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MALDI, Denise. 1991. “Guardiães da Floresta :Rio Guaporé, século XVIII” Ed.Petrópolis,1989.

(:26-52) Guerreiros do Jaguar – os Povos da Savana


Maldi listas as seis sociedades de Mojo habitantes da região tributária dos rios Mamoré e Guaporé
(Mojo, Cajubaba,ítonama, Movima, Cacnichana, Baure.)
(:28-34) Mojos
Grupo com passado interligado ao império inca, de quem chegaram a ser tributários, os Mojos eram
subdivididos em vários grupos, provavelmente de mesma língua, classificada enquanto Aruak.
Relatos dos primeiros jesuítas a adentrarem a região, atestam que em cinco aldeamentos ao longo
do rio grande viviam os Suberiono, no mesmo rio reuniam-se ainda os Casaboyono, os Guanapeono
e os Aperucano. Nas margens do Guaporé os Sabaquereono em três aldeias, ao longo do rio,
seguiam-se os: Satirnono, Apereano, Mayuncano, Siyocono, Cubiquiono, Boseono, Mubocono E
Mapereano.
Os sufixos No e ono designavam a forma plural segundo Maldi.
A população Mojo era estimada em finais do século XVIII , em cerca de 40.000 pessoas, espalhadas
em 72 aldeias, com média cada uma de 60 a 80 habitantes. Estabeleceram comércio com povos
limítrofes como os Mosetene- também tributários dos Incas- com eles trocando algodão e penas, por
objetos de metal e sal. As aldeias Mojo eram interligadas por uma série de estradas, formando uma
unidade social básica, assim como contatos constantes entre as mesmas ,a partir de festas. As
aldeias formavam unidades sociais básicas, ligadas por laços de solidariedade forjados sob o
alicerce da língua comum compartilhada, laços de parentesco e religião.
As aldeias eram nomeadas em nome de alguma divindade, o território ocupado por uma aldeia era
interligado a divindade “protetora” do sítio, de tal forma que a ideia de migrar do local da aldeia,
era interpretado pelos Mojo enquanto uma possibilidade de perderem a proteção da divindade.
Designadas genericamente enquanto acsane, estas divindades tinham gerência sobre variados
elementos da natureza da vida, como : Florestas, rios, Lagos, Morte, etc.
A coesão entre as aldeias era conseguida a partir das cerimônias de consumo coletivo da chica. Em
intervalos regulares, as aldeias se reuniam e durante três dias bebiam, dançavam e conversavam.
A base econômica da sociedade Mojo era a agricultura. Com as principais culturas sendo o milho, a
mandioca, mamão, banana, cana-de-açúcar e algodão. Serviam-se também da caça, em especial de
macacos, veados e pássaros. Assim como da pesca, tendo em vista o perfil alagadiço da região em
que residiam.

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Seu arsenal bélico incluía arco e flecha, dardos envenenados, bolas, lanças e o macaná, o último,
comum a todas as sociedades da província. Assim como eram considerados exímios ceramistas.
(:34-35) Os Baure
Falantes de Aruak, ocupavam um território ao longo do rio Baures, ao longo do rio Itonamas e na
região entre o último e Guaporé. Com maior concentração ao longo do baixo Baures.
Suas aldeias eram cercadas de paliçadas como demonstra a representação a seguir:

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A população Baure era muito superior à dos Mojo, fontes jesuítas em 1700, estimavam os Baure em
cerca de 80.000 habitantes distribuídos em 124 aldeias. Estas eram interligadas por estradas,
garantindo uma comunicação regular, aliando a isto, a coesão social era também conseguida por
meio de laços cerimoniais onde ocorria o consumo coletivo de chica.
Possuíam estratificação, com três perfis bem definidos: líderes (religiosos e seculares), aldeões e
prisioneiros de guerra.
Fontes jesuítas apontam o carácter politeísta do grupo e culto ao Jaguar. Usavam tipoia assim como
os Mojo e acrescenta-se eram patrilocais.

(:36-37) Os Cajuaba
Variavam no último quartel do século XVII entre 1.800 a 12.000 pessoas. Eram considerados uma
sociedade estratificada, com a descrição pelos relatos de uma figura de liderança nomeada Patiti,
que cada aldeia possuía, mas que pouco se sabe pelos fragmentos de informações recolhidas.
Eram considerados falantes de uma língua “isolada”.dada a inteligibilidade de sua língua com a de
outros povos. Alguns de seus habitantes ostentavam mantas luxuosas, com ornamentos de prata
enquanto item comum a vestimenta de alguns homens.
O perfil arquitetônico das aldeias é ressaltado. Havendo em cada aldeia uma praça,ruas e um
“templo”segundo os relatos, acrescenta-se que no centro das aldeias, uma fogueira ardia dia e noite.

(37-37) Os Itonama
Habitavam no século XVII as margens do rio Machupo, desde a lagoa Itonama.
Aceitaram a catequese jesuíta e a realocação para a missão de Santa Magdalena, após um ataque por
escravagistas a suas aldeias em 1720 aprisionar cerca de 2.000 índios.
Ate o ataque, eram organizados em cerca de 23 aldeias. Com população girando em torno de 6.000
pessoas. Eram considerados tecelões hábeis, com suas tipoias sendo consideras de altíssima
qualidade pelos outros povos de Mojos.

(:37-39) Os Movima
Habitavam as planícies a oeste do Mamoré, ao longo dos afluentes Yacuna e Rapulo. Em 1700,
habitavam 80 aldeias cerca de 2.000 índios.Por habitarem território com a maior porção de campos
drenados da bacia do rio Beni, especula-se que tenham deslocado os Mojo ou outras etnias em
tempos pré-colombianos.

