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O BRASIL MONARQUICO EM FACE DAS REPUBLICAS AMERICANAS { RIBEIRO JONIOR O assunto a ser tratado nesta oportunidade oferece-nos 0 ensejo de enfocar o mundo latino-ameticano em conjunto, pos- sibilitando uma compreensio global da sua histéria no século passado. A América Latina do século XIX passou por transforma- Ses substanciais em sua estrutura econdmica, social e princi- palmente politica. . Nao podemos, nem temos a pretensao de esgotar o assunto, pois, muitas pesquisas originais precisam ainda ser feitas.. Sio pouccs e insuficientes os trabalhos histérico-cientificos existentes, estudando a América Latina do século XIX como um todo {*). Assim, a auséncia de bibliografia satisfatdria dificulta-nos um trabalho completo sobre o assunto. A nossa abordagem do tema circunscreve-se ao esforco da reflexfio de um pesquisador do século XX que busca na Histéria o esclarecimento do estado presente. . A América Latina vive, atualmente, momentos decisivos da sua evolucio histérica e necessita de uma conscientizagio dos paises que a compéem e uma conseqiiente tomada de posi¢ao ccletiva. A retrospectiva histérica é necesséria na medida em que traz 4 tona problemas de profundas raizes, incompreensi- veis sem a busca de suas origens. (1) A maior parte dos historiadorcs e socidlogos de lingua espa- hola raramente coloca o Brasil no complexo dos paises da América atina. 146 Na problemdatica do século XIX procuraremos levantar e resolver, na medida do possfvel, algumas questdes em torno de 3 aspectos: 1. Verificar como e¢ por que a América portuguesa estar beleceu ¢ conservou a Monarquia e sua snidade territorial apds 1822, enquanto que a América espanhola, apds 1810, se trans- formou em reptiblicas fragmentadas. 2. Mostrar quais as inflaéncias externas comuns atuantes no século XIX latino-americano. 3. Observar as relagées diplomdticas entre a Monarquia brasileira e varias repsblicas, tentando estabelecer influéncias reciprocas. Daremos, portanto, ao assunto, um enfoque quase que exclusivamente politico-ideolégico num estudo paralelo entre os pafses latino-americanos. A Independéncia na América Latina FStntre os fins do século XV e¢ inicio do XVI deu-se a ocupacio da América pelas monarquias ibéricas. O Novo Mun- do foi descoberto numa época de expansio econdmica da Europa Ocidental. A colonizagao se fez sob o signo do capitalismo co- mercial. Este é 0 primeiro ponto comum a toda a América Latina. A América ibérica tinha que servir 4 mesma finalida- de: devia fornecer ao mercado europeu produtos tropicais de alto valor comercial, metais nobres e pedras preciosas. Nao enttaremos nos matizes de forma colonizadora que diferem, € verdade, mas tanto Espanha como Portugal constituiram suas colénias com aqueles objetivos. Assim as futuras nagées tive- ram semelhante formagSo colonial enquanto instrumentos dos dois paises colonizadores. Na segunda metade do século XVIII, quando a América comegava a adquirir condigdes para sua autonomia, a Europa também assistia a transformacdes importantes em sua estrutu- ra. A partir de 1750 houve a primeira fase da Revolugdo Industrial e em 1789 eclodiu a Revolugao Francesa marcando a ascensio da burguesia. Latino-americanos que participaram do processo de Inde- pendéncia, como Miranda, O'Higgins, Bolivar, José Bonifacio e outros, estudando ou viajando pela Europa, tomaram contato com essas transformacdes e empolgaram-se com as novas idéias liberais. 