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CF: Como avaliar se um conto de fadas teve ou não uma boa tradução?
ML: Com os mesmos critérios que se aplicam a qualquer obra. O bom tradutor é o que
serve de ponte entre autor e leitor e passa despercebido. Essa é uma das razões porque,
exceto em livros de caráter mais técnico, não gosto de notas do tradutor, estorvando a
história. O ideal é que o texto não pareça ter sido traduzido.
CF: E agora, as questões do idioma. Uma tradução deve ser a mais fiel possível ao
texto original?
ML: A questão da fidelidade é complexa. Se o texto soa natural e fluente no original,
deve soar assim também na tradução, o que será impossível se o tradutor ficar colado à
letra do original. O que interessa é obter o mesmo efeito, ainda que por vezes seja
preciso usar recursos um pouco diferentes. Mas creio que se deve ter a fidelidade
possível, respeitados os limites da língua-alvo. Quanto à criatividade, seria conveniente
não tentar ser mais criativo que Perrault, os irmãos Grimm ou Andersen.
CF: Como o professor pode selecionar boas traduções para sua escola e seus
alunos?
MF: Boas traduções muitas vezes não são aquelas assinadas por nomes famosos, ou
mesmo por grandes escritores. Num livro muito interessante chamado À margem das
traduções, publicado nos anos 40, Agenor Soares de Moura analisa as tolices
perpetradas por grande número de escritores brasileiros da melhor estirpe em traduções
descuidadas... De fato, se nomeada não é documento, não conheço maneira de descobrir
boas traduções senão correndo os olhos por elas, examinando-as. A prova do pudim está
em comê-lo. Há também tradutores, sejam eles também escritores ou não, cujo nome é
uma marca de qualidade. O professor deve aprender a reconhecê-los.
Maria Luiza Borges recebeu menção honrosa do Prêmio Jabuti, em tradução, pelo
livro Alice: edição comentada, de Lewis Carroll (Zahar), em 2002, e o Prêmio
FNLIJ Monteiro Lobato de melhor tradução jovem pelos livros Contos de fadas
(Zahar), em 2005, e Nenhum peixe aonde ir, de Marie-Francine Hébert (Edições
SM), em 2007. Os livros publicados pela Zahar foram relançados em 2010, em uma
caprichada versão de bolso.
Disponível em http://www.cartacapital.com.br/educacao/carta-fundamental-arquivo/o-
segredo-de-traduzir-2. Acesso em 06/1/17.