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REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL

PODER JUDICIÁRIO DA UNIÃO


JUSTIÇA DO TRABALHO
TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO
3ª VARA DO TRABALHO DE BRASÍLIA-DF
Sentença do Processo nº 1138-67.2015.5.10.0003

Aos vinte e sete dias do mês de setembro do ano de dois mil e dezesseis, às
17h25, na 3ª Vara do Trabalho do Brasília-DF, pela lavra do Juiz do Trabalho Substituto
GUSTAVO CARVALHO CHEHAB, na Ação Trabalhista ajuizada por
em desfavor de Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, foi
publicada a seguinte decisão:

S E N T E N Ç A

RELATÓRIO

Trata-se de Reclamação Trabalhista ajuizada por


em desfavor de Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos.
Em sua petição inicial, o reclamante insurge-se conta a demissão por justa causa
que lhe foi imposta em face a sua atuação como chefe do então Departamento de
Encaminhamento e Administração da Frota - DENAF nos anos de 2009/2010. Postula a
reintegração no emprego e o pagamento de todos os benefícios e direitos desde sua
demissão, nulidade do processo administrativo, inclusive em tutela antecipada,
declaração de inexistência de dívida com a condenação em dobro do valor cobrado,
indenização por dano moral e multa em favor do FAT. Sucessivamente requer a reversão
da justa causa em dispensa imotivada com o pagamento das verbas rescisórias daí
decorrentes. Dá à causa o valor de R$ 1.000.000,00 e junta documentos
Foram juntadas cópias de documentos do processo 328-92.2015.5.10.0003 pelo
reclamante e em face do despacho de fls. 1.346.
A antecipação de tutela foi indeferida (fls. 1.391/1.393).
Na audiência de fls. 1.403, não houve conciliação. O reclamante requereu a
reconsideração da decisão que indeferiu a tutela antecipada. Foi recebida a defesa com
documentos.
A reclamada, em sua defesa, suscita preliminares de ilegitimidade ativa do MPT,
inépcia da petição inicial. No mérito, defende não haver direito à estabilidade e sustenta
que o reclamante foi punido após regular procedimento administrativo no qual teve amplo
direito de defesa. Acrescenta que ele envolveu-se em irregularidades por meio de
dispensa de licitação (Contrato 105/2010) em detrimento de contrato previamente
existente e celebrado após regular processo licitatório (Contrato 51/2010). Traz suas
considerações acerca dos fatos deduzidos em juízo. Pugna pela improcedência do
pedido.

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Sentença do Processo nº 1138-67.2015.5.10.0003

O reclamante apresentou réplica, com documentos, e nova manifestação.


Indeferido o pedido de reconsideração (fls. 1.690).
A reclamada se manifestou sobre os documentos juntados e trouxe nova
documentação, sobre a qual o reclamante trouxe suas considerações.
Na audiência de fls. 1.804/1.808, o reclamante e uma testemunha foram ouvidos.
Na assentada de fls. 1.809/1.814, as demais testemunhas foram apresentadas.
Indeferida contraprova. Sem outras provas a serem produzidas, encerrou-se a instrução
processual. Proposta conciliatória final rejeitada.
As partes apresentaram razões finais em memoriais.
É o relatório.

FUNDAMENTAÇÃO

1. INUTILIZAÇÃO DE FOLHAS
Estando completamente em branco a fls. 1.084 e a fim de otimizar os trabalhos
em secretária, evitando-se sobrecarga desnecessária, DETERMINO a inutilização da fl.
1.084, com a colocação da indicação de "em branco" ou "sem efeito".

2. JUNTADA DE DOCUMENTOS
O reclamante em réplica e a reclamada em manifestação avulsa juntaram
diversos documentos referentes a parecer técnico e exame do pedido de reconsideração
da decisão que dispensou o reclamante por justa causa, sem que a parte adversa tivesse
vista deles.
Percebe-se que a documentação acostada é comum a ambas as partes, pois diz
respeito ao processo administrativo disciplinar e ao pleito de reconsideração
administrativo. Do teor de ambas as documentações percebe-se que ela não trazem
qualquer elementou ou argumento novo ao que está sendo debatido nos autos. Nada
acrescentam, nem interferem na questão em debate. Nesse contexto, a abertura de prazo
para as partes se manifestarem em nada altera a solução do litígio, mostrando-se, na
prática, inócua. Diante DEIXO de intimar as partes da juntada dos documentos de fls.
1.785/1.795 e 1.797/1.803 porque inócuos para o deslinde da controvérsia.

3. PRELIMINAR DE INÉPCIA DA PETIÇÃO INICIAL


A reclamada suscita preliminar de inépcia da petição inicial, sob o argumento de
que há contradição e incompatibilidade entre os pleitos de letra "i" e "j" e porque foram
formulados pedidos genéricos e inespecíficos nas letras "d" e "e" do pedido.

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Não há qualquer vício nos pleitos "i" e "j". Primeiro porque não há tecnicamente
qualquer incompatibilidade entre eles, pois o deferimento ou indeferimento de um não
prejudica o outro. Segundo porque é lícito ao autor formular pedidos cumulativos,
sucessivos ou alternativos, ainda que incompatíveis entre si, cabendo ao magistrado, se
for o caso, aplicar o direito à espécie, inclusive reconhecendo, caso seja essa a situação,
a relação de prejudicialidade entre os pleitos apresentados.
Com relação às expressões assinaladas pela reclamadas dos pleitos "d" e "e", há,
de fato, inépcia.
As expressões "todos os valores, vantagens, benefícios e direitos", "mas sem
limitar" e "etc." não permitem identificar o alcance da pretensão deduzida em juízo e qual
é especificamente o provimento judicial postulado. O pedido deve ser certo. O julgador
não pode interpretá-lo extensivamente, tampouco proferir decisão além do que foi
postulado.
No mais, a petição inicial atende ao disposto no art. 840, § 1º, da CLT na medida
em que há longa exposição dos fatos e o pedido decorre logicamente dela. A narrativa
apresentada na exordial permite o entendimento da pretensão deduzida em juízo e
guarda consequência lógica com o pedido feito, possibilitando a parte reclamada o pleno
exercício do seu direito ao contraditório e a ampla defesa, até porque inexiste qualquer
dos vícios apontados.
ACOLHO PARCIALMENTE a preliminar suscitada e JULGO EXTINTO, sem
resolução do mérito, o pedido de pagamento de "todos os valores, vantagens, benefícios
e direitos", "mas sem limitar" e "etc.", por inépcia.

4. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE ATIVA


A reclamada suscita preliminar de ilegitimidade ativa, sob o argumento de que o
pedido de letra "i" diz respeito à penalidade fixada em Ação Civil Pública ajuizada pelo
MPT em face de eventual descumprimento da decisão proferida pela 6ª Vara do Trabalho
de Brasília.
Com razão à reclamada, da própria narrativa da petição inicial (fls. 148/149)
percebe-se que a postulação do reclamante diz respeito à satisfação da penalidade
prevista na sentença prolatada pelo MM. Juízo da 6ª Vara do Trabalho na Ação Civil
Pública 653/2014-006 ajuizada pelo MPT e revertida ao FAT.
Dessa forma, o reclamante não é o titular, nem o substituto processual do titular
do direito sobre o qual se funda o pedido. Não há, portanto, pertinência subjetivo do
reclamante cobrar multa ao FAT em ACP do MPT por eventual descumprimento de
decisão judicial da qual não é parte.
ACOLHO a preliminar de ilegitimidade ativa e JULGO EXTINTO, sem resolução
do mérito, o pedido de condenação da reclamada no pagamento de multa astreintes de
R$ 10.000,00 reversível ao FAT.

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5. CERCEAMENTO DE DEFESA. INDEFERIMENTO DE


CONTRADITA À TESTEMUNHA.
Irrepreensível o entendimento do juízo que indeferiu a contradita à 1ª e 2ª
testemunhas da reclamada suscitada pelo reclamante porque ausentes elementos que
retirem a isenção em depor ou que demonstre haver interesse no deslinde da
controvérsia.
Na contradita, em regra, a falta de isenção da testemunha deve ser demonstrada,
pois se trata de um exame prévio de admissibilidade da tomada de depoimentos. Ainda
que haja dúvida quanto ao interesse da testemunha em colaborar com uma parte, o
magistrado poderá, advertindo-a, compromissá-la e ouvir suas declarações. Depois, ele
poderá fazer um exame mais apurado do seu valor probatório, sobejando com os demais
elementos de prova e fazendo uma avaliação crítica da credibilidade, segurança,
consistência, coerência, independência, isenção das respostas, inclusive pela observação
do comportamento da testemunha em audiência e de sua relação com os sujeitos do
processo. Poderá, inclusive, fazer uso de técnicas da Psicologia do Testemunho e da
doutrina especializada.
É justamente por isso que a lei já enumera, como exceções, as hipóteses em que
a parcialidade da testemunha é presumida (como amizade íntima, inimizade capital,
parentesco próximo, etc). Para os demais casos, o afastamento preliminar de um
depoimento exigirá prova, sob pena de constituir cerceamento de defesa para quem
arrolou a testemunha. O mero temor que alguém irá mentir para o Juiz não justifica, por si
só, o deferimento da contradita.
No caso dos autos, as contraditas tiveram como único fundamento o possível
interesse na lide uma vez que a 1ª testemunha respondeu ao PAD e teria interesses
conflitantes com o reclamante e a 2ª testemunha porque participou da comissão
disciplinar no referido PAD.
Em ambos os casos, as testemunhas negaram o interesse na causa e o
reclamante não apresentou qualquer prova acerca da falta de isenção ou do animus em
prejudicar o reclamante. Sem tal demonstração não há como, liminarmente, considerá-la
suspeita ou impedida em depor. Não se pode inferir um interesse na causa por parte da
testemunha pelo mero temor ou receio de que ela possa lhe prejudicar.
REJEITO o protesto por cerceamento de defesa apresentado em face do
indeferimento das contraditas às testemunha conduzidas pela reclamada.

6. CERCEAMENTO DE DEFESA. INDEFERIMENTO DE


CONTRAPROVA À TESTEMUNHA.
A reclamada apresentou protestos por cerceamento de defesa pelo indeferimento
da contraprova à testemunha do reclamante, Sr. Fábio, acerca da afirmação dele de que
a empresa MTA não foi consultada para a utilização do contrato 105 para embarque da
carga do contrato 51.

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Data vênia, o objetivo da contraprova de testemunho não é o de rebater uma ou


outra resposta da testemunha, sob pena de transformar de se eternizar o processo,
tumultuando seu andamento.
A testemunha vem a juízo relatar um evento que presenciou e que diz respeito ao
fato controvertido. Suas respostas, como os demais elementos dos autos, devem ser
balizados com o arcabouço probatório dos autos, em face do princípio da unidade da
prova. Por isso, não são afirmações ou respostas isoladas e descontextualizadas que,
pinçadas, são levadas em conta no julgamento da causa, mas sim o quadro fático, com
suas nuancias, que se extrais do confronto entre as diversas provas.
No caso dos autos, em se tratando de processo licitatório e de contratação
emergencial para atender especificamente a rota de carga postal entre o eixo São Paulo-
Brasília-Manaus, a questão objeto da pergunta necessariamente diz respeito à
procedimento documental. Em outras palavras, a eventual consulta ou não a empresa
MTA acerca da comutabilidade da remessa das cargas entre os diversos contratos
somente pode ser objeto da prova documental, pois ligada à irregularidade atribuída ao
reclamante. Portanto, a resposta da testemunha não tem qualquer relevância para o
debate dos autos, até porque a consulta ao licitante/contratante não pode ser verbal, mas
sim formalizada no devido processo administrativo.
Além disso, a 2ª testemunha da reclamada tirou o foco dessa questão como
fundamento da rescisão do reclamante ao dizer "que a razão da aplicação da "justa causa" foi
o sobre preço na utilização dessa segunda linha a partir de Brasília-DF" (fls. 1.813). Assim, a
questão da eventual consulta ou não da empresa contratante MTA foge do foco do motivo
para a aplicação da justa causa. Em outras palavras, a consulta ou não à MTA é
irrelevante ou impertinente, pois, de acordo com a testemunha da reclamada, o motivo da
justa causa aplicada foi a utilização de uma segunda linha aérea para Manaus, a partir de
Brasília.
Acrescente-se, ainda, que sobre a questão central debatida nos autos, essa
testemunha Sandro Senseve mostrou-se desconhecer diversas questões relevantes para
a avaliação da falta grave aplicada ao reclamante, especialmente acerca dos problemas
na malha aérea e do quase colapso do terminal relatado pela testemunha Gerson.
Correto, portanto, o indeferimento de prova impertinente, pois inócua para
produzir os efeitos pretendidos pela parte insatisfeita.
REJEITO o protesto de cerceamento de defesa pelo indeferimento da contraprova
a uma pergunta que se tornou irrelevante pela própria prova produzida pela reclamada.

7. INDEFERIMENTO DE PERGUNTA À TESTEMUNHA.


Esse Juízo indeferiu as perguntas "Se havendo normalidade a carga não urgente era
despachada junto com a carga urgente via aérea, porque foge do objeto do pedido?" e "Se é comum
o embarque de carga não urgente em aeronave contratada para transporte de carga urgente?" feitas
pela reclamada à testemunha Gerson (fls. 1.808).

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A testemunha já havia respondido tais perguntas no início do depoimento e


esclarecido os fatos afetos a tais questões ao longo do depoimento.
Como se não bastasse, apesar o indeferimento, respondendo a questão seguinte,
a testemunha espontaneamente respondeu as indagações da reclamada:
"Que esclarece que havendo vaga na aeronave (linha aérea regular) toda carga urgente é
nela transportada mas caso não haja vagas é possível despachá-la por VAC para
contingência para complemento da linha regular quando ela não comporta todo volume"
(fls. 1.808).
Portanto, tendo sido respondida a questão, anteriormente e posteriormente ao
indeferimento da indagação, não há qualquer prejuízo para a defesa da reclamada.

8. JUSTA CAUSA. EMPREGADO PÚBLICO. PROCESSO


ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. NULIDADE. PERDÃO TÁCITO. ATO DE
GESTÃO. ESTABILIDADE. REINTEGRAÇÃO. VANTAGENS SALARIAIS.
Discute-se nos autos a dispensa do reclamante, por justa causa, em face de sua
atuação como chefe do então Departamento de Encaminhamento e Administração de
Frotas (Denaf) da reclamada em 2010 quando da contratação da empresa MTA Master
Top Linhas Aéreas S.A. por meio dos contratos 51/2010, de R$ 3,4 milhões, e de
105/2010, de R$ 19,6 milhões, bem como a regularidade do processo administrativo
disciplinar que imputou ao reclamante faltas graves.
O debate envolvendo as partes alcança um amplo leque de questões, desde a
alegação da existência de estabilidade e da necessidade de apuração da falta grave por
processo administrativo disciplinar, bem como na regularidade desse. Há
questionamentos acerca de quais normas disciplinares são aplicáveis, da ocorrência de
perdão tácito, a natureza do ato tomado e a correção ou não do procedimento e da
decisão tomada.
As diversas questões envolvidas no processo, que consumiram do magistrado
diversos dias de trabalho, revisão, leitura e releitura da documentação e depoimentos
tomados. O próprio reclamante, que reclama a urgência e antecipação de tutela, trouxe
uma petição inicial de 157 laudas, recheadas de impugnações e de questionamentos
sobre a apuração e a decisão que lhe aflige. Isso, obviamente, acaba por ensejar o
retardamento no exame de tantos argumentos e teses.
Ante a complexidade dos aspectos que envolvem a demanda, é necessária uma
exposição detalhada do contexto dos fatos e da realidade que envolve a atuação do
reclamante e de como se iniciou e transcorreu o processo disciplinar, bem como do
exame das diversas questões suscitadas nos autos. Para facilitar a exposição, passa-se a
dividir essa análise em sessões, capítulos e subcapítulos.
A. Contexto histórico, econômico e político
Para compreensão dos aspectos que envolvem os fatos que culminaram com o
ato de dispensa por justa causa do reclamante, é necessário mergulhar no contexto
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histórico, político e econômico da época dos fatos. As decisões debatidas nesses autos
podem ser melhores entendidas com a compreensão da dinâmica dos fatos e dos
aspectos que o circundam. Quando se olha o passado, com o entendimento do presente,
é fácil julgar a história, mas, quando se olha para o futuro, sem saber o que vai acontecer,
a melhor opção, muitas vezes, é um mero exercício de possibilidades.
Além disso, mergulhar no passado ajuda a entender o tempo em que perdurou o
processo administrativo e os aspectos que envolvem a decisão ali tomada, bem como os
contratos envolvendo a empresa aérea Master Top Linhas Aéreas Ltda, centro da
controvérsia dos autos.
A.1. Apagão aéreo, crise econômica mundial e efeitos na aviação de cargas
Há cerca de dez anos atrás, em 29/9/2006, no dia em que tomava posse neste
Tribunal (como também em outros TRTs) uma grande e qualificada turma de juízes
substitutos, aconteceu uma das maiores tragédias da aviação brasileira, que foi a queda
do voo 1907 da Gol Linhas Aéreas, justamente na rota Brasília − Manaus, objeto da
discussão dos autos. Teve inicio, a partir de então, a maior crise do setor aéreo brasileiro,
que teve impacto na saúde financeira de companhias aéreas e nas atividades
correlacionadas.
Para complicar, em 2008/2009 surge a crise econômica mundial, que teve como
estopim a bolha imobiliária nos Estados Unidos da América. Tal crise teve um profundo
impacto no setor aéreo, com perdas estimadas em US$ 9 bilhões em todo o mundo e
queda de receita por carga da ordem de 17%1.
No Brasil, a partir de 2009, diversas empresas aéreas cargueiras sofreram os
efeitos desse cenário. Em março de 2010, a VarigLog, a maior companhia aérea neste
setor, entra com pedido de recuperação judicial perante a Justiça de São Paulo e reduz
suas operações e frota.
Paralisaram suas atividades de carga aérea em 2010: a Air Brasil, que operava
um Boeing 727-200F e parou de operar definitivamente em novembro de 2010; a Brasil
Express Transportes Aéreos S.A. (BETA Cargo), que operava 4 aviões Douglas DC-8-70F
e 4 Boeings 707-300C/F, após a rescisão dos contratos com a reclamada; a Rico Linhas
Aéreas, que entre seus aviões tinha um Boeing 737 cargueiro e que paralisou seus voos
regulares em junho de 2010; a TAF Linhas Aéreas S.A., com aviões Boeing 737-200 e 1
727-200F, deixou de operar transporte de passageiros e continuou a operar carga aérea,
ainda que precariamente.
Em 2010/2011, a Master Top Linhas Aéreas (MTA), operava 3 (três) aeronaves
McDonnell Douglas DC-10-30F. Em 2011, a empresa, deixou de operar após o
rompimento dos contratos com a reclamada, por decisão do Ministro das Comunicações
que a declarou inidônea.

1
KNOWLEDGE WHARTON. Setor aéreo enfrenta crises de grandes proporções. 17 jun. 2009. Disponível
em: <http://www.knowledgeatwharton.com.br/article/setor-aereo-enfrenta-crise-de-grandes-proporcoes/>.
Acesso na data de hoje.
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A.2. A crise política e os contratos da MTA com os Correios


Como se não bastasse a crise econômica, fatos correlatos aos contratos da MTA
com a reclamada geraram uma crise política no 2º semestre de 2010 e que culminaram
com o processo disciplinar ora impugnado.
Em meio à disputa eleitoral para sucessão do ex-presidente Luis Ignácio Lula da
Silva, a revista semanal Veja2 publica, na sua edição de 15/9/2010 (em circulação alguns
dias antes), reportagem na qual acusa o filho da então Ministra-Chefe da Casa Civil da
Presidência da República Erenice Guerra a praticar, entre outras condutas, tráfico de
influências junto à reclamada para fins de favorecer a Master Top Linhas Aéreas Ltda.
(MTA) na celebração de contratos.
A reclamada apresentou na peça de fls. 1.225/1.226 trechos da reportagem, entre
os quais que relata que a MTA chegou a ficar 4 dias sem operar em face de dificuldades
de renovação da licença de voo junta a ANAC e "que as dificuldades se traduziam em
cobrança de propina" (fls. 1.226)3.
A partir de então, uma série de reportagens ganhou as páginas do noticiário. O
então diretor de operações dos Correios, área que comandava à época a Denaf, coronel
Eduardo Arthur Rodrigues, que segundo alguns fora indicado pela Ministra ao cargo que
assumira em 2/8/2010, é apontado como testa de ferro do sócio real da MTA e de ter
favorecido referida empresa4.
Diante do impacto da notícia na campanha eleitoral da então candidata à
presidência da república Dilma Rouseff e da repercussão negativa de nota divulgada na
imprensa, a Ministra Erenice Guerra deixa o Governo5 no dia 16/9/2010. Também pede
demissão, o diretor Eduardo Arthur Rodrigues, que era chefe do reclamante, no dia
20/9/20106.
Em face do que parece mais um escândalo nos Correios7, os órgãos de controle
interno e externos, como o TCU e a CGU8 e a Polícia Federal, iniciam um pente fino sobre
todos os contratos celebrados entre a reclamada e MTA.

2
VEJA.COM. A mãe de todos os escândalos 3: "está na hora de você conhecer a doutora". Disponível em:
<http://veja.abril.com.br/blog/reinaldo/geral/a-mae-de-todos-os-escandalos-3-%E2%80%93-
%E2%80%9Cesta-na-hora-de-voce-conhecer-a-doutora%E2%80%9D/>. Acesso na data de hoje.
3
Encontra-se encartada no arquivo DECOD-0012-2011-Vol-01_fls-001-200A.pdf, do CD de fls. 1517, pp.
227-247 a integra da reportagem "O polvo no Poder", da edição de 15 set. 2010 da Revista Veja.
4
ESTADÃO. Diretor dos Correios e argentino se unem para controlar transporte: documentos mostram que
eles montaram empresa de fachada para operar a MTA, pivô de lobby que derrubo a ministra Erenice
Guerra. São Paulo: 18 set. 2010. Disponível em: <http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,diretor-dos-
correios-e-argentino-se-unem-para-controlar-transporte,611907,0.htm>. Acesso na data de hoje.
5
BBC Brasil. Entenda o caso que levou à queda de Erenice Guerra. Brasília, 20 set. 2010. Disponível em:
<http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2010/09/100920_erenice_entenda_atualiza_dg.shtml>. Acesso
nesta data.
6
AGÊNCIA BRASIL. Diretor dos Correios pede demissão após denúncias de favorecimento a empresa
aérea. Disponível em: <http://memoria.ebc.com.br/agenciabrasil/noticia/2010-09-20/diretor-dos-correios-
pede-demissao-apos-denuncias-de-favorecimento-empresa-aerea>. Acesso na data de hoje.
7
Em maio de 2005, um empregado dos Correios aparece em vídeo reproduzido em todos os telejornais
recebendo certa quantia em espécie. Foi o início do chamado "mensalão", que seria a maior denúncia de
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É sobre essas duas crises que estão inseridos os fatos objetos da apuração e,
também, a própria apuração em si.
B. O serviço postal aéreo de cargas dos Correios
A presente controvérsia tem origem na atuação do reclamante no Departamento
de Encaminhamento e Administração de Frotas (Denaf), vinculado à Diretoria de
Operações (Diope), área da reclamada encarregada de gerir a Rede Postal Aérea
Noturna.
O reclamante exerceu a substituição do chefe do Denaf até 16/12/2009
continuando a desempenhar o encargo de gerente corporativo de planejamento e
encaminhamento do Denaf (fls. 1.554) que ocupava desde 2007 (fls. 1.556). Em
14/5/2010 e em 1/6/2010, foi designado chefe do Denaf (fls. 1.555 e 1.557), sendo
dispensado desse encargo, a pedido, a partir de 24/2/2011 (fls. 1.558)
B.1. Rede Postal Aérea Noturna
Segundo o TCU, "a Rede Postal Aérea Noturna (RPN), implantada em 1974, é o
conjunto de Linhas Postais Aéreas executadas com aeronaves fretadas (parcial ou totalmente) pela
ECT para o transporte de carga postal" (fls. 530/531).
Inicialmente, esclarece o TCU, a reclamada utilizava aviões de companhias
aéreas de transporte regular de passageiros, mas em face da dependência da
disponibilidade de espaços nos porões das aeronaves e de ficar preso aos horários
fixados por tais empresas, passou a contratar empresas no sistema "full", com
disponibilidade completa dos espaços dos aviões para si.
Somente quando não houver espaço suficiente, haveria a utilização residual,
subsidiária, em espaços das aeronaves, denominada de Viação Aérea Comercial (VAC),
cujo valor do quilo transportado ultrapassa a média da RPN. Segundo o TCU (fls. 537), o
VAC, além do prejuízo econômico, traz perda na qualidade do serviço.
A RPN possuía 17 contratos firmados por ocasião do julgamento do processo TC
014.882/2010-8 pelo TCU, considerando esses dados, bem como as informações do
Relatório de Demandas Especiais da CGU tem-se os seguintes contratos:

Tabela 1: contratos da RPN da reclamada vigentes em 2010


Contrato nº Empresa Vigência(*) Valor (R$)
101/2009 Air Brasil Linhas Aéreas Ltda. 43.292.291,47
155/2010 Fretax Taxi Aéreo Ltda. 2.789.999,52

corrupção da história do país até a Lava Jato, e que em junho de 2005 culminou com a saída do então
Ministro Chefe da Casa Civil José Dirceu (REVISTA ÉPOCA. Entenda o mensalão: relembre o início do
escândalo, seus desdobramentos e os envolvidos. Disponível em:
<http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EDR78680-6009,00.html>. Acesso na data de hoje.
8
CAPA ZH. Controladoria quer rever contrato de empresa aérea com Correios: a Master Top Airlines foi
pivô da crise que derrubou Erenice Guerra da Casa Civil. Disponível em:
<http://zh.clicrbs.com.br/rs/noticia/2010/09/controladoria-quer-rever-contrato-de-empresa-aerea-com-
correios-3048677.html#>. Acesso na data de hoje.
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Contrato nº Empresa Vigência(*) Valor (R$)


13739/2005 MEGA Transportes Aéreos Ltda. 2.085.600,00
51/2010 MTA - Master Top Linhas Aéreas S.A. 25/3/10 a 25/3/11 3.429.888,00
105/2010 MTA - Master Top Linhas Aéreas S.A. 11/5/10 a 6/11/10 19.620.140,76
156/2010 MTA - Master Top Linhas Aéreas S.A. 8/7/10 a 8/7/11 20.973.955,20
174/2010 MTA - Master Top Linhas Aéreas S.A. 16/7/10 a 16/7/11 18.743.000,00
50/2009 RIMA - Rio Madeira Aerotáxi Ltda 1.433.577,08
27/2010 Rio Linhas Aéreas Ltda. 47.819.222,00
64/2010 Rio Linhas Aéreas Ltda. 20.816.785,44
188/2010 Rio Linhas Aéreas Ltda. 40.678.316,08
189/2010 Rio Linhas Aéreas Ltda. 17/8/10 a16/8/11 44.894.997,84
13403/2005 Total Linhas Aéreas S.A. 40.977.013,44
106/2009 Total Linhas Aéreas S.A. 41.193.951,39
13866/2006 TRIP Linhas Aéreas S.A. 11.060.016,00
102/2009 TRIP Linhas Aéreas S.A. 8.240.596,32
199/2010 TWO Táxi Aéreo LTDA 3.378.999,36
TOTAL 371.428.349,90
(*) Apenas dos contratos que têm correlação com os fatos debatidos nos autos

A capacidade das aeronaves cargueiras, algumas delas utilizadas por empresas


aéreas brasileiras no 1º semestre de 2010, era a seguinte:

Tabela 2: capacidade de carga das aeronoves cargueiras e utilização no Brasil


Capacidade total Carga ECT Cubagem Palletes
Aeronave Cias. Aéreas
de carga (Kg) (*) (Kg) (#) (m3)
Cessna C208 1.590 1.333 12,7 0 n/d
ATR 42-500 5.450 4.399 41,9 0 Total
737-200C 17.315 11.760 112 7 Rico, TAF
737-300SF 19.731 13.639 129,9 8 n/d
727-100C/QC 19.777 14.416 137,3 9 n/d
727-200F 29.491 20.233 192,7 12 Air Brasil, TAF, Rio, Globex, Total
757-200F/SF 32.755 24.226 230,73 14 VarigLog (+)
707-320C 41.867 22.312 212,5 13 Beta, Skymaster
DC-8-73F 48.826 30.985 295,1 18 Beta
DC-8-63F 50.703 30.985 295,1 18 Skymaster
767-300F 57.665 47.313 450 24 ABSA
DC 10-30F 76.408 48.216 459,2 35 MTA
MD-11F 91.644 60.218 573,5 36 n/d
Fontes: CGU (2011), TCU (2011), Boeing.com (2016), Anac.gov.br (2016), Aeromuseu.com.br (2016), Brain
& Cia. (2007, CD-ROM, fls. 1.517, Anexo 6, pp. 56-57).
(*) A capacidade de carga (payload) varia por inúmeros fatores como modelo, tempo útil ou de fabricação,
autonomia de voo, resistência e tamanho das pistas de pouso e etc.
(#) Peso máximo da carga postal em face da densidade de 105 Kg/m3 (Fonte: Brain & Cia. Auditoria, 2007)
(+) A VarigLog estava em recuperação judicial, devolvendo diversos aviões maiores e trocando sua frota.