147 Na América, as colénias inglesas lancaram a sua declara- Gio de Independéncia em 1776. O exemplo da Independéncia dos E.U.A. e a ideologia da Revoluc%o Francesa agitaram os espiritos americanos mais es- clarecidos, despertando 0 mundo colonial. O manifesto de Mi- randa, o precursor, entusiasmado com a Independéncia dos Es- tados Unidos da América e a revolta contra a opressiva taxagao nas Minas Gerais foram os primeiros sintomas sérios de uma tomada de consciéncia na América Latina. Nao se pode dizer, porém, que tivesse havido uma tomada de consciéncia coletiva; nem mesmo da elite mazomba ou crioula. Por outro lado, nao havia, como nas coldnias anglo-americanas uma estrutura econé- mica e social propfcia 4 independéncia. Ao contrdrio, a eco- nomia latino-americana era baseada nos metais preciosos, na gtande lavoura, e seu comércio era fator de dependéncia dos mercados externos ligados As metrdpoles. Por isso os projetos de Miranda, por exemplo, expresséo de um pensamento politico hispano-americano pouco original, nfo encontravam ressonancia considerdével na América. As condicdes internas pata uma auto- nomia nfo se cristalizaram antes do inicio do século XIX. Res- salta um historiador contemporaneo que no século XVIII as novas idéias liberais no mundo hispano-americano eram pro- postas pela prépria metrdpole e fruto da filosofia das luzes (). Em 1783 Aranda, ministro de Carlos III propés a formacao na América de monarquias com infantes espanhdis sob a égide do rei da Espanha. Em 1794 Goddi teria proposto a mesma idéia mas também niio foi aceita pela Coroa Espanhola. Em Portugal varios politicos, entre eles D. Rodrigo de Souza Coutinho, aventaram a possibilidade de transferir a sede da Monarquia portuguesa para a parte mais rica do seu impé- rio, o Brasil (3). O plano foi abandonado e o Brasil era ainda no inicio do século XIX, um vice-reino. Na América espanhola, no ultimo quartel do século XVIII foram criadas por Carlos III as intendéncias que absorveram em parte as attibui¢des politico-administrativas dos vice-reinados (4), (2). Pierre Channu —~ L’Amerique et les Ameriques, Paris, Armand Collin, 1964. Passim, . (3) Cf. Oliveira Lima — D. Jodo VI no Brasil, Rio de Janeiro, Livraria José Olympio Ed., 1945, 3 vol., 1.°. vol. (4) Interessante € notar a fragmentagio da América espanhola obedecendo no geral A divisio feita por intendéncias. 148 Retomemos 0 mundo curopeu dos fins do século XVII. Destacam-se duas grandes poténcias: a Inglaterra industriali- zando-se ¢ expandindo scus mercados ¢ circulos de’ influéncia politica; a Franga impregnada dos ideais liberais, tendo uma burguesia que queria aumentar o secu raio de agio. No infcio do século XIX Napoleo tem o propésito de conseguir para a Franga a hegemonia do mundo, Tentando set a primeira poténcia européia esbarra no ledo britanico. Uma luta titanica de impe- tialismos tem lugar na Europa. O que a diplomacia nao resol- veu foi resolvido pelas armas. Em 1806 Napolefio decretou 0 Bloqueio Continental. As conseqiiéncias advindas dessa decisto so de transcendental importincia pata o estudo da Indepen- déncia da América Latina. Embora a Inglaterra conseguisse furar 0 Bloqueio na Euro- pa, fato demonstrado pelos trabalhos de Jorge de Macedo (8) e Pinto de Aguiar (°), a indvistria inglesa necessitava de maiores mercados, Desde meados do século XVIII dirigira suas aten- ges para o Novo Mundo ibérico desfrutando das vantagens de vassalagem econédmica portuguesa. Contrabandeava impune- mente no Brasil ¢ procurava dominar 0 comércio hispano-ame- ticano principalmente no Prata (7). Portugal era ponto estratégico na consolidacio da mano- bra napolednica. D. Jodo depois de muitas vacilagées optou pelo apoio a Inglaterra e, por sugestdo desta, retirou-se pata 0 Brasil em fins de 1807, tendo Junot quase obstado a sua rell- rada, Transferia-se para o Brasil toda a familia real para uma estada mais duradoura do que poderia supor. A dinastia bra- gantina fincaria alicerces no Brasil. Na Espanha, depois do apoio do ministro Goddi a0 plano de Napoledo, Catlos IV abdicou em favor de seu filho Fer- nando VII. Porém na degradante entrevista de Bayonne entre Carlos IV, Fernando VII e Napoledo concluiu-se pela petma- néncia do primeiro no trono e logo depois Carlos IV novamente abdicou, desta feita em favor de José Bonaparte, irmao do Imperador francés, . (5) Jorge Borges de Macedo — O Bloqueio Continental, Eco- nomia ¢ guerra peninsular, Lisboa, Delfos, 1962. (6) Pinto de Aguiar ~~ Abertura dos portos do Brasil (Cairu ¢ os ingleses), Salvador, Progresso, 1960. (7) Cf, Nelson Werneck Sodré — As Razoes da Independéncia, Rio de Janeiro, Civilizagao Brasileira, 1965. 