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Eram falantes de uma língua considerada isolada.
(39-40) Os Canichana.
Considerados os mais bélicos dos povos da região, ocupavam a margem direita do Mamoré e das
cabeceiras do Machupo, totalizavam em 1693, cerca de 4.500 pessoas. Distribuídas em 72 aldeias,
cercadas de paliçadas assim como os Baure. Mesmo 100 anos sob as missões jesuítas, não lhes
negou totalmente o espírito guerreiro, Foram líderes de duas revoltas contra os Espanhóis, em 1801
e 1820, quando queimaram um edifício guardião de arquivos jesuítas.
Maldi ressalta que o rio Mamoré foi um eixo dos territórios Mojo, Movima ,Canichama e Cajubaba.
Baures e Itonama estavam mais próximos do Guaporé. As localizações destes povos, foram
parcialmente mantidas pelos jesuítas, que estrategicamente fundaram as missões nas áreas das
aldeias principais.
(:40-45) Os Guarayo, Os Pauserna e os Chiriguano.
Reconhecidos enquanto uma única sociedade designada enquanto Itatin. Estes três grupos
descendem dos Guarani, mais especificamente de levas expedicionárias Guarani, que subiram do
Paraguai até a região - então uma das fronteiras Incas - entre finais do século XV e início do XVI
em quatro expedições guerreiras (1476,1513,1519,1521). Especula-se que estas vastas expedições
Gurani- A qual o Inca Huayna Capac respondeu construindo uma série de fortalezas na fronteira do
império.-explicavam-se tanto pela busca dos Guarani por ouro e prata, do qual as Caracará (charcas,
chica) estavam providos e provavelmente se dispersou por meio dos Chané - habitantes de um
território dos Andes até o alto Rio Paraguai - até os Guarani, quanto pelo desejo cosmológico
Guarani por uma terra de fartura e sem males.
Quando do seu recolhimento as missões no século XVII, parte do grupo manteve-se nas margens do
rio Paraguá, afluente do Guaporé,fato em “pau cerne”, o que deu origem a sua nova denominação:
Pauserna.
A história destes povos com as missões religiosas é diversa. Os Guarayo foram recolhidas as
missões de Chiquitos em um processo contínuo entre fins do século XVII e XVIII. Os Chiriguano
resistiram por sua vez, durante boa parte do período em que foram incorporados a catequese, faz
questão de frisar a autora que atacaram as várias expedições punitivas enviadas em sua direção., em
1609 houve as primeiras tentativas de catequizá-los, sem êxito, por dois frades franciscanos. Em
1727 houve uma grande rebelião Chiriguano contra os missionários estabelecidos em seus
territórios.
“Livres”, finalmente em 1929 com a secularização das missões, parte dos Chiriguano passou a

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empregar-se nas fazendas e intensificou-se o casamento com não-indios.

(:45-46) Os Txapakura
Tinham seu território ancestral no alto e médio rio Baures. Cronistas assinalavam suas numerosas
aldeias cercadas por paliçadas.
Alguns citam suas semelhanças com os Mojo, como: uso de tipoias e as semelhanças entre a língua
Aruak dos Mojo com a língua Txapakura. Teoriza-se neste sentido, uma migração em tempos pré
colombianos deste povo do Alto Mamoré para variados locais.
Teoriza-se que ancestralmente, alguns grupos Txapakura atravessaram o Mamoré e fixaram-se em
alguns de seus afluentes da margem direita, onde estão atualmente os Pakaas-Novos, únicos por
serem o único povo Txapakura em território Brasileiro.
Migrações Pós-Colombianos foram responsáveis ainda, pela migração de grupos Txapakura do
Baures para a região acima do afluente San Simón.
É registrada ainda uma outra migração após a expulsão dos jesuítas, que levou os grupos à
cabeceira do rio São Miguel, afluente da margem direita do Guaporé, onde foram encontros no
início do século XX, os Huanyam ou Pawumwa, hoje extintos.
Finaliza Maldi de forma categórica. Afirma que o Guaporé agrupou ancestralmente os povos
Txapakura, não tendo sindo observada a presença da etnia em nenhuma outra região.

(:46-53) Os Sirionó
Diversidade sociocultural da planície de Mojos é ressaltada pela autora neste subtópico que assinala
entre outras informações, o carácter singular dos Sirionó.
Povo possivelmente formado pelos remanescentes de alguma civilização subjugada, eram um povo
nômade, organizado em pequenos grupos de 30 a 40 pessoas, sob a liderança de um “chefe” de
pouco poder efetivo, no ponto de vista ocidental. Não fabricavam canoas, andavam nus e tinham
habitações temporárias.
A diversidade étnico cultural da província de Mojos foi explorada pela autora, que revela um
mosaico de línguas, classificadas segundo aponta, do seguinte modo:

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Maldi, finaliza apontando um quadro do cenário demográfico na região em fins do século XVII:

(:53-61) Os “Pequenos”– Povos do Planalto Chiquitano


Também designados enquanto “pequenos”, os variados povos habitantes entre os 15° e 20° de
latitude sul do oriente Boliviano viveram por muito tempos isolados uns dos outros, caracterizando-
se pela sedentarização. Receberam a designação dos espanhóis, por causa da altura diminuta da
porta de suas casas. Um nome genérico, acabou aplicado a região que viviam: A província de
Chiquitos.
Agrupados sob a denominação genérica de “Chiquitos”, os povos eram logicamente radicalmente
diferentes entre si, o que pontua Maldi, torna tarefa difícil a confecção de um panorama etnográfico
sobre a região. Ainda assim, a pesquisadora nos apresenta as classificações linguísticas feitas a
partir de fontes jesuítas por Métraux, Paul Rivet e Créqui-Montfort. Uma língua isolada Chiquitana
era citada pelo jesuíta Hervás primeiramente, subdividida em quatro subgrupos:

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Os Saraveka habitaram no século XII, as margens do Rio Verde, afluente do Guaporé e tinham
enquanto vizinhos os Pauserna, os Paunaka e os Paikoneka.
A partir de fontes históricas, a autora assinala que as semelhanças da língua Saraveka e alguns
dialetos Aruak, situa a língua enquanto uma língua Aruak. Acrescenta-se ainda, suas semelhanças
com certas línguas do norte Amazônico e poucas similaridades com dialetos Bolivianos.
Uma série de outros grupos Aruak é ainda considerada habitante tradicional da região ao norte de
Concepción de Chiquitos, entre as cabeceiras dos Rios Blanco e Verde.
Um grupo Chiquitano que foi bem descrito pelos missionários, foi o Manasi. Contactados em 1704,
habitavam o noroeste da província e segundo informam as fontes da autora, eram divididos em
diversas aldeias que teriam ruas e praças regulares, os contatos entre essas aldeias eram constantes e
de caráter cerimonial.
Eram uma etnia que tinha sua subsistência retirada da caça e da pesca, com cerâmica considerada
notável.
(:61-68) Caminhos Da Planície. A Conquista Do Oriente Boliviano.
A expansão colonial no planalto chiquitano deu-se a a partir de alguns centros irradiadores, em
especial as cidades de Assunção e de Santa Cruz de La Sierra. Anterior a fundação de Santa Cruz ,
foi fundada a cidade de La Plata, numa região de tradição Inca.
Maldi faz um breve histórico da região. Com presença de povos conhecidos enquanto Collas, a
região do Altiplano Boliviano foi subjugada pelo império Inca em fins do século XV, pouco antes
da destruição do império pelos Espanhóis. Na manutenção do controle sobre a região, Maldi pontua
que segundo fontes históricas, a elite Inca, utilizou-se de três estratégias básicas no controle social:
• Hostilização de um povo contra o outro
• Escravização de alguns povos às expensas de outros
• Deportações forçadas de povos inteiros
Encontrando uma dinâmica economia escravista no decadente império Ameríndio, os Espanhóis
apropriaram-se das estratégias nativas de escravatura nos primeiros anos de colonização.
Maldi pontua brevemente a história ou “mito fundador” de algumas das cidades polo da região, as
sagas e intrigas dos primeiros “heróis” europeus a avançarem, dominarem e colonizarem as terras
desconhecidas estão na base da narrativa do histórico de fundação de uma série de cidades, entre
elas Sucre, Assunção, Santa Cruz, entre outros povoados.

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A reputação cimentada pelos europeus a partir de sua irradiação do subjugado império inca,
cimentou a percepção dos povos das planícies Bolivianas. Quando no início do Século XVII, uma
expedição liderada por Solis Holguín faz contato com os Tapacura, os povos da planície já não viam
com curiosidade aos exploradores europeus e sim como uma ameaça. Santa Cruz a cidade de onde
vinham, era um conhecido centro irradiador de conquista, de onde partiam as expedições
escravagistas. Maldi sublinha uma especificidade na “conquista” da planície Boliviana.
Em seu sentido tradicional, “conquista”, significava o estabelecimento de uma nova hierarquia de
dominação e a divisão destes em sistema de encomiendas, assim com a fundação de cidades, algo
que não ocorreu na planície.
Na região ocidental da Bolívia, a colonização foi feita através das encomiendas - um sistema
herdado dos Incas pelos hispânicos – e na região oriental a partir das Missões.
A área de Chiquitos foi cedo alvo dos Portugueses que invadiram a região em assaltos frequentes a
aldeias de índios Chiquitanos, assim como missões Guarani, que passaram a atacar a partir de 1618
no rio Paraná. Os ataques Lusos, não eram simplesmente atrás de mão de obra escravizada,
indiretamente esses ataques buscavam desgastar os domínios espanhóis, um objetivo deliberado
destes ataques.
A maior parte das missões estava instalada em locais estratégicos, cumprindo a função de defesa do
território, assim como de barreira ao rival. Impedindo seu avanço as áreas com recursos
econômicos. Simbioticamente ligadas no processo conquista estavam a catequese e a ação militar.
Trabalhando solitariamente ou em grupos, os missionários eram a base da dominação colonial em
muitas regiões por serem menos onerosos que a manutenção de uma guarnição militar.
(:69-70) As Missões
Maldi pontua o caminho a ser percorrido no próximo tópico, frisando a parca documentação
disponível até então sobre as missões Mojo e Chiquito. A essa lacuna, se deve um conflito em 1820
entre o governador espanhol da província e índios Canichana em San Pedro. O governador
espanhol na ocasião exigiu o bastao, símbolo de poder, de um cacique Canichana, na negativa do
cacique, que afirmava que o mesmo tinha sido um presente de deus, o Governador o baleou com um
tiro no peito. O filho do cacique em revolta organizou a fúria Canichana contra o governador, que
sob a ira indígena escondeu-se com seus soldados no antigo colégio dos Jesuítas, de onde
começaram a atirar nos índios que em resposta atearam fogo ao edifício. Obrigados a saírem o
governador e seus soldados foram mortos, assim como as informações que carregavam os
manuscritos Jesuítas perdidos nas chamas.

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As informações históricas disponíveis sobre as missões Mojo e Chiquito, são provenientes em
grande parte de relatos de viajantes em visita a região no século XIX. A tônica dos relatos é de
êxtase e perplexidade com as ruínas. Por meio dos relatos desses viajantes, Maldi busca construir
um panorama das missões.

