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ENTREVISTA ENCARTE ECONOMIA

Sérgio Mendonça fala Sindicalistas de várias A valorização do


sobre as negociações entidades e correntes trabalho como fonte
no Fórum do Trabalho apresentam propostas do desenvolvimento
ANO 17 - N 9 47 - R$ 7,50 - DEZ/JAN/FEV-2004 - ESPECIAL

Debate Sindical
f

fu tiro do trabalho
Os dilemas da reforma sindical e trabalhista
Orçamento Partiripativoi o povo deride Aafolto e recopeomentu de ruas Restaurardo do Patrimônio Histórico

Resgate do ouhm de ruo A Prefeitura


Popular de Olinda
mostra o que faz.
A Prefeitura de Olinda é uma prefeitura realmente popular. Popular porque escuta o cidadão.
Popular porque decide corn a população o que fazer no município. Popular porque prioriat
obras e ações que beneficiam os que mais necessitam. Na saúde, educação, habitação,
obras, cultura, em todos os setores, o avanço da Prefeitura Popular de Olinda é uma realidade
que, dia a dia, modifica a qualidade de vida do olindense e de sua família.

Popular. Assim é a Prefeitura de 01 nda. Uma gestão conhecida e reconhecida por suas ações.

GLilkIPA
Património da Humanidade

,11
PREFERIRA
POPULAR

limpeza de meats PSF, agentes em osdo, vacinação de idosos: saúde em alta


ÍNDICE
Debate Sindical é uma publicação
trimestral do Centro de Estudos Sindicais
(CES). Sede: Rua Monsenhor Passalácqua, 4 Os wsrnirdxistaea e siwW
ng 158, Bela Vista,
São Paulo, SP, CEP 01323-010, ALTAMIRO BORGES
fone/fax: (11) 289-1496
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8 0 valor estratégico da reform em arso
Editor:
Altamiro Borges COLUNA: MARCIO POCHMANN
Wt.
Conselho de Redação:
Antônia Rangel 9 "Refonna não resolve o problema do desemprego"
Augusto Buonicore
Augusto Petta ENTREVISTA: SÉRGIO MENDONÇA
Cláudio Gonzalez
Guiomar Prates
João Batista Lemos 15 Cent& se unem pela reduaio da jornada
José Carlos Ruy JOÃO BATISTA LEMOS
Osvaldo Bertolino
Sérgio Barroso
Umberto Martins
18 Ospecosnasmu&mcasdo esMihta sixkd
Conselho Editorial:
Armando Boito COLUNA: ANTÔNIO AUGUSTO DE QUEIROZ
César Benjamin
Clóvis Moura
Décio Saes 19 As propostas das centrcis, confederações e federações
Emir Sader ENCARTE ESPECIAL: DEPOIMENTOS DE SINDICALISTAS
Francisco Teixeira
João Pedro Stedile
Luis Fernandes
Luís Paulino
35 Valorizaaio do trcixtio como fonte de desenvolvinento
Lucília Machado UMBERTO MARTINS
Marcos Gomes
Nilton Vasconcelos
Paulo Schilling 40 A frontein entre governo, pertido e sixicato
Ricardo Antunes
Abigail Pereira
COLUNA: JOÃO GUILHERME VARGAS NETTO
Alvaro Gomes
Augusto Petta
Edson Pimenta
41 "Uma nova estrutura sixiai pera um novo tempo"
Gilda Almeida DOCUMENTO DA CORRENTE SINDICAL CLASSISTA
Gilson Reis
Gregório Poço
José Carlos Schulte 47 A cifici trajetória da legislaaio trchalista no Brasi
Luís Gavazza
Mônica Custódio PAULA BEIGUELMAN
Nivaldo Santana
Raquel Guisoni
Vianei Martins 50 A saúde do trchaliador e os Itites da legislaaio
Wagner Gomes COLUNA: HERVAL PINA RIBEIRO
Capa:
Eugênio Sigaud
Acidente de trabalho, 1944
Revisão:
Josenildo Marques
Editoração eletrônica:
Sandra Luiz Alves

DEBATE SINDICAL 3
CONJUNTURA

Os riscos
A reforma trabalhista
e sindical, proposta
pelo governo Lula,
debatida em inúmeros
fóruns e prevista para
ser votada em 2004,
definirá o futuro do
trabalho no Brasil
ALTAMIRO BORGES
JO ÃO
- GUILHERME VARGAS NEII0

A intenção de promover "uma


profunda" reforma trabalhista e
sindical, conforme o anunciado
desde o início do mandato do
presidente Lula como uma das
prioridades do seu governo, está
ouriçando todos os setores
estratégicos da sociedade
brasileira. E não é para menos.
Afinal, a pretendida reforma visa
mexer nas arraigadas normas da
Consolidação das Leis do
Trabalho — que completou 60
anos de vida em 10 de novembro
— e também na jovem
Constituição de 1988. 0 tema é
dos mais explosivos porque
interfere nas relações antagônicas
entre capital-trabalho. Em certo
sentido, ela balizará o futuro do
trabalho no Brasil.
No debate em curso, surgem
dois extremos. De um lado, os
que defendem que a reforma
aperfeiçoará a legislação vigente.
Neste campo, porém, os enfoques
são contraditórios. O patronato
quer a reforma para flexibilizar os
direitos trabalhistas e para reduzir
o poder dos sindicatos, sob o

4 DEBATE SINDICAL
do sorma
a se mexer. As seis centrais que
participam do Fórum (CUT, FS,
CGT, SDS, CGTB e CAT), têm
procurado atuar de forma
unitária, sob a coordenação
técnica do Dieese. Neste esforço,
argumento de que é preciso empregadores e governo sobre a encaminharam ao governo o
desengessar e "modernizar" as reforma sindical e trabalhista no documento "Pauta do
relações de trabalho. Já uma Brasil". Este organismo tripartite crescimento", com 21 propostas
parcela do sindicalismo acredita é composto por 72 integrantes e para "retomada do
que a vitória eleitoral de Lula funciona com oito grupos desenvolvimento e geração de
criou uma oportunidade histórica temáticos, além da sua comissão postos de trabalho". Outro bloco
para avanços na atual legislação de sistematização. Suas reuniões, foi formado pelas 14
trabalhista e sindical — inclusive quase semanais, expressam bem as confederações de trabalhadores.
para a conquista da redução da fraturas expostas neste complexo Após criticarem o fato de terem
jornada e do direito de tema. sido excluídas do FNT, elas
organização no local de trabalho. Além disso, em outubro o criaram, em meados de outubro,
No outro extremo, estão os governo instalou a Comissão o Fórum Sindical dos
que avaliam com total descrédito Nacional de Direito e Relações de Trabalhadores. Mais refratárias às
a reforma, encarando-a como uma Trabalho como órgão auxiliar da mudanças, elas defendem a
perigosa armadilha contra os FNT. Ela reúne especialistas na manutenção do sistema
direitos trabalhistas e a área e membros de entidades de confederativo, da unicidade e das
organização sindical. Neste bloco, pesquisas, como o Diap contribuições compulsórias. Fruto
os temores se concentram em (Departamento Intersindical de da legítima pressão, passaram a
lideranças dos trabalhadores, mas Assessoria Parlamentar). O jurista ter acento no FNT.
também há nuances de interesses. Arnaldo Sussekind, único
Alguns desejam apenas manter o sobrevivente do grupo que redigiu DESMONTE SINDICAL
status quo; outros analisam que a a CLT nos anos 40, foi nomeado Em todas estas instâncias, o
correlação de forças adversa e a seu presidente de honra. Por tema mais controvertido é o que
natureza híbrida do governo Lula último, há um Grupo de trata da futura estrutura sindical.
ainda desaconselham mudanças Trabalho da Reforma Trabalhista Até porque o governo pautou este
nesta área. Lembram que a no Conselho de Desenvolvimento ponto em primeiro lugar no
reforma em curso no Brasil está Econômico e Social, outro fórum FNT, sob o pretexto de que
inserida numa onda mundial de tripartite criado pelo Executivo. antes de fazer a reforma
regressão do trabalho e de Já no âmbito do Legislativo foi trabalhista é preciso saber quem
desmonte dos sindicatos, o que constituída uma Comissão são os interlocutores", explicou
ocasiona confrontos em vários Especial da Reforma Trabalhista, Osvaldo Bargas, secretário do
países. dirigida pelo deputado Vicente Ministério do Trabalho e
Paulo da Silva, o Vicentinho, ex- coordenador do Fórum. Até
FRATURAS EXPOSTAS presidente da CUT. agora, porém, o único consenso
Diante destas abissais A existência de tantas firmado foi sobre a legalização das
diferenças de interpretação que instancias e a pressão do lobby centrais a partir de certos critérios
refletem as próprias contradições patronal forçaram o sindicalismo de representatividade. O
de classes, surge como natural e "vestibular sindical", como já foi
positiva a criação de várias batizado, incluiria a representação
instancias de discussão sobre o Pretendida reforma em pelo menos dez ramos de
tema. O governo Lula, sensível as mexe nas arraigadas atividade, um piso de sindicali-
divergências, tomou a iniciativa normas da (LT — que zados e a presença, no mínimo,
de criar o Fórum Nacional do em 15 estados. Só as centrais
Trabalho (FNT), instituído pelo completou 60 anos — legalizadas teriam acesso às verbas
decreto número 4.796, de 30 de e também nas várias públicas, como as do FAT.
julho, "com a finalidade de O que tem emperrado toda
coordenar a negociação entre os
conquistas da jovem discussão neste grupo temático do
representantes dos trabalhadores, Constituição de 1988 FNT é a questão da unicidade.

DEBATE SINDICAL 5
CONJUNTURA

trabalhadores! A mesma desavença interessa ao trabalhador",


As discussões no incontornável persiste na questão rechaçou Ricardo Gebrim,
Fórum Nacional do das contribuições compulsórias. presidente do Sindicato dos
Advogados de São Paulo. Já a
Trabalho estão REGRESSÃO TRABALHISTA? CUT criticou a pressa do
emperradas no ponto Se no debate sobre a reforma ministro. "Toda a discussão sobre
sobre a unicidade sindical o ritmo é acelerado, a CLT deve ser feita no Forum
apesar de truncado, já no tocante Nacional do Trabalho", cutucou
sindical; não há a legislação trabalhista pouco se João Felicio.
qualquer consenso caminhou. Há muitos boatos, Se estes episódios indicam que
mas nada de concreto no âmbito as nuvens estão carregadas, com
do FNT e dos outros fóruns. várias ameaças de regressão no
Neste ponto não há qualquer Logo no início da gestão, o trabalho, não seria justo fazer
consenso. As confederações de ministro Jacques Wagner chegou qualquer crítica ao governo nesta
trabalhadores, como já foi dito, a inspirar temores ao se contrapor área. Pelo contrário. As medidas
insistem na manutenção do ampliação do prazo do seguro- adotadas ate agora têm sido
existente. Já as centrais sindicais desemprego (compromisso progressistas. Logo de cara, ele
estão divididas; a maioria até eleitoral de Lula) e ao propor o engavetou o PEC concebido por
aceita um sistema misto — fim da multa de 40% do saldo do FHC que impunha a prevalência
unicidade nas entidades de FGTS para o trabalhador do negociado sobre o legislado —
primeira instância (sindicatos de demitido sem justa causa. Diante resultando em duro golpe nos
base) e pluralismo nos órgãos da forte reação, logo recuou — até direitos trabalhistas. Em seguida,
intermediários (federações, porque a tal multa foi proposta na também pediu a retirada do
confederações, centrais), desde Constituinte de 1988 pelo então projeto de lei 4.302, outra
que respeitados alguns critérios de deputado Luis Inácio Lula da excrescência da "era tucana'', que
representatividade. Mesmo a Silva. institucionalizava a terceirização e
CUT, que sempre pregou o Posteriormente, o ministro ampliava a duração dos contratos
pluralismo expresso na Convenção anunciou sua intenção de temporários (mas, até agora,
87, está fraturada, para desânimo promover uma "faxina" na CLT. manobras no Congresso têm
do seu presidente, Luiz Marinho. Um anteprojeto de lei eliminaria impedido o arquivamento). Além
"Eu defendo a liberdade plena, quase 100 dos seus 922 artigos. disso, Lula lançou o Programa
mas a maioria dos sindicalistas Entre outros, extinguiria o artigo Primeiro Emprego que, embora
tem horror a esta idéia". 384, que garante a mulher limitado, não causa precarização
Apenas o governo surge, descanso de 15 minutos entre o do trabalho, e fez questão de
aparentemente, coeso neste item. término da jornada normal e o defender a redução da jornada.
No documento "Diagnóstico início da adicional, e o 138, que Tais atitudes geraram a fúria
sobre a reforma sindical e proíbe a prestação de serviços no dos conservadores. No editorial
trabalhista", o Ministério do período de férias. O mal-fadado "A triste sina dos projetos
Trabalho prega a "adoção do anteprojeto logo caiu no modernizadores", o jornalão
modelo de organização esquecimento. "Não são reacionário O Estado de S.Paulo
referenciado na liberdade e mudanças profundas, mas destilou veneno contra o
autonomia sindical, sob nenhuma supressão de direitos presidente Lula por sua
inspiração das convenções da "capitulação às forças corporativas
OIT". Mas não há consenso nem interessadas em deixar as coisas
nas entidades patronais. Seus O governo Lulu já como estão, o que só ajuda a
principais ideólogos, como o manter engessadas as relações
consultor José Pastore, apóiam o engavetou o projeto trabalhistas". Já o consultor Jose
governo no fim imediato da de FHC que impunha Pastore, tão alegre com o
unicidade, mas há os que temem desmonte sindical, criticou a
a fragmentação. Para unir o bloco
a prevalência do timidez do governo no tocante a.
patronal, alguns de seus porta- negociado sobre o flexibilização trabalhista. "0 triste
vozes chegaram a apresentar uma legislado e a norma da história é que os tais direitos
curiosa sugestão: unicidade para o inegociáveis estabelecidos pela
patronato e pluralismo para os sobre terceirização anacrônica CLT estão sendo

6 DEBATE SINDICAL
FMI sempre inclui
NIP

nos acordos várias


condicionantes para
flexibilizar direitos vespeiro, nas relações antagônicas apoio popular, a implementar o
entre capital-trabalho. Nesta seu projeto de precarização do
trabalhistas e para batalha estratégica, que interfere trabalho e de desmonte da
reduzir o poder de na essência da exploração organização sindical.
fogo dos sindicatos capitalista, todos os setores O jogo da reforma trabalhista
entram em campo. e sindical está apenas começando.
Prova disto é revelada na ação Ou o sindicalismo classista
usufruídos por uma parcela do FMI, que tenta viabilizar um aproveita a oportunidade histórica
pequena e cadente", blefou. novo acordo com o governo. Este aberta com a vitória das forças de
carrasco da oligarquia financeira centro-esquerda nas eleições para
JOGO DE PRESSÃO sempre inclui entre suas manter e ampliar os direitos dos
Todo o debate em curso sobre condicionantes para empréstimos trabalhadores, ou será tragado
a reforma trabalhista e sindical, várias exigências para a pelo vendaval neoliberal.
seja no Fórum Nacional do flexibilização trabalhista e a Derrotada na urna, a elite tentará
Trabalho, nas outras instâncias de redução do poder dos sindicatos. emplacar sua vingança. Cabe aos
discussão, na mídia ou na Outro indicador é o poderoso trabalhadores reforçarem também
sociedade, só confirma que este lobby dos empresários, geralmente sua justa e inteligente pressão.
tema dará muito pano para camuflado, para reduzir o fictício Qualquer passividade será fatal!
manga. O presidente da Câmara "Custo Brasil". A globalização Toda e qualquer divisão neste
Federal, deputado João Paulo neoliberal não combina com campo também cobrará o seu alto
Cunha, inclusive chegou a prever regulação do trabalho ou prego!
que esta reforma só será votada sindicatos fortes, já que venera o
em 2005 — para a ira da "deus-mercado" e renega a vida Altamiro Borges é jornalista, editor da Debate
burguesia e mesmo de alguns democrática. Neste sentido, o Sindka/Correio eletrônico: aaborgesl@uol.com.br
111.
integrantes do governo. O motivo capital usará todos recursos para Joôo Guilherme Vargas Netto é consultor sindical de
óbvio: o governo mexeu num forçar o governo Lula, que goza de diversas entidades em Sit Paulo

DEBATE SINDICAL 7
MERCADO DE TRABALHO
MARCIO POCHMANN

O valor 1 transformou empregos


assalariados em ocupações
desvinculadas da proteção social,

estratégico trabalhista e sindical, como a


profusão de falsos estágios, falsas
cooperativas, falsos autônomos e
da reforma falsa terceirização.
Tudo isso resultou na

trabalhista desestruturação do mercado de


trabalho. Somente um a cada dois
ocupados é assalariado, enquanto
O Brasil segue discutindo as um a cada três possui alguma
reformas. A previdenciária e a forma de proteção social e
tributária estão em curso. Em trabalhista. O risco em marcha é
breve, a partir do Fórum ser visto cada vez mais o
Nacional do Trabalho, o governo conjunto de proteção social e
Lula deverá enviar ao Congresso trabalhista como privilégio e não
Nacional um novo projeto para a direito universal de quem
legislação sindical e trabalhista. Superar os danos trabalha. Somente em 2002, por
Nesse aspecto, interessa
ressaltar o valor estratégico que
causados pelo exemplo, 96% das vagas abertas
em todo o país foram com
pode ter a reforma trabalhista neoliberalismo na remuneração de até um salário
para o país, assim como a mínimo mensal.
construção da Consolidação das década passada
Leis do Trabalho teve para os
brasileiros da primeira metade do OS SEM PROTEÇÃO
século XX. É bom lembrar que o de que o país precisa deve ser
Brasil era uma economia agrária contemporânea do projeto de O Brasil necessita fazer as
exportadora de produtos país que todos desejamos para os pazes com o futuro. Precisa voltar
primários, tendo a maior parte de próximos 50 anos. Qual a a crescer de forma sustentada ao
seus ocupados no campo e sem legislação apropriada para o longo dos próximos anos. Dessa
representação sindical expressiva. trabalho vindouro? Da mesma forma, podem ser abertas novas
forma, qual o formato adequado perspectivas para a ocupação,
para a representação sindical dos assim como a legislação trabalhista
NOVA REALIDADE próximos anos? e sindical ao ser inovada deve
levar em consideração cerca de
Toda a legislação sindical e 35 milhões de brasileiros
trabalhista foi projetada para um ESTRAGO NEOLIBERAL ocupados sem proteção social e
país urbano e industrial, muito trabalhista diante da visão
diferente da realidade existente Não há como negar que o apresentada até hoje pela CLT.
até então. Combinada com o novo projeto de legislação Esse parece ser o desafio que
projeto de desenvolvimento trabalhista precisa exercer um o país precisa enfrentar. Do
nacional, que permitiu, de fato, o diálogo necessário entre o Brasil contrário, as próximas gerações
país deixar de ser agrário, com a que temos hoje, após 12 anos de poderão acusar as atuais de
maior parte da população políticas neoliberais e duas negligência, no mínimo.
morando nas cidades, a legislação décadas de estagnação
sindical e trabalhista foi estratégica econômica, e o que se quer daqui
para consolidar um Brasil novo, a para frente. Do contrário, corre-
partir da segunda metade do se o risco de se realizar uma
século XX, ainda com problemas, reforma da legislação trabalhista e
porém muito diferente das sindical que termine Marcia Pochmann é professor licenciado do Instituto de
Economia da Unicamp/SP e secretário do
condições de trabalho e de vida consolidando o estrago que o Desenvolvimento, Trabalho e Solidariedade da
sindical existentes até 1950. neoliberalismo já fez. Ou seja, a Prefeitura de Sao Paulo. Correia eletrônico:
A reforma trabalhista e sindical reforma via mercado, que marciop©prefeitura.sp.org.br
" ‘f iST A