149 Em Portugal os exércitos dos comandantes ingleses ¢ sol * dados portugueses repcliram a invasio de Junot e depois as de Soult ¢ Massena. Mesmo depois da expulsio dos franceses do territério portugués as forcas militares ficaram sob 0 comando de Beresford cujo procedimento foi uma das fortes motivagdes da Revolugio do Porto de 1820. Na Espanha os espanhdéis nfo aceitaram o governo de José I. Manifestaram solidariedade a Fernando VII e instala- ram uma junta governativa central d 4 uciondrio. le cardter revo! restauracto do monarca deu-se em 1814. Houve depois uma revolucio liberal em 1820 anterior 4 de Portugal. Veio poste- riormente a reagio absolutista em 1823. Com a morte de Per. nando VII em 1833, cessou a ameaca de reconquista das antigas coldnias, vam sob 0 No mesmo momento como us metrépoles estavam dominio napolednico iniciou-se, efetivamente, nas colénias ibe- ricas, 0 processo da sua emancipacio. Cada provincia hispano-americana devia escolher entre José I ou sublevar-se em nome de Fernando VII, legitimo ocupante do trono espanhol. Instalaram-se na América espanhola, a exemplo da Espa- nha, juntas governativas. Estas repeliram emissdérios do ret usurpador e manifestaram seu apoio a Fernando VII. Os se- cessionistas, magons das grandes cidades da América espanhola, advogados, padres etc., comegam a se manifestar. © movimento de separacio adquire expressio e alastra-se. Em Buenos Aires em 25 de maio de 1810, uma junta insurrecional depds 0 vice -rei Cisneros. O Chile seguiu, logo apés, 0 exemplo. No Mé xico, Iturrigaray presidia uma junta central eleita pelos cabil- dos. Hidalgo e Morelos iniciaram movimentos anticonservado- tes. Mais tarde, Ittrbide proclamou-se rei de uma monarquia efémera. Caracas proclamou sua independéncia em 5 de julho de 1811. A América espanhola, enfim, ficou toda envolvida na Jota pela emancipagio, fruto do isolamento causado pela situa- 40 na Metrdpole. A Independéncia da América hispanica $6 veio depois de muita luta e muito sangue derramado. O Peru, Ultima provincia a proclamar sua independéncia, o fez em 1824 depois da batalha de Ayacucho, , 150 a + A Independéncia do Brasil: conservagio da monarquia e¢ da unidade territorial No Brasil, a transmissiio da Famflia Real diferenciou_com- pletamente o processo da Independéncia do resto da América. Com a vinda da Corte, pode-se afirmar, terminou 0 perfodo colonial brasileiro ¢ inaugurou-se a fase independente, De fato, ° Brasil ‘transformou-se em centro do_ Império portugués, A conseiéncia separatista foi sufocada pela presenga do monarca ¢ confianga em dias melhores. A. abertura dos portos brasi- leiros a0 comércio livre, o transplante do organismo adminis- trative para a colénia, a’ elevagio do Brasil a Reino Unido em 1815 transformavam o status politico ¢ econdmico do pais. Depois da Revolugio liberal do Porto em 1820 as Cortes erais cxigiram a volta de D. Joao VI. A posterior acto das Cortes, assumindo o poder de’ fato, foi orientada no sentido le anular as concessdes feitas a0 Brasil no perfodo joanino. Essas intengdes explicam-se pelo exame dos elementos que fizeram a revolugio. A maior parte eta da burguesia que vivia em fungio do monopélio comercial e que tinha no Brasil a sua maior fonte de renda. Mas, ja era tarde, 0 processo cra inrever Sivel. A chamada