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is responsive Mara Aparsi Cota Dare ‘CRIS LoHT tora Asistente ising Meneses arent Kari: Cian Lire ators em Bit aiors om SP 1p 3101975 sx reprodrid, jm gui forem os meios cmpropados sem a pormisro, or ec a horn, Agradecimentos especiais para ‘Amaldo Oliveira e Sandra Cureau ‘Mauricio Martins ¢ Sonia Ferreira is _ TEORIAS CONSTITUCIONAIS EM PERSPECTIVA __ Em busca de uma Constituigao pluridimensional JOSE ADERCIO LEITE SAMPAIO Professor da Graduagio e Pés-Graduagiio da PUC Minas eda UFMG. Mestre e Doutor em Direito Constitucional pela UFMG. Procurador da Repiiblica “resist any thing better than my own diversity, Breathe the air but leave plenty after me, And am not stuck up, and am in my place Do I contradict myself? Very well then, I contradict myself. (Zam large, I contain multitudes.)” 4 JOSE ADERCIO LEITE SAMPAIO de cunho patrimor a ¢ irracional? Que € povo, sendo um amontoado sobrevivéncia? Que é Con: de suposta primazia, mas vezes ad hoc quantas divorciadas dos padi Que so as teorias constitucionais além de rascunhos realidades existenciais da Terra do Nunca? Por que, entio, insistimos tanto com elas? Parecemos todos estudiosos de coisa alguma. Ou apenas de letras que ncia dos seus enunciados e da descoberta de novos horizontes de conhecimento, mas sem nenhuma preocupagio com seus descritores de belas ou sinuosas ligdes doutrinarias ou bem nos mantemos revoluciondrios de uma que dino mesmo. , Nos impdem a refletir sobre as razdes do -m como sobre as inadequagdes de nossas Precisamos, em primeiro lugar, desontologizar o receituirio de definigdes que repetimos e escrevemos sem maior atengao, para tentarmos ia.a planos de dominio sutis e buscar a trajetéria de ‘emancipagio coletiva, largada em algum ponto da histéria, E imprescindivel refazermos 0s tragos de um projeto inacabado, de um devir da construgéo humana, de priticas que se alimentam de teorias e normas que se refazem das prticas. De um autoconstituir-se por ago. De uma Constituigd. 1, CONSTITUICAO: O QUE? © termo “Constituigio” é um daqueles que possuem significados para todos os gostos. Seu legado mecanicis é de fundagdo de um Estado limitado constituigo de um corpo bioldgico. Tudo movido ao vapor dos tempos ‘modernos. Fora por aquela movimentada época de luzes e revolugdo que a desde tempos imemoriais, se alterara em diregio & subjetividade de um ser dligno e portador de pretensdes de vida anterior a qualquer organizagio politica. ‘Um ser-homem descolado de ser-Deus reinava com sua vontade livre ¢ cconstituinte que se fincava de maneira duradoura num contrato quase sempre escrito de ordenacdo da vida comum. Sea palavra constitutio, jé nas origens, remetia & dualidade do nascimento ¢ do nascituro, do constituir-se imitado pela prépria Constituisdo, sua ambigitidade se alargoucom o passar do tempo ‘TEORIAS CONSTITUCIONAIS EM PERSPECTIVA. 5 pelo cultivo de uma antinomia entre o império normativo ¢ a realidade viva. Sem falar de que o objeto de ordenago, mesmo sem o timbre de Co {ja ocupava 0 debate apontados como para efetivamente vigorantes). O sentido de representagao social © de es sntre o mando e 0 comando, entre os coman ainda o reconhecimento de que o direito, espe & politica. O direito do Estado se continha no Estado de di ito era o objeto de estudo do Direito do Estado. Seja como for, a palavra eonsitiiczo” passou a ser usada em algun ‘inventada pelos Antigos. A polissemia era inevitavel. Nao ha nada melhor para ‘significar nada do que uma palavra que signi "Basta recolhermos alguns estudos de do termo para nos idos ¢ de esquemas 4) conceito contetido, vig. a Con: mento escrito que contém um sistema de garantias da liberdade ¢ \divisio de poderes.' “Agesta, por volta de 1943, diferenciava, ao lado do sentido moderno ‘uma norma hipotética diz que vale, mas porque, como dizia Schmitt, is lite; € c) a de ordem concreta—a fonte da Teoria de la Constieucion, Trad, Francisco Ayala. Madtid: Alianza —s Ne Esato 6 JOSE ADERCIO LEITE SAMPAIO ordem constitucional nao se encontra numa norma fundament: nem na decisdo fundamental, mas nos dados uiltimos de: fem que essa decisio esas normas se api”, B uma da Constituigao nogdes da palavré de organizacdo do ‘modo de ser do Estado; c) uma nogio politica .dos principios de orientagio lo ordenamento juridico. E distintos modelos: a) como ordem axiol6gica ~ trata-se de uma estrutura, da sociedade e/ou do Estado, que retine um conjunto de fendmenos sociais que conjunto de fendmenos sociais cristal dado instante, que nfo portam val podendo, em razio disso, ser de: esse desenho o realismo. Verdi, Madrid: Espasa-Calpe As, 1985, p. ‘TEORIAS CONSTITUCIONAIS EM PERSPECTIVA, Z sistema juridico. Kelsen ¢ as teorias da Constituigao formal sio as referéncias desse modelo.