(:71-88) A província de Mojos


Maldi inicialmente historiza a formação das diversas missões na província de Mojos, com suas
datas de fundação, localização e etnias reducionadas.Cenário que pode ser sintetizado pelo quadro a
seguir, de produção da própria autora:

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Parte a autora a detalhar características destas missões. Assinala a autora que as missões Mojo
buscaram respeitar divisões internas das sociedades subjugadas, buscando emular nas missões uma
estrutura administrativa em conformidade com a estrutura social nativa. A unidade administrativa
mais importante era a parcialidad, ela poderia corresponder um grupo étnico inteiro no caso de
haver mais de uma em uma missão ou poderia corresponder a uma divisão interna de uma mesma
sociedade, como um clã por exemplo. Cada missão possuía oito cargos administrativos exercidos
por índios, com a autoridade maior recaindo logicamente sobre o missionário europeu:

As missões eram arquitetonicamente e administrativamente similares, com a igreja imponente no


centro das missões, representando sua onipotência na vida cotidiana.
A organização da missão Santo Reyes, recuperada por um historiador, da algumas evidências sobre
o que seria a hierarquização da vida social nestas missões. Os 648 habitantes desta missão estavam
divididos em duas categorias:
As famílias – incluindo-se nessa categoria todos os praticantes de algum ofício como marceneiro,
pintor, cantores, ferreiros, etc. Partilhavam o excedente de comida produzido pelos membros da
missão em troca dos seus “serviços” e tinham status de “elite”.
O pueblo- O resto da população.

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Estas missões, ate o início do século XVII concentraram-se ao longo do rio Mamoré e seus
afluentes; a partir de 1709 começaram a expandir-se pelo Rio Baures e a partir de 1719, pelo Rio
Itonamas. Em 1743 iniciou-se a ocupação do rio Guaporé.
A presença jesuíta no oriente Boliviano durou cerca de um século, de 1688 a 1768, com sua
expulsão da região. Muitas missões tiveram duração instável. As que tiveram êxito são hoje o gerne
de fundação da maioria das cidades da planície Boliviana, muitas próximas de afluentes e
tributários do Guaporé: Trinidad, Loreto, San Javier, San Pedro, Baures, Magdalena, San Joaquim,
Santa Ana, Reyes, San Borja e San Ignacio.

A ferra disciplina imposta pelos jesuítas foi um elemento catalisador da desagregação sociocultural
nativa após a saída dos clérigos. Incapazes segundo Maldi, de se reorganizarem após a expulsão dos
religiosos, os povos de Mojo reagiram com perplexidade e mesmo revolta contra os novos e cruéis
curas e posteriormente com migrações massivas com destino a margem direita do Guaporé.

(:88-98) Província de Chiquitos


Em narrativa similar a desenvolvida no subtópico anterior, a pesquisadora se utiliza de longa e
detalhada exposição histórica da fundação das primeiras missões jesuítas em Chiquitos. As quais
identifica em sua data de fundação, etnias e localização no quadro abaixo:

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(:99-112) O Primeiro Narrador, o Primeiro Aventureiro: A descoberta das Missões
Raposo Tavares teria sido o primeiro explorador Europeu a alcançar o Guaporé em uma de suas
investidas sobre os povos indígenas locais no século XVII.
Partindo desta premissa, Maldi inicia a descrição em clima “heroico” da descoberta das primeiras
missões jesuítas da região pelo governo da então Província do Pará no início do Século XVIII e os
detalhes da visita a estes primeiros cristãos europeus vivendo nas margens do Guaporé.

(:113-118) A ocupação espanhola da margem oriental.


Maldi historiza a ocupação em meados do século XVIII, da margem direita do Guaporé por três
missões Jesuítas espanholas. Tendo como única fonte sobre o fato, o cronista Luíz Fagundes de
Machado que visitou a região em 1749/50.
Três Missões jesuítas espanholas chegaram a ser instaladas na Margem direita do Guaporé. Quais
seriam: San Miguel do Guaporé- fundada em 1746, instalada na foz do rio Baures pelo clérigo
Gaspar Prado com 4.000 índios uma missão na ilha Grande. Ou Comprida, localizada na foz do Rio
Mequens, e finalmente, também em 1746, a missão San Simón, formada com índios Moré.
As três missões contavam em conjunto com pelo menos 5.000 índios, a maioria Moré e Aricoroni.
Localizadas em território reconhecido amplamente enquanto Português apesar de acordos de limites
ainda não terem sido firmados, estas missões cumpriam aos desídios da política externa espanhola,
representando aos burocratas lusos, um inimigo a ser vencido.

(:119-189) O Guaporé Lusitano


(:121-128) Itenez, Cautário,Mequens: O nome dos rios, o nome dos povos

Maldi passa a uma breve descrição do processo formativo da região, seu histórico de formação, seus
povos nativos, etc.
Os Moré, possivelmente foram os primeiros povos da margem direita do Guaporé a quem os
Portugueses tiveram contato em sua ocupação da região no início do século XVIII. Povo de amplo
território, habitava diversos pontos em ambas as margens do rio, com presença também nos rios
Baures e Machupo no território da atual Bolívia.
A pesquisadora sublinha o papel que muitas expressões de origem indígena tiveram na nomeação de
muitos rios da região (Corumbiara, Mequéns, Sararé, Caxibi, Baures, etc). O rio “Mequéns”, teria

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sido denominado em homenagem a um cacique no rio Pareci, o Rio Guaporé, seria também
chamado Guaraporé, designação de origem desconhecida, assim como o rio Corumbiara, designado
Corumbijara por alguns cronistas, também sem explicação. A esta incoerência Maldi aponta a
possível deturpação, modificação, por navegadores, cronistas e exploradores de relatos colhidos
entre indígenas. Situados na inter-relação entre história e cosmologia, a imagem construída pelos
indígenas sobre certo povo ou paisagem era eivada de mitologia, ao mesmo tempo que carregava o
acontecimento histórico simbolicamente.
No registro desses relatos, cronistas já o fazem de segundo mão, a partir da construção mágica, que
exploradores, navegantes, etc já haviam construído em sua memória desses lugares e povos mágicos
e ao mesmo tempo perigosos.
Maldi parte a listar as primeiras sociedades indígenas a serem mencionadas em documentação
histórica, entre estas: Os Guarayo - considerados canibais - os Urumus, Guarayutaz, os Moré - Na
Missão De São Miguel - Aricoroni, Guajaratas, Pauserna e Guarayo.
A ocupação Tupi da margem direita do Guaporé é anterior a migração dos Guarayo, Maldi afirma
que os estudos do arqueólogo Eurico Miller, concluem que o alto-médio Guaporé foi inicialmente
atingido por grupos agricultores ceramistas em cerca de 900 E.C, coincidente ao aumento de
umidade e temperatura entre 900-950 E.C e melhores condições de subsistência. O arqueólogo
conclui que os primeiros grupos fariam parte do tronco Tupi, falantes da família Tuparí de língua
Guaratagaja.