Segundo o TCU (fls. 513), a reclamada tem Terminal de Carga Aérea (TECA) em
Brasília, Guarulhos, Salvador e Galeão e Terminas de Carga de Superfície em Jaguaré-

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SP, Rodoanel-SP e Benfica-RJ e diariamente transporta 5 mil toneladas de cargas por via
terrestre e 900 toneladas por via aérea.
As postagens podem ser expressas (Sedex, nas diversas modalidades) ou não
expressas (PACs). Segundo o TCU (fls. 515/516), em 2009 houve 180.623.974
postagens, sendo 152.945.537 expressas (84,7%) e 27.678.437 não expressas (15,3%).
B.2. Impacto da crise nas linhas da reclamada
Tanto o Tribunal de Contas da União (TCU) com a Controladoria-Geral da União
(CGU) relatam diversos problemas que se abateram sobre as linhas de carga postal da
reclamada a partir de outubro de 2009 e 1º semestre de 2010.
A Corte de Contas esclarece que, a partir de 2009, a Rede Postal Noturna passou
por dificuldades que chegaram a interromper mais da metade da sua principal malha
aérea, como inoperância continuada da TAF, determinação de rescisão contratual com a
Skymaster Airlines, Beta e Aeropostal Brasil Transporte Aéreo e a paralisação não
programadas de aeronaves da Total Linhas Aéreas estabelecida pela ANAC (fls. 531).
O relatório da CGU (fls. 382/383) aponta que em outubro de 2009 foi declarada a
indoneidade da Beta paralisando as linhas para A3 (Manaus) e A4 (Porto Velho), em
dezembro de 2009 houve acidentes com 2 (duas) aeronaves da TAF paralisando as
linhas A3 e 7401 (Brasília), em janeiro de 2010 2 (dois) aviões da Total das linhas A1 e A2
(Curitiba, Florianópolis e Porto Alegre) foram proibidas de voar pela Anac e em março de
2010 houve rescisão unilateral dos contratos com a TAF por inoperância, paralisando a
linha A7 (Fortaleza).
O acórdão do TCU9 (fls. 531) esclarece que foram rescindidas as linhas de carga
postal da Beta Cargo (percurso de ida e volta) de Recife − Salvador − Guarulhos e de
Manaus − Brasília − Guarulhos e da TAF de São Luis − Teresina − Brasília e Belém −
Brasília − Rio de Janeiro.
Para o TCU, em razão disso, "51% da carga destinada à RPN deixou de ser
transportada em janeiro de 2010. No mês de agosto deste ano, esse percentual caiu para 8,91%" (fls.
531). Segundo o relatório da CGU:
"Essa situação levou o sistema de transporte aéreo a um caos operacional durante os
primeiros meses de 2010. Nada menos que 300 toneladas/dia de carga deixaram de seguir
pelas linhas da Rede Postal Aérea Noturna. Este impacto não ocorreu somente na
capacidade de carga da RPN, mas também na falta de ligações aéreas importantes que
também deixaram de existir". (fls. 383, grifou-se).
Segundo o TCU (fls.516/517), os índices de qualidade da reclamada na entrega
de cartas e encomendas tiveram uma queda acentuada a partir de dezembro de 2009,
sendo uma das duas principais causas, dificuldades enfrentadas no transporte executado
pela Rede Postal Aérea Noturna. O acórdão apresenta uma tabela que revela que os
índices de qualidade do Sedex caíram da casa de 95% no 1º semestre de 2009 para 81 a

9
TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. Processo TC 014.882/2010-0. Interessados Comissão de
Fiscalização Financeira e Controle da Câmara dos Deputados e Empresa Brasileira de Correios e
Telégrafos - ECT. Acórdão 3148/2010. Plenário. Ata 46/2010, Rel. Min. José Jorge.
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88% no primeiro semestre de 2010. Sublinhou que em agosto de 2010 o índice foi de
encomendas não entregues foi de 14,47% e, como o valor da indenização é o valor do
Sedex pago, se todos os clientes reclamassem indenização, a perda anual do
faturamento com o Sedex seria de 14,47% ou cerca de R$ 470 milhões em face da
receita bruta com encomendas de mais de R$ 3,25 bilhões em 2009.
O Tribunal Contas da União (fls. 518/519) destacou, ainda, que as indenizações
pagas pelos Correios por atrasos em entregas em 2009 foram de R$ 4.798.062,34, com
média mensal de R$ 399.858,53, e de janeiro a junho de 2010 de R$ 6.035.455,09, com
média mensal de R$ 1.005.909,00 (aumento de 152%). Esclarece que, "em março de 2010,
quando surgiram problemas com várias linhas da Rede Postal Noturna, o valor total de indenizações
atingiu o pico de R$ 1.365.743,44".
C. Aspectos jurídicos
A controvérsia dos autos compreende, ainda, algumas premissas jurídicas,
fundamentais para o enquadramento jurídico dos fatos e para a análise da regularidade
da apuração.
C.1. Estabilidade. Motivação da Dispensa.
A primeira questão que se apresenta é se o reclamante é detentor de estabilidade
no emprego e, se para ser dispensado, somente por justa causa e mediante regular
processo administrativo disciplinar.
Como regra, o Tribunal Superior do Trabalho (TST), diversamente do que ocorre
com o empregado da Administração Pública Direta e Autárquica, entende não incidir a
estabilidade do art. 41 da Constituição Federal, invocada pelo reclamante, aos
empregados da Administração Indireta (Súmula 390).
Acontece que a própria reclamada, quando lhe interessa, procura obter o
reconhecimento judicial das garantias próprias da Administração Direta, como a execução
por precatório, os juros de 0,5%, etc.
De qualquer sorte, esse entendimento do TST tem gerado críticas da doutrina. O
Ministro Maurício Godinho Delgado adverte para o risco de fraude ao comando
constitucional do acesso ao emprego público por concurso público10.
Nos casos dos autos, ambas as partes concordam que a aplicação da penalidade
da justa causa depende de prévia apuração em processo administrativo, conforme
previsão normativa. Elas chegam, por diversas vezes, a invocar norma interna da
empresa que regulamenta tal procedimento e que se encontra encartada, em seus
diversos regulamentos e modificações.
Diante disso, em que pese a discussão acerca da aplicação do art. 41 da
Constituição aos empregados da ECT, está claro que a reclamada, por norma interna,
condicionou a aplicação da justa causa a observância do procedimento interno que se
obrigou. Portanto, em qualquer caso, tem incidência no particular, ao menos, a Súmula 77
do TST.

10
CF. DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 2ª Ed.: S. Paulo: LTr, 2003
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C.2. Garantia de contraditório e da Ampla Defesa


Para os fins da Súmula 77 do TST, é imprescindível que o processo
administrativo que a empregadora se comprometeu permita o exercício do contraditório e
da ampla defesa, sob pena de esvaziamento desse entendimento.
O princípio da ampla defesa é a diretriz que permite que o acusado apresente
“todos os elementos tendentes a esclarecer a verdade ou mesmo de omitir-se ou calar-se, se entender
necessário”11. O princípio do contraditório é a exteriorização da ampla defesa, por meio da
dialética, onde “a parte tem o direito de se manifestar sobre todas as provas produzidas e sobre as
alegações feitas pela parte adversa”12.
O art. 5º, LV, da Constituição Federal consagra os princípios do contraditório e da
ampla defesa aos litigantes em processo administrativo ou judicial. Sua importância como
direito fundamental inspirou a alteração do art. 57 do Código Civil pela Lei 11.127/2005,
que assegurou a ampla defesa e o contraditório aos membros de uma associação em
face de sua exclusão por justa causa. Também a exclusão de sócio minoritário de uma
sociedade empresária deve observar o contraditório e a ampla defesa, conforme preceitua
o art. 1.085, parágrafo único, do Código Civil.
Antes mesmo da vigência do novo Código Civil de 2002, o Supremo Tribunal
Federal (STF), por ocasião do julgamento do RE 158.215/RS, anulou a expulsão de um
associado de uma cooperativa, por não lhe ter sido assegurado o contraditório e a ampla
defesa. Na ocasião, entendeu-se que era intangível o princípio constitucional do devido
processo legal13, da qual o contraditório e a ampla defesa são corolários14.
No julgamento do RE 201.819/RJ, o STF concluiu que houve violação do devido
processo legal, contraditório e ampla defesa em face da expulsão de membro de uma
sociedade15, conforme fundamentos sintetizados na seguinte ementa:
“SOCIEDADE CIVIL SEM FINS LUCRATIVOS. UNIÃO BRASILEIRA DE
COMPOSITORES. EXCLUSÃO DE SÓCIO SEM GARANTIA DA AMPLA DEFESA E
DO CONTRADITÓRIO. EFICÁCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS
RELAÇÕES PRIVADAS. RECURSO DESPROVIDO. I. EFICÁCIA DOS DIREITOS
FUNDAMENTAIS NAS RELAÇÕES PRIVADAS. As violações a direitos fundamentais
não ocorrem somente no âmbito das relações entre o cidadão e o Estado, mas igualmente
nas relações travadas entre pessoas físicas e jurídicas de direito privado. Assim, os direitos
fundamentais assegurados pela Constituição vinculam diretamente não apenas os poderes
públicos, estando direcionados também à proteção dos particulares em face dos poderes
privados. II. OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS COMO LIMITES À AUTONOMIA
PRIVADA DAS ASSOCIAÇÕES. A ordem jurídico-constitucional brasileira não conferiu

11
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 15ª Ed. São Paulo: Atlas, 2004, p. 125.
12
MOTTA FILHO, Sylvio Clemente da. Direito Constitucional: teoria, jurisprudência e 1.000 questões. 19ª
Ed. R. de Janeiro: Elsevier, 2007, p. 114.
13
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE 158.215/RS, Relator Ministro Marco Aurélio, DJ 7/6/1996,
Disponível em <http:\\www.stf.jus.br>, Acessado na data de hoje.
14
MORAES, op. citato, p. 124.
15
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE 201.819/RJ, Relator Ministro Gilmar Mendes, DJ 27/10/2006,
Disponível em <http:\\www.stf.jus.br>, Acessado na data de hoje.
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a qualquer associação civil a possibilidade de agir à revelia dos princípios inscritos nas leis
e, em especial, dos postulados que têm por fundamento direto o próprio texto da
Constituição da República, notadamente em tema de proteção às liberdades e garantias
fundamentais. O espaço de autonomia privada garantido pela Constituição às associações
não está imune à incidência dos princípios constitucionais que asseguram o respeito aos
direitos fundamentais de seus associados. A autonomia privada, que encontra claras
limitações de ordem jurídica, não pode ser exercida em detrimento ou com desrespeito aos
direitos e garantias de terceiros, especialmente aqueles positivados em sede constitucional,
pois a autonomia da vontade não confere aos particulares, no domínio de sua incidência e
atuação, o poder de transgredir ou de ignorar as restrições postas e definidas pela própria
Constituição, cuja eficácia e força normativa também se impõem, aos particulares, no
âmbito de suas relações privadas, em tema de liberdades fundamentais. III. SOCIEDADE
CIVIL SEM FINS LUCR ATIVOS. ENTIDADE QUE INTEGRA ESPAÇO PÚBLICO,
AINDA QUE NÃO-ESTATAL. ATIVIDADE DE CARÁTER PÚBLICO. EXCLUSÃO
DE SÓCIO SEM GARANTIA DO DEVIDO PROCESSO LEGAL.APLICAÇÃO
DIRETA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS À AMPLA DEFESA E AO
CONTRADITÓRIO. As associações privadas que exercem função predominante em
determinado âmbito econômico e/ou social, mantendo seus associados em relações de
dependência econômica e/ou social, integram o que se pode denominar de espaço público,
ainda que não-estatal. A União Brasileira de Compositores - UBC, sociedade civil sem fins
lucrativos, integra a estrutura do ECAD e, portanto, assume posição privilegiada para
determinar a extensão do gozo e fruição dos direitos autorais de seus associados. A
exclusão de sócio do quadro social da UBC, sem qualquer garantia de ampla defesa, do
contraditório, ou do devido processo constitucional, onera consideravelmente o recorrido,
o qual fica impossibilitado de perceber os direitos autorais relativos à execução de suas
obras. A vedação das garantias constitucionais do devido processo legal acaba por
restringir a própria liberdade de exercício profissional do sócio. O caráter público da
atividade exercida pela sociedade e a dependência do vínculo associativo para o exercício
profissional de seus sócios legitimam, no caso concreto, a aplicação direta dos direitos
fundamentais concernentes ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa (art.
5º, LIV e LV, CF/88). IV. RECURSO EXTRAORDINÁRIO DESPROVIDO”.
Os princípios da ampla defesa e do contraditório, segundo o STF e o Código Civil,
são aplicáveis, no âmbito de entidades privadas, para caso de punição de um dos seus
membros.
Em face da chamada eficácia horizontal dos direitos fundamentais, “não se pode
admitir que os poderes atribuídos ao empregador não estejam sujeitos à referência dos preceitos
constitucionais”16. Para César Arese toda sanção disciplinar no ambiente de trabalho dever
ser precedida de um processo em que há o contraditório17.
Ana Paola S. Machado Diniz ensina que:

16
MOREIRA, Teresa Alexandra Coelho. Da esfera privada do trabalhador e o controlo do empregador.
Coimbra: Coimbra, 2004, p. 60.
17
ARESE, César. Principio de igualdad o no discriminación, derecho de defensa y acceso a la Justicia en el
contrato de trabajo. In: Cadernos da Amatra IV, P. Alegre: HS Editora, ano IV, nº 10, jan/mar. 2009, p. 108.
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“A eficácia horizontal desses direitos no âmbito da empresa é inerente à própria unidade do


ordenamento jurídico. Como direitos de proteção implicam limitação tanto à ação estatal
como à autonomia privada, com a imposição de um dever geral de respeito pelos direitos
uns dos outros nas relações privadas, evitando-se, assim a formação de espaços neutros à
influência da Constituição. O contrato de trabalho não pode ser visto como um título
legitimador de violações aos direitos fundamentais. O trabalhador não perde sua condição
de cidadão por inserir-se na organização empresarial. Também o empregador no pleno
exercício de seu poder diretivo há de atentar para os equilíbrios e limitações recíprocos que
emanam dos direitos fundamentais garantidos pelo texto constitucional”. 18
Em outras palavras, “os instrumentos normativos tutelares devem incidir sobre as
relações laborais, conciliando o poder diretivo patronal com as dimensões essenciais da dignidade
do trabalhador, por força imperiosa da eficácia horizontal dos direitos fundamentais”19.
A diretriz do art. 5º, LV, da Constituição de 1988 não se aplica apenas aos
litigantes em processo administrativo ou judicial, mas também às relações privadas como
associações e sociedades empresárias, por expressa previsão de lei e a e em face da
jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, alcançando, inclusive a reclamada. Referida
conclusão decorre diretamente da supremacia da Constituição sobre a CLT e sobre as
normas internas da reclamada.
No caso dos autos, a norma interna, tanto a invocada pelo reclamante, como a
trazida pela reclamada estabelecem uma fase investigativa e outra processual, na qual
será exercido o contraditório e a ampla defesa.
Não há dúvida, portanto, que o reclamante somente pode ser punido mediante
apuração de sua conduta por processo administrativo. Esse, conforme já exposto, deve
observar, por força do art. 5º, LV, da Constituição Federal e as normas internas
aplicáveis, o direito ao contraditório e à ampla defesa.
C.3. Motivação do ato administrativo e teoria dos motivos determinantes
A reclamada, conforme asseverado, procura a aplicação dos benefícios próprios
da Administração Pública Direta, como a execução por precatório, taxa de juros reduzida.
Seus atos, mesmo os de gestão de seus empregados, devem estar revertidos dos
mesmos atributos dos atos administrativos em geral, sendo elementos constitutivos o
sujeito, o objeto, a forma, a finalidade e a motivo. Aliás, é sobre esse ângulo que a
apuração disciplinar, de certa forma, procura avaliar a conduta do reclamante como, por
exemplo, em relação ao caráter emergencial que culminou com a celebração do Contrato
105/2010.
Ensina Maria Zanella Di Pietro que o motivo “é o pressuposto de fato (circunstâncias
que levam a prática do ato) e de direito (dispositivo legal que fundamenta o ato) que serve de

18
DINIZ, Ana Paola S. Machado. Direitos personalíssimos do trabalhador e liberdade de empresa:
ponderação nos meios de controle empresarial. Revista Amatra V: vistos etc.. Salvador: Amatra V, 2007, v.
I, nº 6, pp. 79-80.
19
PORTO, Carla Teresa Baltazar da S. O Princípio da Dignidade da Pessoa Humana e o jus variandi
patronal. In:Revista Amatra V: vistos etc., Salvador: Amatra V, 2009, v. I, nº 9, p. 37.
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fundamento ao ato administrativo”20, de modo que a falta de motivo ou a indicação de motivo


falso invalidam o ato.
Estabelece a doutrina, ainda, que, em face da teoria dos motivos determinantes, a
validade do ato administrativo vincula-se aos motivos indicados como fundamento, de
modo que, quando a administração motiva o ato, mesmo que a lei não exija, ele só será
válido se os motivos forem verdadeiros. Assim, caso afastado o motivo que determinou o
ato, por decisão judicial, seria ele nulo quanto ao motivo e, portanto, passível de ser
invalidado ou ter seus efeitos cassados.
No caso dos autos, a validade do ato administrativo que dispensou o reclamante
está vinculada aos motivos que o ensejaram, sob pena de se tornar ineficaz.
C.4. Dispensa do reclamante por justa causa
O reclamante foi comunicado, por meio da Carta 092 de 26/2/2015, que os
membros da Comissão de Disciplina da reclamada (Codis), no exame do Processo Decod
012/2011 pela aplicação da justa causa (fls. 344). Não foi indicado, nesta comunicação, o
dispositivo legal em que a sua conduta foi enquadrada.
O Processo Decod 012/2011, juntado parcialmente pelo reclamante em autos
físicos, e na íntegra (até o recurso administrativo) no CD-ROM juntado às fls. 1.517,
culminou com a aplicação da pena de rescisão por justa causa ao reclamante por violação
do disposto no Manlic módulo 7, capítulo 2, subitem 2.1, alínea "j", e Módulo 46, Capítulo
2, subitem 2.1, alíneas "w" e "ee" e, a responder, em solidariedade com outro empregado,
pela importância de R$ 396.309,60 (Mampes 46/2, item 4.4, alíena "d").
O Departamento Jurídico da reclamada (fls. 1.027/1.054), em 20/2/2015,
enquadrou as condutas do reclamante (não utilização do Contrato 51/2010 e aumento dos
custos de transportes com favorecimento da MTA; não formalização da não utilização do
Contrato 51/2010 e permitir o transporte de cargas não urgentes no Contrato 105/2010),
como atos de improbidade e de indisciplina (art. 482, "a" e "h", da CLT. Sobre esses
dispõe o Manual de Pessoal:
"MANPES
MÓDULO 46: Regulamento Disciplinar de Pessoal
CAPITULO 2: Deveres, Proibições e Penalidades
(...)
2 DEVERES
2.1 Todo empregado deve:
(...)
w) manter-se atualizado com as normas de serviço e a legislação pertinentes ao órgão
onde exerce suas atividades, observando-as em todos os seus aspectos;
(. ..)
ee) eximir-se de utilizar das prerrogativas que o cargo ou função lhe conferem para induzir,
coagir, constranger ou beneficiar indevidamente empregados e terceiros" (fls. 1.051).

20
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 17ª Ed. São Paulo: Atlas, 2004, p. 203.
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Improbidade, do latim, improbitas (má qualidade, imoralidade) é o atributo dado a


uma pessoa desonrada, que não observa as regras da moralidade21. Para Eduardo
Gabriel Saad, "ato de improbidade é todo aquele que não se coaduna com os padrões da
moral de uma dada sociedade e num dado momento"22.
Para Mauricio Godinho Delgado23, ato de indisciplina "é o descumprimento de
regras, diretrizes ou ordens gerais do empregador ou de seus prepostos e chefias,
impessoalmente dirigidas aos integrantes do estabelecimento ou da empresa". Da mesma
forma, entendem a indisciplina como o descumprimento de ordens gerais de serviços
Sérgio Pinto Martins24 e Valentim Carrion25.
C.5. Ônus da prova da justa causa
A justa causa é “antes de tudo, um grave e culposo comportamento de uma pessoa, que
produz severo dano à relação socioeconômica e jurídica que ela mantém com outra pessoa”26.
O principal elemento da justa causa de ordem subjetiva é a vontade do
empregado (culpa ou dolo) e no plano objetivo são requisitos: a tipificação (previsão em
lei), gravidade do ato, nexo de causalidade entre a falta praticada e a dispensa,
proporcionalidade (correlação entre ato faltoso e punição), imediação (ou imediatidade),
non bis in idem (sem dupla punição para o mesmo fato) e, por fim, a conexão entre a falta
e o serviço.
Pelo princípio da continuidade da relação de emprego, compete à parte que alega
justa causa, demonstrá-la em juízo, a teor dos arts. 818 da CLT e 333 do CPC. A justa
causa é fato modificativo do direito alegado em juízo e obsta diversos direitos trabalhistas
referentes à rescisão. Por isso, a jurisprudência desta Corte é no sentido de que a justa
causa exige comprovação robusta de sua ocorrência:
“JUSTA CAUSA. NÃO CONFIGURAÇÃO. Havendo alegação de ocorrência de falta
praticada pelo empregado (art. 482 da CLT), é da reclamada o encargo de provar a justa
causa imputada ao reclamante, a teor do disposto no inciso II do art. 333 do CPC, devendo
fazé-lo de modo cabal, induvidoso e inconteste, vez que representa uma mácula na vida
profissional do empregado. Não se desincumbindo a reclamada de tal ônus, forçoso é o
reconhecimento da dispensa imotivada” (TRT da 10ª Região, RO 013/2011-103-10-
00, 1ª Turma, Rel. Des. Maria Regina Guimarães, DEJT 21/9/2011).
“1. JUSTA CAUSA. ABANDONO DE EMPREGO. ÔNUS DA PROVA. Versando a
discussão sobre a ocorrência de abandono de emprego praticado pelo obreiro a embasar
sua dispensa por justa causa, e sendo esta a alegação apresentada pela reclamada, sobre ela
recai o encargo em prová-la (CLT, artigo 818, c/c CPC, artigo 333, inc. III), devendo fazê-
lo de forma precisa e inequívoca, porquanto se trata da mais severa penalidade aplicada ao

21
MARTINS, Sérgio Pinto. Comentários à CLT. 14ª Ed. São Paulo: Atlas, 2010, p. 510.
22
SAAD, Eduardo Gabriel. Consolidação das Leis do Trabalho comentada. 43ª Ed. São Paulo: LTr, p. 682.
23
DELGADO, Curso de Direito do Trabalho, op. cit., p. 1.141.
24
MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do Trabalho. 9ª Ed. São Paulo:.Atlas, 1999, p. 313.
25
CARRION, Valentín. Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho. 35ª Ed. São Paulo: Saraiva,
2010.
26
DELGADO, Curso de Direito do Trabalho, op. cit., p. 1.222.
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empregado no curso do contrato. Não tendo a empresa se desvencilhado de seu ônus,


afastada está a pretendida aplicação da despedida motivada ao reclamante, devendo a
reclamada efetuar o pagamento das verbas correspondentes” (TRT da 10ª Região, RO
190/2011-006-10-00, 2ª Turma, Rel. Des. Brasilino Santos Ramos, DEJT
14/9/2011).
“[...] 2 CONTRATO DE TRABALHO. RESOLUÇÃO. JUSTA CAUSA NÃO
COMPROVADA. Os princípios da boa-fé e da continuidade da relação de emprego (CC,
art. 112; CLT, art. 3º), aliados às regras de distribuição do ônus da prova (art. 818 da CLT
c/c art. 333, II, do CPC), cometem ao ex- empregador o encargo de demonstrar, de forma
clara e inequívoca, a prática de ato grave pelo operário. Afinal, sendo o emprego uma das
principais fontes de subsistência da classe proletária nas sociedades capitalistas, não é
razoável presumir que o prestador se conduza de maneira ilegal (CLT, art. 482)” (TRT da
10ª Região, RO 495-2010-001-10-00, 3ª Turma, Rel. Des. Douglas Alencar, DEJT
29/4/2011).
Incumbe à reclamada, portanto, a comprovação da justa causa em relação às
condutas indevidas atribuídas ao reclamante, isto é, aos atos de insubordinação e de
indisciplinas a ele atribuídas.
D. Sindicância e processo administrativo disciplinar
Feitas essas considerações, incumbe examinar a regularidade da apuração, em
face dos diversos vícios arguidos, bem como sobre a norma procedimental aplicável ao
procedimento.
D.1. Breve histórico da apuração disciplinar
A apuração dos fatos que ensejaram a abertura do processo disciplinar contra o
reclamante teve como ponto de partida reportagem publicada pela revista Veja, edição de
15/9/2010, que ensejaram a abertura do Processo 00190.026802/2010-30 pela CGU.
Esse órgão realizou ações de controle entre os dias de 24/9 a 7/12/2010 (fls. 357).
Na segunda quinzena de dezembro de 2011, a CGU elaborou o Relatório de
Demandas Especiais (fls. 355/460). Em 10/2/2011, o Presidente da reclamada (por meio
do expediente CI Presi 0011/2011 encaminhou-o para o chefe do Departamento de
Controle Disciplinar, que, no dia seguinte, abriu processo de investigação (cf. fls. 11/12,
do arquivo "DECOD-0012-2011-Vol-01_fls-001-200A.pdf", do CD-ROM de fls. 1517).
Houve resposta do Denaf (do reclamante e de outro investigado) e, após a
abertura da sindicância e a citação para defesa (fls. 501/502).
Inicialmente, em 27/12/2012, a comissão de sindicância, instaurada em
16/11/2011 (fls. 611), atribuiu ao reclamante 3 (três) condutas faltosas: i) anuir com a não
utilização do Contrato 51/2010, com o encaminhamento de carga via terrestres para ser
embarcada para Manaus, via aérea, favorecendo a MTA e aumentando os custos para a
reclamada de R$ 1,99/Kg para R$ 3,70/Kg, pactuado no Contrato 105/2010 (ofensa ao
Manlic, módulo 2, capítulo 2, subitem 1.1, alínea "f"); ii) anuir com pagamento a maior à
empresa MTA, em face dessa forma de remessa da carga postal para Manaus, devendo
ser responsabilizado pelo prejuízo de R$ 396.309,60 causado a reclamada (violação ao
Manlic, módulo 2, capítulo 2, subitem 1.1, alínea "c"); iii) não observância do limite de 25%
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estabelecido no art. 65, § 1º, da Lei 8.666/1993 e no Manlic, módulo 7, capítulo 5, subitem
1.2.2.2 (essa última acusação foi depois suprimida).
Houve pedido de esclarecimentos do coordenador da Comissão de Disciplina (fls.
706/708).
Foi informado que a MTA operava 3 aeronaves DC-10-30F (matrículas PR-MTC,
PR-MTA e PR-MTP, nº de sérias 46540, 47908 e 4693, respectivamente) e que a partir de
21/5 até 12/6/2010 foi utilizada apenas o avião de matrícula PR-MTC (fls. 733/734). Há,
nesse documento, ainda, o registro que de 17/5 a 13/6 foi operado apenas um percurso,
mas a tabela de fls. 524, consigna, em todos os dias que ocorreram voos, os aeroportos
de Guarulhos e Manaus (como origem ou destino) e o de Brasília (como o de operação).
Foram colhidos depoimentos (fls. 736/760, 764/766, 768/770).
A comissão de sindicância ofertou relatório complementar (fls. 796/854), juntado
de forma incompleta, no qual consta a seguinte apuração do prejuízo à reclamada pelo
embarque da carga em Brasília ao custo de R$ 3,70 ao invés de R$ 1,99/Kg (fls. 851):