"As reformas não resolvem


o problema do desemprego"
Há 25 anos atuando no
Dieese, o economista
Sérgio Mendonça está
otimista com o rumo dos
debates sobre a reforma
trabalhista, mas alerta:
qualquer mudança deverá
ser acompanhada de
crescimento na economia,
caso contrário, terá pouco
efeito.
CLÁUDIO GONZALEZ

Quem visita pela primeira vez


a sede do Dieese (Departamento
Intersindical de Estatística e
Estudos Sócio-Econômicos), com
certeza se surpreende. O órgão,
mantido por convênio com
entidades sindicais, funciona num
velho casarão dentro do Parque da
Agua Branca, na zona oeste de
São Paulo. O ambiente externo
lembra um sítio. De vez em
quando é possível encontrar
galinhas, patos e até cavalos
circulando. Mas da porta para
dentro, o assunto não é nada
bucólico. O Dieese desenvolve
atividades de pesquisa, assessoria,
educação e comunicação nos participa do Fórum Nacional dos apresentar as propostas de
temas relacionados ao mundo do Trabalhadores — uma instancia mudanças na legislação
trabalho. das centrais sindicais que visa trabalhista e na forma de
A frente do Dieese, ocupando elaborar propostas conjuntas que organização sindical do país.
sua diretoria técnica desde 1990, serão levadas ao Fórum Nacional Nesta entrevista à Debate
está o economista Sérgio Eduardo do Trabalho (FNT), organismo Sindical, Sérgio Mendonça
Arbulu Mendonça. Por indicação tripartite oficial criado pelo aborda os principais temas em
unitária do sindicalismo, ele governo Lula que deverá debate nestes fóruns.
ENTREVISTA

Debate Sindical Vamos começar É uma coordenação mais


da forma tradicional, pedindo para "A hora de pensar técnica. Somos um órgão de
você contar um pouco da sua a questão da redução assessoria do movimento sindical
trajetória profissional e acadêmica. e eu estou nesse papel como
Sérgio Mendonça: Longo da jornada é agora, diretor técnico do Dieese, de
período da minha vida pegando corona na coordenação, de secretaria técnica.
profissional foi passado aqui no discussão da reforma Isto porque é evidente que
Dieese. Sou formado em ninguém tem um mandato para
economia na USP (Universidade trabalhista no Fórum coordenar outra central, nenhuma
de São Paulo), fiz pós-graduação Nacional do Trabalho" central coordena outra central e
também na USP e depois não muito menos o Dieese coordena
segui a carreira acadêmica. Nesse as centrais. É um espaço unitário
período, trabalhava na FIPE não. Essa reforma tem um de discussão e de reflexão para a
(Fundação Instituto de Pesquisas componente de simbolismo no intervenção no Fórum Nacional
Econômicas), mas na área de governo Lula. Afinal de contas, do Trabalho, que é um espaço
informática, e era estudante de ele foi dirigente sindical. Acredito institucionalmente constituído.
economia. Enquanto fazia a pós- que o Lula não vai ficar distante
graduação, vim trabalhar no dessa reforma em nenhum Há algumas semanas, o ministro do
Dieese, no final dos anos 70. momento e não vejo como ele vá Tribunal Superior do Trabalho,
Tenho 25 anos de trabalho no tratar de forma desequilibrada as Francisco Fausto, falou que haverá
Dieese, porque desde 78 já presto partes envolvidas no debate. É uma guerra na negociação da
serviços para o órgão. Mas foi em evidente que os empresários serão reforma trabalhista. Você acha que
1981 que passei a ser ouvidos, não é possível fazer uma vai haver muita polêmica?
formalmente contratado pela reforma trabalhista e sindical sem Sérgio Mendonça: Acho. Não
instituição. que eles sejam auscultados. Mas vai haver consenso. A maior parte
Durante um tempo fui técnico não vejo o risco do movimento das divergências deve se situar no
da subseção do Dieese junto ao sindical não ter uma voz forte e campo da relação entre capital e
Sindicato dos Bancários de São presente. Talvez o que possa trabalho. Essa deve ser a tônica
Paulo. Foi no período em que acontecer é que, em muitos central. E há divergências
houve renovação no sindicalismo, pontos, não haja convergência e o também dentro das diversas
nos anos 80. Mas o sindicato governo, nestas questões, vai bancadas — com exceção da do
sofreu intervenção que durou um tomar a decisão e encaminhar. governo, que tende a enquadrar
ano e meio e, por isso, a subseção suas posições antes. Mas no caso
não tinha como funcionar. Aí eu Quais são os espaços de diálogo da bancada dos trabalhadores há
vim para a coordenação do Dieese. criados para poder formular a pontos de difícil superação. Este
O diretor técnico da instituição na proposta de reforma trabalhista? fórum que foi criado está fazendo
época era o Walter BareIli. Em Sérgio Mendonça: Há o um esforço muito rico de buscar o
1990, ele deixou a direção técnica, Fórum Nacional do Trabalho, consenso, fazendo com que cada
que é um cargo de confiança do que já está constituído pelo entidade ceda um pouco nas suas
movimento sindical, e eu fui governo federal, sob comando do posições. Mas dá para antever
indicado para substituí-lo. Estou ministro do Trabalho, Jacques que, em alguns pontos, vamos ter
nesta função desde maio de 1990. Wagner. O coordenador geral é o dificuldades de construir
Como se vê, minha trajetória é Osvaldo Bargas, secretário das consenso.
muito forte no Dieese. relações do trabalho do Do lado da bancada dos
ministério. Neste Fórum, a empregadores também há
No processo de debate da reforma bancada dos trabalhadores, que é diferenças. Eles têm problemas de
da Previdência, o governo Lula foi representada por várias centrais representatividade nas suas
acusado de dar pouca atenção as sindicais (CUT, Força Sindical, entidades e há questionamentos.
reivindicações das entidades CGT, CGTB, CAT e SDS), Mas pode ser que no setor
sindicais. Você acha que na reforma resolveu, por decisão política, empresarial, por tradição, a voz de
sindical e trabalhista há o risco da criar uma instância paralela, o comando seja um pouco mais
opinião do setor empresarialpesar Fórum Nacional dos firme e haja enquadramento. Já
mais que a dos trabalhadores? Trabalhadores, e convidou o do lado da bancada dos
Sérgio Mendonça: Acho que Dieese para coordenar. trabalhadores há mais

10 DEBATE SINDICAL
democracia, autonomia, e capítulo, sobre a legislação discussão da reforma da
dificilmente uma central vai trabalhista. Essa parece ser a Previdência, o Conselho de
enquadrar a outra. Na hipótese de leitura mais favorável que o Desenvolvimento Econômico e
divergência nas bancadas ou entre ministro tem apontado. Social (CDES) debateu e
as bancadas, o governo vai apresentou propostas, mas depois
encaminhar a sua proposta. Isto já O governo tentou limpar a pauta o Congresso Nacional, com sua
está previsto no regimento do do legislativo das propostas de FHC autonomia, alterou e votou a
FNT. E vai haver uma disputa para a drew trabalhista, como a reforma. De fato, existe o risco
pesada, porque é uma reforma terceirização. Isso pode ser um destes fóruns, em tese, colocarem
complexa, que mexe com coisas prenúncio de que as propostas do em xeque o papel do parlamento.
que têm muito tempo. A CLT atual governo serão diferentes das Mas o que vimos, na prática,
tem 60 anos; a estrutura sindical, apresentadas por FHC? que foi a Camara dos Deputados,
considerando seu início no final Sérgio Mendonça: Acho que neste primeiro momento, quem
dos anos 20, tem 70 anos. Mexer foi muito positivo o governo decidiu em relação às reformas da
em coisas arraigadas, lá do federal ter feito isso, porque não previdência e tributária. Neste
período do Getúlio, não é fácil. dá para estar discutindo uma caso, não me parece que o
Não acredito que a solução se dê coisa no FNT e estarem entrando Congresso tenha perdido a sua
em curto prazo e o governo quer outras propostas no Congresso. prerrogativa.
acelerar a reforma. Este tempo Claro que pode entrar proposta Claro que numa discussão
curto dificulta. com apoio de deputados e como da reforma trabalhista, que
senadores, porque eles são envolve as três partes, os
A idéia do governo é que o fórum autônomos e só têm que prestar consensos são um mecanismo de
apresente a proposta oficial? contas do seu mandato aos seus pressão. É evidente que se o
Sérgio Mendonça: Isso não partidos. Na medida em que o governo, empregadores e os
está claro. O que o ministro governo consiga negociar isso no trabalhadores se entenderem num
Jacques Wagner tem dito é que na Congresso, é ideal que limpe a ponto da reforma trabalhista ou
medida em que haja consensos, o area para que o FNT seja o espaço da estrutura sindical, isso
governo se sentirá à vontade para privilegiado de discussão nas significará uma forte referência
encaminhar as propostas ao relações trabalhistas e de tudo o para a votação no Congresso.
Congresso Nacional. O termo que se quer mudar. Acho bastante Mas, mesmo assim, ele pode não
usado para isso é o de "proposta positiva essa posição. concordar. Ocorrerão situações,
fatiada". senão de consenso das três partes,
mas de duas partes estarem de
Então não vai ser um pacote único? "Há espaço no Brasil acordo, e do Congresso ou alguns
Sérgio Mendonça: Essa é a fala para a conquista da partidos terem opiniões distintas.
do ministro através dos meios de Quando o Tancredo Neves
comunicação. Não posso
redução da jornada; ganhou a eleição, depois veio o
assegurar que vai ser assim. O a oportunidade José Sarney, foi criada a Comissão
ideal, na minha opinião, é que politico é agora; tem Afonso Arinos, com intelectuais
houvesse uma visão de conjunto, brasileiros notáveis. Ela apresentou
porque dificilmente uma coisa que malhar o ferro uma proposta de Constituição, mas
deixa de estar conectada com a enquanto está quente" o congresso constituinte a ignorou e
outra. Está se discutindo fez outra. O Congresso é muito
estrutura sindical junto com a cioso do seu espaço. É óbvio que se
legislação trabalhista. Mas há Hei reclamações de que esses espaços houver o consenso das três partes
uma visão de completar primeiro criados pelo governo, como o não há porque querer modificar por
a questão da estrutura, segundo Fórum Nacional do Trabalho e o modificar.
interpretação da fala do ministro. Conselho de Desenvolvimento
O capítulo da estrutura sindical, Econômico e Sociah estão tirando Nesse processo de negociação, você
que está sendo a primeira etapa um pouco o papel do legislativo. enxerga alguma personalidade que
da discussão do Fórum, uma vez Você acha que essa critica vai vai ter uma voz ativa mais
concluída teria os consensos aparecer com relação h reforma influente? Por exemplo, o ministro
encaminhados ao Congresso trabalhista e sindical? Jacques Wagner, o senador Paulo
Nacional; depois viria o próximo Sérgio Mendonça: Na Paim ou o deputado Vicentinho?

DEBATE SINDICAL
11
ENTREVISTA

Sérgio Mendonça: Os apelo social importante. Mas, de A oportunidade política é agora.


parlamentares com tradição certa forma, não podemos ignorar Dificilmente haverá redução se
sindical, como os senadores Paim que a luta histórica da legislação não for agora, quando o ferro está
e Mercadante (que foi assessor da do trabalho é dar melhores quente. Tem que malhar o ferro
CUT e é líder do governo) e os condições de vida e de trabalho enquanto está quente.
deputados Vicentinho, Medeiros para os já ocupados. Isso também
e muitos outros oriundos desta é um apelo social importante. As Considerando todas as dificuldades
área, terão forte influência. Há elites brasileiras e a classe que podem surgir para a aprovação
ainda deputados das entidades trabalhadora precisam enxergar das reformas sindical e trabalhista,
patronais, como o Armando também este aspecto, porque se você daria um prazo para que
Monteiro da CNI. Sem dúvida, agregou o objetivo nobre da sejam finalizadas?
esses congressistas vão se destacar. geração de emprego, mas Sérgio Mendonça: Não sei
Já o ministro Jacques Wagner terá permanecem os objetivos responder. Vejo o governo muito
um papel de liderança. Cabe históricos e muito nobres decidido a encaminhar até o final
lembra que quem coordena o também de melhorar as condições do ano, pelo menos a parte da
FNT é o Osvaldo Bargas, um ex- de trabalho, dar melhores estrutura sindical. 2004 é um ano
sindicalista que conhece a condições de vida para o eleitoral e dizem que o Congresso
estrutura sindical há muito trabalhador, para que ele viva em opera bem só no primeiro
tempo. Agora, insisto, nesta família, para que tenha uma semestre. Se não houver a votação
reforma o próprio presidente Lula reprodução feliz da sua vida. neste período, nem que seja
vai dedicar uma atenção especial. Talvez essa seja uma das apenas do capítulo da estrutura
Ela terá opiniões fortes de propostas mais unitárias diante sindical, acho que a reforma fica
personalidades do Legislativo e do setor empresarial. Os EUA para 2005. 0 Fórum Nacional do
também do Executivo. têm aumentado a sua jornada Trabalho usará o primeiro
anual e, em função da sua semestre para discutir a legislação
Você poderia citar alguns pontos hegemonia no mundo, muitos trabalhista e outros temas da
que seriam inaceitáveis na rtforma imaginam que a única saída é, ao reforma trabalhista. De qualquer
trabalhista e alguns altamente contrário de trabalhar menos, forma, há uma chance de se
desejáveis? A redução da jornada trabalhar mais. É um contra- aprovar pontos da reforma ainda
seria um destes? senso histórico, mas é um fato no primeiro semestre do próximo
Sérgio Mendonça: O debate neste mundo globalizado. Não ano.
da redução da jornada é muito está acontecendo nos países Vejo com muita dificuldade o
difícil. A redução da jornada num europeus. De qualquer forma, é encaminhamento completo da
primeiro momento aumenta os forte a influência dos EUA e proposta de reforma, que prevê a
custos para o empregador, mas ela também das condições de legislação trabalhista, o papel da
pode ser extremamente virtuosa trabalho adversas na Asia. Cada justiça, as questões
do ponto de vista das condições país tem que buscar o seu destino administrativas, o Ministério
de trabalho, da geração de histórico e o que a sua luta Público do Trabalho, o segmento
emprego e pode produzir, dentro política permite. Acho que no enorme que está fora do trabalho
de algum tempo, mais capacidade Brasil há espaço para esta formal, etc. Acho difícil que tudo
de competição da economia. conquista. O movimento sindical isso seja encaminhado no próximo
Numa economia global, essa deve lutar para reduzir a jornada. ano, sobretudo por ser um ano
pressão do setor empresarial, seja eleitoral.
ele nacional ou multinacional, vai
ser radicalmente contra. Mas a
"A polarização entre Daria para antever a agenda queo
hora de se pensar a questão da governo pretende encaminhar em
redução da jornada de trabalho é unicidade sindical e relação à reforma?
agora, pegando carona na pluralismo é mesmo Sérgio Mendonça: Todo o
discussão da reforma no Fórum investimento do governo tem sido
Nacional do Trabalho.
insuperável; devemos na discussão da estrutura sindical.
Com o agravamento do apontar na direção A tese defendida é que, para se
desemprego, é correto defender a de um sistema discutir a legislação do trabalho, o
redução de jornada como o movimento sindical deve primeiro
objetivo de gerar emprego. É um mais representativo" pensar como vai ficar a sua

12 DEBATE SINDICAL
pluralidade. Há a unicidade no trabalhadores, das centrais, deve
"A década de 90 foi município, mas cresce a evitar isso ao máximo. Se ficar
muito desfavorável quantidade de sindicatos na discutindo conceitual e
categoria. Está ocorrendo um filosoficamente o tema, o
para o trabalhador e processo de fragmentação na sindicalismo cairá em armadilhas
o sindicalismo; a representação dos trabalhadores. insuperáveis. Hoje, temos 11 mil
legislação não foi Perdeu-se o controle, quem está sindicatos de trabalhadores,
decidindo se vale ou não criar o segundo o IBGE, e não parece
capaz de impedir sindicato é a Justiça e o razoável que se consiga ter uma
a precarização" Ministério do Trabalho, que pode representação adequada com esse
liberar ou não a nova entidade. número de sindicatos. Não estou
Num ambiente de liberdade, o dizendo que há um número ideal.
estrutura, como funcionarão as ministério pressiona para liberar. Num país deste tamanho, com
partes. Qual a essência da Na verdade, a discussão sobre 27 estados e 5.600 municípios,
discussão que se pretende fazer de a representatividade surge como a evidente que não teremos quatro
boa fé? É aumentar a palavra que a bancada dos sindicatos, como na Holanda, ou
representatividade do trabalhadores encontrou para onze, como na Alemanha - que
sindicalismo brasileiro. Esse é o evitar essa polarização (entre são países mais homogêneos,
objetivo central. Se a tendência unicidade e pluralidade). Essa menores. Mas acho que a nossa
for essa, você cria espaços para polarização é ideologicamente estrutura sindical — a despeito do
discussão adequada da legislação insuperável. As centrais têm hibridismo entre unicidade no
do trabalho. O encadear das posições claras sobre o tema, as município e liberdade para criar
propostas do governo está de confederações e federações idem. sindicatos — está indo numa
acordo com o pensamento de Dentro de cada central também direção contrária aos que desejam
uma grande parcela do há divergências. Se a gente o aumento da sua
movimento sindical. discutir a questão da representatividade.
representatividade, qual estrutura
Esse aumento da que queremos depois da reforma Considerando os repetidos
representatividade passa pela — porque esta vai demorar, não se desentendimentos entre o
manutenção da unicidade ou o muda uma coisa desta da noite Executivo e o Judiciário, você acha
governo vai sugerir o seu fim? para o dia, só num ambiente que podem ocorrer problemas no
Sérgio Mendonça: Em tese, revolucionário ou no pós-guerra, e encaminhamento da rtforma, como
temos a unicidade sindical que não estamos nessa situação, mas considerar inconstitucionais
vem da história do sindicalismo e sim numa democracia — e apontar algumas medidas?
a que resultou da Constituição de na direção de um sistema mais Sérgio Mendonça: A reforma
88. Esta garantiu que no representativo, acho que teremos estará sujeita a pressões de todos
município tenha um único acertado. os lados, do Congresso, dos
sindicato para uma única Não sou ingênuo para não partidos e também da Justiça.
categoria e criou a liberdade de achar que muitas vezes o debate Acho que depende de como for a
organização do setor público, vai ressurgir sob a camisa da votação no Congresso Nacional.
entre outras mudanças. De 1988 unicidade versus pluralidade. Se o Legislativo der um largo
para hoje houve uma triplicação Acho que a bancada dos apoio â proposta, acho dificil que
do número de sindicatos. Numa a Justiça consiga se opor. A não
empresa como a Volks, onde se ser que se aprovem mudanças
imagina que só os metalúrgicos flagrantemente inconstitucionais.
"A reforma pode dar Não sendo assim, mesmo que
do ABC negociam, existem 47
sindicatos lá dentro. com os burros n'água instâncias da Justiça sejam contra,
A tentativa de construção do se a economia não não vai ter como inviabilizar. Em
consenso na bancada dos última análise, vai bater no
trabalhadores é para evitar esta
andar para frente; ela Supremo Tribunal Federal. Se o
dicotomia entre a unicidade e não gera emprego; a Congresso acolher a reforma, o
pluralidade. Na verdade, não sei o questão central é a STF dificilmente vai se colocar
que existe hoje no setor sindical contra. Mas não sou advogado e
brasileiro, se é unicidade ou do desenvolvimento" estas análises envolvem uma visão