Duas teorias norteariam a história de ocupação indígena da região: Os Guarayo-Pauserna atingiram


a margem direita do Guaporé no século XVI, vindos da região de Santa Cruz, na segunda versão,
em tempos pré-colombianos, grupos Tupi emigraram da região do Aripuanâ, atingindo a cabeceira
dos rios Mequéns, São Miguel, Branco, Colorado e Corumbiara, e após cisões, finalmente
alcançaram a margem do Guaporé
O quadro encontrado pelos Portugueses, quando de sua chegada a margem direita do Guaporé
aponta um quadro etnográfico formado por sociedades de linguá Txapakura e Tupi, sem contato
entre si. A pesquisadora ressalta ainda, a descrição de Levý-Strauss do Guaporé enquanto fronteira
entre a cultura Mojo Chiquitana(margem esquerda, Andina ) da cultura amazônica (margem direita,
com duas áreas: Txapakura e Tupi).
(:128-140) A sagração do Ocidente
Criada em 1748, a província de Mato Groso que incluía então a região do Guaporé , abarcava um

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território de cerca de 48 mil léguas, fazendo fonteira com São Paulo no sul e com o Grão-Pará no
norte. A importância estratégica da província ao império Português é atestada pela escolha de Dom
Rolim de Moura para o cargo de governador.
Homem de formação cultural distinta, Rolim de Moura é apontado governador da província em
função das pressões do conselho ultramarino Português que recomendava a indicação de um
governador “distinto e inteligente” para a estratégica região fronteiriça.
Rolim de Moura chega as margens do Rio Guaporé em dezembro de 1751 e trata de cumprir as
ordens da coroa, fundando as margens do Guaporé a Vila Bela da Santíssima Trindade de Mato
Grosso, onde se instalou.
A estadia de Rolim de Moura na região é o pano de fundo utilizado pela autora para a descrição das
intensas rivalidades geopolíticas entre Madrid e Lisboa nesta faixa de fronteira. A discórdia entre os
dois poderes ibéricos é sumarizada nas disputas entre jesuítas Espanhóis e Portugueses por
evangelizar o maior número possível de índios na região, acarretando o fortalecimento das missões,
que guarneceriam, fortalecidas com os números de índios “evangelizados” a fronteira do Guaporé,
contra o avanço territorial do rival.
Maldi ressalta as contradições das relações transfronteiriças entre os dois impérios. No que pese os
conflitos e proibições de Lisboa, as trocas comerciais entre uma margem e outra continuavam
fluindo normalmente. Seja de forma dissimulada entre Jesuítas espanhóis de Mojo e Jesuítas
Portugueses, seja com anuência do governador da província.
A expulsão dos jesuítas em 1759,incide no abandono das mesmas pelos índios e consequentemente
ao enfraquecimento da vigilância da fronteira lusitana. Rolim de Moura, em resposta procede a uma
militarização da região, escalando as tensões na região, que finalmente deságuam num conflito
militar limitado -guerrilha-com a coroa espanhola. A vitória portuguesa neste conflito, garante a
posse portuguesa da margem direita do Guaporé.

(:141-152) Exército de índios: De Gentios a Vassalos.


Maldi discorre neste subtópico sobre a militarização indígena formulada pelos jesuítas. No que pese
o discurso inicial das reduções sob ideais cristãos de paz e solidadriedade. A necessidade de
proteção das missões frente os constantes ataques de escravagistas portugueses e espanhóis foi um
elemento fundante na mudança de atitude dos clérigos.
Vistas pelo colono médio, assim como por parte da administração colonial, enquanto reservatórios
de mão de obra indígena, tendo em vista que apesar das epidemias, se mantinham em uma

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demografia estável. As missões eram continuamente atacadas por bandeirantes ávidos por
escravizar indígenas.
Apesar das ressalvas e ocasionais negações, as cortes ibéricas tendo em vista seus interesses
territoriais concordaram em armar as missões, apesar das ressalvas dos colonos com relação ao
assunto.
Na América espanhola, ressalta Maldi, os jesuítas com apoio do governo, interessado na proteção de
suas fronteiras, conseguiram constituir um verdadeiro exercito indígena na província de Mojos,
limítrofe ao parcamente defendido Guaporé Lusitano. Gonçalves da Fonseca em viagem a fração
espanhola da fronteira em 1749, listava cerca de 4.000 índios enquanto aptos às armas.
Maldi ressalta o papel do índio no imaginário dos burocratas portugueses do período. Na crônica
oficial e relatos de viagem do século XVIII, raramente utilizavam da palavra “tribo”, optando pelo
uso da noção de “nação”, distinguidas sob a dicotomia “barbaras e mansas”. Um produto do
pensamento do século, a que o estado selvagem não antagoniza com a ideia de cultura. Neste
sentido, “bárbaro” é a sociedade, de “natureza má”, que nega a catequese e a conquista.
A instrumentalização dos índios aos interesses geopolíticos da coroa,é evidente na cronica oficial,
em um primórdio da política de “caboclização” contemporânea. Interessava a coroa a transformação
destes índios em vassalos do rei, tendo em vista a defesa das riquezas da terra, assim como sua
possível utilização futura no combate aos índios espanhóis.
Essa noção dos índios enquanto “guardiões da fronteira” ibérica, foi utilizada por ambas as
metrópoles e teve consequências catastróficas a várias sociedades indígenas. Os Paiaguá, habitantes
das proximidades do Rio Paraguai, foram perseguidos sem quartel pelos Portugueses, por serem
considerados guardas espontâneos da fronteira da coroa de Castela. Neste sentido, uma outra
hipótese de “guerra justa”.
Em benefício de suas estratégias territoriais, as cortes insistiam que os povos indígenas não
poderiam ser retirados de suas aldeias de origem. Capitães generais no Guaporé, traçaram diretrizes
para coibir emigrações indígenas. Não havendo conflito com as terras de colonos europeus, esta era
uma tática possível, desde que os índios fossem considerados vassalos da coroa portuguesa.
A conversão dos povos indígenas a condição de vassalos da coroa, ocasionou que os portugueses
interpretassem os índios da margem esquerda do Guaporé da mesma forma, enquanto súditos do rei
da Espanha e vice-versa. Lisboa estimulou a migração de sociedades inteiras da margem espanhola
à margem direita, interessados tanto na povoação da margem portuguesa, assim como no
esvaziamento da margem espanhola, tornando-a vulnerável.