burguesia portuguesa, paradoxalmente fea ciondtia, encontrava um Brasil consciente dos seus direitos ¢ AUX Se momento todas as classes sociais coesas em torn Ce D. Pe fee Proclamada a Independéncia em 1822, de forma pacilica em relagio 4 América Latina, D. Pedro foi proclamado Impe- tador do Brasil. Proclamou-se a Independéncia mas o Jeane monarquico transplantado da Europa continuo nO Brasil lo momento da Independéncia nfo se pos © problema da forma politica. Com a ideologia mondrquica enraizada, a maioria Co Povo brasileiro e os politicos apoiaram 0 lider da emancipasae politica do Brasil que era um principe. Mesmo_ os elementos mais radicais concentravam-se mais na idéia do federalismo do que propriamente na Republica com todas as suas imp aes lemocrdticas. Foi dado um crédito a0 liberalismo de D. Pedro Le esperava-se muito da prometida Constituicao. pe outro lado, a estrutura latifundidria e escravista apolava ‘ orm mo- ndrquica pelo sentido conservador € pela aparéncia a le gue era revestida a pessoa do principe. Ademais o Brast rea me -independente tinha duas tarefas a cumprit: consolidar a Inde- pendéncia internamente e através do reconhecimento do poder central, pelas provincias recalcitrantes, Bahia, Par4, Maranhio, Piauf e Cisplatina, e fazer-se reconhecer no plano externo. A 151 pteservagio da unidade e o reconhecimento internacional, sa- biam os brasilciros, seria muito mais dificil sem o concurso de D. Pedro. Esta primeira fase da independéncia do Brasil teve omo objetivo principal afastar as tentativas de recolonizacio. Vemos, portanto, que a instalag?o da monarquia no Brasil recém- -emancipado nao se deve sé ao respeito pela pessoa de D, Pedro. Ha uma série de fatores atuantes. As provincias do Norte e Nordeste foram dominadas gra- sas as tropas mercendrias contratadas por D. Pedro, assegurando para a ionarquia do Brasil independente a regifo que era res- ponsdvel por mais. de 60% das rendas nacionais na época, de onde se compreende porque a unidade brasileira era importante. Em 1823 todas as provincias se mantém sob a tutela de D. Pedro I, O Brasil superou nessa época uma das maiores amea- gas de desintegracio politica de sua Histéria. No plano externo o governo de D. Pedro conseguiu em 1825, o reconhecimento de Portugal e dos outros pafses. Nao sem ptejufzo de monta para a nacio. O acordo firmado com a Inglaterra de abolir o trdfico de escravos indispds os donos de tetas e de escravos contra D. Pedro, uma das causas im- portantes de sua abdicacio. Passados os primeiros momentos do seu governo liberal, D. Pedro mostrou-se absolutista. A dissolugao da Assembléia Constituinte em novembto de 1823 foi o primeiro sinal patente das intengdes de D. Pedro. Foram suprimidas algumas con- quistas liberais. A Confederagio do Equador em 1824 foi reprimida_vio- lentamente, instalando-se um verdadeiro regime de terror. Mais uma vez, de forma violenta foi conservada a unidade territorial do Brasil. E nesta oportunidade, porém, muitos dos que tra balhavam pela emancipagio politica de sua patria foram cruck mente executados, Tudo isso e mais a intervengio de D. Pedro no Prata, # Protecio que ele dispensava aos portugueses € sua preocupa¢ao com os problemas do trono portugués de sua filha D, Maria da Gloria, fizeram desencadeat sobre o Imperador uma série de insubordinagdes regionais e principalmente uma violenta oposi- So dos grupos ‘politicos no Rio de Janeiro. D, Pedro, tendo contra si um ambiente totalmente adverso, foi levado a abdicar em 7 de abril de 1831. Com a abdicagéo ¢ o perfodo regencial consolidou-se a Independéncia do Brasil. SN OK Os brasileiros no perfodo regencial de 1831 a 1840 tive- tam oportunidades de transformar o Brasil em Reptblica. No create, a Coroa foi conservada para o sucessor legal, D. Pedro a Aledntara. Como se explica isso? Existem