DEBATE SIN DICA 13


ENTREVISTA

política e jurídica mais funcionamento do mercado de


fundamentada do que eu posso "Vai haver uma trabalho. Keynes já dizia isso nos
dar. disputa pesada, porque anos 30 e, na época, suas idéias
passaram a ser hegemônicas,
Como você avalia as profundas a reforma sindical superando o liberalismo dos
mudanças no mundo do trabalho é complexa, mexe clássicos.
ocorridas nos últimos anos? com coisas que têm Atualmente, entretanto,
Sérgio Mendonça: Houve tivemos democratização com
degradação do trabalho, muito tempo; a (LT piora das condições de vida dos
independentemente de alguns tem 60 anos de idade" trabalhadores. A sensação que o
avanços na legislação e do próprio brasileiro simples, comum, tem é
avanço da democracia. Há uma que a democracia não serve. Você
contradição: tivemos avanços na Sérgio Mendonça: Não saberia faz uma reforma sindical que
legislação e na democracia depois dar uma resposta segura pode ser boa, vai aumentar a
da Constituição de 88, mas, ao pergunta. Mas acho que não. representatividade, leva a
mesmo tempo, ocorreu uma Quem saiu da carteira de trabalho legislação trabalhista numa
enorme precarização do trabalho. ou do emprego público e foi direção positiva, mas se a
A década de 90 foi muito trabalhar por conta própria, no economia continuar parada, como
desfavorável para os trabalhadores geral, foi forçado a isto pelo nos últimos 20 anos, a reforma
e o movimento sindical. A desemprego. Não foi por opção dará com os burros n'água. Não
legislação não foi capaz de pessoal, a não ser para uma porque não foi uma reforma bem
impedir a regressão. A década de minoria. A maioria foi empurrada pensada e democrática, mas
90 foi muito pior para o trabalho a essa situação e, muitas vezes, porque as condições objetivas,
do que as décadas anteriores. continua com um nível de renda materiais da economia e do
que não lhe permite pensar na sua mercado do trabalho, não vão dar
Isso se reflete principalmente no proteção no futuro, por exemplo, sustentação a estas mudanças.
abandono do registro em carteira? com relação à Previdência. Daqui Este é um ponto central. A
Sérgio Mendonça: Justo. Hoje a 15 ou 20 anos, vamos ter no reforma não tem capacidade de
temos 27 milhões de Brasil milhões de pessoas com 60 resolver isso. O projeto de
trabalhadores com carteira anos de idade sem qualquer desenvolvimento está numa outra
assinada ou do setor público que proteção. Esse será um grande esfera. Depende da inserção do
estão protegidos, para uma problema no futuro. Brasil na economia globalizada,
população, segundo os dados da depende da luta política aqui
Pnad/2001, de 75 milhões sem No livro "A situação do trabalho dentro, depende dos nossos
carteira assinada. Claro que nem no Brasil", no qual você colabora, fatores históricos estruturais de
tudo é precarização. Os afirma-se que a valorização do exclusão e distribuição de renda
empregadores têm renda; existem trabalho passa obrigatoriamente que não são fáceis de resolver.
autônomos que pagam INSS, uns pelo desenvolvimento econômico. Vide como foi tímida a reforma
sete milhões. Mas a parcela maior O Palocci disse, recentemente, que tributária. O único ponto mais
não tem qualquer vínculo de não vai ter crescimento neste ano. positivo, que era a da alíquota
proteção. A década de 90 é uma Se a situação não melhorar, você progressiva sobre a herança, caiu
década de desestruturação do acha que essa reforma trabalhista na primeira votação do
mercado de trabalho no Brasil. pode virar letra morta? Congresso, o que mostra o caráter
Sérgio Mendonça: Acho! A conservador das elites brasileiras.
O nível salarial é muito baixo no reforma pode dar com os burros
Brasil. Já encontrei gente que n'água se a economia não andar
desistiu do emprego formal para ser para frente. Não vai haver
camelô, pois trabalhando como mudança na estrutura sindical ou
autônomo os ganhos seriam bem na legislação do trabalho que gere
maiores. Você acha plausível que emprego na quantidade exigida,
uma boa parcela da população que garanta inclusão e melhoria
tenha feito esta opção e, com isso, de renda. A questão central é a do
diminuído o número de empregos desenvolvimento. É isso que vai Claudio Gonzalez é iornalist, membro do conselho de
formais? melhorar as condições de redação da Debate Sindical

14 DEBATE SINDICAL
PONTO DE VISTA

ASTICA
It`

Centrais se une na luta E0

pela redução da rnada


Já está em curso, pelo Brasil A redução da jornada da medida e decidiram apoiar a
afora, uma campanha nacional Proposta de Emenda Constitu-
pela redução da jornada de é uma necessidade cional do deputado federal Inácio
trabalho sem redução de salários Arruda (PCdoB/CE) e do senador
— e com a diminuição ou a histórica decorrente Paulo Paim (PT/RS), que propõe
proibição das horas extras. Trata- do incessante avanço a redução do tempo de trabalho
se de uma iniciativa promissora e para 40 horas semanais imediata-
inédita das centrais sindicais da produtividade mente, com uma transição
brasileiras (CUT, Força Sindical, gradativa para a semana de 35
CGT, CGTB, SDS e CAT), que do trabalho horas, que hoje vigora na França e
decidiram unir forças e em outros países europeus. Em
constituíram, em conjunto com o JOÃO BATISTA LEMOS tramitação no Congresso
Dieese, um comando nacional Nacional, o projeto Arruda/Paim
(com dois representantes por As centrais também já foi aprovado por unanimidade
central) para encaminhar esta luta realizaram um seminário para pela Comissão de Constituição e
estratégica. avaliar o significado e os impactos Justiça (CCJ) da Câmara Federal.

DEBATE SINDICAL 15
PONTO DE VISTA

As centrais decidiram apoiar o projeto Arruda/Paim, que propõe a redução para

A redução da jornada de diferente, mas a situação revela-se


trabalho é uma tendência que, aos neste momento razoavelmente
trancos e barrancos, vem se favorável k. classe trabalhadora,
afirmando ao longo dos dois que marcha com invejável coesão
últimos séculos e que, a rigor, em torno desta bandeira histórica
pode ser considerada como uma e internacional, enquanto é
necessidade histórica decorrente possível notar respeitáveis
do incessante avanço da divergências no seio do
produtividade do trabalho, que empresariado brasileiro quando se
reduz o tempo necessário fala do tema. Se agir com
produção de mercadorias e cria as sabedoria, o movimento sindical,
condições objetivas necessárias aliado aos partidos, entidades e
para que a produção social capaz
O presidente Lula personalidades progressistas,
de suprir a demanda humana (e já manifestou conseguirá levar a bom termo a
da Humanidade, considerada publicamente o seu campanha nacional pela redução
como uma totalidade) possa ser da jornada de trabalho sem
realizada com um esforço apoio à medida, redução de salários, com um
produtivo a cada dia menor que é uma das desfecho feliz para a nação e a
(menos cansativo, menos maioria da sociedade.
embrutecido), liberando tempo
prioridades do seu
livre para a educação, o lazer, o plano de governo
descanso, a família. OPORTUNIDADE HISTÓRICA

realidade como resultado de Com assessoria e apoio ativo


LUTA DE CLASSES acirrados conflitos de classes, do Dieese, os integrantes do
cujos protagonistas são os comando da campanha estão
Do início do século XIX aos trabalhadores, de um lado, e os compreendendo que a
tempos atuais (e em maior ritmo capitalistas, do outro. Basta possibilidade da redução da
ao longo do século )00, a jornada recordar, a este respeito, os jornada de trabalho sem redução
legal de trabalho foi acontecimentos que configuraram de salários encontra hoje, no novo
substancialmente reduzida na o massacre de Chicago no curso cenário político criado pelo
maior parte dos países da luta pela redução da jornada governo Lula, uma rara
capitalistas, sendo hoje em para 8 horas diárias, que oportunidade histórica de se
muitos lugares a metade do que inspiraram o 1 0 de Maio. transformar em realidade. O
era naquela época. Isto é verdade A redução da jornada impõe presidente da República já
também para o Brasil, onde no limites a. exploração da força de manifestou seu apoio a. medida,
início do século passado trabalho pelo capital, à extração que consta do seu programa de
trabalhava-se em média até 14 daquilo que Karl Marx chamou governo e também tem a simpatia
horas por dia e depois a jornada de trabalho excedente e é por isto do vice-presidente José de Alencar
foi limitada a 8 horas diárias, que em geral o capitalista (esta e o respaldo do presidente do
compondo 48 horas por semana a encarnação viva dos interesses do Tribunal Superior do Trabalho
partir de 1932 e alcançando as capital) é contra a redução da (TST), Francisco Fausto.
atuais 44 horas semanais depois jornada. Quando a proposta é O fato do projeto Inácio/Paim
da Constituição de 1998. reduzir jornada sem reduzir ter sido aprovado por
Embora a tendência à redução salário a gritaria nas trincheiras do unanimidade na Comissão de
da jornada tenha um caráter capital é geral e, em algumas Constituição e Justiça da Camara
objetivo, ela não se afirma de destas ocasiões, parece até que o Federal também sinaliza um
forma espontânea em nossa mundo vai cair. clima favorável no Congresso
sociedade. Só se transforma em No Brasil, não é muito Nacional. A unificação do

16 DEBATE SINDICAL
40 horas, com uma transição gradativa para a semana de 35 horas

produtividade do trabalho. O
fortalecimento do mercado
interno, que virá com mais e
melhores empregos e o
crescimento da massa salarial, na
verdade é algo indispensável a
retomada do crescimento da
economia nacional. Ademais, é
preciso lembrar que a renda dos
trabalhadores brasileiros caiu mais
a4fr4oAr 4 de 14% entre setembro do ano
eairowalogoa, passado a setembro deste ano e,
goac7-40, , mexc desta forma, a valorização dos
,eogesvegive salários derivada da redução do
Bandeira deve ser 77<.)/Z-E: tempo de trabalho seria apenas
agitada como ponto P.09E1 04Rr4 uma compensação das perdas
96?,/er 7( impostas 5 classe trabalhadora nos
essencial de um últimos 12 meses, nada além
novo projeto de no capitalismo, só vinga como disto.
desenvolvimento do resultado da luta de classes. A perspectiva acalentada pelo
Neste momento, a redução da governo Lula e o movimento
pails, oposto jornada de trabalho (sem redução sindical é que uma redução de
ao neoliberalismo de salários) é uma bandeira que quatro horas na jornada de
tem de ser compreendida e trabalho resulte na criação de
agitada como um ponto essencial cerca de 2 milhões de novos
movimento sindical e a de um novo projeto de postos de trabalho no Brasil,
necessidade inadiável de combater desenvolvimento nacional, oposto reduzindo de forma significativa
o desemprego também são fatores ao neoliberalismo e os níveis de desemprego. Isto será
que pesam a favor da campanha fundamentado na valorização do possível se a medida for associada
liderada pelas centrais. trabalho. Porta-vozes do capital 5. redução das horas extras e a
Entretanto, não se deve alegam que a medida elevará o retomada do crescimento
desprezar o poder de fogo de famoso "Custo Brasil" e reduzirá a econômico. Trata-se de um
setores das elites empresariais, que competitividade das empresas grande objetivo nacional. Para os
já manifestam aberta oposição a nacionais, prejudicando os trabalhadores conscientes, o
idéia, como os presidentes da investimentos privados e significado da redução da jornada
Confederação Nacional da restringindo as possibilidades de de trabalho vai além dos seus
Indústria (CNI), Armando retomada do crescimento impactos mais imediatos sobre a
Monteiro Neto, e da Fiesp, econômico. Isto não é verdade. economia, pois ao limitar a
Horácio Piva. O patronato mais exploração da força de trabalho
intransigente não vai permanecer pelo capital, ela é uma medida
de braços cruzados nesta luta. Por CONCENTRAR ENERGIAS que abre caminho 5. superação da
isto, uma grande campanha de exploração do homem pelo
conscientização da classe A experiência histórica indica, homem. É uma luta que vale a
trabalhadora e esclarecimento da pelo contrário, que a redução da pena e não devemos medir
opinião pública e a mais ampla jornada cria emprego, eleva o esforços para sua vitória.
mobilização social em todo o país poder aquisitivo da classe
são indispensáveis para a trabalhadora, distribui renda, Joao Batista Lemos é coordenador nacional da Corrente
conquista desta reivindicação aumenta o consumo popular e Sindical Classisto (CSC) e membro do conselho de
histórica, que agora, como sempre induz um avanço ainda maior da redação da Debate Sindical

DEBATE SINDICAL 17
ANTÔNIO AUGUSTO DE QUEIROZ
por força de eventual adoção do
Riscos da sindicato orgânico, vinculado às
centrais; d) perda de receita com

reforma na a extinção da contribuição


sindical.

estrutura MARAVILHA OU DESASTRE?


sindical O sindicalismo brasileiro não
o desastre que afirmam os que
A proposta de nova estrutura querem substituí-lo nem a
sindical, apresentada como maravilha que afirmam aqueles
condição para a "modernização" que o defendem sem mudanças.
das relações de trabalho e Foi com ele que se derrotou a
receitada como solução para o ditadura, se criou um partido de
fortalecimento do sindicalismo e a massas, se promoveu a campanha
valorização da negociação coletiva, das diretas-já, se convocou a
passou a ser prioridade após a Mudança não pode Constituinte, se destituiu um
aprovação das reformas
previdenciária e tributária na
significar a mera presidente e se elegeu um líder
sindical presidente da República;
Camara. extinção do modelo mas ele necessita ser atualizado.
No plano geral, esta reforma Esse processo de
acena com mudanças capazes de da unicidade aperfeiçoamento, entretanto, não
assegurar ampla liberdade de pode significar a mera troca do
organização (Convenção 87); de modelo da unicidade pelo da
dar proteção ao exercício das A resistência dos empresários, pluralidade, como querem alguns,
liberdades sindicais (Convenção além da "ameaça" da sem qualquer regra de transição
98); e de garantir a representação representação no local de ou legislação de sustento. Se for
dos trabalhadores nas empresas trabalho, assenta-se em três assim, o trabalhador poderá ser
(Convenção 135). No plano pontos: a) temor de que a profundamente prejudicado, face
específico, agrega princípios da liberdade sindical resulte na à desorganização e até o caos
Convenção 141, para os estabilidade de um maior número inicial.
trabalhadores rurais, e da de trabalhadores; b) medo de que
Convenção 151, para os sejam obrigados a abrir a sua
servidores públicos. contabilidade para tornar as ABRE ALAS -

negociações transparentes; c)
incerteza quanto aos novos Portanto, a reforma sindical,
FORTE CONTESTAÇÃO interlocutores que poderão advir espécie de abre-alas para a
da ampla liberdade de fundação trabalhista, precisa ser debatida e
O novo modelo é defendido de sindicato. formulada com cuidado e
com entusiasmo pelo presidente No movimento sindical de prudência. Aprovada a mudança,
da República, pelo ministro do trabalhadores são quatro as a pressão pela "valorização" da
Trabalho, pelo secretário do preocupações principais: a) negociação, em substituição à lei,
CDES e também pelas principais eventual adoção da pluralidade e da conciliação extrajudicial "no
centrais sindicais. Mas, a julgar sindical, com a pulverização e âmbito da empresa", em
pelo resultado das conferências enfraquecimento das entidades; substituição à decisão judicial,
estaduais do trabalho e pela b) redução do sindicato à será inevitável, forçando o debate
recente criação do Conselho condição de representante da flexibilização da legislação.
Nacional dos Trabalhadores, é apenas dos associados, com a
contestado por boa parte do conseqüente eliminação da figura
atual sistema confederativo, tanto da convenção coletiva; c) Antônio Augusto de Queiroz é jornalista, analista
do empresariado como dos esvaziamento politico e perda do politico e diretor do Diap (Departamento Intersindical
, trabalhadores. poder de representação sindical de Assessoria Parlamentar)
I
ENCARTE ESPECIAL

A reforma trabalhista

Opiniões e sindical, proposta


pelo governo Lula, é
um tema explosivo,
que gera acaloradas
polêmicas. Diante

sobre a desta
complexidade, a
revista Debate
Sindical solicitou

reforma depoimentos de
dirigentes de várias
entidades nacionais,
entre centrais,
confederações e

sindical e federações. Nas


páginas a seguir,
este encarte
especial apresenta

trabalhista as avaliações e as
propostas destes
renomados
sindicalistas, num
mosaico amplo e
plural que expressa
as diversas correntes
de pensamento em
disputa nesta
batalha.
DEBATE SINDICAL 19
Os princípios e
as possibilidades
"NÃO PODEMOS PERDER A
OPORTUNIDADE HISTÓRICA

DADA PELA CONJUNTURA"

LUIZ MARINHO
Liberdade e autonomia, fim outra questão central para os mesmo dentro da CUT. Muito
do imposto sindical, da trabalhadores, o desemprego menos entre as centrais.
unicidade, direito de organização recorde, o governo continua Esta constatação, no entanto,
no local de trabalho e fim do insensível â necessidade não deve nos levar ao pessimismo,
poder normativo da Justiça do emergencial de criar postos de mas, sim, a trabalhar para
Trabalho são princípios que, trabalho, como foi proposto pela desenhar um projeto de reforma
desde o seu surgimento, em CUT ao presidente da República. possível. Não podemos perder a
1982, norteiam o pensamento da Na reforma trabalhista e oportunidade histórica dada pela
Central Única dos Trabalhadores. sindical, que é o que importa conjuntura deste momento. E o
O que queremos e podemos fazer, analisar neste momento, as que é a reforma possível? Do meu
no entanto, são coisas diferentes. posições do governo e do ponto de vista, é mais que
Vivemos dias históricos. Lula e Ministério do Trabalho têm sido reconhecer as centrais sindicais.
seu governo, hegemonizado pela corretas. Primeiro porque Se não é possível acabar de vez,
esquerda, simbolizam expectativas aceitaram discutir a reforma pelo menos com a unicidade e o
de gerações que dedicaram a vida sindical antes da trabalhista. E. imposto sindical, dois dos
â construção de uma sociedade bom lembrar, no entanto, que o principais esteios do modelo
livre do seu passado de projeto de lei da flexibilização só vigente, é preciso pelo menos
escravismo, oligarquias e foi retirado do plenário da criar condições para que, ao longo
autoritarismo. Mas, resultado de Câmara a partir de mobilização de um processo de transição, se
uma composição política que das centrais sindicais. possa trocar estes pilares pela
chega â centro-direita, o governo pluralidade sindical e por um
Lula é um governo em disputa. REFORMA POSSÍVEL modelo de financiamento em que
A posição do governo, no os trabalhadores tenham direito a
GOVERNO EM DISPUTA entanto, não será o bastante para decidir para onde vai o dinheiro
A recessão, o desemprego e os garantir uma reforma sindical descontado de seus holerites.
indices de exclusão social democrática, como queremos. Ao E, se não conseguirmos
alcançam níveis jamais registrados tratar também da representação encontrar este caminho, corremos
na nossa história. As disputas se dos empresários, ela torna-se o risco de adiar mais uma vez a
manifestam por toda parte: na cenário de conflitos de classe. reforma sindical por... sabe Deus,
questão agrária e nos conflitos Significa dizer que as chances de quantos anos mais!
sociais urbanos em particular. Na passar pelo processo legislativo
reforma da previdência, não dependem de unidade, pelo
obstante os avanços contidos no menos no interior do sindicalismo
projeto, o governo fez opção de dos trabalhadores. Pulverizado
atender â. magistratura em por conta de um modelo
detrimento das reivindicações do corporativo, em alguns temas,
funcionalismo e dos trabalhadores como a questão da unicidade Luiz Marinho é presidente nacional do Central Única
de baixa renda. Também em sindical, não há unidade nem dos Trabalhadores (CUT)