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(:152-167) O Guaporé Sem Os Jesuítas
O cenário experimentado na região, em especial na província espanhola de Mojos, com a expulsão
dos jesuítas é descrito pela autora.
Dada em 03 de setembro de 1759, a ordem de expulsão dos jesuítas dos domínios Portugueses, tem
relação com fatores estruturais da economia Portuguesa que datam de meados do século XVIII. A
crise econômica que passava o país ibérico - em parte por acordos comerciais extremamente
favoráveis a Inglaterra - a dependência de produtos industrializados ingleses - pagos com ouro das
colonias - e por fim o contrabando praticado pelas nobrezas nas colônias e o poder paralelo de que
gozava o clero - em muitos casos como na amazônia, sendo concorrente direto da coroa na
comercialização de alguns produtos como as chamadas “drogas do sertão”- formavam uma situação
caótica.
Convidado para compor o gabinete de D.José I, Sebastião. José de Carvalho e Melo, o Marquês de
Pombal, deu início a um programa de reorganização do comércio Português, objetificando a
diminuição da dependência portuguesa frente a Inglaterra. Esta política teve um dos seus principais
frutos na criação das companhias de comércio, entre as quais: Companhia da
Ásia(1753),Companhia do Grão Pará e Maranhão (1755), Da pesca da Baleia e dos Vinhos do Alto
Douro(1756) e de Pernambuco e Paraíba (1759).
Não foram critérios exclusivamente econômicos, a justificarem a expulsão dos clérigos dos
domínios portugueses. Comercializando sob regime de isenção de impostos - dado seu perfil
religioso - A companhia de jesus lucrava com a exportação de “drogas do sertão”, - fruto do
trabalho dos índios nas reduções - sem que isso gerasse lucro ao estado português. Foram taxados
enquanto “inimigos certos e declarados de Portugal” pelo Marquês.
A legislação subsequente a expulsão dos jesuítas feita sob a influência de Pombal, decretou a
“liberdade” dos indígenas, com a expulsão dos missionários e a proibição em qualquer cenário da
escravidão indígena. Pena nova legislação, os índios deveriam ficar concentrados em aldeias sob a
autoridade de administradores que teoricamente zelariam pela educação e interesses indígenas.
A nova legislação previa que os índios deviam se concentrar em aldeias sob o controle de um
administrador - que teoricamente zelaria pelos interesse e educação dos indígenas - chamadas de
diretórios, nestas aldeias a língua portuguesa era obrigatória e o índio enquanto trabalhador era
encorajado. Grande incentivo era dado aos casamentos mistos, inclusive com incentivos como
prêmios, armas e dinheiro ao soldado português casado com uma índia.

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A remuneração destes funcionários indigenistas, era deduzida da sexta parte da produção indígena,
o que colocava o funcionário enquanto beneficiário direto do trabalho indígena.,que além disto,
podiam ser alugados por particulares por diária.
Parte destas aldeias funcionavam ainda enquanto pontos de apoio à navegação das Companhias de
Comércio.
Na Província de Mojos, de domínio espanhol, a expulsão dos jesuítas criou um desafio a
administração colonial, a constituição de um novo quadro de administradores para a região de
Mojos e Chiquitos. Chegou-se a conclusão pela instalação de curas no lugar de jesuítas. Dois para
cada missão, um responsável pela administração temporal, e outro pela espiritual junto aos
indígenas. Em grande parte formado por seminaristas e leigos, o contingente de curas se mostrou
um desastre. O contrabando clandestino de gado e outros produtos com os Portugueses se mostrou
incontrolável aumento em sentido indiretamente proporcional as próprias missões: Entre 1767 e 177
das 15 principais missões espanholas, restaram 12.
Em visita a Mojos em 1781, o cronista Português Francisco José de Lacerda e Almeida, apresenta
um retrato melancólico da região que nos primeiros relatos lusos era considerada símbolo do poder
jesuítico espanhol. O cronista se impressiona com a incompetência, ganância e autoritarismo dos
“guardiões da liberdade” indígena :

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A consequente perca de autoridade, trouxe o recrudescimento dos castigos corporais, generalizando
as fugas aos domínios de Lisboa. João Pedro da Câmara, Segundo Capitão-General da capitania de
Mato Grosso em cartas enviadas ao governador da província comunica a chegada de índios das
missões de Santa Magdalcna e Concepcíon, afirmando que os índios haviam matado o padre
substituto dos jesuítas envenenando-o. O capitão alegava ainda outros fatores no esvaziamento na
faixa de fronteira espanhola:

A queda demográfica foi evidente. Lazaro de Ribeira em 1788 calculou um decréscimo de 10.000
pessoas da população habitante na região em 1767.A fuga indígena da região foi em sentido a todas
as direções possíveis: Florestas subandinas, margem direita do Guaporê, savanas abertas, em síntese
, qualquer lugar longe dos curas e sua tirania.
Uma grande mobilização espanhola em Mojos, fez os portugueses pensarem em uma possível
ofensiva no Guaporé. Mas era engano: as tropas tinham sido mobilizadas para reprimir os índios,
em revolta contra os curas.
A importância das populações indígenas as estratégias coloniais era evidente. O governador Souza
Coutinho ao passar o governo a Luiz Albuquerque, alertou sobre a decadência das missões Mojo,
prevendo em trinta anos a extinção de sua população indígena.
Luiz Albuquerque, assumindo a capitania coloca em prática as recomendações reais, que sumariza
da seguinte maneira:

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Maldi ressalta, a parte da recomendação que impulsiona o comércio clandestino. Após a expulsão
dos clérigos, os burocratas que combatiam seu comércio ilegal, estimulam este mesmo comércio,
inclusive abrindo a fronteira e incrementando o número de mercadorias portuguesas no mercado
local.