Tabela 3: prejuízos causados à reclamada, segundo a apuração disciplinar


Peso Diferença (R$)
Período
(Kg) Peso*R$1,71
Jun/2010 76.950 131.584,50
Jul/2010 43.150 73.786,50
Ago/2010 90.970 155.558,70
Set/2010 20.890 35.379,90
TOTAL 231.960 396.309,60

Iniciado a fase de processo administrativo, com a citação para apresentação de


defesa no processo disciplinar (arquivo "DECOD-0012-2011-Vol-11_fls-1970-2011.pdf",
do CD-ROM de fls. 1517, pp. 100/101) em 19/12/2013, o reclamante apresentou defesa
prévia (fls. 855/900).
No relatório da comissão disciplinar (fls. 901/974) foram afastadas as
responsabilidades pelas condutas da comissão de sindicância e mantidas três
responsabilidades constantes do relatório complementar da comissão de sindicância (cf.
fls. 973).
No voto apreciado pela comissão disciplinar (fls. 975/1.026), complementado às
fls. 1.027/1.031, foi acolhida a prescrição da pena de advertência, e no mérito, por
unanimidade, aplicou a pena de rescisão por justa causa ao reclamante por violação do
disposto no Manlic módulo 7, capítulo 2, subitem 2.1, alínea "j", e Módulo 46, Capítulo 2,
subitem 2.1, alíneas "w" e "ee" e, a responder, em solidariedade com Adelino Candido
Rodrigues dos Santos, pela importância de R$ 396.309,60 (Mampes 46/2, item 4.4, alíena
"d"). Imputou ao reclamante as seguintes condutas:
i) deixar de utilizar o Contrato 51/2010 e encaminhar a carga não urgente para
Manaus, via rodoviária para o TECA Brasília e depois por via aérea, com aumento dos

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custos para a reclamada de R$ 2,24/Kg para R$ 3,70/Kg, favorecendo operacional e


financeiramente a MTA e gerando um prejuízo de R$ 396.309,60 para a reclamada;
ii) não solicitar ao gestor administrativo a formalização da não utilização do
Contrato 51/2010;
iii) permitir o transporte de carga não urgente para Manaus no Contrato 105/2010,
cujo objeto era carga urgente, descaracterizando a emergencialidade dessa forma de
contratação.
O Departamento Jurídico da reclamada (fls. 1.027/1.054), em 20/2/2015,
enquadrou as condutas do reclamante como atos de improbidade e de indisciplina (art.
482, "a" e "h", da CLT.
O reclamante apresentou recurso da decisão (fls. 1.055/1.148).
Ajuizada a Reclamação Trabalhista 328-92.2015.5.10.0003, perante esta Vara do
Trabalho, foi concedida, em 13/3/2015, antecipação de tutela para conceder efeito
suspensivo ao recurso administrativo interposto e, por consequência, determinar a
reintegração do reclamante no emprego, com a manutenção dos salários e preservando a
vigência do contrato de trabalho até o julgamento do mérito do recurso (fls. 1.152/1.157).
Após a expedição do mandado de reintegração, seu cumprimento, apresentação
de defesa e réplica, o pedido foi julgado extinto sem resolução de mérito ante a perda do
objeto (fls. 1.386/1.389).
D.2. Norma regulamentar aplicável
Discutem as partes qual a norma regulamentar disciplinar aplicável ao caso. O
reclamante entende que a condição, a disposição normativa mais favorável (Mancin)
incorporou-se ao contrato de trabalho, não podendo ser alterada em seu prejuízo. A
reclamada sustenta que as regras disciplinares aplicáveis são as que estão vigentes
(Mancod), não se podendo acumular regras distintas, misturando com disposições
revogadas.
O reclamante admite que o Manual de Controle Interno (Macin) vigorou de 1992 a
1997, foi substituído pelo Manual de Controle Disciplinar (Mancod), mas assevera que
disposições como a que trata do perdão tácito pela imobilização do processo
administrativo disciplinar por mais de 30 dias incorporou-se a seu patrimônio jurídico, sob
pena de violação do art. 468 da CLT e da Súmula 51 do TST. Defende, ainda, que o
Manlic e o Mampes não existiam à época da sua contratação, apenas a partir de 1992,
por isso não poderiam ser aplicados.
A reclamada defende a aplicação da teoria do conglobamento. Assevera que o
exercício do poder regulamentar não configura supressão de direitos materiais. Defende a
aplicação da norma no tempo, em face do seu caráter processual. Acrescenta que o
reclamante não teve qualquer vantagem deferida anteriormente revogada ou alterada.
Impugna a aplicação do Mancin em detrimento do Mancod, sob o argumento de que este
é que vigia na época dos fatos.
Foram juntadas em meio físico, pelo reclamante, o Regulamento de Pessoal,
oriundo da Deliberação 038/1985 (fls. 290ss) e o Manual de Controle Interno (Macin), de
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1992 (fls. 329ss) e, pela reclamada, o Manual de Controle Disciplinar (Mancod) de


setembro de 2012 (fls. 1.519/1.534) e o Manual de Licitação e Contratação (Manlic) de
novembro de 2012 (fls. 1.536/1.552).
Em meio eletrônico, consta no arquivo "DECOD-0012-2011-Vol-04_fls-601-
800.pdf", do CD-ROM de fls. 1517. os Módulo 2 e 7 do Manual de Licitação e Contratação
de 2009 e 2008, respectivamente, (pp. 27/41), o Módulo 6, capítulo 4, do Manual de
Organização (Manorg) de 2007 (pp. 42/43), o Módulo 46, capítulo 2, do Manual de
Pessoa (Manpes) de 2006 (fls. 44/48).
Percebe-se, em vários casos, que as vigências das normas são distintas para os
diversos módulos.
D.2.1. Princípio da proteção: norma e condição mais benéficas
O princípio protetor (ou da proteção), estruturante do Direito do Trabalho,
reconhecendo a hipossuficiência do empregado na relação de emprego, procura atenuar,
no plano jurídico, o desequilíbrio existente no campo fático. Subdivido em três
subprincípios, destaca-se, no particular, dois:
i) o da condição mais benéfica ao empregado, que estabelece que as “vantagens já
conquistadas, que são mais benéficas ao trabalhador, não podem ser modificadas para pior”27 e
que, havendo condições (disposições contratuais) conflitantes no contrato, prevalecerá à
cláusula mais favorável ao empregado, exceto se houver norma proibitiva de escalão
superior no modelo tradicional;
ii) o da aplicação da norma mais favorável ao empregado, segundo o qual “o
operador do Direito do Trabalho deve optar pela regra mais favorável ao obreiro”28, quando
houver mais de uma norma aplicável. Referida opção se dá no processo de elaboração da
norma, na hierarquia das normas e na interpretação da norma.
Percebe-se, assim, que os subprincípio tratam de coisas distintas. O primeiro diz
respeito a um benefício, uma vantagem de direito material, o segundo refere-se a
qualquer disciplinar normativa que possa ensejar uma regra mais favorável ao
empregado.
Quanto à aplicação da norma mais favorável, Júlio C. Bebber29 afirma que para
aferi-la é exigida a presença concomitante dos seguintes requisitos: a) pluralidade de
normas jurídicas, “somente a existência de uma pluralidade permite o comparativo do qual se
extrairá a norma mais favorável”; b) vigência simultânea das normas jurídicas, não se
compara norma vigente com revogada à época dos fatos; c) diferente hierarquia, pois se
forem da mesma a norma posterior revoga a anterior; d) validade das normas em
confronto, que não podem ser ilegais ou inconstitucionais; e) aplicabilidade das normas, a
normas devem regular a mesma situação jurídica; f) colisão entre as normas, uma delas
deve ter nível de proteção superior ao da outra; g) maior benefício, uma delas deve ser

27
MARTINS, Direito do Trabalho, op. cit., p. 73.
28
DELGADO, Curso de Direito do Trabalho, op. cit., p. 198.
29
BEBBER, Júlio César. Direito do Trabalho: temas polêmicos. Revista Gênesis. Curitiba, out/2002, nº 20, p.
548.
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mais favorável ao empregado; h) inexistência de norma estatal proibitiva, não pode haver
norma cogente estatal que proíba a concessão da vantagem ao trabalhador de modo
superior à existente.
Preenchidos os requisitos supra, há 3 (três) teorias acerca da aplicação da norma
mais favorável ao empregado:
A teoria da acumulação (atomista) “propõe o fracionamento do conteúdo dos textos,
retirando-se preceitos e condições singulares de cada um, que se destaquem por seu sentido mais
favorável ao trabalhador30”. Com isso há uma acumulação, uma soma de vantagens
extraídas de diversos diplomas, pois os preceitos são comparados um a um. Esse critério
permite um saldo mais favorável ao empregado, mas gera um fracionamento no sistema
normativo e com a criação de uma terceira norma, com elementos das diversas normas
comparadas.
A teoria do conglobamento (globalista ou incidência das normas) estabelece que
a norma é apreendida globalmente quando o seu conjunto se apresenta mais favorável ao
empregado que outras normas, também globalmente apreendidas. Sendo uma norma, em
seu conjunto, mais favorável a outra é ela quem incide inteiramente sobre o contrato de
trabalho, excluindo a outra. Essa teoria tem como premissa a ideia de que uma norma
jurídica é uma unidade orgânica e indivisível.
A última teoria, denominada de incidência dos institutos (acumulação das
matérias, incindibilidade dos institutos ou conglobamento orgânico), é uma síntese das
duas teorias anteriores e vem ganhando prestígio da doutrina e na jurisprudência.
Segundo ela, o intérprete analisa as normas conflitantes instituto por instituto para aplicar
a mais favorável instituto por instituto. Para Amauri Mascaro Nascimento, o conjunto que
se leva em conta é o de normas sobre as mesmas matérias, assim “organiza-se o
instrumental ratione materiae para extrair-se a mais benéfica, porém sem desprezo à prevalência da
norma especial sobre a geral”31.
D.2.2. Identificação de condição e/ou norma mais benéfica
Não há, essencialmente, muitas diferenças entre as diretrizes gerais do Macin e
do Mancod, mas pontualmente distinções procedimentais.
Por exemplo, o prazo para início da apuração do Macin item 1.1, do capítulo 2, do
módulo 7 (fls. 329) é "de preferência" 24h. O item 3.1 estabelece que a autoridade
instauradora deve definir o prazo para conclusão dos trabalhos, não podendo ser superior
a 30 dias, e autorizar sua prorrogação (fls. 331). O prazo para a defesa na fase
processual é de 5 dias (fls. 335), contra os 10 do Mancod. Há previsão de perdão tácito
para o feito paralisado durante a sindicância por período acentuado (aproximadamente 30
dias) (fls. 337).

30
DELGADO, Maurício Godinho. Fontes de Direito do Trabalho. In: BARROS, Alice Monteiro de. Curso de
Direito do Trabalho: estudos em memória de Célio Goyatá. 2ª tiragem. São Paulo: LTr, 1993, p. 110.
31
NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de Direito do Trabalho, 18ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 277.
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Inexistência de condição mais benéfica ao empregado


Não identifico condição mais favorável ao empregado, isto é, que se incorporou a
seu patrimônio jurídico.
Via de regras normas procedimentais, tais como relativos a procedimentos
internos, ainda que disciplinares, não se enquadram na ideia de condição mais favorável,
salvo quando assegura um direito procedimental que tenha direta repercussão nas
vantagens trabalhistas. Explica-se: se a norma anterior assegura o direito à dispensa
apenas por justa causa a um empregado, a seguinte que a suprime, não tem aplicação a
ele, nos termos do subprincípio da condição mais benéfica ao trabalhador e ao disposto
no art. 468 da CLT e na Súmula 51 do TST. Do mesmo acontece, se uma assegura um
direito de defesa (como ouvir testemunha) e a nova norma não; se uma prevê uma
situação de perdão ou remissão da punição e a outra não, etc.
Ou seja, para incorporar-se ao contrato de trabalho, a norma anterior deve
assegurar um direito material, ainda que a disposição se refira a procedimento disciplinar.
Não há qualquer fundamento na alegação do reclamante de que, quando
admitido, não havia norma disciplinar prevendo faltas graves. Os motivos para a justa
causa estão elencados em lei (especialmente no art. 482 da CLT). É a lei quem diz o que
é falta grave apta a ensejar a ruptura contratual e não a norma interna. Esta pode apenas
explicitar, com mais ou menos pormenores, condutas indesejáveis. Porém, explicitando
ou não, enumerando-as ou não, é a lei que incide na espécie. Por isso, eventual relação
de rol de condutas após a contratação e a sua extensão a posteriori não constitui violação
do subprincípio da condição mais favorável.
A questão relativa à configuração do perdão tácito está ligada diretamente aos
prazos fixados por cada norma. Por exemplo, a Mancod fixa prazo para defesa na fase
processual de 10 dias, na Mancin apenas 5 dias. A Mancod é explícita sobre a
possibilidade de reinquirição de testemunha, a Mancini não. Assim, ampliados os prazos
para a defesa na Mancod, tem-se, como corolário, a diluição da configuração do perdão
tácito pela demora no procedimento. Nesse caso, não se pode reconhecer que houve
propriamente uma condição mais favorável que foi suprimida pela nova norma, mas uma
reformulação de regras procedimentais, sendo a Mancod mais prolixa do que a Mancin.
O disposto item 5.1, Módulo 7, do Manual de Controle Interno (Macin), acerca do
pronunciamento por escrito do chefe imediato do empregado, é apenas uma faculdade e,
da mais forma, não traduz uma condição mais benéfica a incorporar-se ao contrato de
trabalho.
Não configuração de conflito aparente de normas e de norma mais favorável
Por outro lado, não há direito adquirido a regras meramente procedimentais,
ainda que, indiretamente, interfiram no direito material. Exemplo: a norma anterior prevê
oitiva de testemunhas e após interrogatório e a nova inverte a ordem. Ainda que se possa
compreender que a primeira é mais benéfica, por permitir que o empregado fale após a
produção de toda a prova oral, ela é meramente procedimental e sua eventual
repercussão no direito material é pontual, incidental, indireta. Não se trata, em casos
como esses, de condição mais benéfica, mas de norma mais favorável.
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Em se tratando de normas procedimentais, com vigências em épocas distintas,


não está presente o segundo requisito apontado acima por Júlio Bebber: vigência
simultânea das normas jurídicas. Nesse caso, incide, na espécie, o princípio de que o
tempo rege o ato.
De fato, não há como compreender que os procedimentos regulamentares da
sindicância e do processo administrativo constituem vantagens que vão além do tempo de
sua vigência.
AFASTO a aplicação da Mancin em detrimento da Mancod, da não aplicação do
Mampes, da Mancod e outras normas regulamentares e NÃO ENCONTRO condição mais
favorável ao reclamante que não tenha sido observada pela reclamada.
D.3. Vícios na sindicância e no procedimento disciplinar
O reclamante discute a regularidade da apuração disciplinar que ensejou sua
dispensa por justa causa. Aponta diversos vícios procedimentais que, a seu juízo,
ensejara violação da ampla defesa e do contraditório, como: i) reabertura de nova
comissão de sindicância para apurar supostos fatos novos, em desacordo com a Mancod,
módulo 1, capítulo 2, subitem 5.17; ii) oitiva de testemunhas pela comissão de
sindicância, sem que pudesse estar presentes (violação do subitem 5.11 da referida
norma); iii) parcialidade da comissão de disciplina evidenciada por aduzir que foram
descumpridas todas as normativas quando sabe que a imputação se refere a apenas
algumas; iv) contradição entre a imputação da primeira sindicância e a da comissão
disciplinar; v) ausência de indicação no aviso de dispensa do dispositivo legal em que se
funda a decisão.
D.3.1. Reabertura da sindicância
O item 5.17 do Mancod (fls. 1.530), que trata de fato novo, não assegura o retorno
da apuração a fase anterior, mas sua apreciação pelo responsável pela sindicância ou o
julgador do processo administrativo.
Na verdade, o fato novo que o reclamante alega, diz respeito às diligências e
novas informações solicitadas pelo coordenador da Comissão de Disciplina (fls. 706/708)
e que acabou por alterar as imputações inicialmente apuradas na fase de sindicância.
Na fase investigatória não há libelo de acusação ainda estabelecido, é possível,
durante o correr da sindicância, haver alteração do objeto da investigação, o exame de
fatos novos, a reformulação do foco da investigação. Apenas após a formação do libelo
acusatório, com a ciência do investigado das imputações e responsabilidades que lhe são
atribuídas, é que a possibilidade de alteração da acusação pode, eventualmente, ensejar
vício e/ou prejuízo ao direito de defesa ou do contraditório se, agravar a situação do
acusado, não ser a ele garantido o amplo exercício de seus direitos constitucionais. Não é
essa, porém, a situação dos autos.
REJEITO a tese de nulidade do processo administrativo disciplinar pela não
reabertura da sindicância.

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D.3.2. Alteração da imputação


As primeiras conclusões da comissão de sindicância, que indicou imputações
outras ao reclamante, não vincula a comissão disciplinar, tampouco obriga a reclamada a
oferecer o formal acusatório com base nas condutas ali identificadas. Ao contrário, em se
tratando de mera fase de investigação, preliminar ao processo disciplinar, é possível a
alteração da acusação, o arquivamento, a dilação para novas diligências, etc.
Obviamente que eventual interpretação oposta acerca da norma procedimental
violada, ou do procedimento normativo que o reclamante deveria seguir, pela comissão de
sindicância enfraquece a imputação acerca do descumprimento das regras da reclamada.
De fato, se a própria sindicância mostra-se insegura acerca de qual o procedimento
regulamentar, a regra interna, que o reclamante deve seguir então menos força terá essa
acusação. Todavia, isso diz respeito ao mérito da questão e não a vício de procedimento.
AFASTO a alegação de vício na apuração da falta grava em razão da alteração
da imputação na fase de sindicância.
D.3.3. Regularidade do libelo acusatório
Concluída a sindicância, o item 5.8 do Mancod de 2012 (fls. 1.529v) deixa clara
que a citação que precede a abertura da fase processual administrativa "deverá conter,
claramente, as irregularidades, as normas internas infringidas e o valor do dano ao erário (se houver
valor definido) e a informação de que o empregado envolvido poderá se auto defender ou ser
defendido [...]".
Na cópia eletrônica do Decod 012/2011 (arquivo "DECOD-0012-2011-Vol-11_fls-
1970-2011.pdf", do CD-ROM de fls. 1517, pp. 100/101), consta que em 19/12/2013 o
reclamante foi citado para apresentação de defesa no processo disciplinar e que relaciona
as condutas imputadas ao reclamante, os dispositivos das normas internas que teriam
sido violados, e a expressa transcrição da norma interna que lhe assegura o direito ao
contraditório e a ampla defesa, inclusive para arrolar, inquirir e reinquirir testemunhas.
AFASTO a irregularidade na formação e comunicação do libelo acusatório.
D.3.4. Inobservância do contraditório e da ampla defesa
Com relação à fase de sindicância, o item 5.1.2 do Mancod (fls. 1.529) estabelece
a natureza investigativa da fase de sindicância, não havendo acusado (denominado de
"empregado envolvido") e, por isso, nem contraditório ou ampla defesa. O item 5.7
estabelece, nessa fase, que o advogado ou o representante não intervirá nas perguntas
feitas ao sindicante ou ao declarante, sendo-lhe facultado, ao final, formular perguntas ao
declarante, desde que pertinentes ao objeto da apuração (fls. 1.529v.)
Na fase processual, porém, inaugurada com a entrega da citação do libelo
acusatório, será observado o contraditório e a ampla defesa (fls. 1.529v, subitem 5.11),
inclusive, arrolar, inquirir e reinquirir testemunhas (item 5.15.a, fls. 1.530), podendo ser
indeferidos requerimentos impertinentes ou protelatórios (item 5.15.1, ibid).
De fato, conforme exposto acima, tem plena incidência no procedimento
administrativo disciplinar da reclamada os princípios constitucionais do contraditório e da
ampla defesa, ainda que pela eficácia horizontal dos direitos fundamentais.
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Todavia, examinando a defesa no processo disciplinar (fls. 855/900) não encontro


qualquer requerimento para oitiva de testemunhas ou reinquirição daquelas ouvidas na
fase da sindicância. Na verdade, o reclamante não requereu a produção de qualquer
outro elemento de prova.
Diante disso, foi elaborado o relatório final de fls. 901/975 e, a partir de então, a
decisão da comissão disciplinar que lhe aplicou a penalidade máxima (fls. 976ss).
Não tendo o reclamante requerido a produção de qualquer prova, sequer a
reinquirição das testemunhas ouvidas na fase da sindicância, REJEITO a alegação de
cerceamento de defesa e inobservância do contraditório, ainda que a decisão que aplicou
a justa causa tenha fundamentado, pontualmente, em depoimentos da fase de
sindicância.
D.3.5. Imparcialidade da comissão de disciplina
Não há qualquer elemento fático, sequer na prova oral produzida em juízo, que
conduza à conclusão de que a comissão de disciplina agiu com parcialidade com a visível
intenção de condenar o reclamante. Até mesmo o contexto político que culminou com a
apuração e a devassa porque passaram os contratos da MTA, com a apuração pela CGU,
TCU, Comissão de Disciplina e Polícia Federal, são indícios suficientes a ensejar a
conclusão defendida pelo reclamante.
Eventuais hipérboles utilizadas na fundamentação da decisão disciplinar não
constitui elemento ou prova cabal da ausência de parcialidade ou animus em prejudicar.
O reclamante não se desonerou de comprovar o fato constitutivo do direito à
anulação da decisão da comissão disciplinar que aduziu em juízo, a teor dos arts. 818 da
CLT, 333 do CPC/1973 e 373 do CPC.
REJEITO a alegação de vício na decisão da comissão disciplinar por
imparcialidade.
D.3.5. Ausência de indicação do dispositivo legal no aviso de dispensa
Particularmente, compreendo que em toda e qualquer dispensa por justa causa
deve o empregado ser cientificado do enquadramento legal que lhe foi imputado, como
corolário da eficácia horizontal dos direitos fundamentais, entre os quais o direito à
informação.
Todavia, no caso particular, em face da longa apuração e da efetiva atuação do
reclamante na sindicância e no processo disciplinar, está claro que ele tinha plena ciência
dos fatos e das condutas imputadas a ele quando recebeu o aviso de dispensa. Até
mesmo, procurou exercer o direito a recurso postulando, judicialmente, a suspensão do
ato rescisório.
Diante disso, não restou caracterizada, no particular, ofensa ao contraditório, a
ampla defesa e ao devido processo legal administrativo, tampouco houve prejuízo para a
defesa judicial do seu procedimento, que julga correto, apropriado e dentro das normas da
reclamada.

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REJEITO a anulação da intimação do aviso de dispensa por justa causa por


ausência de indicação do dispositivo legal que o fundamenta.
D.3.6. Pequenas irregularidades de forma
Examinando a apuração preliminar e o processo administrativo, não encontro
qualquer dos pequenos vícios aduzidos pelo reclamante ao longo deste feito, inclusive
aqueles que foram objetos da inquirição em audiência. AFASTO, assim, as impugnações
dispersas sobre pequenas irregularidades formais ao longo da apuração da falta grave
imputada ao reclamante.
E. Imediatidade e perdão tácito
A primeira questão que salta aos olhos diz respeito ao tempo de apuração das
denúncias e a imediatidade da dispensa por justa causa.
O reclamante alega que houve perdão tácito em face da: i) demora na aplicação
da pena de justa causa após a conclusão do processo administrativo; ii) paralisação do
processo administrativo por mais de 30 dias sem qualquer diligência; iii) prolongamento
da apuração por um período interminável; iv) postura contraditória da reclamada ao trazer
a participação de decisões estratégicas e demiti-lo por justa causa.
E.1. Conceituação
O transcurso do tempo entre o ato faltoso e a dispensa por justa causa constitui
perdão tácito, conforme assinala a doutrina trabalhista:
“O fato deve ser contemporâneo à medida aplicada à dispensa por justa causa (atualidade).
Em caso contrário, pode haver o que se intitula de perdão tácito”32.
“Entre a falta praticada e penalidade máxima aplicada, deve inexistir solução de
continuidade, sob pena de presumir-se perdoado o ato ilícito do empregado. É o que a
doutrina denomina de imediatidade entre a falta e a punição”33.
“No que tange à imediaticidade da punição, exige a ordem jurídica que a aplicação de
penas trabalhistas se faça tão logo se tenha conhecimento da falta cometida. [...] Tal prazo
conta-se não exatamente do fato irregular ocorrido, mas do instante de seu conhecimento
pelo empregador (ou seus prepostos intraempresariais)”. [...] Esse prazo pode ampliar-se
ou reduzir-se em função da existência (ou não) de algum procedimento administrativo
prévio à efetiva consumação da punição”34.
E.2. Paralisação do processo por mais de 30 dias
Conforme asseverado anteriormente, este juízo afastou a aplicação da Manlic,
então não há que se falar em perdão tácito em face de prazo instituído por essa norma.
De qualquer sorte não entendo que o processo ficou paralisado por mais de 30
dias. As questões trazidas à baila são complexas e exigem exame e tempo para serem