20 DEBATE SINDICAL
NO

Contribuindo para
escrever a história
"A REFORMA TEM NO FÓRUM
... NACIONAL DO TRABALHO
UM ESPAÇO PRIVILEGIADO"

PAULO PEREIRA DA SILVA

O país está vivendo um sentido de não romper sentido, seria uma temeridade
momento politico radicalmente com a nossa cultura política a liberação indiscriminada
importantíssimo. Graças a político-sindical. Queremos, sim, da organização dos trabalhadores
mobilização de toda a sociedade, como afirma o nosso documento, em nome da liberdade e
a classe política está debruçada institucionalizar o "novo" que já autonomia sindical na base.
sobre as reformas estruturais que convive com o velho modelo, o Esta decisão criaria um cenário
estão sendo esboçadas há muito que já o legitima na prática. propício para a manipulação dos
tempo. O Fórum Nacional do Entre as nossas propostas trabalhadores pelos seus
Trabalho, que deverá concluir estão: reconhecimento legal das empregadores, que poderiam se
P., seus trabalhos no final deste ano, centrais como órgão máximo da aproveitar da fragilidade da
é resultado dessa mobilização e estrutura sindical, com a exigên- consciência cidadã do nosso povo
representa uma grande chance de cia de critérios legítimos para a para conquistar hegemonia
escrever uma bela página na sua representação. Nas instâncias orgânica dentro das empresas,
história do movimento sindical. E intermediárias, defendemos concorrendo, assim, com o
a Força Sindical está contribuindo confederações e federações filiadas movimento sindical.
para isso. ou não as centrais, que possam ser Poderiam ser definidas ainda
No que diz respeito aos institucionalizadas também outras medidas para fortalecer a
trabalhadores, temos a segundo critérios de unidade de ação do movimento
responsabilidade de realizar a representatividade. Já na base sindical, como a constituição de
melhor reforma sindical e dessa pirâmide, defendemos a uma Camara Nacional de
trabalhista possível. Nossa unicidade: sindicatos únicos por Regulação do novo sistema
história, marcada por momentos base territorial, sendo o sindical, composta pelos
de grande êxito, há muito está município o menor território representantes das centrais
estagnada em razão de um possível. E, neste caso, a reconhecidas.
conjunto de leis anacrônicas. Elas representatividade se dará através Outro tema pendente é o do
hoje nos amordaçam a um de processo eleitoral majoritário sistema de custeio. Não temos
processo jurídico-burocrático que com regras democraticamente dúvida quanto a necessidade
não enxerga o trabalhador como estabelecidas. urgente de acabar com o imposto
cidadão, seja dentro ou fora de sindical obrigatório. No entanto,
seu local de trabalho. RISCO DE MANIPULAÇÃO a nova estrutura necessita de
Por que defendemos a recursos para seu custeio, e, neste
ESPAÇO PRIVILEGIADO unicidade sindical na base? Ora, sentido, somos favoráveis a taxa
A reforma sindical e não podemos desconsiderar nossa negocial paga por todos, cobrada
trabalhista tem no Fórum espaço cultura política. Somos uma na ocasião dos contratos ou
privilegiado de discussão entre sociedade com fortes traços da convenções coletivas.
governo, trabalhadores e democracia representativa e com
..., empregadores. A Força Sindical incipiente adoção da prática da Paulo Pereira da Silva (Paulinho) é presidente da
tem pautado sua atuação no democracia participativa. Neste Força Sindical

DEBATE SINDICAL
21
O futuro do
IN trabalho no Brasil

"FALA — SE EM REFORMA NÃO


NO SENTIDO DE DEFENDER "El

O TRABALHO DA RAPINAGEM LIBERAL"

ANTONIO CARLOS DOS REIS


Inegavelmente, este é um dos rapinagem do neoliberalismo, ordinária. Para isto, é necessário
momentos mais delicados do mas no sentido de flexibilizar haver critérios de aferição da
sindicalismo brasileiro, onde se cada vez mais os nossos direitos e representatividade das entidades
discute com maior rigor a reforma até mesmo de jogar na lata do lixo sindicais, principalmente das
estrutural da nossa organização o nosso "código dos mínimos", a centrais, a fim de que o conjunto
sindical, bem como da legislação Consolidação das Leis do do movimento sindical saiba
trabalhista. Trabalho (CLT). escolher, para se filiar, uma
Como se não bastasse o A Confederação Geral dos central que tenha: organização na
desemprego sempre crescente, Trabalhadores (CGT) reafirma ao maioria dos estados; representação
aliado ao avanço cada vez maior movimento sindical brasileiro e na maioria dos setores de
da economia globalizada, o que diante do Fórum Nacional do atividades econômicas; e um
tem deixado muitas categorias de Trabalho que os seus princípios percentual realista de
trabalhadores reduzidas a não serão abandonados. A CGT trabalhadores filiados nos seus
frangalhos, ainda impera a sempre defendeu e, as suas sindicatos de base.
vigilância incessante dos entidades filiadas também, a Estamos confiantes de que, se
empregadores que, ao manutenção da CLT, cuja o Fórum Nacional do Trabalho
substituírem mão-de-obra, atualização deve haver, porém, não perceber que, na atual
pressionam para que os novos discutido artigo por artigo, para conjuntura, o que se deve fazer é
admitidos não fortaleçam os seus não corrermos nenhum risco de fortalecer as relações trabalhistas,
sindicatos, reduzindo-se assim, vermos suprimida qualquer caberá aos dirigentes sindicais
sistematicamente, o número de conquista da classe trabalhadora brasileiros mobilizar-se com todas
trabalhadores sindicalizados, com brasileira. as suas forças para fazer prevalecer
a sempre presente ameaça de que no congresso nacional a
há um grande exército de UNICIDADE SINDICAL manutenção dos direitos
desempregados aguardando para No tocante ã organização trabalhistas, o reconhecimento de
ocupar a vaga de alguém, por sindical, a CGT também nunca centrais sindicais, a unicidade
salários cada vez menores. abriu mão, nem abrirá, da defesa sindical e a contribuição
do sistema confederativo, baseado compulsória, não riscando da
MANUTENÇA0 DA CLT na unicidade sindical e na carta magna os artigos 7 0 e 8°.
Com isto queremos reforçar a contribuição compulsória, voltada Enfim, tentar substituir a
tese de que este é um período em para o custeio desse sistema. nossa legislação com o argumento
que o trabalhador brasileiro e as A CGT também não tem que é da década de 40 e
suas entidades representativas nenhuma dúvida de que é substituí-la por uma convenção
mais necessitam do amparo do da OIT da mesma década,
chegada a hora do
simplesmente ridículo e
Estado. Mas o que observamos é o reconhecimento das centrais
rigorosamente inaceitável.
contrário: fala-se em reforma sindicais, dentro do sistema
trabalhista não com o sentido de sindical brasileiro — o que poderá Antonio Carlos dos Reis (Salim) é presidente da
defender o trabalhador da ser feito através de legislação Confederação Geral dos Trabalhadores (CGT)

22 DEBATE SINDICAL
Os desafios dos
novos tempos
"NOVO TEMPO EXIGE MENOS

CONFLITOS E MAIS COOPERAÇÃO

ENTRE CAPITAL E TRABALHO"

ROBERTO SANTIAGO

A importância do Fórum cinco princípios básicos: Na eventualidade de desencontros


Nacional do Trabalho está em Respeito à liberdade. As com o novo sistema, bastard
que podemos construir novas mudanças na área trabalhista parte insatisfeita não renegociar o
bases da sociedade, via reformas, devem ser guiadas por regras que negociou. Volta-se, nesse
fortalecendo a representação democráticas. Trabalhadores e caso, ao atual sistema. A
sindical como único e eficaz empresários precisam descobrir Constituição continuará
instrumento de negociação do quais as instituições que melhor garantindo esses direitos.
trabalhador. se ajustam ao Brasil, estimulando
O FNT é um fato histórico. investimentos, emprego e QUALIFICAÇÃO PROFISSIONAL
Deve melhorar o que tem trabalho e reduzindo conflitos. A SDS ainda elege como
conserto, mas extinguir o que não Valorização da negociação tarefas principais do FNT a
tem remédio. Para a SDS, a coletiva. A SDS pede direitos educação, a qualificação
reforma trabalhista deve começar negociáveis e contratualizados e profissional e a inclusão no
da base. Não adianta levar ao não apenas inegociáveis e trabalho, principalmente para os
Congresso Nacional aquilo que legislados. A SDS não quer a 40 milhões de trabalhadores
não é consenso entre governo, revogação de nenhum direito; informais.
empregadores e lideranças quer a preservação dos As mudanças ocorridas no
sindicais. direitos constitucionais trabalho têm desdobramentos
Buscando o entendimento, é e o inicio da era dos direitos fortes na educação e formação
preciso apresentar ao Legislativo negociáveis. profissional. A principal tarefa
as propostas das instituições do Soberania da vontade das deve ser a da formação
trabalho no país. Além de partes. A utilização de direitos profissional direta para o sistema
governo, empregadores e líderes negociáveis deve ser feita apenas de produção. Isto exige maiores
sindicais, é importante a por quem deseja negociar, por investimentos do Estado.
participação de magistrados, quem se sinta em condições de O emprego nos serviços foi o
advogados trabalhistas e negociar e considera mais que mais cresceu nos anos 90,
especialistas que militam na área. vantajoso negociar. mas pouco foi investido em
Gradualismo. A SDS educação neste setor. Para a SDS,
CINCO PRINCÍPIOS acredita que, para ser trata-se de sanear com educação
O país precisa de instituições democrático, o novo sistema terá profissional a ocupação no sistema
trabalhistas que estimulem de ser aceito voluntária e produtivo, a base da pirâmide da
investimentos produtivos e não gradualmente. Deve ficar, sociedade, para garantir
que os espantem. Novos tempos portanto, a critério das partes competitividade e restabelecer
exigem menos conflitos e maior escolher entre o atual e novo condições dignas da plena
cooperação entre capital, trabalho sistema. cidadania.
e governo, garantindo a inclusão Dinamismo. A opção pelo
social. O Brasil tem pressa e exige novo sistema não precisa significar Roberto Santiago é vice-presidente do Social-Democracia
o comprometimento inicial com a renúncia irremediável ao atual. Sindical (SUS)

DEBATE SINDICAL 23
C
Reformar ou não,
eis a questão!
"SEM ABRIR EM DEMASIA A
PORTEIRA, É PRECISO DAR PASSO •Ant

EM FAVOR DA MODERNIZAÇÃO"

LAERTE TEIXEIRA DA COSTA

O sindicalismo brasileiro existência do sindicato orgânico e CLT precisa sim ser enxugada em
nunca se viu tão acuado: ou parte a ratificação da Convenção 87, da suas partes retrógradas e
para uma total reformulação e Organização Internacional do antidemocráticas. Em muitas
com isso desestrutura todo o seu Trabalho; outras centrais se partes, ela é um instrumento
arcabouço legal, vigente desde a aproximam de um lado ou de anacrônico e totalitário, espécie
primeira metade do século outro, mas suas bases postam-se de contratão coletivo patrocinado
passado, ou luta claramente em favor da pelo Estado. Não cabe mais entre
desesperadamente para manter unicidade e da contribuição; nós.
esses mesmos preceitos em pleno organizações independentes,
século 21. algumas fortes como a Fecesp, ACABAR COM ANOMALIAS
Essa dualidade está tirando o defendem com muita força e É condenável também a
sono dos sindicalistas brasileiros, fazem lobby em favor da existência de sindicatos de gaveta,
os quais presenciaram momentos unicidade e da contribuição que conservam um número
de democracia e ditadura, sem obrigatória. mínimo de associados e
que a legislação trabalhista e perpetuam diretorias corruptas
sindical fosse profundamente TENDÊNCIA CONSERVADORA em suas instituições. É preciso
modificada. No Fórum Nacional do encontrar formas adequadas para
Na verdade, a experiência dos Trabalho, organizado pelo acabar com todas essas anomalias
últimos 60 anos está tão arraigada governo Lula, é clara a tendência e implantar a transparência e a
entre nós que fica realmente majoritária: ali também os democracia nos sindicatos.
muito difícil aceitar modificações. conservadores são maioria. Não Evoluir para essa oxigenação
No caso, pode-se dizer, a maioria vai ser fácil para o Ministério do uma obrigatoriedade daqueles que
dos sindicalistas é conservadora e Trabalho, cuja tendência é a têm a responsabilidade de
defende, principalmente, a ratificação da Convenção 87, participar do FNT.
unicidade sindical e a fazer valer o seu desejo, não só em A CAT entende que devem ser
contribuição obrigatória. função da resistência dos preservadas as condições de
Por isso, algumas sugestões trabalhadores, mas, sobrevivência dos sindicatos,
estranhas: uma corrente defende a principalmente, em função da federações, confederações e
unicidade na base, liberando toda posição patronal. Como centrais. Sem abrir
a organização sindical para os manter o suntuoso prédio da demasiadamente a porteira, é
demais degraus da hierarquia Fiesp, em plena avenida preciso dar um passo em favor da
sindical, no caso as federações, as Paulista, sem contribuição modernização.
confederações e as centrais. sindical?
Outra tendência oferece a Mas, é preciso ter cuidado.
possibilidade de uma única Dizer, por exemplo, que nossa
central, conformada a partir das legislação trabalhista não precisa
WRI
atuais confederações de ser modernizada é, no mínimo, Laerte Teixeira da Costa é presidente da Central
trabalhadores; há quem advoga a tapar o sol com a peneira". A Autônoma de Trabalhadores (CAT)

24 DEBATE SINDICAL
Liberdade e
autonomia sindica
"CARTA MAGNA GARANTE
LIBERDADE, AUTONOMIA E
O PRINCÍPIO DA UNICIDADE SINDICAL"

ANTÔNIO ALVES DE ALMEIDA

O rumo das discussões sobre que se pretenda fazer. comércio aos domingos e feriados,
as propaladas reformas da No Brasil, porém, criou-se um para restaurar o direito da
organização sindical e trabalhista hábito, verdadeira mania, de que garantia no emprego, da
pretendidas pelo governo tem o país só cresce e se desenvolve se aposentadoria por tempo de
gerado preocupações e debates houver reforma da Constituição. serviço, tudo bem! Enfim, já que
entre os participantes do A nossa Constituição ainda é a mania é reformar, vamos
movimento sindical, sobretudo muito jovem, mas a intensa luta reformar para devolver aos
nas reuniões do Fórum Nacional para reformá-la é uma constante; trabalhadores esses e outros
do Trabalho. até parece que a sua reforma irá direitos que já foram mutilados.
Foi este fato que motivou a acabar com o desemprego, com a Finalmente, chegamos
mobilização das Confederações violência e todas as demais conclusão de que a liberdade e a
Nacionais de Trabalhadores a se mazelas que sacrificam o povo autonomia sindical almejada pelo
reunirem com suas federações brasileiro. sindicalismo brasileiro já estão
filiadas em um Fórum Sindical consagradas no artigo 8° da
Nacional dos Trabalhadores, SÉRIOS PREJUÍZOS Constituição Federal, não
cujos resultados tiveram E como só se pensa em merecendo, por isso, qualquer
repercussões acima do esperado. reforma, a organização sindical e a modificação.
Após a realização desse Fórum, legislação trabalhista não iriam O Constituinte de 88,
as entidades sindicais se ficar fora desse desejo. Mesmo reconhecendo esta conquista dos
mobilizaram nos Estados de que a maioria dos interessados trabalhadores, forjada na luta ao
maneira uníssona, com o objetivo entenda que os artigos 7 0 e 8. da longo dos últimos 70 anos
de mostrar ao governo que a Constituição Federal não devam resistindo a todas as intempéries
organização sindical e a legislação merecer reforma, alguns ainda políticas brasileiras, garantiu e
trabalhista brasileira não carecem insistem nessas modificações. É o consolidou na atual Carta Magna,
assim de tantas reformas como se hábito de mudar, mesmo que não de forma definitiva, a liberdade, a
têm falado. Hoje isto é um seja para melhorar. autonomia e o princípio da
entendimento de unidade do Nosso receio é de que essas unicidade sindical.
movimento sindical nacional. reformas venham para pluralizar e
pulverizar as entidades e para
CONSTITUIÇÃO JOVEM flexibilizar direitos, causando
Alguns países possuem sérios prejuízos. Se ocorrer o
dispositivos em suas constituições contrário, isto é, se a reforma for
recomendando suas reformas ou para restabelecer direitos,
revisões de 15 em 15 anos ou acabando com banco de horas,
mais. Todavia, existem outros em contrato temporário, contrato por
que suas constituições são tempo parcial, as cooperativas de
•-• seculares, tornando-se muito trabalho, terceirizações, com a Antônio Alves de Almeida é presidente da Confederação
difícil qualquer tipo de reforma abertura indiscriminada do Nacional dos Trabalhadores no Comércio (CNTC)

DEBATE SINDICAL 25
Fórum chapa
branca: para quê?
"OS TRABALHADORES PRECISAM
DIZER NÃO À REFORMA ANUNCIADA

PELO GOVERNO FEDERAL"

MOACYR ROBERTO
Já está em pleno majoritária ainda que a da unicidade e das conquistas
funcionamento o Fórum Nacional composição do colegiado seja, na históricas da classe trabalhadora.
do Trabalho, instancia que teoria, tripartite? Os trabalhadores precisam
congrega representantes do Ora, a possibilidade de dizer não a. reforma que o governo
governo, trabalhadores e consenso é mínima. Na questão vem anunciando. Além disso,
empresários para debater as sindical, não há acordo nem entre denunciar a incoerência dos
propostas das reformas trabalhista as categorias profissionais; já na quatro principais interlocutores
e sindical. Mas até que ponto os reforma trabalhista, os desse processo: o presidente Lula;
trabalhadores têm voz neste representantes empresariais o ministro Jacques Wagner; o
colegiado? dificilmente defenderiam a deputado Vicentinho; e o •
O regimento interno, no agenda das lideranças presidente da CUT, Luiz
Título III, determina que, caso profissionais. Assim, a tendência Marinho. Estas lideranças criti-
não haja consenso sobre as sera de que a proposta seja cam tanto a estrutura vigente que
reformas, o governo dará a palavra arbitrada pelo governo. foi fundamental para a construção
final. Diz o artigo 23°: "Na Torcemos para que o texto não de suas carreiras políticas.
hipótese de impasse entre os traga prejuízo aos trabalhadores. Será por meio do FST que os
integrantes do Fórum Nacional Contudo, não poderíamos ficar de trabalhadores irão reagir as
do Trabalho sobre qualquer um braços cruzados e, em propostas que pretendem esfacelar
dos temas em questão contrapartida a. instalação do e enfraquecer o movimento
prevalecerão nos projetos as fórum oficial, as confederações sindical. Não podemos abrir mão
posições do governo". nacionais de trabalhadores da estrutura que assegura a
Posições que sabemos estão criaram o Fórum Sindical dos unidade dos trabalhadores em
focalizadas na flexibilização das Trabalhadores (FST), este sim suas lutas sociais: a unicidade
relações de trabalho, no âmbito verdadeiramente representativo sindical. Por isso, a Contratuh, na
da reforma trabalhista, e na dos anseios da classe trabalhadora. pessoa de seu presidente Moacyr
instituição da pluralidade com Roberto, que é coordenador do
fim da contribuição sindical SISTEMA CON FEDERATIVO FST, conclama a todas as
compulsória, no que diz respeito O FST, que em seu manifesto entidades sindicais a participarem
a reforma sindical. Toda a linha de criação elenca como princípios ativamente da criação dos fóruns
de discussão do governo caminha a liberdade e autonomia na forma nos Estados, manifestando
nessa direção. constitucional brasileira da democraticamente seu apoio ao
unicidade sindical e a fortalecimento do sistema
MEROS COADJUVANTES? manutenção do sistema confederativo e a. manutenção das
Fica a pergunta: os membros confederativo, está crescendo e conquistas históricas da classe
do Fórum são meros atores ganhando corpo. Plenárias trabalhadora.
coadjuvantes? Se forem, para que acontecem em todo o Brasil. São Moacyr Roberto é presidente da Confederação Nacional
instalar um Fórum chapa branca, centenas de entidades se dos Trabalhadores em Turismo e Hospitalidade 04

onde a opinião do governo será mobilizando pelo fortalecimento (Contratuh)