‘ s da polissemia.. a decisio, a criagé inuum (uma situago, um devir, ‘como poderemos encontrar nas concep9dk e formal 6, portanto, ido, abrindo mao da pretensa neutralidade que alimenta © fastio do real de quase todos os nossos teéricos, nativos e estrangeiros. procuram reduzir os espagos entre as duas ant proposigiio sintética de uma Constituigao, JOSE ADERCIO LEITE SAMPAIO, 108 nos textos a referéncia A “Constituigtio formal”, ‘omodo de exteriorizagio — u (@) aorigem constituinte—Constituigio 6a reunio de normas; cenunciadas em forma constituinte ou por um érgio consti acordo com um processo legislativo de reforma muito mais complicado do que 0 exi ordi Essa caracteristica confere aos t jor estabilidade e protegdo contra as mai me, deverfia] indrias damesma. BAND, Paul Droit Publi de Empire Allemand. Pais: Giard, Briere, 1990, pal TEORIAS CONSTITUCIONAIS EM PERSPECTIVA, 9 através das leis comuns do pafs”.® A estrutura hierarquizada do ‘ordenamento juridico, para Kelsen, coloca a Constituigio no nivel mais alto dentro do Direito nacional, de modo q inferiormente escalonadas devem respeit A teoria formal de Constituigao _poténcia, sem ocupar-se se sua relagao cor “pode pouco ounada, se faltar a ele bases: _pretender-se rigido e supremo ou cercar-se de virias garantias juridicas de ‘protegdo contra 0 arbitrio, se carecerem substratos _déem a ela a necessaria vitalidade e fortaleza. Nada pode, na verdade, a pura ‘forma diante das intempéries e do mau humor das lutas pelo poder. todavia, 0 apelo & norma como esforgo de racionalidade como elemento indispensével a exata compreensao do itucional. is da concepedo formal ry L. Constitution and Contemporary Constitutional 1 YeeRICCOBONG Pact dp pera Srled “Contcone x Seno Mater Ie CATELAN Aisa: LABRIOCA, Sana acta) Consens Neate ‘ont Catuive Atala urn. Mano: Gt 2001, p139108 10 JOSE ADERCIO LEITE SAMPAIO 1. REALISMO CONSTITUCIONAL SOCIOLOGICO De acordo com o realismo Huma variedade de concepgdes realistas, esquadrinhadas em como forma de dominio; 2) como quadro de luta politi fundamental; e 4) como produto de decisio politica fundamental 1.1, Constituigo como forma de dominio A Constituigdo pode ser vista pela emersio normativa do jogo de poder existente no scio da sociedade. Nao s: predeterminadas a conduzir uma d ‘andamento da conjungao ou predomi feicio pode s \da produgio alea forga social mais poderosa, Sua de uma normatividade ad hoc, getada a partir dos fatos ou iade normas de acordo com o resultado do embate social interesses e crengas desses fatores no estabelecimento documental das insttuigdes e principios do governo tar 0s fatores reais do poder em uma folha de escrita: “A partir desse momento, incorporados fatores reais do poder, mas sim verdadeiro direito por conseguinte, de corresponder & Const poder que regem o pais. Caso contrério,h 4 LASSALE, Ferdinad. A Esséncia da Constiuigdo, p- 1's LASSALE, Ferdinad, A Esseneta da Constituigdo, p42, __ ee | “TEORIAS CONSTITUCIONAIS EM PERSPECTIVA 1 Para ele, seriam fator estan 10, as instituigde reas do poder as forgas que stam para mantr En ‘0 poder organizado ~ a monarquia, a arist “panqueiros; e, em casos extremos ¢ desesperad cla classe peri ‘0 povo, formado pela pequena burgues me atuagio dos fatores do p ismo que estava entio sobretudo por infl a suposta igualdade “Todos”, no entanto, juzem com suas faustas ss¢ roteito, instrumento de de promessas normativas de cidadani lade e abstragiio di HLASSALE, Fendnad A Esséncia da Co “Imaginemos agora que o Govern ( Ete haat bibografa: PASHUKANIS, Evgeni B La Thore sme, Trad, Jean-Marie Brohm. Paris: E.D.L., E 12 JOSE ADERCIO LEITE SAMPAIO dominagdo de clases, apareihado pelasforas hegeménicas enquanto os fundamentais passam a ser vistos como um sistema de pretenses ‘naividuais gravitar em torno da propriedade.”