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Vinicius Dias

Cultura Francesa II
Les français ont aussi um accent- Planète Rando
Nelson
Passos que se dão no Canadá e na França, mas não no Brasil

Jean-Benoît Nadeau em seu livro Les Français ont aussi un accent descreve sua
experiência com “randonnés” na França, que pode ser entendido como passeada,
caminhada. Experiência difícil de traduzir aqui, o brasileiro sente um choque tremendo
ao ler em “Planète Rando” o cultivo dessa atividade no estrangeiro. O canadense Nadeau
descreve sua experiência com uma franquia de caminhadas Touring Club Francilien,
TCF. Sim, uma franquia! No auge do sucesso, o grupo contou com mais de um milhão
de membros segundo o autor. Um fato surpreendente é o de saber que há vários hotéis
espalhados pela França para servir de parada para quem se aventura nessa experiência.
Na minha infância, tive a sensação de caminhada ser algo excêntrico, malvisto.
Parecia uma atividade de velhos, de pessoas que tinham preguiça de jogar futebol. Parecia
algo de madame chique que não queria suar muito ou até coisa de rapazes frágeis. Mais
tarde descobri que não era tão simples continuar com a vida agitada de uma criança e
percebi que, na verdade, a maioria das pessoas caiam no ócio, inclusive eu mesmo havia
me tornado um sedentário na adolescência.
Não sei se foi o meu amadurecimento ou o do Brasil nessa questão. Parece que
muitas pistas de caminhada foram criadas e no noticiário se divulga mais a importância
de uma atividade como a caminhada.
Há o fator turístico também. Infelizmente, o Brasil não tem essa cultura, ou, mais
provável, não tem pessoas capacitadas para gerar um serviço de larga escala assim.
Também pesa o fator da idade do nosso país. Nadeau destaca que no Canadá não se vê
Igrejas do século XII. Ao menos, nisso se parecemos mais com o Canadá. Aqui não há
tantos monumentos históricos, enquanto na França, imagino eu, nos deparamos sem
querer com um a cada quilômetro.
O mais perto de um “Randonné” que tive na vida foi uma peregrinação que fiz ao
Bom Jesus dos Castores, aqui em São José do Rio Preto mesmo. Descemos em algum
ponto da rodovia, levados pelo ônibus da prefeitura. A expectativa era de percorrer 20km
à pé, mas depois falaram que fizemos 32km na realidade. Fui rezando o terço, então não
falei muito, mas as conversas não variavam muito. No início, a tensão e a dúvida: será
que daremos conta de chegar a pé ao ponto de chegada? Já depois da metade, as
reclamações de dor no pé e cansaço. Alguns mais espirituosos se desafiavam dizendo que
queriam bater o percurso em menos de 5 horas.
Nadeau fala que há dois grupos típicos nos “randonnés”, os espartanos e os
hedonistas. Os espartanos possuem esse espírito mais esportivo, guerreiro. Não
descansam muito, andam rápido, comem em pé etc. Os hedonistas são o contrário e
tentam fazer tudo de maneira mais relaxada. Acho que também havia um pouco disso na
peregrinação. Os espartanos talvez pudessem ser chamados de cruzados nessa situação,
sempre motivando a galera a engolir o choro e a ser mais penitente em nome de Cristo,
enquanto os hedonistas seriam os laxistas reclamões.
Nadeau fala da obsessão dos franceses pela imensidão. O canadense estava
preparado para dormir em um refúgio menos confortável, mas quando viu o refúgio, se
deu conta que era uma casa, ou talvez, em nossos termos, se parecia com um hotel com
tudo disponível, cozinha, bom banheiro, água etc. Não sou especialista em acampamento
Vinicius Dias
Cultura Francesa II
Les français ont aussi um accent- Planète Rando
Nelson
ou em passar noites em pousadas, mas não foi bem essa a minha experiência. Sempre
enfrentei condições precárias nesses locais. O canadense continua dizendo que os
franceses não entendem os perigos de paisagens muito grandes. Os canadenses precisam
levar um kit de sobrevivência no carro, para caso se percam! Aqui no interior do Brasil é
tudo tão monótono. Na minha cidade, na verdade, nem é necessário nem ao menos
carregar a carteira com documentos. Imagino que na capital seja diferente, mais agitado.
Talvez seja preciso um kit de primeiros socorros para caso alguém levar bala perdida.
Nadeau fala um pouco da natureza. Na França mijou em heras venenosas, planta
que deixa a pele queimando. Não há nada disso no Canadá segundo o turista e creio que
tanto os canadenses quanto os brasileiros pensam que é só uma supervilã do Batman. O
viajante continua falando dos perigos do Canadá, citando os ursos e guaxinins ladrões.
Nessa hora senti que a visão romântica da natureza acolhedora do Brasil é verdadeira.
Sinceramente, não consigo imaginar nenhum perigo do gênero. A maioria dos animais
aqui é de pequeno porte, difícil de causar danos graves como um urso. É raro ouvir falar
de casos de envenenamento na floresta ou coisas do gênero. Os predadores aqui também
costumam ser menores. De praga, recentemente se fala muito do javali que vem se
proliferando no Brasil e não tem predador natural, talvez seja o mais perto que temos de
um urso.
Enfim, como não sentir aquele complexo de vira-lata lendo sobre as experiências
em outros países? Os randonnés são os passos que o Canadá e a França deram, mas o
Brasil não deu.

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