26 DEBATE SINDICAL
Unicidade: princípio
e bom senso
"O MOVIMENTO SINDICAL RECONHECE

A SI MESMO E HÁ MUITO APRENDEU

A IDENTIFICAR OS PELEGOS"

SEVERINO ALMEIDA FILHO

O pós-consenso de direitos e a precarização do dentro da empresa com acordo


Washington legou ao mundo trabalho. coletivo.
sociedades mais frágeis, diante da
brutal transferência de renda das PAPEL DAS CENTRAIS IMPEDIR A DESTRUICAO
menos desenvolvidas nações para Neste processo, o governo teve Muito se fala negativamente
concentrá-las nas de maior as centrais como as legítimas da quantidade de sindicatos que
desenvolvimento, além de agravar interlocutoras da classe existem ou pretende-se construir
o desnível social no interior de trabalhadora, com freqüência, no Brasil. Mas poucos observam
todas elas. A poderosa vaga parceiras compreensíveis e que se dividirmos o número total
globalizante precarizou direitos, confiáveis no desmonte de por município brasileiro
reduziu o papel do Estado e direitos. É bem verdade que existente, encontraremos o pífio
dizimou barreiras de defesa das puderam contar para isto com a número de três, no máximo
nações em nome da modernidade ajuda do FAT, amansando quatro sindicatos por município.
e da competitividade. corações e mentes, remunerando, Quanto aos pelegos e
No Brasil não foi diferente. e bem, consciências e corruptos interessados no imposto
Diferente foi a intensidade da compromissos. sindical e sem representatividade,
resistência a este processo. Mas o que fez o Brasil escrever certamente estes existem. E vão
Quando olhamos o nosso país, de uma história diferente de seus continuar existindo, seja na busca
uma perspectiva em que nos pares, que mergulharam na mais do FAT ou de qualquer outra
possibilite enxergar o mundo, profunda crise? No Brasil, o papel fonte que venham a determinar
salta aos nossos olhos o papel da dos sindicatos foi preponderante. como suporte financeiro.
organização sindical nesta Estes mesmos que agora, mais do Isto, contudo, não é o que
resistência. que nunca, tentam destruir. mais importa. O representativo
Via de regra, ela foi construída Procuram destruir suas bases, que movimento sindical brasileiro
a partir do movimento surgido na são: a unicidade sindical que reconhece a si mesmo, e há muito
base sindical daqueles pereniza o conceito de categoria aprendeu a identificar e sobreviver
diretamente atingidos pelas profissional; o chamado imposto aos pelegos. O que importa é que
medidas tomadas. Vez ou outra — sindical que, cobrado e contamos com bases que
pela magnitude do problema ou distribuído de forma universal, garantem instrumentos
pelo tamanho da corporação impossibilita que seja extraordinários para quem quiser
atingida —, as chamadas entidades instrumento de barganha política; construir autênticos, legítimos e
superiores e as chamadas centrais a base territorial mínima eficientes instrumentos de
foram levadas a se rebelarem. municipal que impede a representação e defesa da classe
Infelizmente, via de regra atomização dos sindicatos; e a trabalhadora. E isto não podemos
também, quando não ampla e geral representação que permitir que destruam.
imediatamente percebido pelos impossibilita a remuneração a Severino Almeida Filho é presidente da Confederação
trabalhadores, foi recheada de menor dentro do seio da categoria Nacional dos Trabalhadores em Transportes Aquaviário e
silêncio e ignomínia a perda de com convenção coletiva, ou Aéreo, no Pesco e nos Portos (Conttmaf)

DEBATE SINDICAL 27
Sindicalismo das
profissões liberais
"AGENDA NACIONAL DO
SINDICALISMO PARA SER
ENVIADA AO PRESIDENTE LULA"

LUIS EDUARDO GAUTERIO GALLO

O sistema confederativo das sindicato de médicos. pontos poderiam resultar na


profissões liberais reúne no Brasil unidade dos trabalhadores e em
em torno de 520 sindicatos em IMPORTANTE PAPEL uma agenda nacional do
todos os estados. Entre federações Os conselhos profissionais não sindicalismo, que possa ser
filiadas à CNPL (26) e as que representam nossos trabalhadores enviada ao presidente Lula: 1)
existem fora, somos 36 federações de base. Nem poderiam. Sua Manutenção do artigo 8° da
nacionais e interestaduais. Dados natureza é outra. Servem para constituição, com unicidade
recentes indicam a existência de 5 fiscalizar exercícios profissionais. sindical de baixo até o topo; 2)
milhões de profissionais liberais, Boa parte de nossos sindicatos Legalização das centrais; 3)
detentores do estatuto de não assina acordos coletivos. Estão Criação de um Conselho
profissões regulamentadas, com juntos, nas diversas campanhas Nacional de Reconhecimento
conselho federal e os regionais (na salariais unificadas, com os Sindical; 4) Democratização das
grande maioria). O censo do sindicatos majoritários e em nada eleições sindicais; 5) Custeio do
IBGE de 2001 mostra quase um atrapalham. Ao contrário, somam sistema confederativo pela
milhão de associados as nossas esforços na luta por melhores contribuição sindical e
entidades de base. Um dos condições de trabalho e de salário. confederativa; 6) Critérios de
sindicatos mais antigos do país Ocorre que muitas vezes o representatividade para todas as
o dos Contabilistas de São Paulo, sindicato majoritário não atende entidades; e 7) Organização por
fundado em 1918. às reivindicações específicas dos local de trabalho.
A Consolidação das Leis do profissionais liberais. Estamos empenhados para
Trabalho trata das profissões Ainda assim, nossos sindicatos unir as 15 confederações
liberais. Assegura que as profissões têm papel a desempenhar. Entre nacionais e as centrais sindicais
que tenham regulamentação, e outros, dois se destacam: 1) nessa agenda. Das seis principais
cujo exercício dependa de Formação profissional — que os centrais, já garantimos o apoio da
aprendizado especializado e conselhos e as próprias escolas e CGT, da CGTB e da CAT.
científico, tenham estatuto faculdades não dão conta; 2) Luta Restam ainda esforços de ambos
especial e possam organizar-se em de idéias na sociedade — ou seja, os lados — inclusive do nosso —
sindicatos. qual a opinião destes profissionais para unificarmos o conjunto dos
Isso em nada atrapalha a sobre temas de importância trabalhadores e da classe para
organização de categorias ou (opinião dos médicos sobre saúde, construirmos uma nova estrutura
mesmo de sindicatos de ramo. dos engenheiros, arquitetos e sindical, democrática, autônoma,
Até porque essa mesma CLT nos corretores sobre habitação livre e soberana, para estar
deu o direito a dupla popular, e tantos outros preparada para lutar pelos seus
sindicalização, que a maioria dos exemplos). direitos políticos e sindicais.
profissionais liberais acaba
seguindo. Assim o médico da PONTOS PARA REFORMA
metalúrgica é sócio do sindicato Assim, nós da CNPL Luis Eduardo Gautério Gallo é presidente da
majoritário e do seu entendemos que os seguintes Confederação Nacional dos Profissões Liberais (CNPL)

28 DEBATE SINDICAL
Contra a
pulverização
"A REFORMA SINDICAL DEVE

POSSIBILITAR UM SINDICATO

MAIS FORTE E REPRESENTATIVO"

MADALENA GUASCO PEIXOTO

A Confederação Nacional de O sindicato que interessa aos imprescindível que os


Trabalhadores em trabalhadores na defesa de seus procedimentos eleitorais tenham
Estabelecimentos de Ensino interesses é o sindicato unitário, prazos razoáveis de inscrição de
(Contee), filiada h. CUT, entidade combativo e democrático. A chapas, campanha eleitoral,
representativa dos professores e unidade dos trabalhadores é uma limites para tempo de gestão e
dos trabalhadores em arma estratégica e imprescindível respeito às instancias
administração escolar das na luta pelas melhorias de democráticas. Estes
instituições privadas de ensino, condições de vida e pelas procedimentos significam avanço
que tem em sua base 60 transformações necessárias na importante na democracia
sindicatos e seis federações, sociedade. sindical.
representando mais de 400 mil Assim, temos como um dos É fundamental assegurar na
trabalhadores, aprovou no seu pressupostos repudiar qualquer reforma sindical uma legislação dc
último Congresso uma ampla proposta de reforma que garantias para o exercício da
campanha pela manutenção dos possibilite a fragmentação das atividade sindical, possibilitando
direitos trabalhistas, da liberdade entidades. Devemos assegurar de fato a democracia no local de
sindical, pela valorização do salvaguardas para evitar o trabalho.
trabalho, sem redução de salários. sindicato por empresa, estabelecer Os trabalhadores devem se
A reforma sindical que a base minima territorial de um organizar e orientar sua luta para
defendemos é a que possibilita município para a fundação de um que a reforma trabalhista e
um sindicato mais forte e sindicato. sindical tenha caráter progressista,
representativo, enraizado nos Qualquer mudança não pode que democratize as relações de
locais de trabalho, unitário por desconsiderar as entidades que trabalho, valorize o papel do
ramo de atividade, independente existem, as categorias e a base Estado visando a garantia de
e livre. Entidades preparadas para territorial que representam e direitos, fortaleça os sindicatos e
garantir e ampliar as conquistas abrangem. É a partir do que amplie os direitos conquistados.
sociais, para incorporar amplos construímos que devemos realizar O debate da reforma trabalhista e
setores excluídos e marginalizados a mudança e não negar ou ignorar sindical não pode estar dissociado
pela economia capitalista. a organização, o patrimônio e a da reafirmação da necessidade da
história das entidades. retomada do crescimento
ARMA ESTRATÉGICA econômico, das mudanças na
Colocamos-nos em luta contra CÓDIGO ELEITORAL política econômica e de um novo
o perigo da pulverização sindical, Também defendemos o modelo de desenvolvimento
da fragmentação das entidades — estabelecimento de um código econômico.
com a constituição de sindicatos eleitoral sindical que estabeleça
por empresa — e contra permitir regras para garantir o princípio da
que as entidades fiquem sem democracia e transparência nas Madalena Guasco Peixoto é coordenadora-geral da
fontes de custeio para garantir a entidades. Para possibilitar a Confederação Nacional dos Trabalhadores em
sua sobrevivência. participação de todos é Estabelecimentos de Ensino (Contee)
yoriaPieSSIVOSPIWA
DEBATE SINDICAL 29
Equívocos sobre a
reforma sindical
"0 ATUAL MODELO FORTALECE
A UNIDADE E A REPRESENTAÇÃO

DOS TRABALHADORES"

JOSÉ CAETANO RODRIGUES


É sabido que a estrutura enfrentamento dos desafios de desenvolver o seu trabalho
sindical brasileira carece de interesse comum, como o sindical. Em segundo lugar, esta
mudanças. Neste contexto, o desemprego, reforma agrária e contribuição do trabalhador
assunto desperta interesses e tantos outros. Vale observar que, representa a insignificância de
opiniões das mais variadas, que muito antes das centrais sindicais, 0,27% da remuneração/ano.
nem sempre refletem a nossa já existiam as chamadas Portanto, não seria justo penalizar
realidade. "intersindicais" que cumpriam os bons e autênticos, que são a
Em primeiro lugar, a crise da basicamente este papel. maioria, por conta dos poucos
estrutura sindical deve-se, falsos dirigentes.
justamente, a. ausência de RISCO DA FRAGMENTAÇÃO
legislação própria que assegure a A idéia de romper com o atual MUDANÇAS NECESSÁRIAS
participação democrática dos modelo para construir um outro Todavia, merece ser
trabalhadores na vida de sua (inserto), inclusive com a considerada a necessária
entidade, sem privilégios ou introdução da pluralidade, redistribuição das quotas-parte da
fendas que permitam atos representa maior fragmentação e contribuição sindical no sentido
corruptivos e anti-sindicais. Por divisão dos trabalhadores. Neste de excluir a participação do
isto, culpar o atual modelo é cenário, deve-se considerar que o Estado (20%), sendo esta
equivocado. empregador exercerá o seu papel, destinada a. gestão da estrutura
É importante observar a sem contar que o trabalhador sindical, inclusive as centrais, que
diferença entre "estrutura" e perderá seu espaço de referência. poderiam reduzir ou até suprimir
modelo" sindical. O nosso E deve-se observar ainda a os elevados valores cobrados a
modelo é pautado na organização diferença entre a organização dos título de mensalidades.
por categoria profissional ou servidores públicos e do setor Finalmente, considerando que
econômica, verticalmente privado. a causa da desorganização sindical
estruturada — na base pelos Outro equívoco é a defesa por não é do "modelo" e sim da
sindicatos (limitados aos "alguns" da extinção da ausência de leis, entendo que: 1)
municípios); no plano contribuição sindical. A tese é Deve-se regulamentar o artigo 8.
intermediário pelas federações sustentada sob o pretexto do da Constituição visando
(limitadas aos Estados); e no topo ‘`comodismo dos dirigentes disciplinar os mandatos sindicais,
(nacional) pelas confederações. sindicais", visto que esta garante a democratizar os procedimentos
Este permite que uma manutenção financeira da eleitorais e garantir o custeio
determinada categoria tenha entidade independentemente da independentemente das
representação em todos os níveis e representatividade associativa. contribuições associativas e
fortalece a unidade dos Ocorre, em primeiro lugar, voluntárias; 2) Reconhecer e
trabalhadores. que enquanto uns poucos se definir o papel das centrais
Em segundo lugar, a enquadram neste conceito de sindicais.
unicidade não prejudica a acomodados", a grande maioria José Caetano Rodrigues é secretário-geral do Confederação
organização intercategorias no depende da contribuição para National dos Trabalhadores na Saúde (CNTS)

30 DEBATE SINDICAL
Reformas: mudar
para melhor
"NÃO PODEMOS TEMER AS
MUDANÇAS; MAS DEVEMOS
EVITAR TODAS AS ARMADILHAS"

MIGUEL ABRÃO NETO


Há anos participando do nossos sindicatos, ainda assim o As reflexões em todas as nossas
avanço nas lutas do sindicalismo, balanço histórico das lutas instancias e também no interior
temos enfrentado inúmeras recentes traz o saldo positivo de do Fórum Nacional do Trabalho
controvérsias que dominam o uma organização sindical crítica e devem ter este objetivo. É preciso
nosso campo, com palavras de amadurecida. O sindicalismo superar nossas divergências e
esclarecimento e esforços pela brasileiro é reconhecido no sectarismos. Só unidos teremos
unidade. Já enfrentamos as mundo inteiro como um dos mais forças para interferir nesta reforma
investidas dos governos anteriores, atuantes e representativos. O decisiva para o futuro dos
que tentaram dividir e próprio resultado da eleição trabalhadores.
enfraquecer o movimento presidencial no final do passado Não é tarefa simples porque
sindical. Com muita luta e teve a inquestionável contribuição estamos cansados e divididos. Por
unidade, nós conseguimos barrar do movimento sindical. isso, instalamos o Fórum Sindical
os ataques mais destrutivos Agora, quando nos preparamos dos Trabalhadores (FST), com a
nossa organização, evitando o para debater as perspectivas do maior mobilização dos últimos
pior! sindicalismo brasileiro numa tempos já conseguida junto às
Também tivemos de combater conjuntura nova, trata-se de bases em todo o país. Mais do
os que "vendem a alma ao diabo", reconhecer a necessidade e a que nunca, devemos fazer tudo
conforme denunciamos num oportunidade das mudanças. A pela unidade nas ações, discursos
editorial do nosso informativo. estrutura que os trabalhadores e documentos, a fim de
Com o falso discurso da construíram nas últimas décadas garantir a mudança capaz de
liberdade, alguns dirigentes está funcionando, mas há muito melhorar nossa organização e
bateram pesado na atual estrutura que aperfeiçoar. A hora é chegada. fortalecer a estrutura do
sindical, fazendo o jogo dos Não podemos temer as sindicalismo.
inimigos. Tentaram e não mudanças; mas devemos evitar as Teremos muitos desafios pela
conseguiram extingui as armadilhas. É preciso mudar para frente. Há uma brutal ofensiva
contribuições de custeio. melhor; este deve ser o nosso lema para anular ou reduzir as nossas
Tentaram e não conseguiram na discussão em curso sobre a conquistas históricas. Só com um
minar o acesso do trabalhador reforma trabalhista e sindical. sindicalismo classista, mais
Justiça do Trabalho. Tentaram e fortalecido, renovado, é que
não conseguem a quebra da FORTALER O SINDICALISMO poderemos resistir às ameaças,
estrutura básica do sindicalismo, Precisamos listar tudo o que é encarar os desafios e evitar mais
com a introdução do pluralismo. útil e opera a favor do bom flexibilização, perda e lesão aos
funcionamento da ação sindical. direitos dos trabalhadores.
SALDO POSITIVO E também o que está superado e
Mesmo forçados a reconhecer emperra a nossa vida. Com esta
tantos equívocos, preconceitos e pauta debatida, consensuada, Miguel Abrão Neto é presidente da Confederação
interesses menores alimentando a iremos ao Congresso lutar pela Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos
divisão e o enfraquecimento dos sua aprovação. de Educação e Cultura

DEBATE SINDICAL
31
Sindicalismo
para todos
"NOVAS OPORTUNIDADES NESTA
CONJUNTURA EM QUE UM
EX — SINDICALISTA CHEGA Á PRESIDÊNCIA"