32
JORGE NETO, Francisco Ferreira & CAVALCANTE, Jouberto de Quadros Pessoa. Manual de Direito do
Trabalho. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003, p. 634.
33
CAIRO JÚNIOR, José. Curso de Direito do Trabalho. 3ª ed. Salvador: Juspodivm, 2009, p. 460.
34
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 2ª ed. São Paulo: LTr, 2003, p. 1.789.
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examinadas. O próprio juízo está há mais de 15 dias seguidos redigindo a presente


sentença, sem falar no tempo dispendido na leitura e releitura de cada peça processual
dos 9 volumes que compõe os presentes autos e dos 26 do CD-ROM juntados aos autos
às fls. 1.517.
Nesse contexto, não há propriamente uma inércia na condução do processo que
revelasse o desinteresse da reclamada na punição do reclamante e/ou o perdão tácito. Ao
contrário, o processo seguiu seu curso com o tempo necessário para análise, inclusive da
farta documentação e dados acostados.
AFASTO a alegação de perdão tácito pela paralisação do feito por mais de 30
dias.
E.3. Demora na aplicação da pena após a conclusão do processo
O processo disciplinar que ensejou a aplicação da justa causa ao reclamante foi
julgado em 6/11/2014. Segundo o volume 13 do Processo Disciplinar juntado em meio
eletrônico (CD-ROM de fls. 1.517), em 11/11/2014, foi encaminhado ao Departamento
Jurídico da reclamada. No dia 10/12, referido órgão devolveu o processo à Comissão
Disciplinar em face de falhas que apontou. Em 7/1/2015, em novo julgamento, a Codis,
complementou a decisão anterior, e, na mesma data devolveu o feito à área jurídica, que
apresentou seu entendimento em 20/2/2015 (volume 14). A partir de então, foram
expedidas as notificações da decisão aos interessados, entre as quais, no dia 26/2/2015,
a rescisão por justa causa.
Da mesma forma, encerrada a instrução, o tempo gasto na análise do
departamento jurídico da reclamada, com o enquadramento das condutas atribuídas ao
reclamante no art. 482 da CLT não constituiu, no caso perdão tácito, mas sim o tempo
necessário para conhecimento, análise e complementação da decisão. Nesse contexto,
tenho como justificado o interstício entre o início do julgamento pela Codis e a
comunicação da dispensa por justa causa, não se aplicando, por isso, o prazo de 30 dias
a que alude a Lei 9.784/1999 para conclusão/decisão do processo.
AFASTO o perdão tácito pela demora na aplicação da pena de justa causa após a
conclusão do processo administrativo.
E.4. Postura contraditória da reclamada
O reclamante não demonstrou em juízo a alegada postura contraditória da
reclamada, ônus que lhe competia por se tratar de fato modificativo do direito de rescisão
de justa causa, a teor dos art. 818 da CLT, 333 do CPC/1973 e 373 do NCPC. Saliente-se
que a tese contrária, de que o encargo é da reclamada, conduz à conclusão de
comprovação de fato negativo, o que, salvo raríssimas exceções, são impossíveis ou
quase impossíveis de serem demonstrados, conforme assinala a uníssona doutrina de
direito processual brasileiro, no particular.
Além disso, o fato alegado na petição inicial apenas revela que a reclamada,
mesmo apurando as condutas imputadas a ele, não o teria excluído do trabalho ou de
decisões que lhe seriam afetas. Isso, caso ocorresse, já configuraria uma punição e, se
prolongada no tempo, poderia, até mesmo, ensejar assédio moral. A reclamada, mesmo
apurando os fatos, deu, pela narrativa do reclamante, efetividade ao princípio
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constitucional da presunção de inocência e isso não constitui, data vênia, em perdão


tácito.
AFASTO a alegação de perdão tácito em face da alegação de postura
contraditória da reclamada.
E.5. Prolongamento da apuração por um período interminável
Com razão o reclamante em relação ao prolongamento da apuração por um
período demasiadamente longo.
O item 6.14 do Mancod de 2012 estabelece prazo prescricional, a contar da
ciência do fato pela autoridade responsável por sua apuração (item 6.15), de 5 anos para
infrações puníveis com dispensa por justa causa, 2 anos para as puníveis com suspensão
e 180 dias para as que ensejam advertência (fls. 1.532).
Data máxima vênia, não há como considerar como razoável o prazo de 5 anos
para apuração de falta grave ensejadora da rescisão por justa causa.
Os arts. 7º, XXIX, da Constituição e 11 da CLT estabelecem um prazo máximo de
2 anos para, após o encerramento do vínculo de emprego, a parte interessada ajuizar a
presente Ação Trabalhista. Ou seja, se o ato rescisório é o marco da prescrição bienal,
parece-me evidente que a prescrição também incide em favor dos empregados, sendo
vedado aos empregadores aplicar a pena de justa causa, ainda que pendente de regular
apuração por processo administrativo, por período superior a 2 anos da ciência do fato,
salvo se a demora na apuração for ocasionada pelo próprio trabalhador.
No caso dos autos, o reclamante não atuou em procrastinar o feito administrativo.
Este, apesar da ciência dos fatos em 10/1/2011 pela Presidência da reclamada (e do dia
seguinte pela área responsável pelas apurações disciplinares) perdurou por longos e
duradouros 4 anos. Ou seja, a justa causa aplicada se refere a fatos, cuja ciência, a
reclamada teve 4 anos antes da aplicação da pena capital.
Não houve conduta reiterada ou continuada. A atuação do reclamante foi pontual
até junho de 2010 ou, quando muito, até a Rio Linhas Aéreas assumir a rota A12. Não há
espaço para aplicação da prescrição quinquenal, mas bienal porque a justa causa é fator
para rescisão contratual.
Na verdade esse juízo considera o prazo de 2 anos já bastante longo, uma vez
que a própria CLT prevê um período de prova de 1 ano, um prazo máximo de 90 para o
contrato de experiência e 30 dias para conclusão de inquérito para apuração de falta
grave de empregado estável e afastado de suas funções.
Todavia, o perdão tácito também se consolida com o transcurso da prescrição.
Assim, tendo a reclamada ciência do fato em 10 ou 11/1/2011 tem, pelo princípio da actio
nata e da incidência dos arts. 7º, XXIX, da Constituição e 11 da CLT estabelecem um
prazo máximo de 2 anos para a conclusão dos procedimentos apuratórios (sindicância
e/ou processo administrativo), sob pena de perdão tácito pelo transcurso da prescrição
bienal.
Constitui direito subjetivo de todo cidadão a razoável duração do processo
administrativo. Nesse sentido, a propósito dispõe o art. 5º, LXXVIII, da Constituição, já
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vigente à época do início das apurações disciplinares e que conforme exposto


anteriormente (item C.2), aplica-se a relação de emprego em face da eficácia horizontal
dos direitos fundamentais:
"Art. 5º
... omissis ...
LXXVIII – a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável
duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação".
Com base na Lei 8.112/1990, aplicável aos servidores públicos federais regidos
pelo RJU, o STJ e o STF possuem precedentes que confirmam em relação a eles o prazo
de 140 dias para o início e conclusão do processo administrativo disciplinar. Até mesmo
em processo administrativo tributário, há o reconhecimento do princípio da razoável
duração de 360 dias (em tempo menor do que os 2 anos da prescrição), conforme
decisão do STJ em recurso repetitivo:
"TRIBUTÁRIO. CONSTITUCIONAL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE
CONTROVÉRSIA. ART. 543-C, DO CPC. DURAÇÃO RAZOÁVEL DO PROCESSO.
PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL FEDERAL. PEDIDO ADMINISTRATIVO
DE RESTITUIÇÃO. PRAZO PARA DECISÃO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA.
APLICAÇÃO DA LEI 9.784/99. IMPOSSIBILIDADE. NORMA GERAL. LEI DO
PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL. DECRETO 70.235/72. ART. 24 DA LEI
11.457/07. NORMA DE NATUREZA PROCESSUAL. APLICAÇÃO IMEDIATA.
VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC NÃO CONFIGURADA.
1. A duração razoável dos processos foi erigida como cláusula pétrea e direito fundamental
pela Emenda Constitucional 45, de 2004, que acresceu ao art. 5º, o inciso LXXVIII, in
verbis: "a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração
do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação."
2. A conclusão de processo administrativo em prazo razoável é corolário dos princípios da
eficiência, da moralidade e da razoabilidade. (Precedentes: MS 13.584/DF, Rel. Ministro
JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 13/05/2009, DJe 26/06/2009; REsp
1091042/SC, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em
06/08/2009, DJe 21/08/2009; MS 13.545/DF, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE
ASSIS MOURA, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 29/10/2008, DJe 07/11/2008; REsp
690.819/RS, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, PRIMEIRA TURMA, julgado em
22/02/2005, DJ 19/12/2005)
... omissis ...
5. A Lei n.° 11.457/07, com o escopo de suprir a lacuna legislativa existente, em seu art.
24, preceituou a obrigatoriedade de ser proferida decisão administrativa no prazo máximo
de 360 (trezentos e sessenta) dias a contar do protocolo dos pedidos, litteris: "Art. 24. É
obrigatório que seja proferida decisão administrativa no prazo máximo de 360 (trezentos e
sessenta) dias a contar do protocolo de petições, defesas ou recursos administrativos do
contribuinte."
6. Deveras, ostentando o referido dispositivo legal natureza processual fiscal, há de ser
aplicado imediatamente aos pedidos, defesas ou recursos administrativos pendentes.
7. Destarte, tanto para os requerimentos efetuados anteriormente à vigência da Lei
11.457/07, quanto aos pedidos protocolados após o advento do referido diploma
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legislativo, o prazo aplicável é de 360 dias a partir do protocolo dos pedidos (art. 24 da Lei
11.457/07).
... omissis ...
9. Recurso especial parcialmente provido, para determinar a obediência ao prazo de 360
dias para conclusão do procedimento sub judice. Acórdão submetido ao regime do art.
543-C do CPC e da Resolução STJ 08/2008".
(STJ, REsp 1138206/RS, 1ª Seção, Rel. Ministro Luiz Fux, DJe 01/09/2010).
Nesse contexto, não faz o menor sentido que empregado público, de empresa
que, quando lhe convém requer em juízo os benefícios da Administração Pública Direta e
autárquica que o prazo para a conclusão do processo/sindicância disciplinar seja de 5
anos.
Não é possível que alguém possa ficar por 5 anos com a espada no pescoço sem
saber se vai ser demitido ou não, se vão lhe imputar uma falta grave ou vai ser inocentado
após um longo processo disciplinar, ainda que subdividido em duas fases.
Logo, ante a eficácia horizontal dos direitos fundamentais nas relações privadas,
conforme fundamento exposto no item C.2. desta sentença e o disposto nos arts. 5º,
LXXVIII, e 7º, XXIX, da Constituição Federal e 11 da CLT, ACOLHO os argumentos do
reclamante e RECONHEÇO o perdão tácito em face da demora da apuração da falta
grave que lhe foi imposta.
Apesar desse fundamento ser suficiente para dirimir a controvérsia, prossigo no
julgamento, por constatar que, também no mérito da falta aplicada, o reclamante tem
razão.
F. A dinâmica dos fatos
Para compreender os acontecimentos dos fatos, é importante saber como eles
aconteceram na linha do tempo. A partir de uma análise dinâmica dos acontecimentos e
das intervenções feitas pelo reclamante no transporte de cargas postais para Manaus
ficará mais evidente se ele agiu em prol da reclamada ou da empresa MTA. Seguem
então, uma linha do tempo com os principais fatos acontecidos entre outubro de 2009 e
agosto de 2010, elaborada a partir das provas colhidas nos autos, conforme destacado ao
longo desta sentença:

Diagrama 1: linha do Tempo dos principais acontecimentos e condutas do reclamante

out/2009 mar/2010 abr/2010 maio/2010 jun/2010 ago/2010

normalidade
51% da RPN centralização centralização
paralisada carga ñ urgente carga ñ urgente
Início da licitação do p/MAO em GRU p/MAO em BSB
crise Contrato 51 frustração execução do execução do
de contrato: Contrato 51 Contrato 105 e Fim pregão
linha A12 suspensão do 51 Contrato 189
centralização
carga ñ urgente dispensa da saturação do fim da
p/MAO em GRU licitação do
TECA GRU 31 crise
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Contrato 189
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F.1. Contratos celebrados e tentados


Não foram trazidos aos autos em meio físico, a íntegra dos Contratos 51 e
105/2010, tampouco os termos do processo de contratação e as propostas ofertadas, mas
somente em meio eletrônico (CD-ROM, fls. 1.517). O Relatório de Demandas Especiais
da CGU, que precedeu a abertura do processo administrativo disciplinar, traz alguns
elementos relevantes para o exame desse feito.
Segundo referido relatório (00190.026802/2010-30), ponto de partida da apuração
disciplinar, juntado pelo reclamante às fls. 355ss, elaborado em face de denúncias da
revista Veja de 15/9/2010, a Rede Postal Aérea Noturna (RPN), a partir de setembro de
2009, sofreu diversas alterações na malha aérea em razão da falta de pilotos da empresa
BETA em face de demissões, ter sido essa empresa considerado inidônea, retomada das
atividades da linha A3 [rota Manaus (MAO) − Brasília (BSB) − Salvador (SSA) − São
Paulo (GRU) − Brasília − Manaus] com a empresa TAF (Contrato 305/2009), acidentes
de aeronaves da TAF, inclusive da linha A3, com a rescisão unilateral do contrato pela
reclamada (fls. 357/358).
Nas informações complementares da CGU (fls. 307) é relatado que em janeiro de
2010 houve paralisação de 3 linhas operadas pela TAF e 2 pela Total.
Diante disso, a reclamada procurou estabelecer novos contratos administrativos,
entre os quais o Contrato 51/2010, fruto do Pregão Eletrônico 239/2009 no qual a Master
Top Linhas Aéreas Ltda. (MTA) sagrou-se como vencedora, com vigência de 25/3/2010
até 25/3/2011, no valor de R$ 3.429.888,00; e o Contrato 105/2010, oriundo da Dispensa
de Licitação 205/2010, com a mesma empresa aérea, e vigência de 1/5 até 6/11/2010, no
valor de R$ 19.620.140,76 (cf. fls. 358).
F.1.1. Contrato 51/2010
O Pregão Eletrônico 237/2009, que resultou no Contrato 51/2010 firmado com a
MTA, tinha como objeto o transporte de carga postal não urgente para Manaus, via São
Paulo e como fundamento o fato dessa cidade concentrar 2/3 de toda a demanda
nacional de tais cargas e das linhas da RPN de São Paulo para Brasília estarem
saturadas (fls. 360).
O demonstrativo de peso transportado, de acordo com o Sistema de Transporte
Aéreo Nacional da reclamada (STAN), revelou de agosto de 2008 até abril de 2009 foram
transportados no trecho Guarulhos − Manaus 28.804 Kg/dia de carga postal, sendo 5.804
Kg/dia de encomendas não urgentes ("DECOD-0012-2011_Anexo-01_Vol-01_fls-0001-
0369.pdf", p. 60 do PDF, cf. CD-ROM de fls. 1517). Como a linha A3 estava sendo
remodelada para transportar 23.000 Kg/dia, não haveria espaço disponível para o
excedente de 5.804 Kg (ID., pp. 67-68), seria necessária a contratação proposta.
Consigna o relatório (fls. 362 e 365) que o Contrato 51/2010, assinado em
25/3/2010, compreendia o seguinte trecho, frequência mensal, valores (estimados e
contratados) e cargas:
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Tabela 4: Estimativa e objeto do Contrato 51/2010, com preços e cargas


Freq. Estimativa Preço estimado Valor Contratado Variação entre
Lote PercursoMês diária de carga diário anual diário anual valor estimado e
(Kg) (por Kg) (R$) (por Kg) (R$) contratado (%)
1 GRU-MAO 22 5.800 3,145 4.815.624,00 2,24 3.429.888,00 -28,78

Ofertaram lances diversas seguintes empresas, porém, com exceção da MTA, as


demais classificadas não são empresas aéreas (fls. 363):

Tabela 4.A: participantes e lances do Pregão Eletrônico


Variação sobre o
Participante Situação Lance
valor contratado
Master Top Linhas Aéreas Arrematante 3.659.568,00 +6,70%
CargoPress Transp. e Logística Classificado 3.674.001,00 +7,12%
RV Consult Transporte Classificado 3.699.999,00 +7,88%
Transglobal Classificado 4.200.000,00 +22,45%
Bruno Chichon Classificado 4.792.659,99 +39,73%
Cargas Pontual Classificado 20.410.896,00 +495,09%

Percebe-se da documentação acostada nos arquivos "DECOD-0012-


2011_Anexo-01_Vol-01_fls-0001-0369.pdf" e "DECOD-0012-2011_Anexo-01_Vol-02_fls-
0370-0670.pdf" (CD-ROM de fls. 1517, p. ex., pp. 249) que a contratação foi sob a
modalidade VAC (Viação Aérea Comercial) (cf. item 10.1 do Contrato, p. 266, "DECOD-
0012-2011_Anexo-01_Vol-02_fls-0370-0670.pdf"), tida pelo TCU, conforme já
asseverado, como de utilização residual, subsidiária (fls. 537).
O Contrato 51/2010 firmado ("DECOD-0012-2011_Anexo-01_Vol-02_fls-0370-
0670.pdf" (CD-ROM de fls. 1517, pp. 254/266), contém as seguintes cláusulas que
revelam a possibilidade da reclamada não embarcar a carga postal ou despachar outro
quantitativo diverso do constante no objeto do contrato:
"2.13. Aceitar os cancelamentos de despacho propostos pela CONTRATANTE [a
reclamada], não cabendo qualquer pagamento das operações não realizadas" (p. 256 do
PDF).
"4.1.1. O valor global estimado não gera, para a CONTRATANTE [reclamada], a
obrigação de sua execução na totalidade, pois se trata de uma expectativa de carga" (p.
258).
"5.1.1.1.1. A ECT somente efetuará o pagamento do peso por Kg da carga que for
efetivamente transportada" (p. 259, grifos do original).
O relatório assevera que o Contrato 51/2010 foi executado entre 6/4/2010 e
22/5/2010, quando a reclamada tornou-o inoperante, em face da assinatura, pela própria
MTA, do Contrato 105/2010, uma vez que a carga não urgente poderia ser transportada a
custo bem menor de R$ 1,99/Kg ao invés dos R$ 2,24/Kg ora contratados.

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Foram transportados os seguintes valores pelo Contrato 51/2010 ("DECOD-0012-


2011_Anexo-01_Vol-02_fls-0370-0670.pdf", pp. 308/311):

Tabela 5: participantes e lances do Pregão Eletrônico


Carga Valor
Época transportada Pago
(Kg) (R$)
Abril-Maio/2010 125.844 281.890,56

F.1.2. Tentativa frustrada de contratação da Linha A12


O relatório referido assinala que houve uma tentativa frustrada de contratação da
Linha A12 (rota MAO − BSB − GRU − BSB − MAO) por dispensa de licitação em
31/3/2010.
A justificativa apresentada pelo Denaf para a criação da linha 12, e da
reformulação da malha aérea, foi a falta de disponibilidade de 9 aeronaves cargueiras
com capacidade de carga de 23 ton, isto é, Boeing 727-200 ou similares. Acrescentou
que, em face da capacidade mínima requerida, apenas as empresas MTA e ABSA
possuíam aeronaves no mercado brasileiro com capacidade de 30 ton e poderiam
participar da dispensa da licitação (fls. 367).
A proposta era efetuar as seguintes quantidades de cargas por trecho da linha A
12 (cf. fls. 368):

Tabela 6: cargas a serem transportadas pela nova linha A12


Peso Estimado
Trecho
Diário de carga (Kg)
GRU-BSB 30.509
BSB-MAO 14.505
MAO-BSB 7.035
BSB-GRU 27.814

Todavia, o negócio não foi efetivado porque a única empresa que apresentou a
proposta (a MTA) ofertou um preço 62% superior ao valor estimado (fls. 367).
F.1.3. Contrato 105/2010
Com o objetivo de suprir o transporte de cargas urgentes na nova linha A12, até
que fosse implementada definitivamente a nova configuração da RPN (em face da
reformulação das linhas) até maio/2011, foi aberta a Dispensa de Licitação 205/2010, que
resultou no Contrato 105/2010 (fls. 366).
Segundo o relatório (fls. 367), 21 empresas foram inicialmente consultadas e
apenas a MTA apresentou proposta no valor de 70,79% do estimado. Depois, a MTA
propôs a redução de 5% do valor cotado.

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Feita a cotação por estimativas de preços a 16 empresas (Gol, VarigLog,


Komodoro Airlines, MT Airlines, Total Linhas Aéreas, Voeair Brasil, Trip, TAF, Azul Cargo,
NHR Táxi Aéreo, TAM, ABSA Cargo, Oceanair, Azul, Gobex Cargo e VoeRico),
apresentaram propostas a Rio Linhas Aéreas, a Total, MTA e a ABSA (apenas no trecho
GRU-MAO) (fls. 368).
Posteriormente, o relatório assinala que 14 empresas foram convidadas a
apresentarem propostas, destacando que a MTA, na Dispensa de Licitação 205,
apresentou a proposta mais vantajosa, 14% acima do valor estimado. Acrescenta que
apenas a MTA e a ABSA apresentaram propostas, sendo que essa última, apenas para o
lote GRU-MAO e em valores superiores ao da MTA, de R$ 3,50/Kg e anual de R$
8.428.728,00 (fls. 369).
A tabela, a seguir, indica os lotes, valores, carga e variação entre o valor estimado
e o valor contratado referente à Dispensa de Licitação 205, que ensejou a celebração do
Contrato 105/2015, em 11/5/2010.

Tabela 7: cargas, frequências, percursos e valores estimados e contratados (Contrato 105/2010)


Freq Peso Médio Preço estimado Valor Contratado Variação entre
Lote Percurso Mês Diário de carga diário semestral diário diário valor estimado e
(Kg) (p/ Kg) (R$) (p/ Kg) (R$) contratado (em %)
1 GRU-BSB 22 21.387 1,728 4.878.159,50 2,00 5.646.168,00 +15,74
2 GRU-MAO 22 9.122 1,985 2.390.146,44 1,99 2.396.166,96 +0,25
3 BSB-MAO 22 5.383 2,60 1.847.445,80 3,70 2.629.057,20 +42,31
4 MAO-BSB 22 4.412 3,80 2.213.059,20 4,50 2.620.728,00 +18,42
5 MAO-GRU 22 2.632 1,694 588.601,70 1,95 677.476,20 +15,10
6 BSB-GRU 22 25.191 1,578 5.246.668.65 1,70 5.652.860,40 +7,74
TOTAIS 17.164.145,64 (*) 19.622.456,76 +14,32
Fonte: CGU. Relatório de demandas especiais, 2011, fls. 451
(*) Há divergência entre o valor apurado pelo juízo e o constante do relatório

F.1.4. Contrato 189/2010


O Contrato 189/2010 não é objeto da presente demanda. Todavia, é importante
traçar algumas considerações sobre ele, uma vez que a empresa Rio, declarada
vencedora após a denegação do Mandado de Segurança interposto pela MTA contra a
decisão que a desclassificara do processo licitatório, acabou por sucedê-la na linha A12
(GRU−BSB−MAO).
A proposta consistia na observância dos seguintes horários e cargas postais
transportadas:

Tabela 8: percursos, horários, distâncias e cargas do Contrato 189/2010


Horários(*) Tempo Peso diário de Distância
Percurso
Chegada Partida voo solo carga (Kg) (+) (Km)
Manaus (MAO) - 19:00 2h50 - 7.035 1.924
Brasília (BSB) 21:50 23:30 1h30 1h40 27.814 832
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Guarulhos (GRU) 1:00 4:00 1h30 3h00 30.509 832
Brasília (BSB) 5:30 7:00 2h50 1h30 14.505 1.924
Manaus (MAO) 9:50 - - - - -
(*) Horários de Brasília
(+) Mesmos pesos constantes da anterior e frustrada tentativa de contratação da linha A12

Lançado o edital de licitação em junho de 2010, mediante o Pregão Eletrônico


106/2010, segundo o TCU (fls. 539/540), a MTA apresentou o menor preço (R$
44.900.000,00), mas não apresentou, tempestivamente, os documentos exigidos e foi
inabilitada. A segunda colocada, Rio Linhas Aéreas Ltda. que tinha ofertado o valor de R$
45.000.634,14, foi declarada vencedora em 14/7/2010, após a disputa no pregão
realizado em 8/7(arquivo "DECOD-0012-2011_Anexo-05_Vol-02_fls-0403-0791.pdf", pp.
12ss, do CD-ROM de fls. 1517), aceitou realizar o serviço por R$ 44.894.997,30 e o
Contrato 189/2010 foi assinado em 17/8/2010.
A MTA, entretanto, impetrou O Mandado de Segurança 37640-08.2010.4.01.3400
perante a 1ª Vara da Justiça Federal e, obtendo a liminar, continuou a operar a linha, até
que a segurança foi negada no julgamento de mérito em 30/9/2010.
Não foram acostados os valores pagos por trecho e por peso, mas o TCU
assevera que a aeronave utilizada pela Rio nesse contrato é um Boeing 727-200F.
F.2. Valores transportados pelo Contrato 105/2010
O relatório da CGU (p. 96) destaca os dados colhidos revelaram que a carga
diária transportada para Manaus entre dezembro de 2008 e fevereiro de 2010 variava
entre 23 e 30 ton, com média mensal de 24.659 Kg. A carga efetivamente transportada
pela MTA de maio a setembro de 2010 para esse destino variou de 25 a 35 ton, sendo a
média mensal de 26.930 Kg (9.133 Kg oriundos de Guarulhos e 17.797 a partir de
Brasília).
Segundo o relatório da CGU (fls. 370), no período de 18/5 a 16/9/2010 foram
apuradas diferenças entre as cargas previstas e as efetivamente transportadas, nos
seguintes valores:

Tabela 9: diferenças de cargas contratadas e transportadas pelo Contrato 105/2010 entre (mai-set/2010)
Contrato 105/2010 Média de carga Custo Variação
Lote Percurso Carga diária contratada Diária transportada diário
(Kg) (Kg) (/Kg)
1 GRU-BSB 21.387 19.584 2,00 -8,43%
2 GRU-MAO 9.122 9.133 1,99 +0,12%
3 BSB-MAO 5.383 17.797 3,70 +230,61%
4 MAO-BSB 4.412 7.739 4,50 +75,41%
5 MAO-GRU 2.632 5.460 1,95 +107,45%
6 BSB-GRU 25.191 6.423 1,70 -74,50%

Todavia, o TCU (fls. 540) destaca que:

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"Na execução do Contrato nº 105/2010, confere-se a deficiência na qualidade dos serviços


prestados pela MTA, em virtude das multas emitidas pela estatal, cujos valores perfazem o
total de R$ 694.028,97. Inclusive, relata-se que a MTA, por falta de recursos, deixava de
voar, por não conseguir pagar combustível, obrigando a ECT a contratar outras aeronaves,
como as operadas pela VAC".
Para o TCU, é obrigação da MTA a manutenção de índice de eficiência maior ou
igual a 95%, porém este é o índice de eficiência da MTA no Contrato 105/2010 (fls. 540):

Tabela 10: índice de eficiência da MTA no Contrato 105/2010


Ano de 2010
Percurso
Mai Jun Jul Ago Set
GRU-BSB 40,00 33,33 31,58 33,33 26,67
BSB-MAO 33,33 39,68 31,67 33,33 33,33
MAO-BSB 93,94 61,90 84,21 87,88 88,10
BSB-GRU 40,74 33,33 37,04 33,33 26,19
GRU-MAO 33,33 39,68 31,67 33,33 26,67
MAO-GRU 39,39 33,33 31,58 33,33 26,19

O TCU ainda registra os seguintes quantitativos de cancelamentos e atrasos da


MTA no período de maio a junho de 2010 (fls. 540):

Tabela 11: quantidade de cancelamentos e atrasos nos contratos da MTA (maio e junho/2010)
Cancelamentos Atrasos Faturamento (R$)
Contrato Trecho
nº % nº % R$ %
105/2010 GRU-BSB-MAO 18 85,7 364 98,7 14.416.253,23 74,1
156/2010 GRU-SSA 3 14,3 2 0,5 2.884.946,94 14,9
174/2010 GRU-REC 0 0,0 3 0,8 1.863.004,20 9,6
51/2010 GRU-MAO 0 0,0 0 0,0 281.890,56 1,4
TOTAL 21 100,0 369 100,0 19.446.094,93 100,0

O TCU (fls. 541) ainda consigna os seguintes números:

Tabela 12: ocorrências outras e valores relativos a contratos com a MTA


Épocas Ocorrências Valores (R$)
Set/09-Ago/10 Gasto da reclamada em VAC pela incapacidade da MTA 17.675.030,86
Mai/10-Ago/10 Multas aplicadas à MTA 1.146.615,69 (*)
-- Multas rescisórias de contratos da MTA 7.366.230,24 (+)
(*) R$ 694.028,97 apenas no Contrato 105/2010
(+) Não foi aplicada multa para o Contrato 105/2010

F.3. Saturação do TECA Guarulhos


A CGU (fls. 384) consigna que com a entrada em operação das novas linhas para
Fortaleza (A13) e Manaus (pelo Contrato 51), que juntas somavam 50 ton por operação:
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"ainda se tentou permanecer com a centralização das cargas não urgentes para Manaus e
Boa Vista no TECA Guarulhos, mas os novos desafios enfrentados por aquele terminar
para viabilizar a entrega de grandes quantidade de cargas às Companhias Aéreas para
embarque nas novas linhas contratadas comprometiam esta situação"
O relatório do CGU transcreve trechos de e-mails e, examinando as mensagens,
conclui:
"[...] julgou-se indispensável a retirada da centralização da carga não urgente para Manaus
do TECA Guarulhos para o TECA Brasília a partir de junho de 2010.
Considerando que a Companhia Aérea oferecia disponível no trecho Brasília-Manaus e que
estava em andamento estrutura de transporte em aeronave dedicada às operações da ECT,
entendeu-se esta coma a única medida operacional que recuperaria a efetividade no
encaminhamento para Manaus, além de proporcionar melhor qualidade no processo
produtivo dos dois principais Terminais de Cargas da ECT - Guarulhos e Rodoanel.
A adoção dessas medidas eliminou em poucos dias o represamento da carga não urgente de
São Paulo para Manaus, podendo-se assim, voltar a praticar prazos de qualidade e evitar
despesas com indenizações em atraso" (fls. 386, grifou-se).
Os boletins operacionais do TECA Guarulhos de 17 e 18 de maio de 2010
("DECOD-0012-2011_Anexo-06_Vol-01_fls-0001-0600.pdf", p. 88ss. do PDF, cf. CD-ROM
de fls. 1517) revelam que diversas cargas deixaram de ser embargadas, inclusive em
voos da MTA, por "excesso de carga". Os resumos desses boletins (ID., pp. 24ss)
consignam resíduos de carga no período de 17 a 28/5/2010 para diversas localidades,
sem esclarecer a razão, e para ambas as espécies de mala postal (urgentes e não
urgentes). Com relação às cargas com destino a Manaus a partir do TECA Guarulhos,
são os seguintes quantitativos de cargas não embarcadas:

Tabela 13: resíduos de cargas não embarcadas no TECA Guarulhos com destino à Manaus
Cargas não embargadas (Kg)
Dia
Urgente Não urgente TOTAL
17/05/2010 2.190 10.000 12.190
18/05/2010 400 10.000 10.400
19/05/2010 0 2.200 2.200
20/05/2010 0 9.400 9.400
21/05/2010 0 10.400 10.400
24/05/2010 0 0 0
25/05/2010 4.400 0 4.400
26/05/2010 0 19.796 19.796
27/05/2010 0 0 0
28/05/2010 0 13.084 13.084
Média diária 699 7.488 8.187

O gráfico, a seguir, extraído do relatório da CGU revela que houve a redução da


carga transportada com destino a Manaus por meio de Guarulhos e um aumento da carga
com origem em Brasília a partir da semana seguinte (3/6/2010):

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Gráfico 1: quantidade de cargas despachada para Manaus segundo a origem (Guarulhos ou Brasília)

Fonte: CGU, 2011, fls. 452.