varias razdes. rimeiramente porque os elementos que assumiram o governo, os chamados liberais moderados, temiam a desordem estabe- lecida nas reptiblicas americanas. As experiéncias latino-ame- Ticanas atemorizavam as elites brasileiras. Diz Pereira da Silva que © sistem republicano tanto mais repugna a indole, 40s costumes, aos interesses € As aspitagdes do povo brasileiro, quanto o espetdculo das nagdes vizinhas, constantemente revol- tadas ¢ ensanguentadas pelas guerras civis ¢ ambigdes de caudi- ‘os, concorriam poderosamente para radicar o principio mondr- quico” (*), Por outro lado o senado, vitalicio ¢ consetvador, fazia tudo para interromper qualquer tentativa de avango de- mocratico (*), Os movimentos de cardter republicano como a Cabanagem, a Sabinada, a Balaiada, si0 sufocados da mesma forma que 9s movimentos radicais do Rio de Janeiro. Estes foram feitos pe- as classes média ¢ inferior. Observa-se em toda ago repressiva 0 governo regencial 0 apoio da classe latifundidria alicergando dessa forma o governo monarquico (?°). Os tumultos repub) i- canos ou federalistas criam o temor ,da desagregacio nacional. Marqués de Catavelas afirmava que sé no poder moderador do Fei residia a necessdria eficdcia, independente das paixdes Politicas dos partidos, para serenar_as discérdias. Pregava © tespeito A Constituicio de 1824. Era seguido pela maioria da Assembléia (11), Os senadores tinham que defender a Constituicao pata se guranca de seu cargo vitalicio. A defesa de certos interesses € privilégios levou os homens da Regéncia, invocando o petigo le anarquia e esfacelamento do Brasil, a conservarem a mo- narquia prolongando-a por mais algumas décadas. (8) Poreira da Silva — Histéria do Brasil: durante a menoridade de D. Pedra If (131.1040), 22 ed Rio de Janeiro, Garnier, 1878, pag. 323. (9) Idem, ibidem. Passim. | (10) Cf, Sodré, op. cif. S6 um movimento insurrecional, 0 Far- roupilha, contou com o apoio dos estancieiros € Por Isso resistiu por mais tempo. (11) P. da Silva, op. cit. Passim. 153 Lo Assim, a coroagio do Imperador de 15 anos de idade, em 1840, foi feita com o objetivo de realizar uma agiio centra- lizadora e consumar a frdgil unidade mantida no Perfodo Re gencial, Vemos dessa forma que, no Brasil, gragas A sua insti- tui¢io legada por Portugal a partir da transmigragio bragan- tina, a Monarquia é implantada no Brasil. Fatores de ordem externa ¢ interna, portanto, conjugavam-se na clevagio ao trono de um monarca brasileiro. A Independéncia da América espanhola: a Republica e o retalhamento territorial Na América espanhola houve uta pela autonomia antes de se pensar na forma de governo a ser adotada. O grande objetivo nfo era a Republica, mas uma equiparagio 4 Metr6- pole. Todavia, as juntas e governos regionais proclamavam 4 Independéncia e a Repiiblica. at Como no Brasil existisse uma estrutura politica, economics e social interna afim com a Monarquia, havia uma forte opiniae mondrquica. San Martin, por exemplo, argentino educado_ na Europa, era partidério de que principes europeus bourbénicos ocupassem os tronos das novas nagSes americanas para evitar a anarquia. Bolivar, o libertador, também estudou na Europa: pre: senciou e impressionou-se fortemente com a coroacio de Napo- ledo. Era republicano, mas seu republicanismo era um misto de cesarismo e democracia. No Congresso de Angostura em 1819, Bolivar expds suas idéias constitucionais. Propunha a Reptiblica, duas Camaras, senado hereditdrio e presidente vita- licio com amplos poderes (12), Locke e Montesquieu acham-se Presentes em Bolivar (1°) mas a impressio causada pelo regime napolednico e a idéia de Hamilton (#*) influenciaram também as suas concepgdes de Republica fortemente centralizada. Era republicano na forma, mas com tendéncia mondrquica ¢ auto- (12) Cf. Diciondrio de Histéria