OMAR JOSÉ GOMES

Estando dentro do movimento balanço histórico das batalhas o bem de nossa estrutura. Nós,
sindical brasileiro há anos, recentes traz saldo positivo, trabalhadores dos transportes, às
participando ativamente das lutas indiscutivelmente. Se há ainda vezes somos vistos como os que
e conquistas dos trabalhadores, já tanto para ser feito, temos de têm de regressar sempre ao
vimos muita coisa. Foram anos de reconhecer igualmente o muito mesmo destino. Mas as nossas
grandes batalhas, com tantos que fizemos ate aqui. posições históricas comprovam
companheiros mostrando Para nós, porém, existem que somos os pioneiros na hora de
coragem e perseverança no novas oportunidades nesta atual transpor os limites.
enfrentamento com os patrões e conjuntura, em que o ex- E o que fazemos agora. Sem
com o pessoal que faz o jogo do sindicalista Lula consegue subir â. abrir mão da unicidade, do
grande capital. Presidência da República numa custeio amplo e compulsório, da
A última etapa dessa luta foi o coligação comandada pelo Partido Justiça do Trabalho como fiel de
combate contra o neoliberalismo dos Trabalhadores. Comparando balança e da categoria como a
do período de FHC, cujo projeto o que aí está com o passado não base da organização, vemos boas
inclui a completa extinção da há quem consiga nos convencer perspectivas para estabelecer, no
atual organização sindical. E o de que nada mudou, que não debate amplo e democrático, os
melhor jeito que encontramos ocorreu um salto em nossa luta, fundamentos de um sindicato
para lutar foi tentar esclarecer que pioraram as perspectivas para mais ágil e mais firme.
cada um com as palavras da os trabalhadores. Só assim conseguiremos
tolerância e a defesa da nossa Não dá para continuarmos avançar nas atuais dificuldades
unidade. falando as mesmas coisas e nos que temos enfrentado na
preparando do jeito que fazíamos negociação coletiva. O que mais
DISCURSOS ENVELHECIDOS nas lutas do passado. Aquelas precisamos, e parece estar
A cada nova etapa dessa teses ficaram velhas e já não nos bastante claro para a maioria, é
empreitada, vemos que servem mais. Mesmo admitindo estar junto nesta hora, unidos e •■•

envelhecem os discursos que que o que pode ser feito está fortes, sem precipitação, sem
pregam o confronto e a pretensão demorando demais, quem divisionismo. Porque o mais
de uma vitória a qualquer preço. consegue jogar os trabalhadores importante que a história nos
Quem nos dias de hoje ainda contra esse governo, que tem o ensina é que somente com a
perde tempo com os que sempre Lula como sua expressão maior? unidade de todos os sindicalistas
preferiram aparecer como os a classe trabalhadora poderá ter
radicais, cantando de galo, UNIDADE PARA VITÓRIA chance de chegar â vitória.
falando grosso e fazendo bravata? A ação das centrais sindicais,
Mesmo forçados a reconhecer sem a menor dúvida, melhorou
nossos erros e tantos interesses muito a luta sindicalista e depois
pequenos mantendo-nos kle vinte anos não tem sentido
divididos, com o enfraquecimento continuar fazendo de conta que Ornar José Gomes é presidente Confederação Nadonal
do sindicato, ainda assim o não existem: serão legalizadas para dos Trabalhadores em Transportes Terrestres (CNTTT)

32 DEBATE SINDICAL
LIFICAÇA0 E
VIEDICO

Modernidade ou
enfraquecimento?
"PROPOSTA ANULA AS CONQUISTAS
QUE A PRÓPRIA UNICIDADE
AJUDOU A CONSTRUIR"

HEDER MURARI BORBA

Quando nós, brasileiros, estrutura sindical vigente no país, representatividade das lutas da
elegemos um trabalhador para extinguindo a unicidade e a classe trabalhadora. Classe
comandar a nação, acreditávamos contribuição sindical trabalhadora da qual os atuais
que um presidente oriundo de compulsória, fragmenta as detentores do poder já fizeram
um partido político gerado a entidades e debilita o movimento, parte há poucos anos atrás.
partir da luta da classe operária retirando direitos adquiridos ao Portanto, o argumento de que
estivesse disposto a fortalecer o longo de muitos anos de lutas e essas propostas representam um
movimento sindical. desconsiderando toda uma "avanço na consolidação do
Com a eleição do trajetória de conquistas na sindicalismo moderno" nada mais
representante de um partido que história do sindicalismo é do que um engodo, uma
se tornou símbolo de brasileiro, que a própria tentativa de desestimular e inibir
combatividade no que diz unicidade sindical ajudou a a luta sindical. Será que se na
respeito a tudo o que representa a construir. época em que Lula e Vicentinho
melhoria das condições de vida da Não somos contrários a eram líderes da classe
mão-de-obra deste país, não mudanças e nem desfavoráveis trabalhadora não existisse a
poderíamos imaginar que um dia modernidade das regras, desde unicidade e a contribuição
seríamos surpreendidos com uma que antes elas sejam amplamente sindical, que dava aos dois as
proposta de reforma trabalhista debatidas e desde que não condições de atuação política, eles
que significa não o fortalecimento signifiquem "entregar o galinheiro hoje estariam no poder?
pelo qual temos lutado, mas sim a para a raposa tomar conta". O Será que as entidades que
pulverização do movimento que não podemos aceitar é que representam os petroleiros, os
sindical. um novo sistema, que acaba com ferroviários e os trabalhadores
os sindicatos de categoria, rurais, por exemplo, sem a
RAPOSA NO GALINHEIRO extingue os dissídios coletivos e unicidade e a contribuição
Antes de qualquer coisa, nós, elimina abruptamente a contri- sindical teriam a força que têm
da Federação Nacional dos buição sindical, seja proposto sob hoje? Será que nós, médicos, que
Médicos, entendemos que o argumento de uma autonomia e já sofremos com as divisões no
qualquer proposta que signifique liberdade que já existem. nosso movimento, com a
a perda de direitos dos existência de várias entidades nos
trabalhadores e qualquer AMPLIAR A UNIDADE representando, devemos
mudança que envolva a reforma Não podemos aceitar que continuar nesse caminho? Não. O
das entidades sindicais têm de ser parlamentares do próprio PT que queremos é exatamente o
precedida por amplo debate, que apresentem propostas de emenda contrário. Queremos, sim, a
envolva todos os representantes constitucional alterando o artigo unificação de toda a categoria
daqueles que serão diretamente 8. da Constituição Federal, que é médica em uma só entidade.
atingidos. exatamente o que nos garante a
A proposta de reforma sindical ampla liberdade do movimento Heder Murari Borba é presidente da Federação
e trabalhista, que altera toda a sindical, a ampla Nacional dos Médicos

DEBATE SINDICAL 33
Cruzada patronal
contra os sindicatos
"A REFORMA DEVE REFLETIR
A VITÓRIA PROGRESSISTA
COM A ELEIÇÃO DE LULA"

WAGNER FAJARDO PEREIRA

Em 2 de novembro, em dos trabalhadores e atacar seus direitos conquistados e o direito


matéria no jornal O Estado de direitos históricos conquistados irrestrito de greve, cabendo aos
S.Paulo, o ex-presidente do com muita luta durante o século trabalhadores a decisão sobre a
Tribunal Superior do Trabalho, passado. sua deflagração e suspensão.
Almir Pazzianoto, desferiu seu Os metroviários brasileiros, O poder normativo da Justiça
veneno neoliberal contra o majoritariamente, sempre do Trabalho deve ser reformulado
movimento sindical. Ele não defenderam a manutenção da com a extinção do "efeito suspen-
poupou elogios à Convenção 87 unicidade sindical como sivo" e retirando sua atribuição de
da OIT e propôs o fim das ferramenta contra a fragmentação julgar greves. A reformulação deve
contribuições compulsórias e a da organização dos trabalhadores. prever que somente às entidades
criação de sindicatos por empresa, Desde o 1° Congresso dos sindicais cabe acionar o Judiciário
considerando a unicidade sindical Metroviários de São Paulo, em Trabalhista como recurso extremo
como um "entulho autoritário". 1986, a categoria repudia a para enfrentar a intransigência
Na mesma edição, uma Convenção 87 da OIT por patronal.
verdadeira cruzada anti-sindical considerá-la um recurso patronal Finalmente, considerando as
foi propugnada pelo jornal que é para o desmonte da organização duas décadas de degradação do
um dos maiores expoentes do sindical. trabalho e a vitória das forças
neoliberalismo na mídia. Não A liberdade e autonomia progressistas, com a eleição de
faltaram críticas à "capitulação" sindicais, conquistadas na Lula, a reforma da legislação
do governo Lula por este ter Constituinte de 1988, devem ser trabalhista deve se inserir neste
engavetado a proposta de FHC de regulamentadas, garantindo a novo ambiente político.
mudança no artigo 618 da CLT, representação sindical nos locais Os metroviários estarão na
impondo a supremacia do de trabalho, a implantação de linha de frente na luta pela
negociado em detrimento do sindicatos por ramo de atividade, manutenção e ampliação dos
legislado. O jornal também o reconhecimento das centrais direitos trabalhistas, a redução da
criticou o poder normativo da sindicais, a garantia de sustenta- jornada sem redução dos salários,
Justiça do Trabalho que, na visão ção financeira das entidades e a a melhoria das condições de
neoliberal, dificulta a "negociação democratização das eleições segurança e saúde, o combate
entre as partes". sindicais, com o estabelecimento discriminação de gênero, raça ou
de um código eleitoral. opção sexual e a valorização do
OFENSIVA CONSERVADORA trabalho como indutor do
Esta é uma prova de que a NOVO QUADRO POLÍTICO desenvolvimento econômico,
reforma sindical e trabalhista em Nas negociações coletivas e geração de emprego e
debate no Fórum Nacional do composição dos conflitos recomposição do papel do Estado.
Trabalho será objeto de amplo trabalhistas, deve-se garantir o
leque de articulações fim das demissões imotivadas com
conservadoras e patronais com o a ratificação da Convenção 158, a Wagner Fajardo é presidente da Federação Nacional dos
objetivo de minar a organização garantia da ultratividade dos Metroviários (Fenametro)

34 DEBATE SINDICAL
ECONOMI A

valorizacão do trabalho como


fonte de desenvolvimento
O fortalecimento
do mercado
interno, essencial
recuperação da
economia
brasileira, requer a
revalorização da
força de trabalho
•■■•
UMBERTO MARTINS

São variados as formas e os


conteúdos concretos da política A superprodução
neoliberal. Sua aplicação nos
diversos países capitalistas
está convivendo
compreende diferenças e fortes, conforme o caso, os com uma espécie de
particularidades significativas, preceitos do pensamento subconsumo crônico,
cabendo destacar as que decorrem keynesiano para exorcismar o
da posição das nações e mesmo demônio da crise e recorrem a um que a orientação
blocos e regiões no interior do protecionismo flagrantemente neoliberal só
sistema imperialista. O reacionário. Trabalham com taxas acentuou no mundo
liberalismo dos ricos é relativo, de juros baixíssimas e déficits
não é o mesmo que vem sendo públicos explosivos — fazendo
imposto aos pobres. ouvidos moucos aos conselhos do propostas de reforma trabalhista e
Enquanto o FMI, o FMI. previdenciária dos governos
Departamento do Tesouro dos europeus quanto na flexibilização
EUA e o G7 sugerem ao "terceiro do mercado de trabalho nos
mundo" o uso de remédios QUINTA-ESSÊNCIA Estados Unidos e na América
amargos e venenosos para NEOLIBERAL Latina. A greve geral dos
"ajustar" a economia com muita trabalhadores italianos contra a
austeridade e "responsabilidade Todavia, há um traço ou uma proposta de reforma
fiscal", cujos efeitos recessivos são característica que confere à. previdenciária do governo
hoje evidentes, os ricaços que política neoliberal uma direitista liderado por Berlusconi
habitam as potências capitalistas identidade universal e constitui a tem, sob este aspecto, um
podem se dar ao luxo da sua quinta-essência: é a feroz objetivo comum ao da sublevação
hipocrisia. Por lá, os governantes ofensiva do capital contra o popular na Bolívia: a derrota da
aplicam em doses mais ou menos trabalho, refletida tanto nas política neoliberal. O

DEBATE SINDICAL
35
ECONOMIA

Um traço que confere à politico neoliberal uma identidade universal e constitui

neoliberalismo revela-se, no final Arrocho, desemprego capacidade de consumo da classe


das contas, uma política do trabalhadora, enquanto a carência
capital financeiro internacional e precarização geram de emprego exclui centenas de
(liderado pelos EUA e o FMI) queda do consumo, milhões do mercado consumidor.
voltada para a depreciação do Deste modo, o neoliberalismo
trabalho e a intensificação da
reduzem o comércio,
a "globalização neoliberal"
espoliação imperialista sobre as elevam estoques da fortaleceram as tendências que
nações mais pobres. indústria e restringem acirram o conflito entre produção
A ideologia neoliberal, que consumo e produzem a crise de
ganhou força após as crises do
reprodução do capital superprodução. E este é um
capitalismo nos anos 70 do século aspecto da crise da economia
passado, supõe que a saída para a neoliberalismo fracassou. Em vez nacional que não devemos
crise consiste em aumentar o grau de solucionar o s . problemas, criou negligenciar. A anemia da
de exploração da força de novas dificuldades, provocando indústria, a estagnação do PIB e a
trabalho, exacerbar o saque um efeito oposto ao proclamado. elevação do nível de desemprego
imperialista e desmantelar o são fenômenos associados ã.
chamado Estado de Bem-Estar depressão do mercado interno
Social. Com isto, os lucros e os SUPERPRODUÇÃO brasileiro que acompanhou (como
investimentos capitalistas seriam E SUBCONSUMO uma contrapartida) o processo de
expressivamente ampliados, ajuste das contas externas
abrindo caminho a uma nova fase Um dos motivos, e quem sabe impulsionado pelas crises
de prosperidade econômica. Os o motivo central, deste fracasso é cambiais.
fatos da vida, que afinal é a mãe a ofensiva contra a classe As estatísticas do IBGE
de todas as verdades, sugerem trabalhadora, a política de indicam que em setembro deste
resultados bem distintos. As depreciação do trabalho, a ano a renda média dos
promessas de desenvolvimento precarização e o desemprego em trabalhadores nas seis maiores
estão se revelando falsas. massa. É visível que um aspecto regiões metropolitanas brasileiras
As taxas de crescimento relevante da crise econômica já tinha caído 14,6% em relação
continuaram em declínio ao atual, no Brasil e em boa parte do ao mesmo mês do ano passado. A
longo das últimas décadas, mundo, é o fato de que as precarização do mercado de
configurando uma tendência empresas não estão encontrando trabalho também avançou. Já a
estagnação econômica em grande mercado para vender seus taxa de desemprego na Grande
número de países capitalistas. O produtos, há um excesso de São Paulo, medida pelo Dieese
desemprego cresceu de forma produção, uma superprodução de (em convênio com a Fundação
assustadora, denunciando uma mercadorias em relação Seade), subiu para 20,6% em
ociosidade escandalosa das forças capacidade de consumo da setembro. O arrocho, a
produtivas. Carência de sociedade. Não se trata de uma precarização e o desemprego
crescimento e desemprego em superprodução absoluta, que provocaram a queda do consumo
massa são os principais ultrapassa as necessidades de das vendas, reduzindo as
ingredientes da refeição consumo do povo. atividades do comércio, elevando
neoliberal, temperada pela Na outra ponta deste os estoques da indústria e
instabilidade da (des) ordem fenômeno, como seu restringindo as possibilidades de
monetária mundial e crises complemento, nota-se o realização do capital.
cambiais intermitentes. empobrecimento das grandes Há uma crescente percepção
Até o presente momento, é massas. A superprodução convive de que sem o fortalecimento do
patente que a política neoliberal com uma espécie de subconsumo mercado interno, com a
não conseguiu contornar a crise crônico, que a política neoliberal recomposição da capacidade de
do capitalismo e, sob este aspecto, acentuou. A desvalorização da consumo do nosso povo, o Brasil
podemos concluir que o força de trabalho reduz a não vai reencontrar o caminho do

36 DEBATE SINDICAL
a sua quinta-essência é a feroz ofensiva contra o trabalho

O "espetáculo do
crescimento" só vinga
se for encenado
crescimento e do desenvolvimento pelos milhões de de desenvolvimento com
nacional. Uma ênfase exclusiva valorização do trabalho, incluindo
nas exportações pode não se desempregados através o aumento real do salário
revelar uma alternativa sábia e da ocupação racional mínimo, reforma agrária, a
eficaz para o futuro. de sua força produtiva reposição das perdas salariais
acumuladas nos últimos anos,
redução da jornada de trabalho,
TRABALHO E PRODUÇÃO de crescimento, com uma reversão do processo de
distribuição menos injusta da flexibilização e precarização do
O fortalecimento do mercado renda e a ampliação da mercado de trabalho, erradicação
interno brasileiro, essencial capacidade de consumo popular. do analfabetismo e elevação do
recuperação econômica, requer, Ao contrário do que se sucede em grau de escolaridade média do
sobretudo, a revalorização da força relação ao capital financeiro, os proletariado. Tudo isto
de trabalho, além de medidas de interesses da classe trabalhadora contribuirá para o
caráter assistencial e emergencial estão em harmonia com os engrandecimento do mercado
como o programa fome-zero. Um interesses nacionais e favorecem o interno e a retomada do
novo projeto de desenvolvimento desenvolvimento. crescimento. As medidas
nacional, em oposição ao I-1 á um conjunto de bandeiras diretamente ligadas ao objetivo de
neoliberalismo, deve enxergar na do movimento sindical que combater o desemprego merecem
valorização do trabalho uma fonte poderiam figurar numa política uma atenção especial.

DEBATE SINDICAL 37
9

Carência de crescimento e desemprego em massa são os principais ingredientes

A luta pela valorização do relação a. parte alocada para a


trabalho demanda um esforço Burguesia brasileira aquisição de máquinas e matérias-
teórico coletivo dos trabalhadores abriu o caminho, o primas, em função da
mais conscientes e dos modernização crescente do
intelectuais ligados ao movimento mercado e a alma ao processo produtivo. Os
popular para resgatar a verdade neoliberalismo; só a investimentos criam menos
sobre o significado do trabalho na classe trabalhadora emprego que antigamente. Por
economia política, verdade isto, o combate ao desemprego
desprezada e distorcida pela tem disposição para moderno passa necessariamente
ideologia neoliberal. Pensadores defender a nação pela redução do tempo médio ou
do porte de Adam Smith, Ricardo da jornada de trabalho, que nas
e Karl Marx sabiam que o condições atuais deve ser efetivada
trabalho ocupa um lugar central merece constar como prioridade sem redução de salários.
no processo produtivo, pois é a máxima das políticas públicas e, Em geral, os capitalistas não
fonte de todas as riquezas sociais, em especial, da política gostam de ouvir falar em redução
a força que cria e agrega valor as econômicalli. de jornada sem corte proporcional
mercadorias, a substancia do no valor dos salários. Temem
lucro e da própria moeda. pelos lucros e alegam que terão
Em todo o processo produtivo, REDUZIR A JORNADA um aumento adicional de custos e
da extração de matérias-primas a perderão competitividade, o que
elaboração do mais sofisticado Se não é possível crescer sem comprometeria o bom
produto industrial, incluindo o emprego é igualmente verdade desempenho das exportações e o
esforço de pesquisa, é o dispêndio que a elevação do nível de crescimento econômico. A
da energia física e mental da força emprego depende da recuperação experiência histórica indica, pelo
de trabalho que agrega valor a do crescimento da economia contrário, que a redução do
produção ou que, em outras nacional e, por isto, também tem tempo de trabalho favorece o
palavras, cria a riqueza social, muito a ver, no Brasil, com a crescimento econômico,
riqueza que em nosso país é necessidade de superar a política ampliando o nível de emprego, a
distribuída de modo tão perverso econômica legada pelo massa salarial e a capacidade de
e injusto. neoliberalismo e as restrições aos consumo. É uma medida que
Sem trabalho, não há investimentos (sobretudo no setor também favorece o avanço da
produção e muito provavelmente público) impostas pelos ajustes produtividade e pode contribuir
sem emprego (ou sem uma fiscal e externo. Tem a ver ainda para elevar a qualidade da força de
elevação substancial do nível de com a continuidade de uma trabalho, se for combinada com
emprego) não alcançaremos o política externa altiva e soberana, um programa de erradicação do
desenvolvimento nacional que ancorada no fortalecimento do analfabetismo e elevação do grau
almejamos. O crescimento virá a Mercosul, negação da Alca e de escolaridade da classe
medida que a imensa energia que diversificação de mercados e trabalhadora, conforme propõe a
hoje jaz ociosa e desaproveitada fontes de capital. Central Única dos
no leito do desemprego, capaz de Cabe assinalar, ao mesmo Trabalhadores [2 ] •
mover milhões de mundos, for tempo, que nas condições atuais o O neoliberalismo representou
sendo empregada no processo crescimento econômico não é o reconhecimento de que o
produtivo. O "espetáculo do suficiente para superar o drama padrão de desenvolvimento do
crescimento" só será possível se do desemprego massivo. Embora pós-guerra havia se esgotado e a
for encenado pelos milhões de ele seja absolutamente política neoliberal constitui uma
desempregados através da indispensável, a verdade é que a antítese do chamado Estado de
ocupação racional de sua imensa proporção dos investimentos de Bem-Estar Social, urna negação
força produtiva na criação de capital destinada h. contratação de do keynesianismo. É uma opção
riquezas. Por isto, o emprego mão-de-obra é cada vez menor em que já malogrou e, embora ainda

38 DEBATE SINDICAL
da refeição neoliberal, temperada pela instabilidade mundial

fazer prevalecer uma nova filosofia


de desenvolvimento nacional que
veja na valorização do trabalho
uma fonte de crescimento.
Dificilmente poderia ser
101. diferente, visto que foi a grande
burguesia brasileira quem abriu o
caminho, o mercado e a alma ao
neoliberalismo. Somente a classe
trabalhadora, que sempre resistiu
e hoje procura descortinar o rumo
da mudança, tem disposição e a
condição de defender os interesses
nacionais.