As testemunhas ouvidas pelo juízo confirmaram que o TECA de Guarulhos estava
com sobrecarga de serviço.
G. As melhores escolhas à luz da Teoria dos Jogos
A grande parte dos julgamentos realizados sobre as ações de cada indivíduo
incorre na tentação da simplificação do resultado, segundo a lógica de um sistema binário
(ou, quando muito, trinário), no qual se diz que o proceder desse indivíduo foi correto ou
incorreto, certo ou errado, resultou em prejuízo (perdas) ou em lucro (ganhos). Tal
raciocínio peca por uma lógica de resultados, onde o consequente é o senhor absoluto da
razoabilidade de uma decisão, e examina a conduta da pessoa de forma isolada, isto é,
sem levar em conta as diversas opções possíveis e, o pior, despreza a intervenção de
outrem no processo decisório.
Todavia, essa forma simples de análise de condutas humanas, que pode ser até
útil em algumas situações, esta há superada pelo desenvolvimento da Teoria dos Jogos,
que rendeu o prêmio Nobel a diversos estudiosos, e que tem a capacidade, pela análise
das estratégias, das ações e das opções que permeiam a conduta humana, prever o
resultado de tais ações e o comportamento das partes, de forma lógica e objetiva.
Amplamente utilizada por nações, corporações militares e civis e por grandes bancos e
empresas, a teoria dos jogos ainda é pouco conhecida por operadores do direito.
G.1. Teoria econômica dos contratos e teoria dos jogos
Dentre as diversas teorias acerca do contrato, a Análise Econômica do Direito35
desenvolveu a teoria econômica dos contratos, que se fundamenta na ideia de que "a

35
A Análise Econômica do Direito é uma corrente de pensamento que procura trazer os ditames da
Economia ao Direito na busca, segundo seus defensores, de dar cientificidade e rigor técnico ao Direito.
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eficiência econômica exige que se faça cumprir uma promessa"36, que se concretiza no contrato.
Para incentivar o cumprimento dessa promessa, o acordo de vontades possui uma série
de estímulos e desestímulos que tornam o cumprimento da pactuação a melhor opção
entre os promitentes, que diante disso, sentem-se seguros, celebram o contrato, gerando
eficiência econômica.
Segundo Ronald Coase37, prêmio Nobel de Economia, nos negócios jurídicos há
uma avaliação do “custo de transação” que norteia a escolha de cada indivíduo, de
acordo com o resultado que lhe é mais favorável, do risco do negócio e da sua validação
a posteriori (inclusive pelos tribunais). Tal custo social pesa sobre o bem comum e
compromete a eficiência do contrato. Quando o custo da transação, para manter o
pactuado, torna-se mais elevado do que o seu descumprimento, há o incentivo para que o
contrato não seja mais observado, gerando um custo social que afeta o bem comum.
Como instrumento para análise dos custos de transação e das estruturas de
incentivo e desestímulos e das escolhas e das ações de cada indivíduo, desenvolveu-se,
no século XX, a Teoria dos Jogos38, que, essencialmente, é uma teoria matemática para
situações de conflito. Por essa teoria, segundo o pioneiro E.S. Véntsel39, são descritas as
opções razoáveis de ação de cada contendor (chamado de jogador) no curso de cada
cenário de conflito (ou de cooperação). Esse modelo matemático simplificado e
formalizado da situação de conflito (ou de interação de condutas de diversos atores) é
denominado de jogo40.
No "jogo", as opções razoáveis de ação de cada jogador são analisadas a partir
de um comportamento estratégico. Segundo, Douglas G. Baird, Robert H. Gertner e
Rendal C. Picker41, "strategic behavior arises when two or more individuals interact and each
individual's decision turns on what that individual expects the others to do"42. O resultado
esperado por cada jogador é denominado de payoff, isto é, aquilo que ele vai ganhar ou
perder com as suas ações e dos demais jogadores.

Esse juízo tem profunda restrição acadêmica a essa corrente de pensamento, que ignora, entre outros,
aspectos fundamentais da Sociologia e da Antropologia e subjulga o Direito à Economia (Cf. DWORKIN,
Ronald. Uma questão de princípio. São Paulo: Martins Fontes, 2001, pp. 351-434. Em sentido contrário:
GALDINO, Flávio. Introdução à teoria dos custos dos direitos: direitos não nascem em árvores. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2005, pp. 239-254). Todavia, por honestidade intelectual, não pode deixar de registrar
que os fatos descritos neste processo podem ser melhor compreendidos segundo a lógica matemática e
econômica da Análise Econômica do Direito e da Teoria dos Jogos, pois é sobre esse viés
preponderantemente econômico que decisões empresariais são tomadas.
36
COOTER, Robert; ULEN, Thomas. Direito & Economia. Porto Alegre: Bookman, 2008, p. 208.
37
COASE, Ronald H. The problem of social cost. Journal of Law and Economics. University of Chicago
Press, oct./1960, v. 3, pp. 1-44.
38
Na chamada “Teoria dos Jogos”, os “jogadores” procuram minimizar os custos de transação e maximizar
seus ganhos em relação ao seu oponente.
39
VÉNTSEL, E. S., Elementos de la Teoria de los Juegos. Moscou: Editorial MIR, 1977, p. 7.
40
VÉNTSEL, ibid..
41
BAIRD, Douglas G.; GERTNER, Robert H.; PICKER, Rendal C. Game Theory and Law. 5ª Ed.
Cambridge: Harvard Press University, 2002, p. 1;
42
Tradução livre: comportamento estratégico surge quando dois ou mais indivíduos interagem e a decisão
de cada um deles se baseia sobre o que ele espera que os outros façam.
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Por muitos anos, os modelos matemáticos da Teoria dos Jogos não conseguiam
solucionar todos os jogos não cooperativos, até que John F. Nash Jr43 propôs um modelo
matemático44 que, na prática, colocou em xeque os ensinamentos de Adam Smith45 ao
revelar que há situações em que a lei da oferta e da procura é insuficiente para explicar
certos fenômenos econômicos. Os indivíduos tendem a agir racionalmente segundo
estratégias que lhe permitam potencializar seus ganhos e reduzir suas perdas. A solução
matemática das diversas condutas dos litigantes, isto é, o resultado matemático do jogo, é
conhecido, em sua homenagem, como “Equilíbrio de Nash”46.
A Teoria dos Jogos é bastante útil no presente caso para analisar se, matemática
e logicamente falando, o reclamante tomou a atitude estrategicamente mais correta para
fins de preservar o interesse da reclamada ou, se ao contrário, ele agiu de forma
inapropriada, beneficiando a MTA Linhas Aéreas e prejudicando a reclamada (ato de
improbidade). Mais ainda, por meio desse modelo matemático, é possível descrever as
ações e as opções que ele tinha no momento da tomada de sua decisão, o que pode ser
útil a compreender o processo de tomada de decisão que tinha sobre si.
Além disso, a Teoria dos Jogos serve para avaliar a conduta da MTA Linhas
Aéreas, suas estratégias e ações. Com isso, é possível aferir se o reclamante e a
reclamada foram vítimas de um conjunto de ações que os subjulgavam e/ou
condicionavam suas condutas em relação aos Contratos 51 e 105/2010 ou se agiram em
favor da MTA.
A fim de poupar as partes e os operadores dos direitos dos cálculos matemáticos
e da econometria, que é de difícil compreensão até mesmo para os bacharéis em
Economia47, este Juiz apresenta a tabela ou o diagrama de ações e dos resultados48 dos
diversos cenários possíveis envolvendo os Contratos 51 e 105/2010, o que facilita a
identificação do equilíbrio de Nash e quando ele se deslocou.
G.1.1. Jogo 1: maior rendimento em favor da reclamada
A primeira questão que se examina à luz da teoria dos jogos é identificar as
opções e a melhor escolha do reclamante para obter os maiores ganhos em favor da

43
John F. Nash Jr. é matemático e também ganhou o Prêmio Nobel de Economia pelo conjunto de 4 artigos
em que propõe soluções para resolver a Teoria dos Jogos. Sua saga foi retratada no filme “Mente
Brilhante”.
44
NASH JR, John F. The bargaining problem. Econometrica, v. 12, n. 2, abr./1950, pp. 155-162; NASH JR,
John T. Non-cooperatives games. The annals of Mathematics, Second Series. v. 54, n. 2, set./1950, pp.
286-295..
45
SMITH, Adam. A riqueza das nações: investigação sobre sua natureza e suas causas. São Paulo: Nova
Cultural, 2006, t. I e II.
46
O Equilíbrio de Nash é o resultado final das diversas ações concomitantes e/ou sucessivas dos
“jogadores” que procuraram tirar o maior proveito econômico de seus atos.
47
Os cálculos são baseados em leis de probabilidade, onde o resultado de cada opção de cada jogador é
maior ou igual a zero e menor ou igual a um (matematicamente: 0 x 1). Conjugadas as diversas opções
entre si, elas formam um problema com tantas expressões quanto forem as opções e com tantos
operadores quanto forem o número de jogadores.
48
Trata-se de uma das duas formas de representação simplificada das ações e dos resultados, ideal para
jogos com diversas jogadas, isto é, em que há várias ações dos jogadores. Cf. BAIRD; GERTNER; PICKER,
op. cit., pp. 7-52.
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reclamada em relação ao envio de cargas postais para Manaus ou, então, as piores
escolhas. Além disso, é possível identificar a eficácia econômica dos Contratos 51 e
105/2010 para a reclamada e se estrutura de incentivos/desestímulos favorece o
cumprimento do contrato, com a diminuição dos custos de transação e a barganha.
Mapeadas as opções, com seus payoffs (resultados), fica fácil avaliar, de maneira
objetiva, lógica e matemática, se o reclamante tomou a decisão certa ou se favoreceu à
MTA ou ainda se atuou de forma contrária aos interesses da reclamada.
Diante disso, passa-se ao "jogo".
a) dinâmica e estrutura do jogo
O jogo é sequencial, isto é, o reclamante tem uma escolha e depois a MTA. O
reclamante tem diversas opções com relação à carga postal com destino à Manaus: a)
não embarcá-la; b) utilizar espaços em aeronaves de companhias aéreas que não a MTA
(por meio de VAC); c) executar o Contrato 51; d) despachar a carga (não urgente e/ou
urgente) para Brasília e de lá invocar o Contrato 105; e) centralizar toda a carga (urgente
e/ou convencional) em São Paulo e daí utilizar o contrato 105/2010.
Dependendo da sua ação, o jogo acaba ou a MTA faz a sua jogada que,
basicamente, se restringe a duas opções: a) cumprir fielmente o Contrato (o 51 e/ou o
105), recolhendo, remetendo e entregando tempestivamente a carga contratada; b) não
recolher, remeter ou entregar-lhe ou fazer isso, mas com atraso.
Cada resultado da conjugação das ações das diversas partes é registrado entre
parentes, sendo o primeiro número o correspondente ao ganho/perda do jogador 1
(reclamante), ou melhor o custo/benefício que a reclamada terá com as decisões do
reclamante, e o segundo número é referente à MTA (jogador 2).
b) fixando os parâmetros dos payoffs
É importante estabelecer os parâmetros dos paysoffs, os resultados do
ganho/perda de cada jogador, para que, conhecendo-os, possa ser apresentado o "jogo".
Com relação aos ganhos da reclamada com a carga postal despachada, tem-se
que o preço hoje de um impresso normal (cód. 2001-0), não urgente, de 1 Kg, para
entrega nacional, segundo a tabela vigente49 desde 1/2/2016, é de R$ 9,25 e 500 g de um
impresso urgente (cód. 2021-4) é de R$ 7,25. A tarifa de uma encomenda não expressa
(PAC) de 5 Kg e dimensões de 10 ou 20x20x20cm do centro de São Paulo-SP para o
centro de Manaus-AM sai por R$ 51,90 (contra R$ 140,30 do Sedex simples) e do centro
de Brasília para a mesma localidade por R$ 44,00 (R$ 109,20 no Sedex)50, o que resulta
uma média de R$ 9,59 Kg {[(51,90+44)/2]/5}. Assim, o preço hoje do impresso normal de
R$ 9,25/Kg é um bom parâmetro para estimar um valor médio de faturamento por quilo da
carga postal na época dos fatos. Na Tabela Única para Atualização dos Débitos

49
CORREIOS. Disponível em: <https://www.correios.com.br/para-voce/consultas-e-solicitacoes/precos-e-
prazos/servicos-nacionais_pasta/impresso-normal>. Acesso na data de hoje.
50
CORREIO. Disponível em: <http://www2.correios.com.br/sistemas/precosPrazos/>. Acesso na data de
hoje. O preço por quilo aumenta para encomendas com menor peso e diminui para encomendas de maior
peso.
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Trabalhistas até 30/9/2016, disponibilizada pelo CSJT51, encontra-se o índice de


1,06639608146717 para o mês de abril de 2010. Fazendo a depreciação da moeda,
estima-se o preço de venda por Kg da encomenda/impresso nacional, não urgente, em
R$ 8,67 {9,25/1,06639608146717} em abril de 2010.
Constam do processo os payoffs por quilo transportado nos seguintes valores e
trechos: R$ 1,99 de Guarulhos para Manaus pelo Contrato 105, R$ 2,24 pelo Contrato 51
e R$ 3,145 pelo VAC na pesquisa de mercado feito para o Contrato 51; R$ 3,70 pelo
trajeto Brasília − Manaus no Contrato 105.
Os contratos preveem multa de 5% sobre o valor da carga ou fração despachada
por cada hora de atraso na sua entrega até o limite de 20%, em desfavor da MTA. O
Contrato 51 contempla multa progressiva pela não coleta tempestiva da carga até o limite
de 20% e o 105 de 10% pela não coleta da carga. Ambas as penalidades são
cumulativas. Portanto, as perdas da MTA por atraso/cancelamento variam de 5% até 40%
sobre o valor da carga transportada no Contrato 51 e de 5% e 30% no Contrato 105.
A reclamada deve usar tais penalidades para fins de reparação aos clientes
prejudicados pelo atraso nas entregas. Dentro de uma certa margem (denominada de
taxa ou índice de eficiência), como apontou o TCU, o valor de eventuais multas aplicadas
será suficiente para cobrir tais encargos.
Conforme destacado anteriormente, a perda da reclamada com o atraso na
entrega da carga postal ao cliente é a devolução do valor pago, segundo o TCU.
Cruzando os dados das tabelas 9 e 13, é possível perceber que da média diária
transportada para Manaus pelo Contrato 105 (por Brasília e por Guarulhos) de 26.930 Kg,
uma média de 8.187 Kg do período de 18 a 28/5/2010 deixaram de ser embargadas, o
que corresponde a 30,4% da média total. Como a relação da perda da reclamada com a
devolução pago é de 1 para 1 (cada 1 real de atraso corresponde, em tese, a 1 real de
devolução), então a manutenção das operações de carga no TECA Guarulhos com
destino a Manaus, em um ambiente de sobrecarga da capacidade do terminal gera uma
perda para a reclamada da ordem de 30,4% do valor por quilo das
postagens/encomendas. Referida perda não é, obviamente, atribuível à MTA e, por isso,
não é coberta pelas multas contratuais.
Com a paralisação de diversas empresas de carga aérea no início de 2010, o
mercado ficou mais concentrado, adstrito a poucas empresas. O Contrato 189/2010, cuja
autorização de lançamento foi em junho de 2010 e que envolve da mesma linha A12 (mas
por valor global e não por lotes divididos em trechos), foi, ao final, celebrado com a
empresa Rio Linhas Aéreas Ltda. ao custo anual de R$ 44.894.997,3052, contra os R$ !A
fórmula não se encontra na tabela do Contrato 105/2010, que era semestral. Assim,

51
CONSELHO SUPERIOR DA JUSTIÇA DO TRABALHO. Tabela Única para Atualização dos Débitos
Trabalhistas até 30 de setembro de 2016. Disponível em: <http://www.csjt.jus.br/atualizacao-monetaria>.
Acesso na data de hoje.
52
O lance inicial ofertado pela Rio foi de R$ 59.261.620,36 (cf. arquivo "DECOD-0012-2011_Anexo-05_Vol-
02_fls-0403-0791.pdf", p. 15, do CD-ROM de fls. 1517), o que corresponde a um acréscimo de 51% em
relação ao valor correspondente ao do Contrato 105/2010.
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houve um aumento, em curto espaço de tempo, da ordem de 14,4%


{[(44.894.997,30/2)/!A fórmula não se encontra na tabela]-1} em face da concentração
de mercado. Referido custo, nesse caso, impacta especialmente os contratos VACs.
Diante disso, a fim de facilitar a visualização das melhores estratégias de cada
jogador, têm-se como resultados (payoffs) das diversas ações e cenários53 os valores
constantes do Anexo I54, parte integrante desta sentença, para todos os efeitos legais.
c) Cenário 1: ampla concorrência, equilíbrio de mercado, regularidade das
entregas e falta de gargalos
No primeiro cenário, o "jogo" a ser examinado acontece em um cenário ideal, isto
é, em um ambiente econômico estável, na qual há concorrência, equilíbrio de mercado,
certa regularidade das entregas (taxa de eficiência elevada) e ausência de gargalos (que
funcionam como repressores da demanda, do fluxo e/ou da cadeia produtiva e que,
portanto, alteram os payoffs).
Cenário 1: ambiente ideal de ampla concorrência, de equilíbrio de mercado, taxa e eficiência elevada e de
ausência de gargalos
Legenda
Jogador 1: Jogador 2:

não embarca reclamante MTA


Payoffs: (reclamante; MTA)
VAC por Contrato 105
outras Cias Contrato 51 via GRU Contrato 105
(-8,67;0) via BSB

(5,525;0)
não leva
não leva transporta ou atrasa
transporta não leva transporta
ou atrasa no prazo
no prazo ou atrasa no prazo

(6,43;2,24) (6,43; (6,68; (4,97;


1,344/2,128) (6,68;1,99) (4,97;3,70) 2,59/3,515)
1,393/1,89)
EQUILÍBRIO DE NASH

53
Com base nos valores por Kg transportada é fácil estimar os ganhos/perdas em reais nos diversos
cenários. Tais valores servem para emular os payoffs. No caso concreto, as perdas e danos, em especial,
podem sofrer flutuações, tanto a maior, pelo descumprimento do contrato de consumo com o cliente com o
pagamento em dobro da tarifa paga (art. 42, § único, CDC) e por custos de armazenagem, que são
progressivos, como a menor, pela não reclamação do cliente lesado.
54
A apresentação dos payoffs em Anexo e em não seguida a essa exposição tem a única finalidade de
facilitar a leitura da sentença e evitar a quebra da linha de raciocínio com dados resultantes de operações
matemáticas. Assim, prestigia-se a clareza da exposição, sem prejuízo da indicação do resultado dos
cálculos em face de cada um dos parâmetros fixados neste item G.1.1.b.
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Em um ambiente econômico estável, o resultado do jogo, equilíbrio de Nash,


corresponde à opção do reclamante de executar o Contrato 105/2010 enviando a carga
postal para Manaus a partir de Guarulhos. Mais do que isso, quanto mais carga postal
(urgente e/ou não urgente) for despachada por Guarulhos maior será o ganho da
reclamada, atingindo seu ápice quando toda a carga postal para Manaus (urgente ou não
e não importando sua origem) for despachada a partir de São Paulo.
O jogo, neste cenário, revela que o reclamante detém sobre a MTA a estratégia
dominante, sendo sua prerrogativa sua escolher, dentre as opções possíveis, aquela que
corresponde ao melhor resultado para si (para a reclamada). De fato, estratégia
dominante é aquela que se apresenta com a melhor opção para um dos jogadores que
obterá o melhor resultado para si, independentemente das decisões do(s) outro(s)
jogador(es). John T. Nash Jr55. demonstrou, matematicamente, que "[…] some of the
strategies of one player may make possible the elimination of a new class of strategies for another
player"56.
Nesse caso, ante a presença da estratégia dominante pelo reclamante, a MTA
fica sem a possibilidade de escolher uma opção que possa lhe render um resultado
econômico mais favorável. Na verdade, qualquer decisão que a MTA tomar, propiciará a
reclamada aferir o máximo de aproveitamento econômico. As opções da MTA ficam
limitadas a duas alternativas: cumprir o Contrato 105 a partir de Guarulhos ou amargar
perdas financeiras se não cumpri-lo integralmente ou se atrasar o transporte da carga
postal.
Em outras palavras, se o reclamante pode escolher a opção que lhe dá maior
ganhos (utilizar o Contrato 105 a partir de GRU para MAO) e persegue essa finalidade,
então a probabilidade de fazer essa escolha é de 100%. Por outro lado, tendo a MTA
apenas duas opções, em face da escolha do reclamante, e procurando maximizar seu
lucro, então sua escolha será essa (cumprir o contrato). Matematicamente falando, o
cumprimento do Contrato 105 com a remessa da carga postal para Manaus a partir de
São Paulo é a resposta do problema (do jogo).
A tabela a seguir, mostra em reais, o quanto representa os ganhos do reclamante
(em prol da reclamada) nas diversas opções que detém:

Tabela 14: resultados dos ganhos do reclamante em prol da reclamada de acordo com a quantidade de
carga para Manaus embarcada por Guarulhos
Cargas diárias (Kg)
5.800(*) 9.122(+) 26.930(#)
resultado (R$) resultado (R$) resultado (R$)
Opção payoff p/dia p/mês ($) p/dia p/mês ($) p/dia p/mês ($)
Não embarca -6,68 -38.744,00 -852.368,00 -60.934,96 -1.340.569,12 -179.892,40 -3.957.632,80
VAC p/outras Cias 5,525 32.045,00 704.990,00 50.399,05 1.108.779,10 148.788,25 3.273.341,50
Contrato 51 6,43 37.294,00 820.468,00 58.654,46 1.290.398,12 173.159,90 3.809.517,80

55
NASH JR, Non-cooperatives games, op. cit., p. 293.
56
Tradução livre: [...] algumas das estratégias de um jogador pode tornar possível a eliminação de uma
nova classe de estratégias para o outro jogador.
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Contr.105 p/GRU 6,68 38.744,00 852.368,00 60.934,96 1.340.569,12 179.892,40 3.957.632,80
Contr.105 p/BSB 4,97 28.826,00 634.172,00 45.336,34 997.399,48 133.842,10 2.944.526,20
(*) Correspondente a Carga diária do Contrato 51/2010
(+) Carga diária contratada no Contrato 105 para o trajeto GRU-MAO
(#) Valor médio da carga diária transportada para Manaus (9.133Kg via GRU+17.797Kg via BSB) de maio a
setembro/10, conforme CGU, fls. 96.
($) Considerando 22 frequências mensais.
OBS. Em negito: o valor que representa o máximo de aproveitamento econômico em favor da reclamada.
Dessa forma, no cenário 1 do jogo 1, CONCLUI-SE que: a) o domínio do jogo
está nas mãos do reclamante; b) optar por utilizar o Contrato 105/2010 e embarcar toda
carga postal, urgente e não urgente, para Manaus a partir de Guarulhos é a opção que
traz para a reclamada o maior rendimento; c) a estrutura de estímulos e desestímulos dos
Contratos firmados pela reclamada está economicamente adequadas e conduzem ao fiel
cumprimento em um cenário de ambiente econômico estável; d) o reclamante, nesse
caso, não age em favor da reclamada, tampouco comete ato de improbidade.
Por outro lado, subjacente ao resultado do jogo, é possível perceber que quanto
mais carga é despachada por Guarulhos pelo uso do Contrato 105 maior é o risco de
desequilíbrio econômico-financeiro da MTA. O lucro ("remuneração") que a MTA
informou no Contrato 51, cerca de 60 dias antes de firmar o Contrato 105, é de R$
0,25/Kg, conforme planilha de custos de formação do preço ("DECOD-0012-2011_Anexo-
01_Vol-02_fls-0370-0670.pdf", p. 292 do PDF, cf. CD-ROM de fls. 1517). Assim, a MTA,
ao apresentar suas cotações na Dispensa de Licitação, que resultou no Contrato 105,
acabou por ofertar, se verdadeira sua planilha, uma cotação que, nesse lote GRU-MAO,
ensejaria um prejuízo operacional de R$ 0,01/Kg [2,24-0,25].
Ao que parece, a MTA procurou fazer uma média ponderada, diminuindo seus
ganhos reais da linha GRU-MAO, abaixo do valor de custo, para, aumentando a cotação
em outros trechos, obter, ao final, êxito em todos os lotes ofertados e, com isso, otimizar a
relação global custos/receitas e o uso da aeronave (em todo o percurso GRU-BSB-MAO-
BSB-GRU teria rendimentos de carga). Curiosamente, a única linha que teve cotação da
concorrência (ABSA) foi, justamente, o trecho GRU-MAO (cotado a R$ 3,50, o que
corresponde a 75,88% a mais do valor dado pela MTA).
Isso, obviamente, não dizia respeito ao reclamante ou à reclamada. Trata-se da
estratégia comercial adotada pela MTA, risco da composição de preço que fez. Todavia,
isso pode ter repercussão, intencional ou não, na alteração do cenário do jogo.
d) Cenário 2: opção da MTA em continuar cumprindo o Contrato 105
transportando a carga para Manaus via Guarulhos em um ambiente econômico
estável
No cenário 2, o enfoque está na atuação da MTA, que tem a opção de continuar
cumprir ou não o Contrato 105 transportando a carga postal para Manaus via Guarulhos.
O contrato não prevê a rescisão de apenas um dos lotes (um dos trechos), tampouco a
rescisão unilateral por iniciativa da MTA. Todavia, ela pode propor à reclamada a rescisão
de todo o Contrato 105 (cláusula 8.1.2, ("DECOD-0012-2011_Anexo-03_Vol-02_fls-0376-

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0659.pdf", p. 13 do PDF, cf. CD-ROM de fls. 1517)57. Também não existe a opção para
propor a repactuação (cláusula 6ª), sequer para recompor o equilíbrio econômico-
financeiro.
Permanecem inalteradas as condições ideais do cenário 1: ampla concorrência,
equilíbrio de mercado, taxa de eficiência elevada e ausência de gargalos. Nesse caso, o
cenário do jogo é o seguinte:
Cenário 2: as opções da MTA para tentar melhorar seu payoff em um ambiente econômico estável

Legenda
Jogador 1: Jogador 2:
propõe o fim
Contrato 105 via GRU do Contrato 105 reclamante MTA
transporta no prazo Payoffs: (reclamante; MTA)
Contrato 105 via GRU
não leva ou atrasa

EQUILÍBRIO
DE NASH
(6,68;1,99) aceita e
Fim Contrato 105: não aceita e
chama o 2º lugar
Insiste no
VAC por Contrato 105
outras Cias Contrato 51 via GRU Contrato 105
(5,17;0) via BSB

(5,525;0)
não leva
não leva transporta ou atrasa
transporta não leva transporta
ou atrasa no prazo
no prazo ou atrasa no prazo

(6,43; (6,43; (6,68; (4,97; (4,97;


0,986/2,033) (6,68; 1,197/3,415)
1,643/2,14) 1,393/1,89) 0,497/1,79) 2,307/3,60)
)
Nota-se que, nesse cenário, o resultado do jogo não se altera. O Equilíbrio de
Nash permanece no fiel cumprimento do contrato por ambas as partes.
Isso porque, a MTA, não tem nenhuma garantia de que, propondo a rescisão
contratual à reclamada ou descumprimento total ou parcialmente o Contrato 105, no
trecho que lhe é desfavorável, o reclamante, como preposto da reclamada, faça uma
escolha que lhe seja mais benéfica do que a atual. Por isso, sua escolha mais lógica é