de Espaiia —. Revista de Occi- dente S.A., Madri, 1952, pigs, 434-442. “me ._ (13)_O. Garlos Stoetzer — El pensamiento politico en la Amé- rica espafiola durante el perfodo de la emancipacién — (1789-1825) — Las bases hispdnicas y las corrientes europeas, 2 v. Madri, 1966 — Instituto de Est. Politicos — Passim. (14) Hamilton defendia a idéia da presidéncia vitalicia nos E.U.A. 154 an ritétia pelo temor A desordem, A desuniio ¢ a caudilbagem que vé ao fim da vida instalar-se nas reptiblicas fragmentadas. Franciseo de Miranda revelou suas idéi projetos constitucionais que possufam sempre un fundo ar crftico ¢ autoritaério. Bernardo O'Higgins compartilhava das idgias de Miranda ¢ nao era sequer liberal. A Constituigito do Chile, apés a proclamacio da Reptiblica cm 1818, foi f apenas 7 membros ligados diretamente a O'Tiggins. Rivadavia, presidente da Argentina em 1826, era mona quista. [2 assim outros. Vemos, portanto, que a concep¢io republicana dos lideres libertadores’ da América era um tanto confusa. ‘Todos viam a necessidade de um governo fortemente centralizado. MN pre meiras constituigdes cram um misto de Monarquia ¢ coe blica. Na pratica, os caudilhos substitufam os monat i guerra e sua excessiva duragio , fizeram passat a diregio das Novas nacdes os chefes mi es e surge 0 caudilhismo como constituigio, Os governos centrais, que s¢ impuscram pela forca oe tinham o prestigio de um rei, causavam ¢m grande verona insurreigdes desse perfodo, agravando os Interesses ae wR resultando no retalhamento do mundo colonia espa vind tentativa de Bolivar de conservar a unidade colon on er 4 Gran Colombia fracassou como fracassariam tambert as as 3 jce-reinado; preva ragdes da Argentina de conservar 0 antigo vice Tea ante i leceram os particularismos ¢ governos fortes publicanos. : : ex central. No Brasil o regionalismo {oi sufocado pelo poder aparato Primeiro porque havia uma autoridade mora seportante a rel: mired ee ar tet manos tiva unidade geogrifica facilitou a tarela ie resto da América ‘Latina a diversidade Fe oe ertitorios, dificultando © acesso ¢ isolando naturaime ° éncia, havia il foi sJamada a Independéncia, uando no Brasil foi_proc nde . : quem passe o trono. Quando houve oportunidad ae pro clamar a Repiblica em 1889 ja havia a experiéncia da Ameri A espanhola ensangiientada € subdividida. _Entio 0 sentido pit tétio e a preocupacio de evitar convulsdes politicas prevalece- ram na mente dos homens da Regéncia. 155 A influéncia inglesa na Independéncia da América Latina Um outro problema que nao pode deixar de ser tratado destacadamente quando se analisa o processo de independéncia na América Latina é a influéncia inglesa cujos aspectos ja se esbogaram ao inicio desta anilise. . Depois da queda de Napoleio, a América Ibérica trans: formou-se num dos setores mais importantes do comércio bri- tanico; por isso.a Inglaterra via com bons olhos os movimentos que tendiam a cortar os lacos entre a América e as metrépoles Apoiava a desintegracio de um império para formar © seu pl prio, As relagées diretas e nfo através das metropoles eram muito mais vantajosas para a aco econémica inglesa. | A partir de 1817 © governo inglés passa a incentivar insurretos da América com armas, munigdes € técnicos. aspecto internacional, depois de Canning substituir Castlereagh em agosto de 1822, 0 governo inglés abandonou a a0 ‘ tepticia para agir abertamente, tomando posicao contra a po ii intervencionista da Santa Alianga. O’Higgins e San Martin teceberam auxilio inglés. O dominio do Peru cristalizou-se com a cobertura naval do oficial britanico Cochrane, 0 mesmo qué ajudou D. Pedro na consolidagio do seu governo. Logo aero dissolugfo da Assembléia em 1823, D. Pedro conseguiu auxilio financeito da Inglaterra com 0 qual armou a represséo aos mo- vimentos revoluciondtios, A