N OTAS
Os versos do grande poeta brasileiro
Augusto dos Anjos em "Lamento das
cousas" se ajustam ã definição do
desemprego moderno:
"Ea dor da forfa desaproveitada,
o cantochão dos dínamos profundos,
que podendo mover milhões de mundos,
jazem ainda na estática do nada"
Em seu 8° Congresso Nacional, a
CUT aprovou resolução que propõe
dedicar parte da jornada remunerada de
trabalho à educação da classe
trabalhadora, visando à erradicação do
analfabetismo e a elevação do grau de
escolaridade. Seria instituído no Brasil
um programa similar ao das 150 horas
anuais para a educação, conquistado pelo
proletariado italiano nos anos 70 do
século passado. Segundo o sindicalista
EN. Enrico Giusti, diretor do Instituto de
seja a política dominante, esbarra na prática, a síntese deste Cooperação Internacional da CISL
numa invulgar resistência dos movimento — a negação do (seção Emília Romana), esta conquista
povos, que em todo o mundo — e neoliberalismo, que pode e deve promoveu mudanças revolucionárias no
em especial na nossa América começar com um novo projeto de sistema educacional para adultos na
Latina — estão em movimento â desenvolvimento, fundado na Itália, reduzindo o analfabetismo a
busca de um projeto de valorização do trabalho, pleno índices insignificantes e levando milhões
desenvolvimento alternativo. No emprego e combate â miséria. de trabalhadores a concluírem o primeiro
Brasil, a eleição de um líder da óbvio que um projeto deste tipo grau. A entrevista de Giusti pode ser
classe operária â Presidência da não vingará por geração acessada no sítio www.tempolivre.org.br .
República foi um sinal muito espontânea e, dada a ojeriza dos
forte neste sentido. capitalistas pelo tema, os Umberto Marlins é jornalista, assessor da secretaria de
A classe trabalhadora precisa trabalhadores terão de lutar com politicos sindicais da CUT e membro do conselho de
elaborar, tanto na teoria quanto muita energia e unidade para redação da Debate Sindicol

DEBATE SINDICAL 39
AÇÃO SINDICAL
JOÃO GUILHERME VARGAS NETTO

A tríplice configuração de governabilidade,


hegemonia e mobilização) as
relações entre os três se alteram.

fronteira: Pode-se falar em "fronteiras


móveis" como numa guerra de

uma relação movimentos. O essencial consiste


em determinar, em cada situação,
a proporção correta, que faz que

complexa todas as outras sejam


desproporcionadas.
Ainda que o problema seja de
Continuo preocupado com os difícil solução, começo a me
problemas da tríplice fronteira. sentir otimista porque escuto
Não me refiro à região de Foz do vozes (e vozes de outras
Iguaçu, mas às relações entre tonalidades, diferentes da minha)
governo, partido e sindicato. que explicitam o problema e
Durante o século passado alertam para ele. Recentemente,
nenhuma das grandes correntes depois de uma viagem à Rússia e a
sociais e ideológicas conseguiu dar A distinção entre sua moda, o professor Jose
uma solução satisfatória para as
relações entre estas três
governo, partido e Pastore disse que "a história
ensina que o atrelamento entre
entidades. O liberalismo sindicato no atual sindicalismo, burocracia e
subordinou cada uma delas ao militância pode ser fatal para a
" mercado". Os totalitarismos cenário politico defesa dos trabalhadores do
impuseram o nnonolitismo da futuro e para o funcionamento de
ditadura partidária e pessoal uma economia competitiva".
sobre o Estado e os movimentos. responsáveis da administração) Trocando a ênfase no futuro pela
A social-democracia e o funciona- para um mutirão: "Que cem ênfase no presente e a
lismo weberiano acomodaram-se flores floresçam, que concorram competição pela solidariedade
com soluções acanhadas que se entre si cem escolas". entre os trabalhadores, assino
equilibraram durante os anos de embaixo.
vacas gordas do "bem-estar AMBIENTE DA POLÍTICA
social", mas desandaram.
Um bom começo seria o CORREÇÃO NECESSÁRIA
óbvio: governo administra,
CEM FLORES FLORESÇAM partido procura dirigir e sindicato Antes tarde do que nunca.
resiste e reivindica. Quero corrigir um erro que
Estamos, portanto, vivendo o Mas, o que dizer da relação cometi no artigo sobre a criação
novo século sem exemplos entre as três esferas quando elas das centrais na Debate Sindical
convincentes e sem soluções se tocam ou se interpenetram? número 34 (junho-2000). A IV
corretas. Esta situação tem Este é o ambiente por excelência Conferência Nacional das Classes
produzido alternativas cínicas e da política, ciência do necessário e Produtoras (Conclap) foi realizada
relativistas ou seu contraponto arte do possível. no Rio de Janeiro, de 31 de
moralista estéril e histérico. Diferentemente da metáfora outubro a 4 de novembro de
Para a correta formulação geográfica em que o Paraguai é e 1977. Estava, portanto, bem viva
deste grande problema e para o continua sendo o Paraguai, apesar na memória dos dirigentes
encaminhamento de soluções de suas fronteiras com Brasil e sindicais que se reuniram com o
pertinentes deveriam ser Argentina, as relações entre ditador Geisel em 7 de
convocadas todas as instâncias de governo-partido-sindicatos não novembro, em Brasilia.
elaboração teórica (as apresentam "fronteiras" estáveis.
universidades, os publicistas, os A cada momento, em cada etapa
centros partidários de do processo real, a cada
investigação, os dirigentes e problema concreto a ser João Guilherme Vargas Netto é consultor sindical de
ativistas sindicais e os enfrentado e resolvido (em cada diversas entidades de trabalhadores em São Paulo
Uma nova estrutural sindical para
um novo tempo em nosso pals
NOW
, HAtAttalAi

ti/460,
pi tINIJICAL

no.

A Corrente Sindical Classista (CSC), o Centro de Estudos Sindicais ((ES) e o Instituto Opinio luris
promoveram, nos dias 27 e 28 de outubro, o Seminário Nacional sobre Organização Sindical.
O evento, que contou com a presença de cerca de cem sindicalistas de 12 Estados,
aprofundou a reflexão sobre a reforma trabalhista e sindical deflagrada pelo governo.
O documento abaixo apresenta as análises e as propostas aprovadas neste rico
e representativo seminário
O debate em torno da reforma trabalho, tema que interessa não Para nos orientarmos diante
trabalhista e sindical tem grande só aos trabalhadores, mas a todas deste debate, precisamos partir de
importância para a classe as forças democráticas, patrióticas uma posição política classista,
trabalhadora brasileira e pode e progressistas deste país, já que considerando a realidade concreta
definir o futuro da organização também deve estar associado a de um país com dimensões
sindical e dos direitos um projeto nacional de continentais e notáveis diferenças
ofo'
trabalhistas. Estão em questão as desenvolvimento com valorização regionais, bem como a história e
regras da luta entre o capital e o do trabalho. cultura do movimento sindical

DEBATE SINDICAL
41
DOCUMENTO

brasileiro. É indispensável levar econômico, com o dos servidores públicos e


em conta o pano de fundo da desenvolvimento do mercado proibindo a intervenção do
crise brasileira, que compreende interno e a recomposição do papel Estado nos sindicatos. Mas não
duas décadas de estagnação do Estado. A reforma sindical e conseguiram ainda garantir o
econômica e uma perversa trabalhista deve ser compreendida pleno direito de atividade
herança histórica de dependência como parte fundamental deste sindical, da organização sindical
frente ao capital financeiro novo projeto. no local do trabalho e de greve.
internacional, agravada nos anos Coerente com esta perspectiva, Defendemos o
90 pela política neoliberal. a CSC lutará pela manutenção e aprofundamento da liberdade
Prevaleceram, em todos esses ampliação dos direitos sindical com a instituição do
anos, a depreciação da força de trabalhistas, pela recomposição do direito de organização sindical no
trabalho e um processo regressivo poder aquisitivo dos salários, por local de trabalho. A legislação
dos direitos dos trabalhadores e uma política de pleno emprego, deve reconhecer e regulamentar a
trabalhadoras. O saldo foi pela redução da jornada de comissão sindical de base, com as
dramático: desindustrialização, trabalho sem redução de salários, seguintes premissas: caráter
desregulamentação do mercado pela melhoria do ambiente e da unitário, com integrantes
de trabalho, aumento da saúde no trabalho, pela igualdade sindicalizados e protegidos por
terceirização e da informalização, e contra qualquer tipo de estabilidade no emprego, sendo
banco de horas, queda no poder discriminação no trabalho. Tudo eleita pelos trabalhadores da base
aquisitivo dos salários e isto passa pelo fortalecimento da e organizada e acompanhada pelo
desemprego em massa. Ganhou o organização sindical. A sindicato.
capital financeiro e perderam a fragmentação da organização
nação, as empresas do setor sindical (por exemplo, o sindicato
produtivo e, principalmente, os por empresa) somente serve ao APERFEIÇOAR A UNICIDADE
trabalhadores. projeto neoliberal e à perspectiva
As dificuldades foram de desregulamentação do Defendemos a liberdade e
agravadas pela implantação de mercado de trabalho e não a um autonomia com unicidade
novas tecnologias e sistemas projeto de desenvolvimento sindical. A unicidade é o
organizacionais, além da nacional com valorização do principal mecanismo para evitar a
desconcentração da produção. trabalho, que exige sindicatos fragmentação e o sindicato por
Antigas profissões caducaram e fortes e representativos. Por isto, o empresa. Entretanto, a vida tem
desapareceram, enquanto objetivo da reforma sindical e mostrado que não se evitou a
surgiram outras, bem como novas trabalhista no ponto de vista dos atuação de mais de um sindicato
doenças ocupacionais. Em geral, trabalhadores e das forças no interior das empresas. Há
as mudanças provocaram efeitos progressistas deve consistir em vários sindicatos para representar
perversos no poder de fortalecer os sindicatos, manter e os terceirizados e um conjunto de
mobilização e de barganha dos ampliar os direitos sociais e categorias diferenciadas, o que
sindicatos. atualizá-los, tendo em vista as desorganiza e reduz o poder dos
transformações ocorridas nas sindicatos na negociação e
relações de trabalho, no modo de mobilização diante do
NOVO QUADRO POLÍTICO produção capitalista. empregador. Por isto, será
O fortalecimento dos necessário ampliar a abrangência
Com a vitória de Lula e das sindicatos começa pelos seus das entidades sindicais,
forças progressistas, democráticas princípios de unidade, liberdade caminhando no sentido da
e populares, o ambiente político e autonomia sindical. Na organização por ramo de
mudou. A correlação de forças foi Constituição de 1988, os atividade, a fim de garantir que
alterada a favor dos trabalhadores, trabalhadores avançaram nesta todos trabalhadores de uma
colocando na ordem do dia a luta conquista, rompendo com a mesma empresa possam se
por um novo projeto de estrutura ministerialista, com a sindicalizar em um só sindicato.
desenvolvimento, nacional, carta sindical, o estatuto padrão, Enquanto não se conclui o
democrático e popular, que — em assim como ampliaram os direitos processo de transição para o ramo
contraposição à ofensiva trabalhistas, estendendo-os aos de atividade, será respeitada a
neoliberal — veja na valorização do trabalhadores do campo, organização sindical por categoria.
trabalho a fonte do crescimento legalizando a organização sindical Os terceirizados terão direito de

42 DEBATE SINDICAL
sindicalização no sindicato que
representa a categoria principal da
empresa tomadora de serviços. Os
sindicatos terão por base mínima
um município, podendo também
possuir uma abrangência regional,
estadual ou nacional.
Tendo a unicidade do
sindicato e o ramo de atividade
como pressupostos básicos e as
...... centrais sindicais como
organizações máximas, devemos
repensar a organização da
estrutura vertical, representada
pelas federações e confederações,
levando em consideração as
atividades do ramo, a relação
entre empregados e empregadores
e o caráter público ou privado do
vínculo trabalhista. É importante
observar que o ramo de atividade,
na estrutura vertical, é o mais
adequado para a organização de
toda cadeia produtiva, da extração
a distribuição.
..... As confederações e federações,
sendo filiadas ou não as centrais,
para obterem o estatuto de poder
negocial e de celebração de
contrato coletivo deverão
obedecer a critérios de
representatividade que devem ser
definidos em âmbito nacional e
estadual. Se estadual, deve levar A unicidade é o
em conta o número de reconhecidas politicamente, mas principal mecanismo
sindicalizados (as), sindicatos e não legalmente. Cabe aos
municípios. Se nacional, o trabalhadores (as) conquistar a
para evitar o risco
número de sindicalizados (as) e legalização das centrais (com da fragmentação e
Estados. poder de negociação e de do sindicato por
celebração de contrato coletivo de
trabalho) para fortalecer sua empresa; porém, deve
PILARES DA NOVA representação política e ser aperfeiçoada
ESTRUTURA econômica na sociedade. Não é
demais assinalar que qualquer
As centrais sindicais são as acordo ou contrato coletivo ramos de atividades e organização
organizações máximas e gerais dos nacional deve passar pelo crivo nos estados do país.
trabalhadores (as) e também as das bases e ser referendado em Sendo assim, a estrutura
mais avançadas, na medida em assembléias gerais pelos sindical que defendemos começa
que resgatam o sentido político respectivos sindicatos. Para as pela comissão sindical de base
classista da luta sindical e centrais conquistarem sua unitária, no local de trabalho;
representam a união de todos os legalização deverão também sindicato único por categoria
trabalhadores frente a exploração obedecer aos critérios de (num processo de transição para a
41, capitalista. Com o fim da representatividade, número de organização por ramo de atividade
ditadura, as centrais foram trabalhadores sindicalizados, econômica), federação e

DEBATE SINDICAL 4.3


DOCUMENTO
PARTE I — CONFLITOS
INDIVIDUAIS
confederação; legalização das direta ou indiretamente ao
centrais, considerando critérios de emprego e ao trabalho, incluindo No Brasil, os conflitos
representatividade. A relação a definição da política econômica. individuais consistem
entre as diversas instâncias da Lutaremos ainda pela constituição essencialmente no simples
organização sindical deve ser de de um Fundo Nacional do descumprimento, pelo
filiação. Trabalho, cujas fontes de empregador, dos direitos dos
Deverá ser garantida por lei a financiamento devem ser trabalhadores, sejam estes
sustentação financeira desta definidas democraticamente após previstos em lei ou em convênios
estrutura, com base nas seguintes amplo debate envolvendo o coletivos. Na prática, tal conflito
contribuições: 1) Mensalidades movimento sindical e o governo. somente se expressa quando o
sindicais, cujos valores serão empregado é despedido e,
obrigatoriamente descontados em mediante reclamação na Justiça
folha de pagamento; 2) NECESSIDADE DA do Trabalho, postula todo um
Contribuição negocial, que TRANSIÇÃO elenco de direitos sonegados
atingirá todos trabalhadores (as) durante o curso do contrato de
da categoria por ocasião das A transição para o novo trabalho. Na realidade, estes
convenções ou dissídios coletivos, modelo deve ser feita de modo descumprimentos não são
constados e resolvidos na
cujo valor também será definido democrático, após ampla consulta,
vigência do contrato, como
em assembléia geral e descontado e respeitar o que foi conquistado
deveria, em função da
em folha de pagamento; 3) em termos de organização, num
inexistência de proteção contra a
Contribuição sindical, que deve processo dinâmico de fusões de despedida imotivada e pela
ser mantida com caráter entidades sindicais. E deve ser virtual impossibilidade dos
compulsório e aperfeiçoada pela feita de forma democrática, após sindicatos atuarem no interior das
nova estrutura sindical, ampla consulta. As mudanças empresas, exercendo papel
redefinindo-se a destinação dos serão feitas através da deliberação flscalizador.
recursos. dos trabalhadores (as). Queremos Esta situação é agravada pela
Deverá ser criado o Conselho mudar o que precisa ser mudado deficiente atuação do Ministério
Nacional de Reconhecimento e defender as conquistas que do Trabalho e a sobrecarga da
Sindical — mantido por recursos resultaram da luta dos Justiça do Trabalho. Deve-se ter
públicos e com representação dos trabalhadores. em conta que, durante os
trabalhadores definida através das A mudança a ser feita é para governos neoliberais, a estrutura
centrais sindicais e das possibilitar a ampliação da de fiscalização trabalhista e da
confederações não filiadas às unidade dos trabalhadores e Justiça do Trabalho sofreu
centrais —, com o objetivo de fortalecer a organização sindical a proposital desmantelamento, a
impulsionar a organização por partir do local de trabalho, pretexto de liberar os
ramo de atividade, fiscalizar o estendendo a representação e ação empregadores de parte dos
registro do sistema sindical, assim das entidades para segmentos custos trabalhistas. A situação se
como instruir e julgar as mais amplos e para setores completou com a criação das
reclamações que envolvam as atualmente desorganizados. Neste Comissões de Conciliação Prévia,
entidades sindicais que integram sentido, é preciso buscar formas que atuam como instrumentos de
ou pretendem integrar o sistema de organização e sindicalização renúncia dos direitos trabalhistas
sindical. especial dos trabalhadores (as) do e previdenciários.
Deverá também ser elaborado mercado informal e dos Ainda que, potencialmente,
um Código Eleitoral para garantir desempregados (as). existam conflitos individuais que
um processo democrático e coibir O sindicato que mais interessa poderiam surgir no curso do
contrato de trabalho e serem
irregularidades nas eleições para aos trabalhadores (as) na defesa de
resolvidos por comissões
renovação das gestões sindicais. seus interesses é um sindicato
sindicais que atuassem no interior
Defendemos a valorização do unitário, de luta e democrático.
das empresas, na realidade, tal
Ministério do Trabalho e Com a visão critica e propositiva, situação não ocorre, em virtude
Emprego, ao qual deverá ser construiremos nossa proposta da histórica rejeição patronal a
garantida uma participação ativa com o conjunto do movimento qualquer tipo de interferência
em todas as decisões associadas sindical. sindical na vida das empresas.
Considerado este quadro, em
que os direitos dos trabalhadores

