretendemos fazer correspondergrfismos. ao universo val de uma forma | (oval Prnat, nw descrtiva dio disereionaia 10 desenho cientiico), gracas 8 conengde do cone feramenta cognitive percept artrara pore Claro que o desenho define, pel solamente de faces © exterores, uma permeablidade do ohar uns heen {ue eta roxio eo qu eth stant, ene o qu end anrns em bao, tudo o que eta & esque a deta. O dessin técnica dispositive de descrigdo do mundo & potas are | seta cam a ua convenes como ss ocean cna sua gramitica~, mas uma esria que acescenta 20 que 8 ooo, tum concalto, ou seja, uma hipotétcarntera eno geno 0 fora, entre um campo @ outro, ene um corpo 6 outers op, | Essa front no entanto, no exist. Ass, odeseno éu, | convengto a part de uma inexiténcia, como ura ese naa \ de demonstragdo das diferengas entre a coises. No entant, muita da patica do Gesenno no pretence er ua ‘descrigéio de mundo, mas uma figuragio codificada a parte de estas lingusticas, elas sm, doscrtvas. 0 cas de deseton ‘que partem de estruturastécnicas, arquitecténicas ou de project, or vezes de mapas, Muitos artes contemporneos ti vo a ‘esenvoWver percursos, no campo do desenho, qe 9 aproxnan estes univers de representagd, habitualmentedonazos px uma dimensdo técnica. Eo caso de artstas que usar mapas co ‘matiz para o desenvolvimento de vabahos ue os subectvzan ‘ou que partem de uma esta catogréfia para a conver ra ‘azBo emocional,afectva ou de reorganizacdo de eos feces, sta possbildade do desento ransladar uma metocoag ppertence a um universo da representacdo rgorosa mais oumencs Scat somo nar soe ugar substancal denito do univers Woe ‘De onde surge essa possibildade & cenplxtdade dos desenhos que abropram, dentro do Assim, 8 Com dos cientifico-analticos, reside no facto certo aster go do um outro contexto de recepeao, weet orolos 6, nessa medida, o uso de Sooners a ee cs, co Gntfica 86 tem sentido pela capacidade rat Tao coum mundo fccional de referencia que pode ce const de legitimagao de “miltipla entrada” ~ ou sea, se p-ae & construao de universos, de quase-mundos (para Tensor grr rane inet, convangesestticas. weet ga muliplidade de procedimentos © consequéncias (usar nlegiagem que usa uma segunda linguagem em relaedo & qual ria mimeta, mas que deve Ser produtiva dentro das regras. fs pemera com uma gramatica apropriada, de ventrloquo) 36 6 sessvel porque a fidez das convengées do desenho procede) {Ge uma forma esponjosa, em permanente processo de ‘espana, remetendo toda o possivel “mal-entencido” para ‘campo da mpossiblidede interpretativa de uma lingua sem ‘aaa, radicalmente polssémica e indefniga Oda questo fundamental na petica do desenho diz respeito 10 a0 ce processos de inactuadade na representagdo. AO ‘ani do que acontece noutros dominios da actividade artistic, isto ra pura, na escultua, ou em media mais recentes, nas quai valores de inovacBo ou de evolugéo parecem , na stra. do moderrismo, ter tomado todo © campo da validagdo, "caso do dasenho a evlugéo nfo possui qualquer significado nie i desenhos mais avangados do que outros, nem de uma ferspecva onogenética, nem de uma perspectva flogenética. 'so¢ um cesennosoisticado pode usar metodologias histéricas Ge detent acasemicoitroduicas em outros contextos de ‘teria cultura, pertencendo, eventualmente, a formulanées de Vanguard, para usar um termo simples. No entanto, uma outra ‘epeio desta nactuaitade pode ser identicada: trata-se de se brocesso8 de desenho que so orundos de uma meméria fat ou de uma eserta vernacular, ou de ordens de anotago (its, ou do universo da patologiapsiquica, etc, Todas estas lnsncas de prética do desenho - onde se incu, naturalmente, a ‘Rrserido @ vista de paleagem ou retrato (embora a palsagem [Eas reste contexto, uma recoréncia notéve, mas a este a ~. geram, paradoxalmente, micro-estéticas de ‘ofsicados e dvericads. A questo & a comproonsdo Secor ie us nstincias, se pode distinguire valorar um sont, IMs cu raolégico de outro, na medida em que as suas vce, Por mais mimiéticas que sajam em reiagao 20 8 conseg ud Necessitam de gerar sensibilidades (@, cao os eat. gos cognitves) que se reportam, no ao s@u to parimeat. Mas a um segundo cédigo, gerado a partir en on 22 ro, mas totalmente auténomoa o ineeridos ‘Pensamento que 6 0 da arte contemporanea. ‘come, Donde: desenho ea sua rita instauram sen Se segunda instancia, néo podendo haver, eee ‘uta forma de expresso

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