Em 1776, morre em Portugal, o rei D.José I, no ano seguinte Pombal se demite, e em 1778 a
Companhia Geral é extinta, acusada de promover a inflação e a destruição de pequenos
comerciantes. Extinta a Companhia, o quadro de crise do Guaporé é agravado. O ritmo de trafego
de mercadorias - já reduzido pelo encarecimento de produtos, dada a grande distância e dificuldade
no transporte de mercadorias - se desfavoreceu ainda mais profundamente. Contribuindo para o
esvaziamento da região.

(:167-170) Febre De Navegar


Maldi em narrativa nostálgica, relata de início uma série de curiosidades históricas sobre a
navegação colonizadora na região. A dificuldade e o sucesso dos 'tenazes e bravos” portugueses em
transporem as intransponíveis cachoeiras do Guaporé, as dificuldades de viagem, que durava de
três a quatro meses na travessia do Madeira-Guaporé.O tamanho e tonelagem dos variados tipos de
Embarcação europeia.
De relevante, Maldi assinala o interesse estratégico do estado colonial de estimular e desenvolver
uma ligação fluvial entre Mato Grosso e Pará, intuito ate hoje não abandonado, vide Hidrovia
Tapajós-, assim como fluxo de comércio na região.
Portugal e Espanha em sua rivalidade, consideravam estratégica a ocupação do Vale do Guaporé.
Com a expulsão dos jesuítas, Lisboa intensificou a navegação. Índios eram atraídos para povoações
de apoio na margem dos rios e introduzidos no processo produtivo da empresa colonial enquanto
mão de obra barata, necessária ao contínuo funcionando do fluxo comercial fluvial.
Maldi finaliza, evidenciando a importância do comércio fluvial no desenvolvimento do dinamismo
econômico necessário ao aumento demográfico local. Localidades iam surgindo na margem dos
rios, onde agricultores desenvolviam culturas em função de satisfazer as demandas dos navegantes.
Plantava-se Frutas cítricas, legumes, feijão, Arroz, Milho, mandioca, cana-de-açúcar, cacau,
criavam gado, porco e galinhas, assim como eram comercializadas castanhas, baunilha, resina,
drogas do sertão em geral, assim como peixe salgado.

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(:170-188) O Forte.
Iniciando sua construção em 1776 sob ordens de Rolim de Moura, O forte Príncipe da Beira foi
forjado em um clima de interesse na proteção das fronteiras Portuguesas após a expulsão dos
Jesuítas.
Localizado a dois quilômetros abaixo da antiga missão clerical de Santa Rosa Velha, o forte,
inicialmente chamado de Nossa Senhora da Conceição enfrentou dificuldades horrendas quando de
sua construção. Seja pela falta de materiais, mão de obra, efetivos - era formado em maioria por
índios “recrutados”- munições, alimentos, etc, a fortificação nunca esteve no ápice de sua força, ou
mesmo foi inteiramente construída de acordo com sua planta original. Pelo menos dois de seus
comandantes, Souza Coutinho e João Pedro, não aguentaram as rudes condições da fortificação,
implorando sob o signo de doenças suas saídas da região.
O forte tornou-se um polo de atração de índios migrantes de Moros,Os maiores contingentes
vinham das missões de San Martin, San Nicolás,Santa Magdalena, e Exaltación. Os contingentes
indígenas provenientes destas localidades, afirma a autora, devem ter sido formados basicamente
por índios Txapakura, Baure, Itonama e Cajubaba. Essas migrações tiveram lugar principalmente
entre 1770-1780.
Os Portugueses entre tando, preferiam acolher os índios vindos das missões, já familiarizados com
o trabalho, do que os índios aldeados. Por outro lado, a reação espanhola a esse movimento era a
acolhida dos escravizados vindos da margem direita do Guaporé.
As reações de ambos os poderes ibéricos, tencionou a região. Por um lado Portugueses exigiam a
entrega dos escravizados, por outro os Espanhóis exigiam condicionar essa “devolução” a entrega
dos índios emigrados da margem direita.
A noção de Liberdade estava no centro desta tensão. Portugal alegava que os índios eram livres e
portando eram mais humanos, “mais livres” que os escravizados.
A interpretação Espanhola de liberdade era entretanto instrumentalizada. Castella argumentava que
os índios eram de fato livres, entretanto deviam tributos -trabalho- as autoridades de Chiquitos e
assim, caracterizavam-se enquanto pessoas que fugiam por razões de dívidas.
Usualmente, os escravizados alcançavam a foz do Itonamas, subiam o Rio e chegavam a missão de
Magdalena, assim como procuravam a missão de Loreto. Fazendo desta forma o caminho inverso
dos índios.
Em alguns momentos, ressalta Maldi, a presença de negros nas missões foi considerável. Fontes

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documentam 51 escravos fugidos em Magdalena,24 em Loreto em 1772;46 em Exaltación em 1776.
Em 1790 foi descoberta na margem do rio Baures, um quilombo, não muito distante da missão de
Magdalena.
Contrário as intenções dos capitães-generais, o forte nunca se constitui enquanto grande ponto
aglutinador de população. Apesar de em alguns momentos possuir uma expressiva população:

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Apesar de atrair indígenas, o forte do Príncipe, não abrigaram durante muito tempo famílias
indígenas. Umas eram enviadas a lamego e Leomil, enquanto outros índios partiam pela vontade de
estar junto a seus familiares.
Entre 1782 e 1792, a emigração de índios diminuiu consideravelmente, coincidindo com a gestão de
Lazaro de Ribeira (1784-1792). Em fins do século XVIII, a fuga de escravos aumentou enquanto a
emigração de índios à margem direita foi insignificante segundo Maldi.
(:189-202) Construção das Cidades: Das Ruínas ao Imaginário ou Vice-Versa.