* ‘A concepgao material em destaque tem grande poder critico, pois procura processo deliberativo-democritico (based-process theory). Michelman, acentuar as diferengas ent itucional do poder ;, como 0 parlamento ¢ o governo, que , retomou as bases do pensamento romantica Burke e De Maistre, nao tanto por compartilhar 1s € normativas.'"” O professor de Harvard por Duverger. posts puramentecontrafactuais de'uma instituigdes p m afirmagao de que toda organizagao possui uma estrutura de poder € is rudimentar que sea. Por que? Porque ss Fried vieram © advogados na importincia da tradigio ¢ do labor ae gradual das for 5 precedentes, tanto its government either 10 Bloor dominate one par of society orto become i tntrument” BY ACKERMAN, Bruce. We the People.1. Foundation. p. 17. MICHELMAN, Frankl. Law’ Republic. “The Yale Law Journal”, v 97, 198, p. “1493-1537, 1503, an 1975 19 er seq. re 58. ® MICHELMAN, Frank I Law's Republic, p. 1504. Me i poy =i = oe ao fy el a2 JOSH ADERCIO LEITE SAMPAIO (O constitucionalismo dialogico assume como premissa, portanto, que . Para fendimento de uma série de condigdes s0% processual que confira a0 proceso anatureza dialogica, 1guém se sentindo obrigado, coagido ou de alguma forma violentado em processos de elaboracao do di Todavia, Michelmai Constituigao nao imidade popular de uma janéncia no tempo ou pelo a vontade ou intengo dos pais a, S40 promovidos pela atuagzo rupos especialmente interessados em voz € res the rest of us situation and its relation to our (and Essa dimensio realista 0 conduz a0 aaa de Constituigio que niio se resume & esfera juridica, nem se contenta com uma orientagdo puramente procedimentalista. O intento constitucional, para ele, € de realizagao do bem comum por meio da autoconstituigio e do autogoverno popular, tornando-se secundério 0 planejamento normativo de tomada de devises vinculantes. Essa vocagio de primazia da existencialidade autoria constitucional pelo povo e nao s6 do povo sua teotia de “content-based conception of cons che cies pasos 8 poveroane ue “quis poder te Sea a __ ee ‘TEORIAS CONSTITUCIONAIS EM PERSPECTIVA. 43 V. EM BUSCA DA CONSTITUICAO. PLURIDIMENSIONAL __ OS PRESSUPOSTOS CONSTITUCIONAIS, ‘Uma Constituicao, formal ou real, escrita ou nao escrita, depende de lo nao seri. Bem que poder i¢do-forma e de uma Con: ita de que se cumpra 0 poder de fato, pouco ou nada a folha de papel. No entanto, quem sucumbe a0 a distincao, perde a aura que encanta a humanidade: o poder de € de lutar por sua realizagao. Perder a capacidade do sonho & deixar- o dos desesperangados. Deixar 0u 0 suicidio e a morte antecipada do espirito ao fenecimento do corpo. Tanto mais grave seri. a situaglo, quanto essa escolha for coletiva. Havera no apenas 0 desaparecimento da leta experiéncia” como dizia Holmes." Constituigao como um nevessidade de ordem, liberdade e soberania popular: FIORAVANTI, Maurizio; 44 instrumento juridico-politico com caracteristicas historicas determinadas. Se de desejo efetivo de de mor gh JOSE ADERCIO LEITE SAMPAIO democracia e igualdade. A Const para depois defini tunidades de todo 0 pov i¢do, exige-se o compromet ritica e social por ela estabelecida, um serem todos 0s E preciso, sem embargo, compreendermos a Constituigio em seu ymentoatual que tende aescapar dos pilares da modernidade. A Constituiglo 1oje forma simbolica e estrutura aberta de sentidos que apela para 0 nosso de culto dos arqueétipos fundacionais da vida em comum, descobrir-se concretizando a Constitu ionais nio se da pelo achamento das coisas ou -xto, nem pela afirmagdo puramente simbélica ‘ou mistica de que existe no Olimpo um Hermes capaz de anuncié-lo aos mortais. ‘Nao hé uma “soberania popular” verde ou vermelha, gorda ou magra, quente ou fia dentro dos casulas constitucionais, a menos que apelemos para metiforas. ‘Em ambos 08 easos, 0 momento herbico no apenas marea o inicio de um novo tempo, mas dota @ nagio de instrumentos que serio capazes de guié-la com previdéncia para todo o sempre — sejam cles aintocdvel Constnugdo norte-americana ‘ou as tdbuas sagradas do leninismo. proprios republicanos brasileiros de 1889 mostraram sensibilidade & importincia da disseminagdo de mitos de origem, fator de estabilidade para um regime politico.” ‘TEORIAS CONSTITUCIONAIS EM PERSPECTIVA 45 