57
Na verdade essa opção acaba por conduzir a um resultado econômico equivalente ao do não
cumprimento parcial ou total do contrato. Todavia, esse Juiz achou por bem manter tal ação representada
no diagrama do cenário 2 e 3 para que o leitor possa visualizar, por si mesmo, tal equivalência
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permanecer no estado em que se encontra, isto é, cumprir o Contrato 105 e despachar a


carga para Manaus por meio de Guarulhos.
A MTA continua presa à estratégia dominante do reclamante e estrutura de
estímulos e desestímulos do Contrato 105, inclusive a que não permite a rescisão
unilateral por parte da MTA, continua eficaz.
O jogo acima REVELA, por fim, que, nas condições propostas (equilíbrio de
mercado, ampla concorrência e ausência de gargalos), qualquer outro resultado que não
o direcionamento da carga postal para Manaus via Guarulhos pelo Contrato 105, ainda
que a MTA descumpra o contrato, conduz a um resultado econômico mais desfavorável à
reclamada e pode, em tese, constituir ato de improbidade.
e) Cenário 3: monopólio situacional e saturação do TECA Guarulhos
No terceiro cenário, há uma situação de baixa concorrência, com reflexos no
equilíbrio de mercado, alta taxa de ineficácia do Contrato 105/2010 e saturação do TECA
de Guarulhos. Neste caso, os payoffs sofrem o impacto da saturação do TECA (30,4%) e
os preços da concorrência aumentam 14,4% (conforme fundamento do item "a" acima).
Consequentemente, o resultado do jogo muda, conforme revela o diagrama abaixo:
Cenário 3: pouca concorrência, desequilíbrio de mercado, ineficiência alta a e saturação TECA Guarulhos

Legenda
Jogador 1: Jogador 2:
propõe o fim
Contrato 105 via GRU do Contrato 105 reclamante MTA
transporta no prazo Payoffs: (reclamante; MTA)
Contrato 105 via GRU
não leva ou atrasa

(6,68;1,99) aceita e
Fim Contrato 105: não aceita e
chama o 2º lugar
Insiste no
VAC por Contrato 105
outras Cias Contrato 51 via GRU Contrato 105
(2,53;0) via BSB

(2,44;0)
não leva
não leva transporta ou atrasa
transporta não leva transporta
ou atrasa no prazo
no prazo ou atrasa no prazo

(3,79; (3,79; (4,04; (4,97; (4,97;


0,986/2,033) (4,04; (4,04;1,393)
0,497/1,79) 2,307/3,60) 1,197/3,415)
1,643/2,14) 1,393/1,89)
EQUILÍBRIO DE NASH
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O ponto de equilíbrio alterou. O diagrama acima revela que a resposta do jogo, o


Equilíbrio de Nash, nessa situação, está no deslocamento da carga aérea com destino à
Manaus a partir de Brasília. A MTA passa a ter um ganho, mesmo pagando os valores
máximos de multas, e a reclamada, em face das opções que dispõe, terá menos perdas.
Nesse cenário, será mais vantajoso para MTA, intencionalmente ou em razão do
desequilíbrio econômico-financeiro anteriormente pontuado, deixar de cumprir, o
Contrato105/2010 a partir de Guarulhos (ou levá-lo a uma ineficiência elevada), como de
fato ocorreu, para, com isso, tomar para si a estratégia dominante do jogo.
Conforme exposto no item B.2 desta sentença, tiveram problemas nessa época a
BETA Cargo, a TAF, a Total e a VarigLog. A Air Brasil operava um único Boeing 727-200F
no início de 2010 e, provavelmente, não tinha disponibilidade de horários (em função do
tempo de voo até Manaus, cf. Tabela 8, e por já utilizá-la no Contrato 101/2009, ver
Tabela 1) e a Rico Linhas Aéreas tinha um único Boeing 737 cargueiro, com menor
capacidade de carga. Sobraram poucas empresas com aeronaves cargueiras de grande
capacidade disponíveis. O equilíbrio do mercado foi alterado.
Ensina Ivo Gico Júnior58:
"Quando a interação social se dá no âmbito do mercado, o comportamento racional
maximizador levará os agentes a realizar trocas até que os custos associados a cada troca se
igualem aos benefícios auferidos, momento a partir do qual não mais ocorrerão trocas.
Nesse ponto, diremos que o mercado se encontra em equilíbrio. Equilíbrio é um conceito
técnico utilizado para explicar qual será o resultado provável de uma alteração na
estrutura de incentivos dos agentes. Modificada a regra em um contexto onde a
barganha é possível (mercado), os agentes realizarão trocas enquanto lhes for benéfico
até que o equilíbrio seja alcançado".
Mais cirúrgica ainda é a lição de Robert Cooter e Thomas Ulen59:
"O oligopólio limita os parceiros comerciais disponíveis a um pequeno número, e o
monopólio os limita a um único vendedor. Quando a quantidade de parceiros é limitada, as
barganhas podem ser muito unilaterais, no sentido de que um lado se aproveita do outro.
[...] As circunstâncias em que condições excessivas tendem a ser impostas ou induzidas
são, antes, aquelas que poderiam ser caracterizadas como 'monopólios situacionais' ".
Tecnicamente falando, nesse cenário, há a configuração de um monopólio
situacional em que a MTA era a única empresa ou uma das poucas60, que poderia
atender a emergência e a urgência da crise que foi gerada ou alimentada por ela,
impondo ou induzindo o comportamento da reclamada na pessoa do reclamante. De fato,

58
GICO JÚNIOR, Ivo. Metodologia e Epistemologia da Análise Econômica do Direito. Economic Analysis of
Law Review. v. I, n. 1, jan.-jun./2010, p. 22, grifou-se.
59
COOTER; ULEN, op. cit., p. 235.
60
A proposta da 2ª colocada (a ABSA) do contrato emergencial 105/2010 é tão dispare da apresentada pela
MTA que é provável que ela tenha incluído nos seus custos, a multa pelo descumprimento de outro contrato
com a reclamada. Nesse caso, a estrutura de incentivo para descumprir aquele contrato e abandonar a
concessão de outra linha seria maior do que o desestímulo em cumpri-lo.
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como a carga postal não podia chegar a Manaus por outra via, senão pela aérea, a MTA
encontrou o ambiente econômico propício para se reposicionar no mercado e impor à
reclamada (e ao reclamante) sua estratégia dominante.
A estratégia dominante em favor da MTA e o monopólio circunstancial que ela
passou a exercer naquele momento são tão evidentes que ela chegou a propor, em
tentativa frustrada da contração da Linha A12, preço 62% superior ao valor estimado (fls.
367)!! O relatório de demandas especial chega a registrar que, nesta dispensa de licitação
em 31/3/2010, a única empresa que apresentou a proposta foi a MTA, o que reforça à
conclusão da presença de um monopólio ou quase-monopólio circunstancial.
Para piorar, o jogo revela que o impacto de cerca de 30,4% (média de 8.187
Kg/dia em face da média diária da carga com destino a Manaus de 26.930 Kg) tornou
economicamente inviável centralizar as operações das cargas no aeroporto de Manaus.
Qualquer opção que o reclamante tinha, até mesmo em despachar a carga por VAC em
outras empresas aéreas ou chamar a 2º colocada na Dispensa de Licitação que originou
o Contrato 105/2010 (a ABSA) e rescindi-lo parcialmente (em relação ao lote 2) eram
soluções, em termos matemáticos, irracionais ou ilógicos.
O relatório da CGU informa que, em razão da paralisação das operações em
diversas linhas aéreas a partir de janeiro de 2010 e da recomposição das linhas operadas,
houve uma evolução de mais de 20% na carga tratada no TECA Guarulhos entre janeiro e
maio/2010 (fls. 491), tendo seu ápice em maio de 2010, o que levou a saturação desse
Terminal de Cargas (fls. 495).
Na verdade, apenas a saturação do TECA Guarulhos, ainda que não houvesse
monopólio situacional, seria suficiente para ensejar a alteração do Equilíbrio de Nash para
despacho da carga para Manaus via Brasília, conforme cálculos efetuados por esse Juiz.
Os cálculos ainda revelam que o ponto em que o Equilíbrio de Nash foi alterado
(ponto de flexão) corresponde a saturação de 19,67% da carga para Manaus {0,304-
[(4,97-4,04)/8,67]}. Em outras palavras, resíduos de carga inferior a 5.297 Kg/dia no TECA
Guarulhos {0,1967*26930} mantém o Equilíbrio de Nash no cumprimento do Contrato
105/2010 via Guarulhos. Por isso, a resposta de máxima eficiência econômica para a
reclamada está no envio da carga que exceder a 5.297 Kg/dia por via terrestre até Brasília
para daí ser despachada para Manaus. Todavia, tal precisão, descontada eventual desvio
padrão, não apurado nesta sentença, somente foi possível de ser apurada após a
consolidação dos dados da execução do Contrato 105, três meses após a decisão de
alterar a remessa da carga não urgente do TECA Guarulhos.
Além disso, o ponto matemático de mudança do Equilíbrio de Nash considera tão-
somente a carga para Manaus e não o impacto da sobrecarga do TECA Guarulhos em
outras linhas da RPN da reclamada. Obviamente, que considerando tais fatores, o ponto
de flexão real aconteceria seria maior que os 19,67% acima referidos, isto é, uma carga
maior do TECA Guarulhos tinha que ser rapidamente liberada em face do risco de
colapso de toda a RPN (conforme, aliás, demonstrou a prova testemunhal). Aliás, a 1ª
testemunha Gerson ainda indicou que a situação era tão crítica que havia dificuldade em
separar as cargas urgentes das não urgentes ao ponto dessas serem embarcadas em

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detrimento daquelas. Daí porque solicitava a retirada de toda carga não urgente desse
terminal aéreo.
De qualquer sorte, o resultado do jogo corresponde exatamente à decisão que o
reclamante tomou e que a reclamada acredita que lhe foi prejudicial.
Os dados analisados neste feito, em especial das tabelas 10, 11 e 12 (item F.2
desta sentença), revelam que a ineficiência da MTA no transporte da carga para Manaus
(índice de eficiência de 33,3%, em ambos os trechos GRU-MAO e BSB-MAO, contra o
ideal de 95% ou mais) parece ter contribuído para o agravamento da saturação do TECA
de Guarulhos. O TCU aponta que o Contrato 105/2010, chegou a ter 18 cancelamento e
364 atrasos entre maio e junho de 2010 (fls. 540), e que nas outras linhas que a MTA
operava apenas 3 cancelamentos (linha para Salvador) e 5 atrasos (2 para Salvador e 3
para Recife). Ou seja, a ineficiência da MTA foi localizada: apenas o Contrato 105
concentra 85,7% dos cancelamentos e 98,7% dos atrasos.
Em um quadro de monopólio situacional, não poderia a reclamada simplesmente
rescindir o contrato com a MTA, sem que houvesse uma alternativa para o transporte para
Manaus, sob pena de, aí sim, consolidar o colapso no TECA Guarulhos com repercussão
em toda a RPN e, quiça, na restante de sua rede de distribuição de encomendas e
postagens. Diferentemente dos outros destinados operados pela MTA, em que a via
terrestre, mesmo para cargas urgentes, poderia ser uma alternativa, essa opção não
existia para despachar a mala posta para Manaus.
Fazendo as contas, o desequilíbrio-financeiro da MTA, com o provável prejuízo
operacional de R$0,01/Kg pela carga transportada na linha GRU-MAO pelo Contrato 105,
conforme apontado anteriormente, não é tão elevado ao ponto de gerar dificuldades
financeiras que inviabilizassem economicamente os voos. Considerando a carga média
transportada de 26.930 Kg/dia, o prejuízo seria de R$ 269,30 por voo61 e, com as 22
frequências mensais, de R$ 5.924,60/mês. Como a MTA, por operar no TECA Guarulhos
tinha obviamente ciência da sobrecarga desse terminal, bem como da paralisação das
atividades e linhas de suas empresas concorrentes (informações simétricas62), então, fica
claro, à luz da Teoria dos Jogos, que os atrasos e cancelamentos foram, na verdade, uma
jogada deliberada, na verdade, a melhor opção que a MTA tinha: inviabilizar, ao máximo,
a remessa de carga postal para Manaus por meio de Guarulhos, inclusive após a decisão
do reclamante de despachar a carga não urgente para MAO a partir de BSB63.
O cenário 3, com a combinação do monopólio situacional, saturação do TECA
Guarulhos e a baixa eficiência da MTA na linha Manaus (e apenas nessa), aponta que o
reclamante, na condição de chefe do Denaf, e a própria reclamada ficaram reféns da
situação crítica porque passavam e da ineficiência da MTA. Nenhuma decisão poderia

61
O que provavelmente era compensado com o razoável volume de carga transportada de GRU para
Manaus, cujo média diária era de 21.387Kg ao custo de R$ 2,00/Kg, isto é, R$ 0,01/Kg a mais do que o
custo por quilo da carga com destino a Manaus pelo mesmo Contrato 105.
62
Informações simétricas. COOTER; ULEN, op. cit., pp.232-234.
63
Se o índice de eficiência elevasse e o TECA GRU voltasse à normalidade havia o risco de se voltar para
o cenário 2 e, nesse caso, o Equilíbrio de Nash retornaria para o ponto anterior: embarque de toda a carga
postal para MAO via GRU nos valores do Contrato 105.
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evitar a perda de lucratividade da reclamada. Mas do que isso, o jogo revela que o
reclamante adotou a decisão menos gravosa para a reclamada. Ele tomou as melhores
decisões possíveis para quem estava preso à "barganha" promovida pela MTA que, de
uma certa forma, encontrou o ambiente propício para, por via transversa, repactuar sua
posição diante da reclamada64, não tendo o reclamante ou a reclamada opção melhor.
Tal cenário conduz, ainda, às seguintes CONCLUSÕES: a) a atitude do
reclamante em transferir a carga não urgente com destino a Manaus de Guarulhos para
Brasília, em situação de saturação do TECA Guarulhos, monopólio circunstancial e
elevada taxa de ineficiência (ou baixa taxa de eficiência) é a alternativa economicamente
mais favorável à reclamada (Equilíbrio de Nash); b) nesse contexto, o reclamante não
agiu em favor da MTA, tampouco praticou ato de improbidade; c) as estruturas de
estímulos e desestímulos do Contrato 105/2010 mostraram-se ineficazes nessas
situações de desequilíbrio de mercado; d) a MTA passou a exercer a estratégia
dominante da execução do Contrato 105/2010; e) a baixa eficiência da linha Manaus
(inexecução parcial ou total do Contrato 105) é, para a Teoria do Jogos, uma jogada da
MTA, ou melhor, a jogada lógica, a única conduta que lhe traria melhor resultado
econômico; f) o reclamante (e por via oblíqua a reclamada) passaram a ser reféns da
MTA e de sua estratégia dominante.
Com esse quadro de dominação econômica pela MTA em relação ao Contrato
105/2015, da baixíssima taxa de eficiência (cerca de 1/3, quando o normal seria acima de
95%) e da inviabilidade de chamar a 2º colocada da Dispensa de Licitação 205/2010 (que
apenas deu lance em um dos 6 lotes da linha A12), tornou imprescindível a abertura de
nova concorrência pública, ainda que em caráter emergencial, para a linha GRU-BSB-
MAO, a fim de que a reclamada tivesse opções e voltasse a ter domínio do jogo.
O anexo 3 dos documentos juntados no CD-ROM de fls. 1.517 revela que o
Denaf, simultaneamente a decisão que centralizou a carga não urgente para Manaus em
Brasília, lançou proposta, em caráter emergencial, para essa linha e que resultou no
Contrato 189/2010. Referida decisão, portanto, também se coaduna com os interesses
econômicos e financeiros da reclamada. O jogo mostra que quanto maior a demora em
substituir a MTA na operação da linha A12 menor aproveitamento econômico a reclamada
teria e mais prolongada seria a ineficiência na operação dessa linha pela MTA.
Em outras palavras, a concomitante decisão em abrir em caráter emergencial
nova proposta para operação da linha A12 reforça a conclusão de que o reclamante não
agiu em favor da MTA, mas, ao contrário, em prol da reclamada.
A análise dos resultados do jogo revela, ainda, que a solução defendida pela
reclamada, de manter a carga não urgente com destino a Manaus em Guarulhos, ou
mesmo de utilizar o Contrato 51/2010, não era a melhor opção. Considerando os payoffs
acima, é possível estimar quanto seria a perda adicional da reclamada com essa opção.
Além dos R$ 396.309,60 apurados pela Comissão Disciplinar relativa ao deslocamento do
Equilíbrio de Nash pelos 231.960Kg transportados por BSB (conforme consta da Tabela
3, item D.1), haveria uma perda da mais R$ 0,93/Kg [4,97-4,04]. Portanto, a opção

64
Cf. Repactuação em BAIRD; GERTNER; PICKER, op. cit., pp. 109-199.
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defendida pela reclamada traria para si um prejuízo adicional de R$ 215.722,80, que


somados com o valor apurado por ela, totalizaria uma perda estimada de R$ 612.032,40.
O reclamante procurou demonstrar que tomou a melhor solução para a reclamada
no processo administrativo, sob outro ângulo e com outra metodologia. Era difícil para a
comissão acolher o método e a linha argumentativa dele, não por estar equivocada (ou
certa), mas por depender do exame de dados que poderiam levar a outros resultados,
dependendo do método de cálculo, e por não afastar o fato concreto visto pela comissão:
a reclamada teve prejuízo e o reclamante foi o responsável pela decisão que o ocasionou,
já que não se poderia culpar a MTA, que, por essa ótica, apenas recebeu o preço do
serviço contratado.
Acontece que números em si não dizem nada, senão examinados detidamente.
Compreendo que pela lógica da Contabilidade e da Auditoria eles recebem rótulos:
prejuízo, prejuízo contábil (ou operacional), etc. Todavia, o ponto que interessa ao Direito,
sob o ângulo da discussão nos autos, é se houve improbidade. O que está demonstrado,
por meio do diagrama lógico acima e que apresenta os resultados matemáticos do
problema (e aí os números ganham sentido), é que, pela teoria dos jogos, o reclamante
não foi o responsável pelas perdas sofridas pela reclamada, mas, ao contrário, foi, como a
reclamada, vítima de mais um capítulo da crise aérea que vivenciou a partir de outubro de
2009 até a normalização dos serviços no 2º semestre de 2010.
Tal conclusão técnica, lógica, econômica, de uma matemática aplicada, não está
presa ao campo teórico, mas foi corroborada, além da prova documental que serviu de
base para a construção dos modelos, pela prova testemunhal. As testemunhas ouvidas
pelo juízo acabaram por confirmar: a) a correção da decisão do reclamante; b) a situação
de quase-colapso do TECA Guarulhos; c) a necessidade de uma decisão e atuação
rápida do Denaf, por meio de seu chefe à época.
Na verdade, a prova testemunhal corrobora todos os três cenários, pois o jogo,
correspondentes aos Contratos 51 e 105 e as demais opções e ações que permeiam as
possibilidades das partes tem, na linguagem da Teoria dos Jogos, várias jogadas. Cada
cenário representado pelos modelos matemáticos acima (de forma simplificada em
diagramas) são retratos da prova documental carreadas aos autos, corroborada pelas
testemunhas ouvidas pelo juízo, das jogadas vivenciadas pelo reclamante (e
consequentemente a reclamada) e a MTA.
G.1.2. Jogo 2: manutenção ou rescisão do Contrato 51/2010
Pedindo vênia as partes, mas há ainda um jogo a ser considerado e analisado: a
rescisão ou não do Contrato 51/2010.
A reclamada aplicou ao reclamante a pena de dispensa por justa causa também
pelo fundamento de que descumpridas as normas internas da reclamada que exigiam a
formalização da ruptura do Contrato 51/2010, com o advento do Contrato 105/2010 mais
vantajoso à reclamada. Incumbe analisar, então, se essa decisão trouxe efetivo prejuízo à
reclamada ou é, data vênia, mera filigrana jurídica.
O Contrato 51/2010 prevê, dentre as hipóteses da cláusula 9ª, a rescisão
contratual unilateral, por iniciativa da reclamada, quando o interesse público o exigir,
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perfeitamente aplicável à hipótese. Não há previsão de multa em favor da MTA nesse


caso. Também não há previsão de penalidade pela mera inexecução do Contrato 51/2010
por iniciativa dos Correios (na pessoa do reclamante).
Proposta a rescisão do contrato pela reclamada ou não o executando, a MTA
pode ter duas atitudes: aceitar ou impugnar a decisão. Se aceitar a rescisão ou a
inexecução, a MTA nada ganha, tampouco sofre prejuízo. Todavia, tem o direito subjetivo
de impugnar quaisquer dessas decisões administrativa ou judicialmente. Acontece que,
em ambos os casos, pelo contrato assinado, nada será devido: o transporte da carga é
mera expectativa de direito e, por se tratar de VAC, sua execução é de aplicação
subsidiária. Além disso, o contrato prevê a rescisão por interesse público, então no caso
de rescisão, estaria observada essa disposição e, em caso de suspensão também, pois
quem pode o mais, pode o menos.
Como a estrutura do jogo é bem simples, apresento as ações, os payoffs e o
resultado do jogo em forma de tabela verdade:

Tabela 15: representação simplificada do Jogo 2: perdas e ganhos pela rescisão do Contrato 51 pela
reclamada
MTA Linhas Aéreas
Ações (reclamante/MTA) Aceita a decisão Impugna a decisão
(0,0) (0,0)
Rescinde o Contrato 51
Reclamante

(0,0) (0,0)
Mantém o Contrato 51 sem executá-lo

Legenda: payoffs (reclamante, MTA)


Equilíbrio de Nash: todos os resultados possíveis do jogo correspondem ao equilíbrio de Nash
Como se vê, todas as escolhas conduzem ao resultado zero. Suspendendo ou
rescindido o contrato o resultado econômico é idêntico: não há aproveitamento
econômico. Por isso, CONCLUI-SE que, para a Teoria dos Jogos, a decisão de
suspender ou rescindir formalmente o Contrato 51/2010 é absolutamente irrelevante, sem
qualquer relevância no campo econômico e, sob o ponto de vista da Análise Econômica
do Direito, também jurídico.
De fato, a conclusão supra tem pleno amparo na Teoria Econômica do Contrato,
na medida em que a eficácia do contrato está diretamente ligada ao cumprimento do
pactuado65. Quando o contrato é suspenso ou rescindido, sem qualquer resultado
econômico, sequer de reparação pelo descumprimento da promessa, então ele carece de
eficácia e não produz qualquer efeito econômico ou jurídico.

65
COOTER; ULEN, op. cit., p. 208.

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H. A conduta do reclamante à luz da prova testemunhal produzida


O reclamante afirma que praticou atos de gestão, não passíveis de punição e
dentro do previsto no Manorg. Aduz que não era o gestor operacional dos contratos 51 e
105/2010; que tomou inúmeras medidas contrárias aos interesses da MTA; não houve
desvirtuamento do objeto do Contrato 105; deu continuidade da utilização da remessa de
cargas urgentes e não urgentes no mesmo contrato. Alega inexistir fraude ou práticas
irregulares que lhe foram imputadas. Sustenta, ainda, entre outras questões, que as
medidas que adotou ajudou a reduzir o percentual de encomendas entregues em atraso,
invocando decisão do TCU e sublinhando a saturação do TECA Guarulhos.
Conforme já asseverado, a prova testemunhal produzida em juízo corrobora a
prova documental exaustivamente analisada e invocada nesta decisão e que, sozinha e
auxiliada pelo exame dos fatos à luz da Teoria dos Jogos, já aponta pela inexistência de
qualquer falta grave praticada pelo reclamante.
H.1. A prova testemunhal produzida
O relato da testemunha Gerson Gonçalves do Souza, a 1ª conduzida pelo
reclamante:
"Que trabalha para a reclamada há 26 anos; que em 2009/2010 trabalhava no TECA
Guarulhos; que não trabalhava diretamente com o reclamante porque ele laborava em
Brasília-DF; que em situação de normalidade somente carga urgente era transportada no
TECA GUARULHOS com destino a Manaus; que em situação de anormalidade a carga
urgente poderia seguir via terrestre até Brasília-DF e despachada via aérea para São Paulo-
SP; que isso era raro acontecer mas que em casos excepcionais ocorria; que a carga não
urgente, como regra geral, era despachada via transporte rodoviário e de lá seguia via aérea
de São Paulo-SP para Brasília-DF e depois aérea para Manaus; que as definições se a carga
ia pela via aérea ou terrestre era em função da prioridade da carga; que a questão do custo
do transporte por uma via ou outro não era levada em conta pelo setor operacional porque
o custo já era calculado com base no tipo de encomenda paga pelo cliente; que SEDEX
tinha prioridade e o PAC não; que a partir do final do segundo semestre de 2009 a malha
aérea utilizada pela reclamada começou a sofrer impacto de mudanças por motivo alheio à
empresa, com cancelamento de diversas linhas, interferindo na logística da empresa; que o
Teca Guarulhos, como principal nó de distribuição dessa malha, sofreu maior impacto; que
isso gerou um grande acúmulo de cargas no Teca Guarulhos, chegando ao ponto de
sobrecarregar a área operacional destinada a carga de 4.500m que em situações de
normalidade fica vazio; que nesse caso meios alternativos são acionados dando-se
prioridade para a utilização da via terrestre para encomendas mais próximas e utilização do
sistema VAC, com as linhas aéreas para as maiores distâncias; que o departamento em que
o reclamante trabalhava era o responsável por essas coordenações e ele estabelecia com
sua equipe planos alternativos, com base nas normas da empresa, considerando as
prioridades de encaminhamento; que do primeiro trimestre até abril/2010 foi
disponibilizado pelo reclamante um meio de encaminhamento aéreo alternativo para
Manaus, maior distância desde o Teca Guarulhos e da qual não havia alternativa a não ser
a aérea; que ante o colapso existente em Brasília-DF, a primeira medida foi tentar escoar a
carga não urgente por São Paulo-SP, que nesse meio tempo também houve cancelamentos

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de outras linhas por companhias aéreas outras e que isso também passou a afetar as
encomendas urgentes; que a área do Teca Guarulhos era destinada às cargas urgentes e que
começou a não ter lugar para as cargas não urgentes no Teca Guarulhos; como em
maio/2010 o Terminal de Brasília-DF começou a ter o volume diminuído em face de novas
linhas, optou-se por encaminhar essas cargas não urgentes por terra a Brasília-DF, nó
importante da distribuição da reclamada, para daqui serem enviados via aérea para
Manaus; que pouco a pouco o Teca Guarulhos foi voltando à normalidade até o início de
agosto, com o retorno de outras linhas aéreas; que na visão do depoente a decisão do
reclamante foi correta; que é comum na operação surgirem problemas desta espécie, uma
vez que a reclamada depende para esta operação das companhias aéreas e dos
equipamentos que elas oferecem; que rotineiramente acontece problemas desta ordem e
que o centro de operação tem que tomar uma decisão; que caso as cargas não urgentes não
fossem despachadas pela via terrestre fatalmente acabaria por serem despachadas juntos
com outras encomendas urgentes e deixando para trás outras também urgentes, o que
causaria prejuízo para a reclamada; que o depoente era Gerente do Teca Guarulhos de 2009
até meados de 2014; que o acontecido em 2009/2010, do tamanho que foi, foi excepcional;
que nessa época foi combinado uma cota diária de cargas não urgentes para serem enviadas
para o terminal do rodoanel; que já aconteceu do Teca Guarulhos recusar a cota de cargas
não urgentes por falta de espaço; que se a carga não urgente não fosse enviada via terrestre
o terminal entraria em colapso total; que além de multas o problema da distribuição da
carga poderia afetar o desabastecimento nas localidades que necessitavam desta carga,
empregados ociosos em alguns lugares e em outros com excesso de trabalho; que quando
normalizou as operações em agosto/2010 a carga não urgente voltou a ser despachada por
terra até Brasília-DF; que nos manuais da reclamada a previsão é de que as encomendas
não urgentes para Manaus são despachadas até Brasília-DF por via terrestre e depois por
via aérea; que não sabe detalhes de como é feito o Processo de licitação para contratação
de linhas aéreas para distribuição dos produtos da reclamada; que havia uma área da
reclamada que cuidava do planejamento e fazia a previsão dos modais em que seriam
despachadas as cartas, denominada DENAF; que teve ciência dos contratos 51 e 105
referentes ao plano de contingenciamento da crise nos modais de ambos os terminais, mas
que não conhece os detalhes de tais contratos porque na operação apenas chega as
frequências, as cargas e as modalidades em que serão feitos os transportes; que o restante é
feito na administração central; que detalhes sobre a administração de contrato o depoente
apenas poderia opinar por achismo pois o que trabalha diretamente são com as atividades
operacionais relacionados ao transporte das encomendas; que o Contrato 51 foi utilizado
pelo que se recorda entre abril e maio/2010; que se trata de um Contrato contingencial, não
havendo compromisso de sua regularidade ou de seu uso contínuo; que ele chegou a ter um
grande uso em face da crise, mas a medida que foi normalizando ele deixou de ser
utilizado; que não sabe dizer se era um Contrato Emergencial porque não era a área do
depoente; que pelo que se recorda a MTA disponibilizou de duas a três aeronaves , mas
para a Unidade o que interessa é a disponibilidade para o embarque da carga; que não entra
nos pormenores para a área do depoente qual a espécie do contrato mas apenas quando
haverá disponibilidade de voo para o embarque da carga; que vários destinos foram
afetados pelo colapso aéreo como Fortaleza, Cuiabá, e outros; que também para o Sul
nesse momento de crise foram despachadas encomendas urgentes pela via terrestre; que o

