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LEGISLAÇÃO EXTRAVAGANTE

SISTEMA PIRAMIDAL

Autor: Wilson de Paulo Ribeiro

RESUMO
Crimes contra a Economia Popular, contra o Sistema Econômico e contra a Ordem
Financeira.

Palavras-chave: Pirâmide Financeira. Marketing Multi Nível. Altos Ganhos. Judiciário


Nacional. TelexFree. Boi Gordo. BBom. Madoff. Sistema Ponzi.

Estudante de Direito. email: wilson.ribeiro@gmail.com


Artigo apresentado a Faculdade Interamericana de Porto Velho - UNIRON, como trabalho
complementar para na matéria de Legislação Extravagante, sob a égide do Professor Cesar Jacques.
Porto Velho, 2019.
1 INTRUDUÇÃO

Este presente artigo não visa explicar em detalhes como funciona o sistema de
pirâmide financeira, apenas explicar o básico de seu funcionamento e como isso prejudica as
pessoas, tanto de forma individual, quanto em sua coletividade, por também afeta seu entorno
não se limitando apenas ao envolvido direto, abordará também as Leis brasileiras que podem
ser aplicadas no combate ao sistema piramidal, já que ainda não há uma legislação que trate
diretamente deste assunto.

2 A ORIGEM DO SISTEMA PIRAMIDAL

Historicamente, a Pirâmide Financeira surgiu antes da ideia de Marketing Multinível.


Charles Ponzi foi um dos primeiros a construir um esquema piramidal com fim de lucro.
Nascido em 1882, Ponzi um italiano legítimo, decidiu em 1902 partir para os Estados Unidos
em busca de oportunidades.

Criou um esquema baseado em empréstimos e compra e venda de selos postais,


adquiridos no exterior por preços menores e revendidos nos EUA por preços exorbitantes
considerando os originais. No entanto, o que fazia de fato no negócio render era a admissão
de novos sócios. Ou seja, aqueles que entravam e 42 “emprestavam” dinheiro, serviam para
pagar o lucro prometido aos primeiros que financiaram a empreitada. Um legítimo esquema
piramidal.

Charles Ponzi cuidava da admissão de cada novo integrante, contudo, a partir do


momento em que, novos investidores não eram encontrados, o sistema entrou em colapso (já
que obviamente a venda de selos era só fachada para o esquema piramidal, conhecido como
Esquema de Ponzi).

Ao final, Charles Ponzi, segundo Alexandre Versignassi e Cristine Kistmuito (2014,


s.p.), ganhou muito dinheiro com sua empreitada piramidal, mas perdeu tudo, terminando a
vida na miséria, sem quase nenhum bem material.

Sua “primeira Pirâmide” (como já relatado não era exatamente o esquema que hoje
conhecemos como Pirâmide Financeira, mas sim o início de sua construção) data de 1920, no
entanto, como ele mesmo relatou na época, já havia cometido delito semelhante, no Canadá,
em 1908, como observado por Marcos Duda, em seu artigo “Marketing Multinível x Pirâmide
Financeira” (2013, s.p.).

Nos anos 50 surgiram novos casos nos EUA, o famoso caso da banqueira "Dona
Branca, a banqueira do povo", e recentemente o mais famoso deles, que culminou com a
condenação do investidor de Wall Street, Bernard Madoff, cujas investigações mostraram
uma movimentação de U$$ 65 bilhões. Madoff foi condenado em 2009 a 150 anos de prisão,
sem direito a condicional.

Nota-se que Pirâmide Financeira é um golpe antigo ainda aplicado nos dias de hoje,
aliás, munido de um misto de curiosidade com extrema popularidade, que oferece

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possibilidade de sucesso apenas no início da empreitada, pois, o sistema piramidal, sempre
irá ruir.

3 OS ESQUEMAS DE PIRAMIDE NO BRASIL

Nos anos 2000 apareceu no Brasil o famoso caso das fazendas de engorda de bovinos,
a Fazendas Reunidas Boi Gordo, ela foi montada por Paulo Roberto de Andrade, de Santa
Cruz do Rio Pardo. Historicamente, a engorda de bois rende 10% em 18 meses. A Boi Gordo
oferecia aos investidores a possibilidade de ganhos de 38% ao ano. Era o velho esquema da
pirâmide, na qual o dinheiro dos que entravam bancava os investimentos dos primeiros que
entraram no jogo. A diferença da TelexFree é que, no caso da Boi Gordo, havia alguns ativos
– fazendas e rebanhos – de garantia, embora insignificantes perto do rombo que deixou no
mercado. O prejuízo atingiu 30 mil clientes. Até abril de 2004, chegava a R$ 2,5 bilhões de
reais.

Não muito tempo após o caso da engorda de bovinos, surgiu no Brasil a TelexFree,
diferente dos investidores da Boi Gordo, que geralmente eram pecuaristas, a TelexFree
envolvia gente simples, gente que ganhava pouco e na ânsia de ver seu pouco dinheiro render
um pouco mais, acreditava nas promessas de mais uma pirâmide financeira. Pessoas que
vendiam suas poucas posses pra investir em promessa de lucro certo e maior dos que eram
oferecidos pelo sistema bancário brasileiro.