mediago inglesa no reconheci- mento da Independéncia por Portugal foi’ importante. OS ingleses defendiam os scus privilégios patenteados no tratado de 1810. Nao queriam perder um vantajoso mercado pata 05. seus produtos. Entre os fins do século XVIII até a primeira década do século XIX a Inglaterra conquistou e consolidou seu domfnio econdmico na América Latina, o que leva Pierre Chaunu a dizer que “de 1797 a 1810 a América Ibérica tornouyse, & Oi até 1914 a mais bela das colénias britanicas” (15), Relagées entre a Monarquia e as Reptblicas apés a Independéncia O Brasil imperial permaneceu isolado do resto da Amé Hea, no sé na forma de governo, mas economicamente também, ‘anco as costas para os pafses latino-americanos e voltado (15) Op. cit, pag. 210. 156 — pao Oceano Atlintico. Podemos no entanto examinar as relagdes politicas do Brasil com os paises do Prata. Faltam pes jisas m . ‘ pesquisas para um relacionamento em termos globais da Amé- tica Latina, A tentativa. consciente de imperialismo de 1D. Joao na América do Sul reconhecida até por Oliveira Lima (7%) tem folno resultado a ocupagio da Banda Oriental, que se comple- do Rein u, depois da derrota de Artigas, tornando-se provincia foi ny inido de Portugal, Brasil e Algarve. A Cisplatina DP dr las provincias que sé reconheceram a autoridade de “Xeero pelas armas, logo apés 1822. Uni Em _ 1825 os cisplatinos buscam o apoio das Provincias nidas do Rio da Prata (futura Argentina) declarando-se_re- publica separada do Brasil ¢ incorporada as provincias unidas Pel as _quais tinha muito mais em comum. A politica de D. edro foi entio, orientada no sentido de conservar o que fora conquista de scu pai. A luta de D. Pedro foi infrutifera, uma vez que as provincias do Rio da Prata ¢ o Brasil concordavam em dar a independéncia ao Uruguai‘em 1828, aprovando a sua Primeita Constituigio em 1830, Esse foi o primeiro choque entre a Monarquia brasileira ¢ as reptiblicas do Sul. Durante © perfodo regencial sé houve um incidente, com ° Presidente Manuel Oribe, em 1837, provocado pelo urugualo que, invocando as divisas do tratado de Santo Idefonso, queria aumentar seu territério, A questo ficou no terreno da diplo- macia ¢ em nada resultou nesse periodo. A intervencio seguinte do Brasil no Prata foi para evitar a anexagio do Uruguai pelo ditador argentino Juan Manuel Rosas e com o objetivo também de defender a liberdade de Navegacao dos rios platinos necessdrios 20 Brasil para o acesso a Mato Grosso. Em maio de 1851 realizou-se uma convengao entre duas cidades rebeladas contra a tirania de Rosas (Corrien- tes e Entre Rios), 0 governo do Uruguai ¢ 0 Brasil. A inter- vengio.da Monarquia foi fator decisivo para a derrubada do governo ditatorial de Rosas depois da Batalha de Caseros em 3 de fevereiro de 1852. Depois disso 0 Brasil nfo teve proble- mas com a Argentina, mantendo sempre ligagSes_pacfficas. Outro problema havido na regido do Prata foi ainda no Uruguai devido as incursdes de uruguaios em territério brasi- (16) Op. cit., 1.° volume. 157 Ieiro do Sul. O Brasil invadiu o territério uruguaio ¢ colocea no governo um elemento do partido colorado que 5 oP ie partido blanco de Aguirre, causador do incidente. omer poder, Venancio Flores reatou relagées amistosas com 0 O acontecimento mais sério de que o Brasil patticipou 7 América Latina foi também na América Meridional envolven ; © Paraguai fortemente militarizado de Solano Lopes flito sane Triplice Alianga (Brasil, Argentina e Uruguai). Conf com 2 gtento iniciado em 1865, sé terminou cinco anos depois derrota do Paraguai. il e as Em todas as questées internacionais entre 0 oie teptiblicas nao se observa uma acio imperialista brasilei “mas Brasil saiu vitorioso de todas as relagdes bélicas no Prata ne nfo extraiu nenhum proveito. Ao contrdrio teve muitos juizos em materiais