(:189-195) Vila Bela


A partir dos relatos da visita em 1827 de Adrien Taunay - parte da expedição Langdorff – Maldi
conta o cenário desolador da abandonada Vila Bela no início do século XIX. Fundada em 1725
enquanto capital da Província de Mato Grosso, a cidade era uma povoação construída para
representar a posse Portuguesa da região do Guaporé. Uma cidade “sentinela”, com sua planta
forjada na Europa, pronta a representar uma “vitrine” da força do império Português aos rivais
Ibéricos da outra margem do Guaporé.

(:195-197) A cidade “negra”


Fragilizada por uma série de fatores econômicos, políticos e mesmo ambientais - A queda da
produção da mineração, a perca de seu status de guardiã da fronteira com a independência Boliviana
, sua reputação de cidade “insalubre”, pelas frequentes epidemias e por fim a transferência do
executivo regional à nova capital Cuiabá- Vila Bela é uma cidade decadente no início do Século
XIX. Dados levantados pela antropóloga revezam que num período de 16 anos, a cidade sofreu uma
redução demográfica de 18%, acrescenta-se ainda, que no decênio 1818-1828, a população geral
diminuiu cerca de 9%, a uma taxa de quase 1% ao ano.

Vila Bela era antes de tudo, desde sua formação, uma cidade de maioria negra como atestam os
recenseamentos levantados por Maldi. Mais de 90% da população citadina era formada por não-
brancos:

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A “quebra” econômica e política da cidade não pode explicar unicamente o abandono da Cidade por
parte de sua elite branca. A autora assinala que a partir de reformulações coletivas dos negros
formuladas politicamente a partir da redefinição da sua identidade étnica frente o novo cenário
social. Os negros antes marginalizados pela cor de sua pele ascendem a posições então limitadas
pelo privilégio da cor branca.
Parte dos antes escravizados foi abandonada por seus falidos ex senhores, a quem eram antes uma
despesa que uma fonte de rendimentos. Essa ruptura teve consequências fundamentais na forja de
um novo arranjo socioeconômico. Uma nova sociedade foi surgindo, através da ocupação da terra e
do trabalho com estruturas de produção, distribuição e consumo singulares, localizados sobre uma
rede de relações sociais, jurídicas, religiosas e culturais, fundamentadas sobre valores próprios.

Maldi ressalta interpretações patrimoniais específicas a nova formulação social negra.


Assinaladas enquanto símbolo da “miséria” e abandono da cidade por cronistas europeus , as ruínas
do palácio e da igreja matriz, não eram apropriadas pelos negros que em sua formulação de
sociedade viam nelas o símbolo da dominação Branca.
A incipiente estratificação dessa sociedade negra é pontuada pela autora. A exploração de atividades
econômicas diferenciadas 9 engenhos de madeira, alambique de barro ou cobre e na segunda
metade do século XIX, a extração de látex e poaia significou o aprofundamento de novas relações
de produção e a introdução do patronato.
O retorno dos brancos no século XX, na década de 1950, sublinha a autora, foi um cenário em que
os habitantes da cidade conseguiram relacionar a chegada de cada branco.

(:197-202) Casalvasco
Alferes Bartholomeu da Cruz, sua esposa e alguns agregados formaram uma fazenda de gado na
margem direita do rio Barbados em frente a serra Ricardo Franco em 1760.
Em visita a localidade em 1783, o capitão-general Luiz de Albuquerque ficou maravilhado pela
beleza do local, e alegando a necessidade de estabelecimento ali de um ponto de defesa da fronteira,

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desapropriou a fazenda e passou a nela residir, formando a partir dela um pequeno povoado.
Luiz de Alburquerque estabeleceu ali um destacamento militar, além de ter distribuído terras e
criado um aldeamento indígena, que agrupou grupos Saraveka e Koraveka, certamente com o
intuito de instrumentalizá-los enquanto mão de obra, assim como parte de um efetivo militar apto a
“guardar a fronteira” quando necessário.
Mesmo em seu zênite, a localidade jamais passou dos 500 habitantes. Com a chegada do século
XIX sua população começou a decrescer e no fim do século, não passava de 50 pessoas.
Quando da visita de alguns cronistas, já no século XIX, o local era definido enquanto - em grande
parte devido ao esvaziando demográfico do Guaporé - uma ruína. Do suntuoso “palácio” em que
habitava Luis de Albuquerque, sobraram apenas ruínas, assim como capela construída em
homenagem a Nossa Senhora da Esperança. O gado da propriedade, antes vasto, agora vagava pelas
matas próximas.

Maldi parte a uma síntese de sua obra. Ressalta a pesquisadora, que se por um lado a ocupação lusa
da fronteira se mostrou com o passar do tempo efetiva em seus propósitos iniciais.Afinal conseguiu
defender os limites oeste de seu império, foi falha - em vista de seu ethos medieval- entretanto, em
garantir uma efetiva população da região. A xenofobia mútua entre os países Ibéricos, assentou a
região de fronteira sob paradigmas militarísticos de defesa de sua própria ocupação e destruição da
do inimigo pela pilhagem e o roubo - principalmente de gado, mas também de “soldados” indígenas
do outro margem-fechando as portas a qualquer forma cooperação econômica entre as duas margens
do Guaporé ao mesmo tempo que inversamente abria desta forma o espaço para o contrabando.
(:203-213) Bibliografia
Lista-se a bibliografia utilizada.

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