O sistema piramidal da TelexFree chegou a movimentar um total de R$ 800 milhões


em todo o Brasil e já estava criando tentáculos na Europa e América Central, mas foi
interrompida pelo Ministério Publico Federal do Acre, e logo depois as investigações
mostraram o real estrago que eles tinham provocado, a enxurrada de pessoas querendo seus
investimentos de volta, mas nada conseguindo. A perspectiva dos donos da TelexFree, o
capixaba Carlos Wanzeler e o norte-americano James Merril era de atingirem a incrível cifra
de R$ 3 bilhões.

4 AS LEIS BRASILEIRAS QUE PODEM SER USADAS NO COMBATE AO


SISTEMA PIRAMIDAL

Além dos danos materiais e psicológicos que geralmente causam os sistemas de


pirâmides financeiras aos envolvidos, nosso sistema penal é brando e antigo, não havendo
legislação específica que trate do assunto, mas para suprir a inércia do legislativo tupiniquim
em relação a esse assunto, a justiça tem tomado algumas decisões em relação a esse assunto,
responsabilizando alguns autores e mentores de golpes financeiros fazendo uso de outros
fundamentos legais, além da já conhecida capitulação do crime contra a Economia Popular.

Várias leis têm sido aplicadas pelo judiciário nacional a mentores desse tipo, que mesmo
ainda não tipificado como crime, tem mostrado seu extremo potencial danoso.

4.1 AS LEIS

Lei nº 7.492/1986
Define os crimes contra o Sistema Financeiro Nacional

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Art. 16. Fazer operar, sem a devida autorização, ou com autorização obtida mediante
declaração falsa, instituição financeira, inclusive de distribuição de valores mobiliários ou de
câmbio:
Pena – Reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

Lei nº 1.521/1951
Crimes contra a Economia Popular
Art. 2º São crimes desta natureza:
IX – obter ou tentar obter ganhos ilícitos em detrimento do povo ou de número indeterminado
de pessoas mediante especulações ou processos fraudulentos (“bola de neve”, “cadeias”,
“pichardismo” e quaisquer outros equivalentes).

Lei nº 6.385/1976
Crimes contra o Mercado de Capitais
Art. 27-E. Atuar, ainda que a título gratuito, no mercado de valores mobiliários, como
instituição integrante do sistema de distribuição, administrador de carteira coletiva ou
individual, agente autônomo de investimento, auditor independente, analista de valores
mobiliários, agente fiduciário ou exercer qualquer cargo, profissão, atividade ou função, sem
estar, para esse fim, autorizado ou registrado junto à autoridade administrativa competente,
quando exigido por lei ou regulamento:
Pena – detenção de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.

Lei nº 8.137/1990
Crimes contra a Ordem Econômica
Art. 7°. Constitui crime contra as relações de consumo:
VII – induzir o consumidor ou usuário a erro, por via de indicação ou afirmação falsa ou
enganosa sobre a natureza, qualidade do bem ou serviço, utilizando-se de qualquer meio,
inclusive a veiculação ou divulgação publicitária;
[…]
Pena – detenção, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, ou multa.

4.2 CÓDIGO PENAL

Estelionato
Art. 171 – Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou
mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento:
Pena – reclusão, de um a cinco anos, e multa, de quinhentos mil réis a dez contos de réis.

Além dessas capitulações específicas, tendo em vista a natureza continuada do crime e


a quantidade de vítimas lesadas, invariavelmente é solicitada a aplicação do artigo 69, caput,
do Código Penal:

Concurso Material
Art. 69 – Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais
crimes, idênticos ou não, aplicam-se cumulativamente as penas privativas de liberdade em
que haja incorrido. No caso de aplicação cumulativa de penas de reclusão e de detenção,
executa-se primeiro aquela. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984).

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Crime continuado
Art. 71 – Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais
crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras
semelhantes, devem os subseqüentes ser havidos como continuação do primeiro, aplica-se-lhe
a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em
qualquer caso, de um sexto a dois terços.

É comum, ainda, que os mentores e participantes do golpe tentem dissimular a


natureza dos recursos havidos através do golpe, com a finalidade de ocultar patrimônio ou
atribuir a ele origem lícita. Nesses casos, atendidos os critérios da legislação, tem-se como
consumada a prática de crime de lavagem de dinheiro:

Lei 9.613/98 – Lavagem de Dinheiro


Art. 1o Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou
propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração
penal.
Pena: reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos, e multa.

§ 2o Incorre, ainda, na mesma pena quem:
I – utiliza, na atividade econômica ou financeira, bens, direitos ou valores provenientes de
infração penal;
II – participa de grupo, associação ou escritório tendo conhecimento de que sua atividade
principal ou secundária é dirigida à prática de crimes previstos nesta Lei.

4.3 DAS CONDENAÇÕES NO BRASIL

No Brasil, o caso de condenação mais famoso foi o deflagrado pela Operação Patrik
na região do Distrito Federal, que acusou 14 pessoas de aplicar esse golpe usando a nova
modalidade de investimento que são as moedas virtuais, nesse caso houve 13 condenações e
uma absolvição por insuficiência de provas.