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contrato 105 também previa passagem das encomendas por Brasília-DF; que não se
recorda com precisão se com o encerramento do contrato 51 as cargas passaram de ser
enviadas imediatamente para Brasília-DF; que reitera que a normalização foi progressiva"
.[...] "Que esclarece que havendo vaga na aeronave (linha aérea regular) toda carga
urgente é nela transportada mas caso não haja vagas é possível despachá-la por VAC para
contingência para complemento da linha regular quando ela não comporta todo volume"
(grifou-se).
O depoimento do Sr. Gerson está em sintonia com a prova documental e
apresenta coerência interna.
A 2ª testemunha do reclamante, Sr. Fábio Vieira Cesar, declarou
"Que trabalha para a reclamada há 33 anos; que atualmente trabalha na Vice-Presidência
de Encomendas, na função de Administrador Postal; que trabalhou diretamente com o
reclamante no período de 2009/2011; que na época trabalhava no antigo Diretoria de
Operações cujo parte das atribuição passou para a atual Vice-Presidência; que em 2009 a
empresa sofreu forte impacto com a mudança da malha aérea quando diversas empresas
cancelaram contratos e linhas também; que a linha para Manaus seja via Brasília-DF, seja
por São Paulo-SP ficaram prejudicadas; que de cerca de 15 linhas entre 6 e a metade foram
canceladas; que isso ocasionou perda de qualidade da empresa e repercussão nacional,
inclusive no noticiário da imprensa no período de 2009/2010; que naquela época havia um
departamento denominado DENAF responsável pela gestão pela malha aérea e rodoviária,
responsável pelo planejamento e pela a adoção de procedimentos de contingenciamento de
eventual crise, segundo as opções disponíveis e de acordo com as regras da empresa; que o
reclamante era o Chefe do DENAF que era subordinado à Diretoria de Operações; que era
o reclamante juntamente com sua equipe quem tinha a atribuição de apresentar as soluções
para esta época de crise; que o reclamante tinha a liberdade e a responsabilidade de propor
as soluções dentro da alçada dele; que ao longo da crise o DENAF foi propondo diversas
soluções para o contingenciamento da crise na malha aérea; que quando a solução dizia
respeito a contrato já firmados era da da alçada do DENAF propor e adotar as soluções;
que quando era necessário haver nova contratação de outras empresas existia
escalonamento de alçadas para autorização de contratação, valores para Gerentes, Chefe de
Departamento, e até aos órgãos colegiados da empresa, conforme manual de licitações da
reclamada; que há uma área especificamente de contratação caso o Chefe do DENAF
encaminhasse diretamente ou dependendo do valor, à autoridade da área a que se refere o
contrato; que nessa época o reclamante encaminhou à Diretoria de Operações diversas
solicitações de contrato cujo número não se recorda; que em relação à linha para Manaus
houve duas situações diferenciadas em 2009/2010; que tanto as encomendas expressas
(URGENTES) e PACs não-urgentes eram despachadas para Manaus por via aérea; que em
2009 houve interrupções de serviços de cargas postadas para Manaus e uma primeira
solução foi feito uma opção de fretamento de carga de São Paulo-SP para Manaus o que
mudava a forma de encaminhamento da PAC para aquela cidade porque naquela época ela
vinha de rodoviária até Brasília-DF, e despachada pelo Terminal de Brasília-DF via aérea;
que esse foi o primeiro plano de contingenciamento remetendo a carga não-urgente a partir
do Terminal de São Paulo-SP; que para o depoente essa solução parecia ser razoável no
momento em função das possibilidades e dos recursos até então disponíveis; que alguns
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meses depois, em funções de novos cancelamentos de linhas houve uma contratação de


fretamento de carga na linha São Paulo-SP / Brasília-DF / Manaus ida e volta; que o
principal terminal de carga aérea da reclamada fica em Guarulhos-SP; que nessa época o
pessoal de Guarulhos começou a reclamar dos volumes de cargas a serem despachadas
para Manaus e solicitar ao DENAF ajuda para superar o gargalo e acúmulo de cargas no
TECA GUARULHOS; que isso afetou também as carga urgentes e por isso foi retomado o
modelo anterior ao contingenciamento, isto é, encaminhar as encomendas não-urgentes
para Brasília-DF, via terrestre, e daqui despachá-las via aérea para Manaus; que na visão
do depoente a solução tecnicamente adotada foi a correta em função da mudança das
circunstâncias relativas à crise vivenciadas; que ambas as soluções eram da alçada do
DENAF e não precisavam ser submetidas à Diretoria de Operações; que algum tempo
depois de ambas as soluções a Diretoria de Operações foi informada pelo DENAF das
intervenções feitas; que a Diretoria de Operações considerou adequadas as intervenções à
época; que o depoente na época era o Superintendente Executivo da Diretoria de
Operações; que o depoente era o superior hierárquico do reclamante; que não foi ouvido no
PAD; que o acúmulo de encomendas em uma determinada fase da operação compromete
todas as fases seguintes e provoca efeito cascata, causando prejuízo à empresa, inclusive
por meio de indenizações; que não tem conhecimento de qualquer irregularidade nas
decisões do reclamante; que não tem conhecimento de qualquer benefício em favor da
empresa MTA; que a empresa MTA foi punida por proposição do DENAF em multas de
vários milhões de reais; que a partir do momento que a segunda solução foi adotada a
primeira foi logicamente abandonada; que não sabe dizer se houve interrupção ou
cancelamento, apenas tem ciência que deixou de ser utilizado e que a forma utilizada por
aquele contrato era de apenas efetuar o pagamento quando houvesse efetivo deslocamento
da carga até São Paulo-SP; que não sabe dizer se isso aconteceu exatamente no mesmo dia;
que não sabe dizer se a empresa MTA foi consultada dessa não utilização do primeiro
contrato, mas que não vê sentido em fazer tal consulta; que é difícil fazer uma comparação
do que seria melhor financeiramente para a empresa entre a decisão tomada e uma eventual
opção que não foi feita, pois não há como se ter parâmetros e saber quais as consequências
de decisão que deixou de ser tomada; que não sabe dizer se houve diminuição do número
de reclamações após a segunda decisão tomada; que acredita que o prazo de entrega da
carga PAC para Manaus aquela época foi de 8 a 10 dias; que não sabe dizer o motivo que o
Diretor de Operações substituiu o Chefe do DENAF , não sabendo dizer a época; que antes
do reclamante ser chefe do DENAF acredita que quem desempenhava essa função era o Sr.
Jorge Eduardo; que acredita que o Sr. Jorge Eduardo, pelo conhecimento que possui,
concordaria com as decisões tomadas pelo reclamante; que acredita que as formalidades
previstas das normas da empresa para alterações contratuais tenham sido observadas; que
com certeza perguntou ao reclamante se foram observadas as normas internas nessas
alterações contratuais; que o depoente não se lembra de ter assinado termos aditivos dessas
alterações contratuais; que o primeiro contrato foi feito por licitação via pregão e o
segundo emergencial; que ambos contratos foram feitos com a mesma empresa MTA salvo
contrato com a parte terrestre; que ao que se lembra os contratos falam em carga postal e
não entra no mérito se é PAC ou EXPRESSO; que não sabe dizer quantas aeronaves a
MTA tinha; que não sabe dizer quantas aeronaves ela precisava para cumprir os contratos

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com a reclamada; que não sabe dizer se já ocorreu de algum contrato feito por pregão ser
utilizado por dois meses" (grifou-se).
Percebe que o relato supra corrobora o histórico dos fatos, dos contratos e das
ações acima apresentadas e que se fundamentou na prova documental. Tal coerência
fortalece o depoimento como meio de prova, bem como a análise já feita nesta sentença.
A 1ª testemunha da reclamada Paulo Eduardo de Lima disse:
"Que trabalha na reclamada há 31 anos; que trabalhava em 2009/2010 na mesma gerência
que trabalha hoje, subordinado ao antigo DENAF; que em determinado período o
reclamante foi chefe do depoente; que acredita que no período 2009/2010 o reclamante não
tenha sido seu chefe, mas que não tem certeza porque houve muitas mudanças à época; que
do ponto de vista administrativo o depoente não teve acesso à informação de ter havido
uma crise em 2009/2010 mas que parece que sim; que pelo que lembra o depoente à época
havia uma linha efetiva na rota São Paulo-SP / Brasília-DF / Manaus e que houve
problema na empresa aérea e em razão disso houve uma tentativa de contratação de outra
empresa, tentativa que se mostrou fracassada, porque ao final foram contratadas duas
linhas com destino a Manaus; que pelo que se recorda foi contratada a mesma empresa;
que não participou diretamente da contratação mas como Gestor Administrativo teve certa
participação; que eram dois contratos e que pelo que se recorda um era emergencial e o
outro não; que esses contratos não tiveram duração longa, não chegaram a ultrapassar um
ano; que acredita que na época, como Gestor Administrativo as contratações realizadas
foram necessárias em face da distância e da inacessibilidade de Manaus por outro meio de
transporte; que a Gestão de Contratos é responsável por fazer a gestão do contrato sob o
ponto de vista administrativo, sob à luz da Lei 8.666; que em relação a esses contratos não
houve alterações contratuais para acréscimos ou supressões; que para interrupção de
contrato deveria ter uma formalidade; que a formalidade seria a solicitação para a
interrupção formal e que no caso não teve; que pelos manuais da empresa esta decisão é do
Gestor Operacional; que não se recorda se na época era o reclamante ou o Sr. Adelino; que
pela Lei 8.666 é necessário a formalização de acréscimo de carga em um contrato; que a
urgência ou a não-urgência da carga influenciam no preço do contrato e não propriamente
a sua característica; que um dos contratos pelo o que se recorda foi licitado por lote; que o
contrato por lote para ser acrescido precisa de uma análise jurídica da Lei 8.666 e por isso
deveriam passara pelo Departamento Jurídico da empresa em último estágio; que no caso
dos autos esse contrato não passou pelo Departamento Jurídico porque eles não chegaram a
ser formalizados; que na verdade, os contratos foram executados conforme a contratação
inicial e não houve qualquer alteração deles, por isso sequer foram instruídos e levados ao
Departamento Jurídico; que pelos dados do Processo a carga embarcada por Brasília-DF
para Manaus, via aérea, aumentou em quantidade mas que não sabe dizer se aumentou
valores, mas acredita que sim; que não havia outra opção de embarcar a carga para Manaus
à época; que na época havia dois contratos, de se embarcar via aérea por Brasília-DF e
outro por São Paulo-SP; que no caso de aumento de carga em um contrato o Gestor
Operacional não tem a obrigação de comunicar ao Gestor de Contrato, salvo se houver
necessidade de acréscimo, via termo aditivo, o que não ocorreu nos autos conforme prova
dos autos; que não importa o percentual da diferença paga a mais do quantitativo total para
o Gestor de Contrato ser comunicado, que em caso de necessidade de acréscimo do objeto
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contratado é que ele deve ser comunicado; que era o Gestor dos contratos 51 e 105; que
não se recorda dos valores globais dos contratos mas que eles não foram ultrapassados; que
os contratos 51 e 105 obedeceram os trâmites legais de contratação; que acredita que os
contratos 51 e 105 não discriminavam a expressão URGENTE ou NÃO-URGENTE; que
não sabe dizer se mencionava as expressões PAC e EXPRESSA; que acredita que esses
contratos eram pagos por cargas transportadas; que se for alterada a via de transporte de
aérea para terrestre o Operacional não precisava avisar a Gestão de Contratos; que se o
contrato deixar de ser utilizado ele também não precisa avisar; que a interrupção, não
utilização, suspensão do contrato é decisão do Gestor Operacional e a extinção/rescisão do
contrato deve ser comunicada ao Gestor Administrador; que com certeza a empresa MTA
sofreu aplicação de penalidade por parte da reclamada por iniciativa do reclamante".
(grifou-se).
Percebe-se que a testemunha Paulo Eduardo demonstrou-se mais esquecida dos
fatos, pois, por diversas vezes, disse que "acredita", "acha" e equivalentes. Todavia, seu
relato também tem amparo na prova documental produzida nos autos. Seu relato não
apresenta disparidade com outros relatos.
A 2ª testemunha da reclamada, o Sr. Sandro Soares Senseve trouxe a visão da
comissão que apurou as condutas do reclamante e seu relato também se mostra útil para
a solução da controvérsia:
"Que trabalha para a reclamada há 33 anos; que verificou que havia uma linha de
transporte de São Paulo-SP para Manaus transportando objeto não-urgente; que se
constatou que havia sido feito uma contratação emergencial de transporte de carga urgente
de Brasília-DF para Manaus em valor bem superior ao praticado lá em São Paulo-SP,
ocorre que essa carga de Brasília-DF para Manaus também transportou objetos não-
urgentes; que a justificativa para abrir a linha de Brasília-DF para Manaus foi a sobrecarga
do TECA São Paulo-SP; que três dias depois da utilização da linha Brasília-DF /Manaus
foi suspensa a linha a partir de São Paulo-SP para Manaus; que se a justificativa era sobre
cargas de trabalho deveriam ter sido mantidas as duas linhas; que foi feita uma
investigação sobre a razão disso acontecer e que a INFRAERO informou que a aeronave
que fazia a linha São Paulo-SP / Manaus é a mesma da que fazia Brasília-DF / Manaus;
que isso gerou um acréscimo de 400% no contrato bem além dos 25% que poderia ter feito
adicional e para a Comissão houve intenção do reclamante em direcionar a carga para esta
linha; que as investigações concluíram que o responsável por tal acréscimo foi o DENAF à
época chefiado pelo reclamante; que não chegou a apurar se houve algum cancelamento de
linha aérea para Manaus à época; que houve acúmulo de carga no TECA Guarulhos; que é
costume a reclamada fazer contratos emergenciais para vazão da carga acumulada; que o
que chama a atenção no caso dos autos é que ao mesmo tempo em que foi feito o contrato
emergencial houve o cancelamento da outra linha aérea quando o normal seria ambas
funcionarem até que o estrangulamento fosse sanado; que não era possível a MTA cumprir
ambos os contratos com apenas uma aeronave; que a decisão de embarque da carga em
Brasília-DF beneficiou a MTA; que a DENAF ordenou a interrupção do embarque da
carga pelo TECA Guarulhos; que acredita que seja porque apenas havia uma aeronave e
não havia condições de embarcá-la naquela linha pois a aeronave passou a ser utilizada na
outra linha; que houve acúmulo de objetos não-urgentes no Teca Guarulhos em função da
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desativação dessa linha; que a desativação de uma linha precisa de um procedimento


administrativo para ser válida; que isso não foi feito no caso; que já trabalhou por 12 anos
na área operacional da reclamada; que a decisão de desativação da linha foi do DENAF;
que anteriormente nos anos anteriores o Teca Guarulhos já estava com problema de
sobrecarga; que a decisão tomada pelo DENAF piorou o problema (de desativação da
linha) que se fosse mantida as duas linhas, atenuaria o problema; que a MTA tinha três
aeronaves, sendo uma apenas para Manaus e outra para outros destinos e a terceira de
reserva; que a desativação da linha diz respeito a sua não utilização; que não sabe dizer se
o Gerente do Teca Guarulhos foi ouvido; que o contrato administrativo 105 passou por
toda a estrutura administrativa dos Correios, inclusive COMEX; que já trabalhou em
terminal de carga, que já foi Gerente de Operações que comandava o Terminal de Carga de
Brasília-DF; que o reclamante foi punido por ter utilizado o contrato de carga por Brasília-
DF e por ter superado os 25% de acréscimo no contrato; que a segunda Comissão
inocentou o reclamante pelo acréscimo de 25% porque é uma prática da empresa quando se
vê diante de uma situação que exige uma decisão rápida para contingenciamento de uma
crise; que a razão da aplicação da "justa causa" foi o sobre preço na utilização dessa
segunda linha a partir de Brasília-DF; que o acréscimo superior aos 25% não foi motivo
para a "justa causa"; que não sabe dizer se foi aplicada alguma multa à empresa MTA; que
não sabe dizer se na época havia problema de malha aérea; que não sabe dizer se esse
problema na malha aérea foi a causadora do acúmulo de serviço narrado pela testemunha
Gerson, cujo trecho foi lido por esse Magistrado; que o colapso no Teca Guarulhos pode
causar prejuízo para a empresa em função de atrasos de encomendas, inclusive a imagem
da empresa; que a Comissão tem ciência de que havia sobrecarga do Terminal de
Guarulhos à época dos fatos; que o colapso do Teca Guarulhos causaria impacto na
distribuição de encomendas em todo o país; que a decisão de abrir a linha para Manaus a
partir de Brasília-DF está correta, o problema está na desativação da linha de São Paulo-SP
para Manaus; que a decisão de desativação da linha foi feita por ato formal do reclamante
após parecer da área a ele subordinado; que a justificativa constante do Parecer não era
plausível pois se referia ao tipo de carga a ser despachado e que isso poderia ser
identificada a separação do que era urgente e não-urgente". (grifou-se).
A testemunha Sandro também corroborou a prova documental já examinada e
seu relato apresenta coerência com ela, e com os demais relatos ouvidos. Todavia,
percebe-se que a Comissão concentrou suas atenções no prejuízo sofrido pela reclamada
e procurou aquele que, na sua visão, seria o responsável, por isso (tal como exposto no
início do tópico G). Desprezou a comissão aspectos fundamentais para a compreensão
completa do problema, presa à visão de que, havendo sobrecarga no TECA Guarulhos,
então a solução mais adequada seria manter ambas as linhas (a do Contrato 51 e a do
Contrato 105).
H.2. Análise da prova testemunhal
A prova testemunhal, no geral, deixa clara a situação particular e peculiar que
passou a reclamada no final de 2009 e início de 2010 e corroboram à conclusão de que o
reclamante não praticou qualquer ato de improbidade ou de indisciplina.

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H.2.1. Ato de gestão e quase colapso do TECA Guarulhos


Todas as testemunhas confirmam que o TECA de Guarulhos estava
sobrecarregado, como já constatado pelo TCU e pela CGU (item F.3 desta sentença). A
própria testemunha Sandro reconhece que o colapso nesse terminal tem repercussão
causaria impacto em toda a rede de distribuição da reclamada. O relato da testemunha
Gerson revela que esse terminal estava à beira do colapso, com risco de
desabastecimento de cidades. A testemunha Fábio relata os pedidos do TECA Guarulhos
para que o Denaf apresentasse uma solução para a carga com destino a Manaus e
pudessem superar o gargalo naquele terminal.
Diante da gravidade da situação, não pode o gestor público ficar paralisado para
ver o que acontece, com medo do TCU, da CGU ou do controle interno. É sua atribuição
decidir. Encontrar soluções para os problemas que, para muitos são de difícil solução e
para outros há sempre uma solução mágica, simplória e salvadora. Ser gestor é ter
responsabilidade, é assumir riscos. Sua conduta, porém, deve ser pautada pela ética,
pelo bem comum, visando o interesse público.
As normas nem sempre têm todas as soluções para as situações da vida (por isso
existem as chamadas lacunas normativas). Situações excepcionais e limites exigem
soluções engenhosas e práticas, para as quais a regra, muitas vezes, não previu de tão
inusitada a realidade cotidiana que grita por uma solução. Nesses casos, eventuais
ortodoxias de manuais de instrução (ou melhor, de regras) não solucionam o problema.
Felizmente, há muito tempo a escola hermenêutica francesa, na qual o Juiz (ou
qualquer aplicador do Direito) é a boca da lei, perdeu força e prestígio, especialmente
diante dos horrores do holocausto nazista, onde a alegação do estrito cumprimento do
dever legal levou o homem à bestialidade66.
Em tais situações, quando o manual não tem as soluções para o problema
concreto que urge solução, cabe a quem decide utilizar-se dos princípios que
fundamentam as normas (especialmente os do art. 37, caput, da Constituição), da
intenção do legislador, e agir com honestidade, lealdade e reta intenção, utilizando de
seus conhecimentos técnicos e práticos para conduzir e oferecer soluções que permitam
superar a situação de crise.
De fato, em um exame preliminar e superficial, não é comum ver uma contratação
por licitação pública ser utilizada por 2 (dois) meses. Também não é comum uma
dispensa de licitação substituir, na prática, um contrato celebrado após uma concorrência
pública. Todavia, também não é normal que as operações aéreas de carga que
movimenta 943 toneladas/dia (conforme TCU, fls. 532) em pouco tempo tenha mais da
metade de suas atividades paralisadas em curto intervalo de tempo afetando a vida de
milhares de pessoas e empresas que dependem da regularidade de seus serviços.
Também não é corriqueiro que cidades, que têm mais de 1 milhão de pessoas, como
Manaus, sofra risco de abastecimento em face da situação de quase colapso do maior
terminal de carga postal do país.

66
ARENDT, Hannah. Eichmann em Jerusalém: um relato sobre a banalidade do mal. São Paulo:
Companhia das Letras, 1999.
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A própria 1ª testemunha da reclamada reconheceu que ambas as contratações


acima mencionadas "foram necessárias em face da distância e da inacessibilidade de Manaus por
outro meio de transporte".
Como se não bastasse, ficou claro do relato das testemunhas trazidas pelo
reclamante, que este procurou adotar diversas medidas para sanar a crise. Procurou
obter um melhor aproveitamento econômico em benefício da reclamada, segundo o Jogo
1 - cenário 1 (item G.1.1.c desta sentença), ou diminuir a sobrecarga inicial do TECA
Brasília (testemunha Gerson), transferindo toda a carga urgente e não urgente com
destino a São Paulo para Manaus. Depois, ante o quase colapso do TECA Guarulhos,
passou a remeter a carga não urgente para MAO por BSB. Utilizou o Contrato 51 para
baratear os custos com VAC. Quando a antiga linha A3 foi paralisada, criou uma nova
linha (A12), remodelando a distribuição da carga, atento as capacidades das aeronaves e
das empresas aéreas disponíveis no mercado brasileiro (tabela 2), aproveitando estudo
feito pela auditoria independente Brain & Cia. (CD-ROM, fls. 1.517, Anexo 6). Diante do
insucesso dessa alternativa, dividiu a operação em lotes e conseguiu, rapidamente, êxito
com a formalização do Contrato 105/2010. Quando percebeu a operação deficitária da
vencedora do contrato (MTA) logo colocou na praça uma opção para essa linha e que
resultou no Contrato 189/2010.
Se as perguntas são: esse juízo vê improbidade na conduta do reclamante? O
reclamante agiu contrariamente aos interesses da reclamada, beneficiando a MTA, com o
deslocamento da carga não urgente com destino a Manaus via Brasília?
Como resposta, digo não.
O que vejo, então?
Vejo um administrador postal criativo, competente, ágil e que atuou em favor dos
interesses da reclamada e que tem uma visão do negócio além do que a reclamada
conseguiu ver. Onde a reclamada vê prejuízo, as testemunhas revelam um cenário
complexo.
Entre a opinião a fria, de uma lógica técnico-burocrática-administrativa, de que o
reclamante agiu contra os interesses da reclamada e em benefício da MTA, e a opinião
viva de quem esteve próximo aos fatos, pela sua atuação operacional-prática-vivencial,
fico, com todo respeito, com essa:
"que na visão do depoente a decisão do reclamante foi correta; [...] que o acontecido em
2009/2010, do tamanho que foi, foi excepcional; [...] que se a carga não urgente não fosse
enviada via terrestre o terminal entraria em colapso total; que além de multas o problema
da distribuição da carga poderia afetar o [des]abastecimento nas localidades" (testemunha
Gerson Gonçalves do Souza, grifou-se).
De fato, reza a técnica jurídica que merece especial atenção do julgador aquela
testemunha "que efetivamente presenciou os fatos ligados ao objeto da ação”67.

67
SAAD, Eduardo Gabriel. Direito Processual do Trabalho. 3ª Ed. São Paulo: LTr, 2002, p. 449.
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Por outro lado, se a testemunha que participou da apuração dos fatos "não sabe
dizer se foi aplicada alguma multa à empresa MTA; [...] não sabe dizer se na época havia problema
de malha aérea; [...] não sabe dizer se esse problema na malha aérea foi a causadora do acúmulo de
serviço narrado pela testemunha Gerson, cujo trecho foi lido por esse Magistrado" (grifou-se),
então: a) a reclamada não se desincumbiu do ônus de comprovar a justa causa aplicada,
nos termos dos já citados arts. 818 da CLT, 333 do CPC de 1973 e 373 do NCPC e dos
precedentes acima; b) a comissão disciplinar ignorou fatos e questões relevantes,
aduzidas na defesa administrativa, tornando a decisão administrativa nula, por
desfundamentação, a teor do disposto nos arts. 37, caput, e 93, X, da Constituição,
aplicável extensivamente ao processo disciplinar por força do art. 50, II, da Lei
9.784/1999; ou c) o desconhecimento das razões que motivaram a decisão do
reclamante, imputada como lesiva, afasta o justo motivo para a rescisão.
Em que pese à digressão acima acerca do eventual confronto entre regra x
princípio, ortodoxia x heterodoxia, norma x realidade, não encontro, nem mesmo na
Manorg, tão invocada pela reclamada, qualquer ofensa à normativa empresarial por parte
do reclamante. Ao contrário, o que se vê é que ele agiu dentro dos limites da legalidade,
tanto é assim que a testemunha Fábio revelou: "que a Diretoria de Operações considerou
adequadas as intervenções à época".
Não pode esse magistrado deixar de consignar a estranheza com a seguinte
declaração da testemunha Fábio: "que o depoente na época era o Superintendente Executivo da
Diretoria de Operações; que o depoente era o superior hierárquico do reclamante; que não foi
ouvido no PAD".
Como assim?! O chefe imediato do reclamante, que tem a competência legal,
normativa e hierárquica de avaliar a conduta do reclamante não foi ouvido?!?!?!
Poderia esse juízo explorar muitos outros elementos da prova testemunhal, mas a
1h30 da manhã de segunda-feira, após horas, dias e semanas de análise do feito, não há
muito mais a ser dito, apenas duas coisas mais.
A prova testemunhal, convergente quanto aos fatos apesar de pequenas
imprecisões e "achimos", e parcialmente discrepante relativamente ao enquadramento
dos fatos (que, no processo judicial, pelo princípio da adstrição, incumbe ao magistrado),
apenas corrobora os modelos matemáticos e os resultados lógicos expostos no item
G.1.1 e G.1.2 da sentença.
Embora não seja constitutivo do tipo legal de improbidade, não encontro qualquer
elemento que revele que o reclamante se beneficiou do fato a ele imputado. O Sr.
Eduardo Arthur Rodrigues, que a imprensa afirmou que seria agente do sócio oculto da
MTA (item A.2), somente tornou-se diretor da área na qual o Denaf em 2/8/2010. Antes
disso, a MTA já tinha perdido o direito de exploração da linha GRU-BSB-MAO, pois
perdeu a disputa que culminou com o Contrato 189/2010, quando a Rio foi declarada
vencedora em 14/7/2010, após a disputa no pregão eletrônico realizado em 8/7(cf. item
F.1.4 da decisão e arquivo "DECOD-0012-2011_Anexo-05_Vol-02_fls-0403-0791.pdf", pp.
12ss, do CD-ROM de fls. 1517).
AFASTO a configuração do ato de improbidade imputado ao reclamante.