e homens. ‘eas com Devido & sua grande extensio, suas relagées estreltae era a Inglaterra e priticipalmente pelo seu regime, 0 Brast inte: visto por alguns estadistas ameticanos como perigoso 20 clas- Tesses republicanos, Rosas exagetava; por questdes Sov ica sificava o Brasil de tepresentante da Santa Alianga na m nao Esse niio cra exatamente o pensamento das reptblicas en obstante, mantinham cautela. A politica externa brasil ios Segundo Reinado caracterizava-se por pronunciamentos sol as repiblicas e pela sua autodeterminagao. Amé Nao obstante sua situagio de pais mais poderoso da als tica do Sul, nunca conseguiu lideranca por ser o tinico, P’ i. monarquista, Por outro lado nao era uma nagao que toma tasse confianga total a muitas monarquias da Europa. A | oem constitucional da monarquia brasileira estava dentro do sist las americano e nio tinha, teoricamente, 0 caréter reaciondtio monarquias européias, A volta do ideal republicano no Brasil A ascensio de D, Pedro II ao trono, marcou, passada 4 Revolugio Praieira de 1848 em Pernambuco, 0 inicio de u™4 paz que se prolongatia por algumas décadas. A chama rep" blicana da esquerda liberal da Regéncia € completamente rept! mida pela forca que a Monarquia d4 ao governo central. “Conciliagio” liderada pelo Marqués de Parang ocupa, também, lugar importante na contengio da idéia tepublicana na medida em que, amenizando-se as lutas partiddrias, qualquer movimento ~ CO 158 de carter republicano nic encontraria ressonincia nas lides politicas. D, Pedro IL impée-se como rei no tanto pela sua seriedade © moral impeedvel, seus atributos, mas pela estrutura latifund: que via na Monarqui. sua estabilidade. __ A cristaliza Monarquia Constitucional teve influén- clas curopt O impacto republicano advindo da Revolugio Francesa atenuara-se na prépria Europa. A época_ vitoriana iniciada em 1837 ¢ 0 grande surto industrial operado na Tngla- terra sob a égide monérquica foi fator de prestigio do regime € a nagio britanica foi modelo para o Brasil. O constituciona- lismo Portugués, como o inglés, teve parcela de influéncia na consolidagio da Monarquia e erradicagio da solugio republi- cana no Brasil. O nico pais republicano na América com sdlidas bases politicas ¢ econdmicas eram os Estados Unidos, mas qualquer tentativa de aproximagio do pais norte-americano foi, por muito tempo, anulada pela habilidade inglesa. Esse zechaco implicou em -afastamento da idéia de Republica. A Guerra da Triplice Alianca ¢ o republicanismo no Brasil O ressurgimento da idéia republicana no Brasil coincide com © fim da Guerra da Triplice Alianga em 1870. O contato com o Uruguai e principalmente com a Argentina, que superara a fase do caudilhismo, pesou, com certeza, no reavivamento do ideal republicano em hibernagio desde o perfodo regencial. Apr tece no cendrio politico brasileiro o elemento militar até entio submisso a D. Pedro ¢ ao seu estado-maior de politicos no s¢n- tido de n&o terem acesso aos quadros politico-administrativos. Ao contririo, nas reptiblicas sul-americanas 0 militar ocupava posigio de destaque. a O contato mais estreito com pafses da América Meridional © 0 estado de guerra pelo qual passaram os militares desperta- ram as suas geragdes mais novas. A. filosofia positivista, oa outro lado, deu uma concepgao mais atuante a0 papel histérico da classe militar. Aos poucos elevou-se o exército na hierarquia da sociedade brasileira do século XIX e deu ambiente para a chamada questio militar, fator importante na proclamagio da Republica. . Os primeiros estremecimentos entre © exército e 0 governo monérquico iniciaram-se durante a Guerra da Triplice Alianga. Tendo a questo militar papel de destaque na Proclamagio da Reptblica e.fruto em grande parte da citada guerra, licito é 159

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