Circunscrição: 1 - BRASILIA
Processo: 2017.01.1.029733-8
Vara: 308 - OITAVA VARA CRIMINAL DE BRASILIA

Também em Goiás, sob o processo 0017371-31.2013.4.01.3500, a empresa


EMBRASYSTEM–TECNOLOGIA EM SISTEMAS, IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO
LTDA, nomes fantasia 'UNEPXMIL' e 'BBOM', na decisão, a Justiça ratifica o entendimento
do MPF de que os negócios realizados pela BBom configuram prática ilegal de pirâmide
financeira e declara a ilicitude e o desvio de finalidade de todas as atividades empresariais
desenvolvidas pela empresa. Foi declarada, ainda, a nulidade de todos os contratos firmados
no âmbito do "Sistema BBom-UNEPXMIL", no período anterior a 5 de agosto de 2013.

Os réus (pessoas jurídicas e físicas) foram condenados ao reembolso dos valores pagos
pelos consumidores, associados, investidores que tenham aderido a quaisquer dos planos
disponibilizados pelo “Sistema BBom" até o referido período, além do pagamento, a título de
danos morais e coletivos, de indenização no valor de R$ 100 milhões, que foram revertidos ao
Fundo de Defesa de Direitos Difusos.
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A Embrasystem teve sua personalidade jurídica parcialmente desconsiderada pela
sentença, sendo decretada, ainda, a dissolução compulsória da Embrasystem e da BBrasil e,
como conseqüência, suas liquidações judiciais. A decisão judicial ainda determina às
empresas a publicarem em jornais de grande circulação comunicado de cessação de todas as
suas atividades empresariais.

CONCLUSÃO

Tão antigo quanto o conto do vigário, o esquema de pirâmide financeira visa o


engajamento progressivo de muitas pessoas, estas deverão aportar seu dinheiro em vários
pacotes com "produtos" ou "negócios" com a promessa de rendimentos nada convencionais.
As pirâmides financeiras são insustentáveis por uma simples razão matemática. Não existem
pessoas suficientes para manter os rendimentos prometidos, o sistema irá ruir, é só uma
questão de tempo. Em todos os casos trazidos nesse artigo, os "negócios" logo em seu começo
apresentaram um rápido e lucrativo crescimento e, logo depois, um enorme prejuízo. Mesmo
assim, atuando direta ou disfarçadamente como “negócio” legal, as pirâmides continuam
fazendo vítimas em todo o mundo.

De tempos em tempos aparecem notícias na mídia sobre casos onde pessoas são
lesadas financeiramente por esses sistemas, sempre alimentadas pela ilusão de parte do povo
de que poderão ganhar dinheiro fácil. E como diria vovó: "O que vem fácil, vai fácil", cabe
mais cautela a quem é instigado a investir nesse tipo de "negócio", é necessário sempre mais
investigação, avaliando riscos, avaliando rentabilidade. Todo investimento tem riscos, e no
mercado de capitais legal, quanto maior o risco maior a rentabilidade. Se a promessa de
retorno for muito alta oferecendo muito pouco risco, o primeiro procedimento é a
desconfiança, pois é justamente isso que o sistema piramidal oferece, altos ganhos e nenhum
risco. É um sistema que não se sustenta e certamente provocará prejuízos financeiros, está
comprovado que só ganham os que ficam no topo da pirâmide.

A pirâmide financeira é crime contra a economia popular, e toda cautela contra esse
modelo é necessário se o investidor não quer ter seu precioso patrimônio dilapidado por
larápios que não medem conseqüências para se dar bem. A recomendação padrão dos
economistas é sempre cautela, questione sempre qualquer oportunidade de ganhar dinheiro
fácil, educação financeira não é saber investir o dinheiro, mas sim todo o comportamento que
se tem em relação a ele.

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BIBLIOGRAFIA E FONTES

Acessos feitos entre: 05/06/2019 e 16/06/2019

https://jornalggn.com.br/noticia/telexfree-o-golpe-do-seculo/

https://sucessonetwork.com.br/conheca-a-legislacao-aplicavel-a-quem-faz-piramides-no-
brasil/

http://intertemas.toledoprudente.edu.br/index.php/Juridica/article/view/4562/4320

https://exame.abril.com.br/negocios/governo-multa-telexfree-em-r-5-5-milhoes-por-pratica-
de-piramide-financeira/

https://exame.abril.com.br/negocios/concordata-de-madoff-supera-us-1-bi-seis-anos-apos-
prisao/

https://www.conjur.com.br/dl/tj-df-condena-13-pessoas-envolvidas.pdf

http://www.mpf.mp.br/go/sala-de-imprensa/docs/not2146%20-%20ACP_Bbom.pdf

TCC - Faculdade de Direito de Presidente Prudente, Thais Rosenbaum Bergo,


CONSIDERAÇÕES ACERCA DE PIRÂMIDE FINANCEIRA SOB O ENFOQUE DO
DIREITO PENAL ECONÔMICO. 2014.

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