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H.2.2. Não revogação expressa do Contrato 51/2010


Conforme exposto no item anterior, não encontro ofensa a qualquer normativo da
reclamada, apto a enseja a justa causa. Há apenas um demasiado apego, desde a fase
administrativa e também neste processo judicial, inclusive por ocasião da instrução
processual, à norma em detrimento da pessoa que faz ou que cumpre as normas; ou
melhor à formalidade em face da realidade.
Ocorre que na relação de emprego prepondera o princípio da primazia da
realidade, onde a realidade dos fatos tem maior relevância do que a formalidade dos atos.
Mesmo que assim não fosse, o Contrato 51/2010 é para VAC. O próprio TCU (fls.
537) reconheceu que tal espécie de transporte de carga postal é de caráter subsidiário (cf.
item B.1, desta sentença). Ora, se ele é subsidiário então somente ele é utilizado quando
o meio principal não funcional.
Assim, pouca relevância tem o fato da MTA utilizar a mesma aeronave que fazia o
trajeto GRU-MAO pelo Contrato 51 para executar o Contrato 105. Aliás, a comissão
esqueceu que depois o trecho GRU-BSB-MAO passou a ser executado pela Rio (Contrato
189/2010) e a reclamada poderia, até a declaração de idoneidade da MTA pelo Ministro
das Comunicações em 2011 utilizar-se do contrato 51/2010 para despachar cargas por
VAC. Nesse caso, não haveria uso da mesma aeronave.
Novamente aqui, a reclamada se apega a pormenores e ignora aspectos
fundamentais: a natureza jurídica do caráter subsidiário do Contrato 51/2010.
Conforme demonstrado anteriormente, a suspensão, a não utilização ou mesmo a
rescisão do Contrato 51/2010 não tem a menor relevância econômica. Observar ou não
uma formalidade menor e irrelevante em um momento de crise aérea em que o sistema,
que sofrera um apagão em março/2010 e estava à beira do colapso em maio/2010 é, data
máxima vênia, procurar pelo em ovo. Ficaria esse juízo mais preocupado se o reclamante
estivesse apegado a isso ao invés de resolver a crise e os problemas urgentes que
estavam na porta de sua sala (nesse caso, sim, poderia haver alguma falta funcional mais
relevante).
Além disso, a própria comissão de sindicância interpretou as normas de maneiras
distintas. A primeira conclusão entendia que o reclamante agiu mal ao anuir com a não
utilização do Contrato 51/2010 e a segunda de que ele cometeu ato, ao final enquadrado
como de indisciplina, em não rescindir formalmente referido contrato (cf. item D.1 desta
sentença). Tal contradição, como ressaltado no item D.3.2, não enseja a nulidade do
procedimento, mas enfraquece a tese da reclamada, pois revela que, no mínimo, a
questão acerca do destino do Contrato 51/2010 é meramente interpretativa e, sendo
interpretativa, não enseja violação literal da norma (a exemplo, aliás, do entendimento que
há muito tempo o TST tinha no exame de admissibilidade de Recurso de Revista na
antiga redação da sua Súmula 221).
Por fim, para não dizerem que esse Juiz é rebelde e não observa as normas
internas da reclamada. O item 6.2.1 do Mancod de 2012 estabelece que, "desde que as
circunstâncias não justifiquem a imposição de penalidade mais grave, a advertência poderá ser

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aplicadas nos casos de descumprimento dos deveres constantes das alíneas [...] w, [...] do subitem
2.1 [...] do Capítulo 2, Módulo 46 do Mampes" (fls. 1.531).
Ora, afastada a circunstância que impunha a penalidade mais grave (o alegado
ato de improbidade) então não subsiste o fundamento para, em conjugação com aquele,
impor ao reclamante a pena mais grave. Em outras palavras, afastado o ato de
improbidade, a norma interna da reclamada repele a aplicação da justa causa em face do
alegado ato de indisciplina.
Aliás, a própria dogmática jurídica é uníssona, no sentido que o ato de indisciplina
por descumprimento de ordens gerais internas deve observar a proporcionalidade das
punições, como, aliás, bem exposto, no particular, na petição inicial.
AFASTO a aplicação da justa causa por ato de indisciplina.
Conclusão
Portanto, não subsistindo os vícios alegados pelo reclamante, JULGO
IMPROCEDENTE o pedido de nulidade do processo administrativo.
Todavia, não procede a justa causa aplicada ao reclamante porque,
sinteticamente: a) há o perdão tácito em face da inobservância da razoável duração do
processo administrativo e do prazo prescricional para a prática de ato rescisório de 2 anos
(arts. 5º, LXXVIII, e 7º, XXIX, da Constituição Federal e 11 da CLT); b) a decisão do
reclamante de transferir a carga não urgente com destino a Manaus por Brasília pela
execução do Contrato 105/2010 não constituiu, à luz do exame das opções que dispunha
a partir da teoria dos jogos, ato de improbidade administrativa; c) a eventual não
formalização da rescisão do Contrato 51/2010, mas sua suspensão/inexecução, não
constitui ato de indisciplina, à luz da Análise Econômica do Direito, porque irrelevante do
ponto econômico e jurídico; d) as provas documental e testemunhal revelaram que o
reclamante agiu para prevenir o colapso da distribuição de cargas aéreas da RPN no
principal nó, hub, de sua rede situado no TECA de Guarulhos, com impacto e prejuízo
para toda a malha aérea da reclamada; e) o próprio superior hierárquico do reclamante e
o gerente do TECA Guarulhos (testemunhas trazidas pelo reclamante) , estando mais
próximas dos fatos, confirmaram o acerto da decisão do reclamante; f) a reclamada, ao
ignorar fato relevante da defesa administrativa, não se desincumbiu do ônus de
comprovar, que o ato praticado pelo reclamante, no contexto de quase colapso/saturação
do TECA Guarulhos, constitui falta grave (arts. 818 da CLT, 333 do CPC de 1973 e 373
do NCPC); g) a comissão disciplinar, ao ignorar fatos e questões relevantes aduzidas na
defesa administrativa, tornou a decisão que aplicou as penalidades nulas por
desfundamentação (arts. 37, caput, e 93, X, da Constituição, aplicável extensivamente ao
processo disciplinar por força do art. 50, II, da Lei 9.784/1999); h) o desconhecimento pela
reclamada das razões que motivaram a decisão tomada pelo reclamante, imputada como
lesiva, afasta o justo motivo para a rescisão; i) preponderância do princípio da primazia da
realidade sobre a formalidade quanto ao Contrato 51; j) o caráter subsidiário do objeto do
Contrato 51 (VAC), conforme ressaltado pelo TCU; k) a divergência da interpretação das
normas a que deveriam ser observadas pela própria sindicância de apuração das
penalidades; l) afastada a improbidade, não foi observada a proporcionalidade, inclusive
estabelecida em norma interna da reclamada (item 6.2.1, Mancod).
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Ante a incidência da teoria dos motivos determinantes, o disposto em norma


interna da reclamada e nos termos da Súmula 77 do TST, JULGO PARCIALMENTE
PROCEDENTE o pedido para, afastando a justa causa aplicada e os atos de improbidade
e indisciplina, determinar a reintegração do reclamante no emprego, no prazo de 8 (oito)
dias a contar da ciência da reclamada desta sentença. Nesse sentido, presentes os
requisitos legais, conforme farta fundamentação ora exposta, CONCEDO a antecipação
de tutela requerida.
EXPEÇA-SE o competente mandado de reintegração.
JULGO PROCEDENTE o pedido, ainda, para determinar o pagamento dos
salários deste a demissão até sua efetiva reintegração.
Concedida a reintegração, JULGO PREJUDICADO o pedido de reversão da justa
causa em dispensa sem justa causa e o pagamento das verbas daí decorrentes.
Deverão as partes informar esse juízo acerca da data da reintegração, bem como
trazer aos autos os últimos contracheques, a fim de possibilitar a liquidação do julgado.
Ante o constatado no item G.1.1.e desta sentença, em especial na conclusão
desse item, e o potencial lesivo das práticas e situações ali relatadas passíveis de ocorrer
em diversos órgãos públicos federais, bem como a excelência dos serviços prestados
pela CGU e pela alta competência de seu corpo funcional, EXPEÇA-SE ofício ao
Ministério da Transparência, com cópia desta sentença (inclusive anexo), para que avalie
a conveniência de: a) avaliar e propor mecanismos eficazes de proteção ao Erário de
situações de monopólio circunstancial e de estratégias dominantes por quem celebra
contratos com a Administração Pública Federal em todos os seus âmbitos, inclusive com
reforço das garantias e de penalidades para que possam assegurar o efetivo cumprimento
do contrato administrativo; b) expedir orientações às áreas estratégicas dos órgãos da
Administração Pública Direta, Indireta e autárquica para que possam identificar situações
de dominação econômica por parte contratante antes que causem prejuízo ao Erário.
Dizem que Juiz não recomenda. Porém, a palavra "sentença" vem de sentir e a
sentença não pode ser omissa. Assim, SUGIRO à reclamada, caso o reclamante tenha
interesse, que, uma vez cumprida a reintegração ora determinada, seja ele lotado junto a
Vice-Presidência de Operações, cuja experiência e vivência poderá ser muito útil à
reclamada.
SUGIRO, ainda, que a reclamada desenvolva programa de qualificação avançado
em gerência de crise, de identificação de situações de monopólio circunstancial e de
análise de comportamento estratégico/estratégia dominante, com o exame da
possibilidade de inclusão do reclamante, caso ele queira, em cursos para os novos
administradores postais para que possa transmitir sua experiência e conhecimento e,
assim, colaborar para que a reclamada continue sendo um grande orgulho para todos os
brasileiros, inclusive desse magistrado.
Saliente-se que, apesar da firmeza dos fundamentos desta sentença, não vai aqui
qualquer desprezo ou depreciação das comissões de sindicância e disciplinar. Ao
contrário, esse magistrado reconhece o empenho e o afinco que ambas as comissões
trabalharam, ao produzirem e analisarem 26 volumes de documentos durante 4 anos de
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árduo trabalho, em especial considerando a expectativa/pressão/satisfação que tinham


que prestar ao TCU, CGU e a própria reclamada e. quiça, à imprensa e à sociedade, ante
a ampla repercussão social dos fatos que culminaram com o presente feito.
Na verdade, esse magistrado fica feliz em saber que o rigor e a seriedade da
apuração são pressupostos dos responsáveis pela apuração disciplinar e por ter
constatado que, de fato, a comissão de apuração tem o firme convencimento da correção
da decisão que aplicou a justa causa ao reclamante. Convicção cada um tem a sua e não
pretende esse magistrado mudar o convencimento de ninguém, nem se tem a ousadia de,
apesar de ter algumas, fazer sugestão para a Codis. Creio que o próprio exame dessa
sentença pela Codis poderá, de algum modo, trazer alguma reflexão útil. Apenas ressalto
que, talvez, seja interessante a reclamada avaliar também a participação de membros da
Codis e dos profissionais que atuaram em ambas as comissões nos programas de
qualificação/cursos acima referidos, seja para fazer o necessário contraponto, seja para
orientar os profissionais da reclamada acerca da postura que devem ter, na visão da
Codis, em situações limites e/ou difíceis com a que passou a reclamada entre fins de
2009 e início de 2010.
Por fim, acredita esse magistrado que a reintegração do reclamante não é apenas
uma questão de direito em face dos inúmeros fundamentos acima expostos, mas é
medida de Justiça a quem não cometeu qualquer ato danoso à reclamada e sim, ao
contrário, agiu na salvaguarda dos interesses da reclamada.

9. DEVOLUÇÃO DO PREJUÍZO À RECLAMADA. INDENIZAÇÃO


EM DOBRO.
Conforme demonstrado exaustivamente anteriormente, o reclamante não causou
prejuízo à reclamada. Ao contrário, o cenário 3 do jogo 1 demonstra que sua conduta foi
dirigida a produzir o melhor aproveitamento econômico em favor da reclamada, dentre as
opções disponíveis em um contexto de monopólico situacional, baixa taxa de eficiência do
Contrato 105/2010, da saturação do TECA de Guarulhos. Nesse contexto, o reclamante
não foi o causador do dano alegado pela reclamada. Tanto ele quanto os Correios ficaram
presos a uma estratégia dominante praticada ou resultada, voluntaria ou
involuntariamente, pela MTA.
O jogo demonstrou que para situações normais os estímulos/desestímulos
previstos nos Contratos 51 e 105/2010 estavam adequadas. Por isso, em situações
extremas, imprevisíveis e alheias a vontade do reclamante afastam qualquer imputação
de culpa ou dolo nos atos que praticou.
Na verdade, o jogo revelou que, naquele cenário, não havia sequer evento
danoso por parte do reclamante que, na verdade, procurou obter o melhor resultado
possível para a peculiar situação vivida.
Ausentes os requisitos do arts. 186 e 927 do Código Civil, JULGO PROCEDENTE
o pedido para reconhecer, com efeito ex tunc, a inexistência de dívida do reclamante para
com a reclamada.

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Diante disso, DETERMINO a exclusão do nome reclamante do CADIN em razão


da referida dívida e torno sem efeito todo e qualquer ato atinente a sua inclusão no
referido cadastro.
FICA a reclamada proibida de efetuar qualquer desconto no contracheque do
reclamante a respeito dessa dívida e obrigada a devolver qualquer importância
descontada do reclamante.
Particularmente esse juízo entende não ser aplicável à relação de trabalho o
disposto no art. 940 do Código Civil. É comum haver Reclamação Trabalhista em que o
reclamante postula vantagem já paga e, nem por isso, essa Justiça Especial o condena a
restituir ao reclamado o que foi pago, em dobro. Isso porque nem sempre o reclamante ou
seu advogado tem acesso a toda documentação sobre as verbas pagas no contrato de
trabalho e a energia e o esforço gasto pelo trabalhador não pode ser restituído. Por isso,
há, na prática das relações trabalhistas, dificuldades na aplicação concreta do dispositivo.
Ora, se ele não poderia ser aplicada em favor do empregador, também não seria na
situação oposta, pois é a lacuna do Direito que justifica a integração da norma trabalhista
e não o favorecido por tal integração.
Na verdade, esse dispositivo do Código Civil tem como finalidade inibir a má-fé
objetiva, na qual uma das partes procura obter da outra uma vantagem que se tornou
indevida, por já ter recebido, repelindo o enriquecimento sem causa.
A situação dos autos é absolutamente diversa. Em que pese esse Juiz
reconhecer a improcedência da dívida e a correção da conduta da reclamada. Não se
trata aqui de dívida paga em que há cobrança do que já foi quitado, tampouco de má-fé
da reclamada, muito menos ainda de tentativa de enriquecimento sem causa.
A reclamada, contabilmente, identificou uma perda de faturamento (prejuízo
técnico, contábil, operacional ou outras espécies de perda financeira). Verificou que, como
o Contrato foi cumprido, não se poderia imputar a MTA por receber o valor contratado.
Como o reclamante foi que autorizou, na concepção da reclamada, a execução mais
gravosa então estariam presentes os requisitos da responsabilidade civil: dano, nexo de
causalidade e culpa.
Ora, o mero exercício do um direito por quem realmente acredita possuí-lo não é
má-fé, ainda que, judicialmente, não seja ele reconhecido como tal.
JULGO IMPROCEDENTE o pedido de pagamento de indenização dobrada do
valor do débito apurado pela reclamada.

10. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL


O mero fato da reclamada, no exercício de um direito que acredita possuir, aplicar
a justa causa ao reclamante, ainda que por improbidade, afastada por esse juízo, não
conduz necessariamente à conclusão de que é devida a indenização postulada
Compreendo a angústia, o sentimento de vazio, a descrença que, eventualmente
possa ter acometido o reclamante, bem como a profunda sensação de injustiça e de falta
de reconhecimento de quem acredita que tomou as melhores decisões em favor da
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reclamada. Tais sensações, em que pese causar abalo psicológico, sentimento de


impotência e, até dificuldades, em relação aos familiares e amigos próximos causam, sem
duvida alguma, dano ao plexo de valores morais de quem está vivendo uma situação
humilhante e constrangedora.
Todavia, para efeito de reparação civil, não basta o evidente dano ou o nexo de
causalidade de serem eles advindos da justa causa e da demissão porque passou. A
questão central está na culpa. A reparação, nesses casos, não tem caráter meramente
objetivo, na qual caracterizado o dano e o nexo, é devida a reparação, mas necessita do
elemento objetivo. É necessária a prova da culpa.
Não encontro nos autos elemento que demonstre que a reclamada agiu com dolo
ou com culpa. Ao contrário, a reclamada realmente acredita na culpa do reclamante. A
testemunha Sandro, que participou da apuração dos fatos, revela a certeza pela correção
da pena aplicada. De fato, por uma análise meramente contábil, sob o ângulo de uma
auditagem, houve prejuízo e o responsável por ele seria o reclamante. Isso é cristalino
para a reclamada que acredita, realmente, que está se utilizando de uma prerrogativa
que, de fato, a lei lhe dá: dispensar por justa causa empregado que, após apuração em
processo disciplinar foi considerado culpado por ato de improbidade.
Somente com uma análise científica das ações, estratégias e resultados, à luz de
uma avançada teoria, que poucos operadores do Direito no Brasil conhecem, é que ficou
clara a correção de suas decisões. Também a prova testemunhal corroborou o que a
matemática aplicada desnudou. Mas ela, só foi produzida em juízo, uma vez que o
reclamante, na oportunidade que teve no processo administrativo, não requereu a oitiva
de testemunhas, nem a reinquirição.
Nesse contexto, não encontro culpa, dolo ou má-fé da reclamada.
A longa duração do processo disciplina, incluindo aí a fase de sindicância, pode, é
verdade, caracterizar assédio moral. Uma perseguição reiterada no tempo, onde o
empregado está sempre com uma faca no pescoço. Mas, no caso dos autos, o próprio
reclamante, em sua petição inicial, deixa claro que durante a apuração continuou a
participar de decisões estratégicas da reclamada, tanto é assim que postula o perdão
tácito. Ou seja, ele não foi preterido, nem perseguido, nem humilhado durante o curso da
apuração. Não houve condenação prévia, mas foi-lhe assegurado o princípio da
presunção de inocência.
Diante disso, em que pese a consideração do juízo pelo sofrimento que tem
passado o reclamante, JULGO IMPROCEDENTE o pedido de indenização por dano
moral.
Todavia, apesar de não compensar os males vivenciados por que agiu
corretamente, não pode deixar esse Juízo passar em branco, o que foi visto e analisado
nesses autos, com o rigor e a frieza da matemática: a excepcional conduta do reclamante
durante a crise que abateu sobre a reclamada.
Considerando o teor dessa sentença, em especial a análise científica da conduta
do reclamante, DETERMINO, de ofício, que seja inscrito nos assentamentos funcionais de
, elogio do Juízo da 3ª Vara do Trabalho de Brasília-DF pela
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capacidade, agilidade, preparo e empenho na sua atuação como diretor do Denaf no 1º


semestre de 2010 e na correta defesa dos interesses da reclamada.
Oficie-se ao Presidente dos Correios para que cumpra a determinação de elogio
e tome ciência das sugestões descritas na conclusão do tema 8.

11. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA


Sobre o montante da condenação incidirão juros e atualização monetária até a
data do efetivo pagamento.
Os juros moratórios, a teor do art. 883 da CLT, serão apurados a partir da data do
ajuizamento da ação. Considerando o julgamento da ADIn 4425 pelo STF, aplica-se à
reclamada o percentual de 1% de juros ao mês.
A correção monetária observará os termos da Lei 8.177/91, da Súmula 381 do
TST e da legislação específica, inclusive quanto à época própria de sua incidência e o
índice a ser aplicado na atualização dos valores devidos (índices oficiais da Justiça do
Trabalho).

12. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA E FISCAL


Em obediência ao disposto no art. 832, § 3º, da CLT e considerando o disposto no
art. 214 do Decreto 3.048/1999, declara-se sujeita à contribuição previdenciária a
condenação pecuniária ora imposta.
Os descontos previdenciários devidos serão recolhidos, mês a mês, sobre as
parcelas salariais ora discriminadas, observando-se o limite máximo do salário-de-
contribuição, a cota de cada parte e a correta identificação do reclamante, sob pena de
execução direta pela quantia equivalente. Não haverá recolhimento em favor de terceiros.
Os descontos fiscais sobre as parcelas salariais deferidas deverão ser apurados e
recolhidos na forma da lei e da jurisprudência consolidada do TST.

13. FORMA DE EXECUÇÃO. CUSTAS.


Em face do entendimento oriundo do STF, a execução dos valores pretéritos
deverá ser feito mediante Precatório ou RPV, em que pese a ressalva do entendimento
desse juízo. Pela mesma razão está a reclamada dispensado do pagamento das custas.

DISPOSITIVO

ANTE O EXPOSTO, nos termos da fundamentação supra, que integra esse


dispositivo para todos os efeitos legais, na Reclamação Trabalhista proposta por
em desfavor de Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos,
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JULGO EXTINTO, sem resolução do mérito, o pedido de pagamento de "todos os


valores, vantagens, benefícios e direitos", "mas sem limitar" e "etc.", por inépcia, JULGO
EXTINTO, sem resolução do mérito, o pedido de condenação da reclamada no
pagamento de multa astreintes de R$ 10.000,00 reversível ao FAT, por ilegitimidade ativa
do reclamante, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido para:

 afastando a justa causa aplicada, determinar a reintegração do reclamante


no emprego, no prazo de 8 (oito) dias a contar da ciência da reclamada
desta sentença;
 determinar o pagamento dos salários deste a demissão até sua efetiva
reintegração..

Arbitro a condenação no valor de R$ 30.000,00. Custas pela reclamada no valor


de R$ 600,00, cujo pagamento está dispensado em face dos benefícios que lhe foram
concedidos pela jurisprudência dominante.
EXPEÇA-SE o competente mandado de reintegração.
EXPEÇA-SE ofício ao Ministério da Transparência, com cópia desta sentença
(inclusive anexo), para que avalie a conveniência de: a) avaliar e propor mecanismos
eficazes de proteção ao Erário de situações de monopólio circunstancial e de estratégias
dominantes por quem celebra contratos com a Administração Pública Federal em todos
os seus âmbitos, inclusive com reforço das garantias e de penalidades para que possam
assegurar o efetivo cumprimento do contrato administrativo; b) expedir orientações às
áreas estratégicas dos órgãos da Administração Pública Direta, Indireta e autárquica para
que possam identificar situações de dominação econômica por parte contratante antes
que causem prejuízo ao Erário.
DETERMINO, de ofício, que seja inscrito nos assentamentos funcionais de
elogio do Juízo da 3ª Vara do Trabalho de Brasília-DF pela
capacidade, agilidade, preparo e empenho na sua atuação como diretor do Denaf no 1º
semestre de 2010 e na correta defesa dos interesses da reclamada.
Oficie-se ao Presidente dos Correios para que cumpra a determinação de elogio
e tome ciência das sugestões constantes da fundamentação (conclusão do tema 8).
Apurem-se os juros, a correção monetária, a contribuição previdenciária e os
descontos fiscais na forma estabelecida na fundamentação.
DETERMINO a inutilização da fl. 1.084, com a colocação da indicação de "em
branco" ou "sem efeito".
Alterada a data do julgamento, intimem-se as partes.

Gustavo Carvalho Chehab


Juiz do Trabalho Substituto

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ANEXO I - PAYOFFS DO JOGO 1

Ante os parâmetros de cálculos fixados no item G.1.1.b são os seguintes os


payoffs possíveis para o Jogo 1:

Tabela 15: tabelas de payoffs (resultados) aplicado nos diversos cenários do Jogo 1
Payoffs
Favorecido Síntese da fórmula de cálculo de cada payoff
(R$/Kg)
ganho pela tarifa cobrada ao cliente da reclamada (8,67) menos a despesa
6,68 reclamante
com a linha GRU-MAO pelo uso do Contrato 105/2010 (-1,99)
ganho pela tarifa cobrada do cliente (8,67) menos a despesa com a linha
6,43 reclamante
GRU-MAO pelo Contrato 51/2010 (-2,24)
ganho pela tarifa cobrada do cliente (8,67) e o custo médio da VAC em
5,525 reclamante
outras empresas aéreas (-3,145)
ganho pela tarifa cobrada do cliente (8,67) e a despesa com a linha GRU-
5,17 reclamante MAO pago à 2ª colocada na Dispensa de Licitação que originou o Contrato
105 (-3,50)
ganho pela tarifa cobrada do cliente (8,67) e a despesa com a linha BSB-
4,97 reclamante
MAO pelo uso do Contrato 105/2010 (-3,70)
ganho pela tarifa cobrada (8,67) reduzida de 30,4% pela saturação da
4,04 reclamante carga no TECA Guarulhos (-30,4%) e menos a despesa com a linha GRU-
MAO pelo uso do Contrato 105/2010 (-1,99)
ganho pela tarifa cobrada (8,67) reduzida de 30,4% pela saturação da
3,79 reclamante carga no TECA Guarulhos (-30,4%) e menos a despesa com a linha GRU-
MAO pelo uso do Contrato 51/2010 (-2,24)
faturamento pela carga transportada no trajeto BSB-MAO pelo Contrato
3,70 MTA
105/2010
faturamento pela carga transportada no trajeto BSB-MAO (3,70) menos
2,59/3,515 MTA
multas pelo atraso/cancelamento no Contrato 105/2010 (de -5% a -30%)
ganho pela tarifa cobrada (8,67) reduzida de 30,4% pela saturação da
carga no TECA Guarulhos (-30,4%) e menos a despesa com a linha GRU-
2,53 reclamante
MAO pago à 2ª colocada na Dispensa de Licitação que originou o Contrato
105 (-3,50)
ganho pela tarifa cobrada (8,67) reduzida de 30,4% pela saturação da
carga no TECA Guarulhos (-30,4%), menos a despesa média do VAC em
2,44 reclamante
outras empresas aéreas (-3,145), com o impacto pelo acréscimo da tarifa
aérea pela concentração de mercado (-14,4%) [1,144*3,145*(-1)]
faturamento pela carga transportada no trajeto GRU-MAO pelo Contrato
2,24 MTA
51/2010 (2,24)
faturamento pela carga transportada no trecho BSB-MAO (3,70) menos
2,307/3,60 MTA multas pelo atraso/cancelamento no trecho no trajeto GRU-MAO do
Contrato 105/2010 [1,99*(de -5% a -30%)}
faturamento pela carga transportada no trajeto GRU-MAO pelo Contrato
1,99 MTA
105/2010 (1,99)
faturamento pela carga transportada no trajeto GRU-MAO pelo Contrato
1,643/2,14 MTA 51/2010 (2,24) menos multas pelo atraso/cancelamento no trecho no
trajeto GRU-MAO do Contrato 105/2010 (de -5% a -30%)
faturamento pela carga transportada no trajeto GRU-MAO pelo Contrato
1,393/1,89 MTA 105/2010 (1,99) menos multas pelo atraso/cancelamento no trecho no
trajeto GRU-MAO do Contrato 105/2010 (de -5% a -30%)
1,344/2,128 MTA faturamento pela carga transportada no trajeto GRU-MAO (2,24) menos
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REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL
PODER JUDICIÁRIO DA UNIÃO
JUSTIÇA DO TRABALHO
TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO
3ª VARA DO TRABALHO DE BRASÍLIA-DF
Sentença do Processo nº 1138-67.2015.5.10.0003
multas pelo atraso/cancelamento no Contrato 51/2010 (de -5% a -40%)
faturamento pela carga transportada no trecho BSB-MAO (3,70) menos
multas pelo atraso/cancelamento no trecho no trajeto GRU-MAO do
1,197/3,415 MTA Contrato 105/2010 [1,99*(de -5% a -30%)}, menos multas pelo
atraso/cancelamento no trecho no trajeto BSB-MAO do Contrato 105/2010
[1,99*(de -5% a -30%)]
faturamento pela carga transportada no trajeto GRU-MAO pelo Contrato
51/2010 (2,24) menos multas pelo atraso/cancelamento no trecho no
0,986/2,033 MTA trajeto GRU-MAO do Contrato 105/2010 [1,99*(de -5% a -30%)], menos a
multa multas pelo atraso/cancelamento do Contrato 51/2010 [2,24*(de -5%
a -40%)]
faturamento pela carga transportada no trecho GRU-MAO no Contrato 105
(1,99) menos duas vezes as multas pelo atraso/cancelamento no trecho no
0,497/1,79 MTA
trajeto GRU-MAO do Contrato 105/2010 [2*(de -5% a -30%)] pelo 2º
atraso/cancelamento no transporte dessa carga nesse trajeto
reclamante sem ganhos ou perda
0
/MTA
-8,67 reclamante Perda pela devolução da tarifa paga (-8,67)

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