sar pratico da interpretagio. Nao ‘No debate atual acerca dos pressupostos igo, que tem grande apelo na Europa, -nacional, nio se admite uma [por uma soberania € por um povo para que se possa falar em imigio. Como sabemios, desde a Paz de Westfalia em 1648, 0 terri ada deseo pode, tanto para regula a relagdes s teritoriais quanto para enffentar em nivel de ros Estados. O povo, por seu turno, era um todo letidade coletiva e de um sentimento de pertenga itemente idéneo a dar sustentagio as decisdes da maioria es prestagdes desenvolvimento de partidos p 46 JOSE ADERCIO LEITE SAMPAIO de um “inimigo comum?”, que pode ser interno ou externo ou ambos; material -0 ou ambos. O poder que se nutre dessa conjugagao é capaz de firmar um pacto que assegure e promova essa unidade e afirmacao identitria, constituindo ou conformando 0 Estado com poderes ou fungdes limitados, assegurando as liberdades det liberdades € 0 interesse ou poder origindrio & de base popular e elabora a Constituigao que reconhece tetroativa e prospectivamente qui ice ao povo, sendo em seu nome exercida por poderes Ha teses pés-nacionais dando conta de que, embora povo seja um grupo heterogéneo, que a soberania se relativize interna ¢ externamente © que territério possa vir a ser gotado de mobilidade, nio se pode abandonar a CConstituigdo como um documento fundamental para disciplina da vida politica para promogao dos valores part © seu cariter ideal aberto se \mostra fundamental ¢ indispensdvel para que distintas visdes de mundo coabitem 0 mesmo territsrio sob as balizas do igual respeito e consideragao, ce das regras procediment as de promulgagao ¢ aplicagio do direito, ccuja justia decorre do lizas e dos procedi (Os pressupostos da Constituisao estdo intimamente ligados a teleologia constitucional como veremos em seguida. 2. A TELEOLOGIA CONSTITUCIONAL ‘com a maneira concreta de Pode, quando ter tido uma fungo, mas nada que se possa projetar para o futuro. Para os outros, a Constituigdo é um conjunto de normas que apresentam peculiaridades em relagdo as outras normas do sistema juridico, sem pertinéncia ou vinclilo fits Ana sega a nomproeuot eto none realizar (uma teleologia constitucional), que pode estar expresso no texto ou BURKHARDT, Walter. Methode und system des Rechts, Zarich: Polygrapischer Verlag, 1936, p. 132. ‘TEORIAS CONSTITUCIONAIS EM PERSPECTIVA, 47 o cultura consttucional, designadamente a de promover |, a estabilidade, a previsbilidade, a seguranga ea unidade (unificagdo) para evitar 0 caos, sendo, enti, um instrumento de governo ituigdo, esto as concepgdes que se firmam no pressuposto @0 texto consttucional transform: ico em juridico. igo € um ato da integragao fatica ~ mediante os processos de decisto que ordena imentalismo orientado por um fim)."“* Ou ainda podem enxerga-la ico gerador ¢ promotor da paz,'* de realizagao Publica ex constitutione), de maximizagio do bem- uma forma de ts? Para alternativas) Estado: La litische Schrifien. Tdbingen: Mohr JASPER; Karl T. Die Idee der Universit Comparative Study of their History and Exists Sons, 1930. 48 JOSE ADERCIO LEITE SAMPAIO quadro), como pode incorporar uma série de tarefas e programas para oEstado, 3s fins 04 antesum fazer- ,elandoéuma*brooding omnipresence’ sacred voice expressing a unitary vision iocadeira ou ordculo sim de construgio vozes, algumas vindas do passado, outras 1a do tempo futuro, mas a servigo da autocompreensti ética de uma dada sociedade existente e imersa que 0 mundo nao se reduz. aos valores de et ‘essas observagdes, avangamos sobre pelo mer coletiva de da mediagao de Conflitos entre as diferentes propostas de governa. O estabelecimento de regras Para 0 proceso garante pelo menos um sentido fraco de racionalizagio, entendido como um “progredir obediente a normas”. A juridificago nao é, todavia, fechada, mas aberta e flexi is procedimental, sem perder de vista, no entanto, a garantia das outras finalidades constitucion: ligdo. A pedagogia de propaganda de fente, que tentam renovar diariamente 1Go ndo apenas de seu simbolismo, 0s que contém, Ei Wes € principios pode soar autoritario ‘ou utépico. No entanto, convivemos com um denominador comum de erengas © concepgées de mundo que compiem, por assim dizer, o niicleo axiol6gico

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