44 DEBATE SINDICAL
Esta proposta que hoje é
Relações de trabalho, negociação ressuscitada, na prática, seria a
extinção do Poder Normativo, já
coletiva e composição de conflitos que dificilmente os empregadores
concordariam em assinar uma
petição conjunta submetendo o
estão essencialmente previstos em basicamente defensivo, de mera conflito coletivo a uma arbitragem
lei, não se pode admitir a proposta manutenção do já conquistado. pública, muito menos à Justiça do
de supremacia do negociado sobre Pouquíssimas categorias se valem Trabalho.
o legislado, pois implicaria em da greve, em função do grave Por isso, qualquer proposta de
grave precarização. processo recessivo e de transformação do Poder Normativo
Aparelhar a fiscalização agravamento do desemprego. em arbitragem pública deverá
Ws. trabalhista, aumentar o valor das Nessa situação, grande parte dos assegurar a compulsoriedade, ou
multas e redimensionar o papel sindicatos se vale do Poder seja, que os empregadores não
político do Ministério do Trabalho Normativo da Justiça do Trabalho, poderão se negar a tal arbitragem
nas decisões que afetem as uma vez que, nos dissídios quando, após decorrido um tempo
relações de trabalho são tarefas coletivos, a praxe é a manutenção razoável para a negociação direta,
de primeira ordem. Por outro lado, do já conquistado e o repasse não for alcançado um acordo entre
modificar o processo trabalhista, integral da inflação do período as partes.
criando restrições aos recursos revisando. Outra proposta razoável seria
protelatórios (como o aumento Outro fator importante a ser que o Poder Normativo somente
significativo do valor dos depósitos considerado é que, por meio do pudesse ser acionado pelos
recursais) de forma a acelerar o Poder Normativo, as categorias trabalhadores.
julgamento definitivo dos profissionais mais fracas tendem a Quanto à crítica ao Poder
processos, fazer mudanças na se bene fi ciar dos julgamentos de Normativo, por limitar a
fase de execução para que o dissídios coletivos relativos às negociação às datas-base, esta
trabalhador receba efetivamente o categorias mais fortes e melhor não procede, porque a vigência
que lhe é devido, ampliar a organizadas. Tal efeito já foi das cláusulas normativas em um
estrutura da Justiça do Trabalho e apontado pelo advogado Tarso ano decorre da prática da própria
ampliar sua competência para Genro como uma "transferência de negociação coletiva e porque os
todas as relações de trabalho, são renda intraclasse". empregadores, em geral, não
alterações essenciais para que a Apontam-se vários defeitos ao concordam com prazos maiores.
Justiça do Trabalho torne-se mais Poder Normativo, como a extinção De todo modo, a solução está
eficiente e menos morosa. de dissídios coletivos pelo TST, a situada na adoção do chamado
Providências no sentido de concessão pelo TST de efeito mecanismo de ultra-atividade, ou
democratizar a Justiça, como a suspensivo em relação às decisões seja, previsão legal de que as
criação de mecanismos de dos Tribunais Regionais e a normas coletivas negociadas ou
controle externo, são relevantes limitação da negociação coletiva julgadas continuam em vigor até
para que esta se torne mais às datas-base. que novas normas as substituam.
consciente de seu papel social. Uma proposta de reformulação Tal medida legal pode ser adotada
do Poder Normativo poderia até mesmo por Medida Provisória,
PARTE II— CONFLITOS contemplar a transformação deste como foi feito pelo governo Itamar
COLETIVOS E NEGOCIAÇÃO em uma espécie de arbitragem Franco e que vigorou por alguns
1,1••••
pública, pela qual da decisão anos até ser revogada por Medida
Em relação à negociação dos adotada pelo Tribunal Regional Provisória assinada pelo
conflitos coletivos, esta se não coubesse mais qualquer presidente Fernando Henrique. Por
apresenta no Brasil, em face da recurso ao TST, muito menos a outro lado, é antiga aspiração dos
prolongada recessão que atinge o concessão de efeito suspensivo. trabalhadores a unificação das
país, de forma bastante Tal proposta, entretanto, não pode datas-base, o que, certamente,
desfavorável aos trabalhadores. ser a mesma adotada pelo seria bastante facilitado após a
No Brasil, em geral, os convênios documento final do Fórum Barelli implementação da ultra-atividade.
coletivos tendem a, no máximo, (que discutiu o Contrato Coletivo
obter como conquista econômica a de Trabalho, em 1994), pela qual PARTE III — DIREITO
reposição da inflação anual e a o Poder Normativo da Justiça do DE GREVE
manutenção das cláusulas sociais Trabalho somente poderia ser
14.•
já conquistadas em períodos acionado pelo consenso dos Outro ponto relevante para a
anteriores. Trata-se de uma sindicatos de trabalhadores e negociação coletiva é a efetiva
negociação de caráter empregadores. garantia legal de que a greve seja

DEBATE SINDICAL 4.5


um direito irrestrito reconhecido paralisam serviços inadiáveis Ganha destaque a idéia de se
aos trabalhadores para exercerem comunidade. De acordo com a criar no Brasil, como existe em
contra os empregadores a única legislação, compete aos grevistas outros países, uma legislação de
forma de pressão que possuem, manter tais serviços em um sustento para a negociação
qual seja, a interrupção de percentual mínimo que atenda às coletiva, estabelecendo a
trabalho e da produção. No Brasil, necessidades urgentes da repressão de condutas anti-
apesar de termos uma razoável lei população, o que pode ser sindicais, como a recusa
de greve (que não destoa das mantido, desde que melhor negociação, perseguição
existentes nos países mais regulamentado. sindicalistas nos locais de trabalho
avançados), produziu-se uma ou, até mesmo, a despedida de
jurisprudência bastante contrária PARTE IV — NEGOCIAÇÃO dirigentes sindicais. Quanto
ao exercício da greve, inclusive COLETIVA NO SERVIÇO organização sindical, esta deve
contrária à própria lei de greve. PÚBLICO ser, de preferência, ligada á
Por tal jurisprudência, o próprio própria dinâmica do processo
exercício da greve constitui um Uma das grandes alterações produtivo.
abuso de direito. Esta que urgem serem feitas, em No Brasil, essencialmente a
jurisprudência conservadora e relação a este ponto, é a extensão negociação se expressa nos níveis
equivocada se expressou no TST do direito de negociação coletiva da empresa e no âmbito de
pelo célebre julgamento da greve aos servidores públicos. Não há município. Somente em situações
dos petroleiros e tem se óbice a tal negociação sob o excepcionais existem negociações
evidenciado também nos pretexto de que o empregador dos de âmbito estadual ou nacional.
famigerados interditos proibitórios servidores públicos (o Estado) está Do ponto de vista dos
concedidos pela Justiça comum e proibido por lei de conceder trabalhadores, interessa manter
pela Justiça Federal contra os vantagens econômicas (pois unido seu campo em tal processo
sindicatos de trabalhadores e limitado pelas normas de negociação, ou seja, que sejam
movimentos sociais. orçamentárias). A negociação os sindicatos unitários os que
Ao contrário do que pareceria coletiva não se limita às cláusulas detenham o poder originário de
primeira vista, a simples proibição econômicas. E mesmo estas negociação coletiva.
da Justiça do Trabalho de interferir podem ser concedidas através dos Visando possibilitar uma maior
nas greves não resolveria o Parlamentos, sendo o concentração da negociação (o
problema. Constituiria apenas o compromisso do empregador na que, a princípio, é benéfico aos
deslocamento da competência de negociação coletiva justamente o trabalhadores), facultar-se-ia,
julgar a greve da Justiça do de enviar projeto de lei conforme mediante delegação de
Trabalho para a Justiça comum ou negociado com os servidores competência pelos sindicatos às
Justiça Federal. Nada indica que públicos. entidades de grau superior
estes ramos do Poder Judiciário (federações, confederações e
tivessem uma posição mais PARTE V — centrais sindicais), a negociação
favorável aos trabalhadores e PODER NEGOCIAL coletiva ou contrato coletivo em
mais respeitosa com o direito de âmbito regional, estadual e
greve. Quanto â negociação coletiva nacional, inclusive intercategorial e
O que poderia ser mais em si, mesmo tendo-se em conta deve prevalecer o princípio da
indicado seria uma norma legal a alteração da correlação de norma mais favorável existindo
que expressamente proibisse a forças verificada com a vitória mais de uma norma coletiva.
Justiça do Trabalho de julgar o eleitoral conquistada, há de se ter Diante do novo cenário politico
conflito coletivo enquanto em vista que vivemos um que se abre com a vitória de Lula
estivesse em curso a greve. A momento defensivo do movimento entende-se ser possível serem
justificativa seria a de que, se sindical (ainda que se abra com o implementadas reformas que
persiste a greve, a negociação governo Lula uma perspectiva de venham a fortalecer o movimento
coletiva ainda não se esgotou e, retomada das lutas sociais), sindical e aumentem a regulação
portanto, na forma do artigo 114 marcado por um cenário de do trabalho em favor dos
da Constituição Federal, a Justiça estagnação econômica e trabalhadores, revertendo-se a
do Trabalho somente pode julgar desemprego crescente. Além tendência de precarização e
tais conflitos depois de esgotada a disso, outro fator que inibe a desregulamentação provocadas
negociação. negociação coletiva é a truculência pela adoção do projeto neoliberal
Ainda restaria a considerar o patronal, que encara a ação em nosso país pelos governos
caso das greves realizadas em sindical como nociva à atividade anteriores. Essa, portanto, deve
atividades essenciais e que empresarial. ser a nossa luta.

46 DEBATE SINDICAL
HISTÓR IA
111•■••

mob.

Pro mu lgag.lo da Constitu lçAo em 1 988. Foto JoséCruz/ABr


Em defesa da CLT
e da Condit**
A difícil trajetória
Pm.
Pouco depois de proclamada a
República, foi promulgado um
da legislação exemplo, era proibido o trabalho
noturno dos menores de ambos os
esboço de legislação protetora do trabalhista no Brasil sexos, até 15 anos (artigo 50).
trabalho, consubstanciado no Vedava-se também o trabalho de
Decreto número 1.313, de 17 de confirma a importância menores "em quaisquer
janeiro de 1891. Não obstante manipulações diretas sobre o
logo se evidenciasse que suas da Consolidação fumo" (artigo 11).
disposições estavam destinadas a Por outro lado, o Código
se tornarem letra morta, o decreto das Leis do Trabalho Penal, recém-promulgado pelo
passou a constituir perante a
opinião uma referência aos
e da Constituição Decreto número 847 de 11 de
novembro de 1890, sendo
compromissos assumidos (mas
não cumpridos) pelo regime para
de 1988 ministro da Justiça Campos
Salles, consignava no Capítulo
com os operários. Assim, por PAULA BEIGUELMAN VII (Dos crimes contra a liberdade

DEBATE SINDICAL 47
HISTÓRIA

Decreto 1.162, de dezembro de 1890, não impediu, em vista dos salários ínfimos

de trabalho) dispositivos para privativa de menores uma regulamentada em março, proibia


coibir as manifestações grevistas ocupação que já em 1891 lhes (em vão) o trabalho noturno
no tocante ao aliciamento e, fora proibida, devido â feminino e também o de menores
principalmente, o recurso aos insalubridade da manipulação de 14 anos.
piquetes. direta sobre o fumo. Num Quanto â jornada de 8 horas,
Boletim subseqüente, o relator havia mais de uma década que os
apontava que, embora o artigo trabalhadores das diversas
ONDA GREVISTA 173 do Regulamento Sanitário de categorias a vinham reivindicando.
1911 apenas permitisse o Contudo, bem longe desse
Na verdade, o Código Penal, trabalho na faixa de 10 e 12 anos parâmetro, os industriais do
complementado pelo Decreto quando se tratasse de serviços principal setor, o têxtil, fixavam
número 1.162 de 12 de leves, a estatística registrava um horário de 11 horas, ou 10,
dezembro de 1890, não impediu, acidentes com trabalhadores dessa como concessão máxima.
em vista dos salários ínfimos e da idade, "ocupados em serviços que Em maio de 1919, em face de
jornada extenuante de trabalho, não podem ser leves". uma nova greve, o governo
uma quase ininterrupta procura demonstrar interesse na
manifestação de greves durante promulgação de uma legislação
todo o pré -1930. Em REDUÇÃO DA JORNADA trabalhista moderna, que
contrapartida, as autoridades instituísse a jornada de 8 horas e
policiais não titubeavam, no caso À grande explosão grevista de regulamentasse o trabalho fabril
da detenção de grevistas, em 1917 responde-se acenando com de mulheres e menores. Porém,
desrespeitar o artigo 207 do promessas de proteção ao trabalho na verdade, não se pretendia
próprio Código Penal, que feminino e de menores — uma das implantar de fato garantias
proibia expressamente transferir o reivindicações dos grevistas —, ao trabalhistas numa indústria cujos
preso sem mandado, ocultá-lo ou, mesmo tempo em que prosseguia setores principais, como o têxtil,
de qualquer forma, prejudicar a a repressão contra as principais empregavam essencialmente
execução da ordem de habeas- figuras do movimento. moças e crianças, algumas até de
corpus. E então, finda a la Grande sete anos de idade.
Tal como os inspetores do Guerra, a Conferência de Paris se
trabalho na Inglaterra, citados por pronunciava no concernente â.
Marx e Engels, também em São legislação do trabalho. Dos SALÁRIO MÍNIMO
Paulo os técnicos do princípios que seriam incluídos
Departamento Estadual do no Tratado de Paz, constavam Num depoimento de década e
Trabalho, criado em 1911, entre outros: direito de meia mais tarde ("A legislação
faziam incisivas denúncias. O associação; proibição do trabalho social trabalhista no Brasil",
recém-editado Boletim do para menores de 14 anos, sendo 1934), o industrial Jorge Street
Departamento descrevia com que entre 14 e 18 seriam confessava haver trabalhado "com
realismo as péssimas condições de permitidos apenas serviços leves; crianças de 10 a 12 anos e talvez
trabalho observadas durante uma repouso semanal; jornada de 8 menos". O horário normal era de
visita a 31 fábricas de tecidos, horas, com semana de 48 horas. 10 horas e, quando necessário, de
onde foram encontrados menores Tais disposições repercutiam 11 ou 12. Com tais declarações,
‘`esqueléticos, raquíticos alguns". amplamente no Brasil, onde a visava Street estabelecer um
No Boletim número 6 era questão operária" estava na contraste entre a situação vigente
assinalado o descumprimento do ordem do dia. Em 15 de janeiro no passado e as normas
artigo 11 do Decreto 1.313. Com de 1919 era assinada a Lei consignadas na nova legislação.
efeito, em vista do ínfimo salário número 3.724, sobre acidentes de Com efeito, o Ministério do
pago, as fábricas de cigarros trabalho. E o Código Sanitário, Trabalho, Indústria e Comércio,
empregavam grande número de promulgado pela lei estadual criado logo em novembro de
crianças. Assim, tornava-se quase paulista número 1.596, 1930, contara para a elaboração

48 DEBATE SINDICAL
e da jornada extenuante, a ininterrupta onda de greve s durante todo o pré-1930

das leis trabalhistas (que unitário â tutela dos sindicatos


incorporavam as reivindicações pelo Ministério do Trabalho.
das décadas de luta operária) com Trata-se evidentemente de um
o suporte de uma equipe sofisma, visto que tal etapa,
esclarecida e competente, da qual iniciada com a Lei de
,...... fazia parte Joaquim Pimenta. Sindicalização de 19 de março de
Acresce que o novo projeto 1931, encontra-se há muito
industrialista, aplicado a uma encerrada.
economia impelida a voltar-se E além do mais, o inciso I do
para dentro, seguia a proposta do referido artigo 8° (o mesmo artigo
new deal e do welfare state que no inciso II estabelece a
rooseveltiano. Nessas condições, o
Constituição vedou unicidade) é explícito: "A lei não
Estado provia a que o trabalho ao poder público poderá exigir autorização do
urbano recebesse aquele mínimo Estado para a fundação de
de condições e de remuneração qualquer intervenção sindicato, ressalvado o registro no
que o puro jogo entre oferta e órgão competente, vedadas ao
demanda no mercado de mão-de-
nos sindicatos; Poder Público a interferência e a
obra (como ocorria na etapa portanto, o argumento intervenção na organização
anterior) tendia a negar-lhe. sindical" (grifo nosso). Portanto, o
Dessa forma, não apenas o contra a unicidade argumento contra a unicidade
Jo- governo contribuía para estimular não procede.
o mercado interno, como também
sindical não procede Quanto â contribuição
introduzia um processo seletivo sindical que, sob pretextos
benéfico, tanto entre as empresas vem sofrendo a partir da década diversos se pretende suprimir,
já estabelecidas, como entre as passada sucessivas investidas em parece-nos oportuno reproduzir a
novas, uma vez que a capacidade nome de uma falsa opinião do insigne e saudoso
de remunerar adequadamente o ‘`competitividade" econômica, às jurista Desembargador Dr. Osny
trabalho se alçava em parâmetro custas do trabalhador, cujos Duarte Pereira sobre a matéria,
de competitividade. direitos legítimos, inscritos nos num dos seus comentários
O direito ao salário mínimo, artigos 7° e 8° da Carta de 1988, escritos durante o preparo da
que já constava das constituições pretende-se precarizar cada vez constituição Cidadã de 1988. Eis
de 1934 e 1937, era em 1° de mais. suas palavras textuais. "A
maio de 1940 definido como Por sua vez os trabalhadores, contribuição sindical compulsória
remuneração capaz de satisfazer às que se insurgem contra a traz, especialmente num país
necessidades normais de "flexibilização", propõem o pobre, recursos financeiros que
o-- alimentação, habitação, vestuário, contrário, ou seja, o tornam os sindicatos fortes e
higiene e transporte do aperfeiçoamento da CLT, com operativos. O risco de corrupção e
trabalhador. Em 10 de maio de acréscimo de direitos, como a de 'peleguismo' ocorre em
1943, o conjunto de toda essa redução da jornada. Mas qualquer entidade coletiva. As
legislação, sistematizada e atenhamo-nos ao artigo 8° da deturpações resultantes de coleta
ordenada, tornava-se a Constituição, que no inciso II das contribuições corrigem-se
Consolidação das Leis do institui a unicidade e no inciso IV através de mecanismos legais".
Trabalho, aprovada pelo Decreto- a contribuição sindical, Em suma, cumpre defender a
Lei número 5.452. estabelecida desde julho de 1940. CLT e a Constituição.
Criticando a histórica
unicidade sindical a qual evita a
SUCESSIVOS ATAQUES fragmentação que a pluralidade
estimula, costumam alguns Paula Beiguelman é professora emérita da USP e vice-
Esse corpus, como é sabido, associar mentalmente o modelo presidente do Sindicato dos Escritores de São Paulo

DEBATE SINDICAL 49
A vir

HERVAL PINA RIBEIRO

A saúde do PRESSÃO SINDICAL

trabalhador Foi o movimento sindical que


recolocou a questão da saúde no
trabalho na pauta social do país,
e os limites criando em 1980 o Diesat. Já os
PST, apensos as secretarias

da legislação estaduais e municipais de saúde,


começaram a surgir mais tarde
com a redemocratização do país.
A nossa Constituição e a Nos dois casos, o Diesat, como
legislação ordinária que regula a vertente sindical livre, e os PST,
matéria dizem caber ao Sistema estatais, eram, ao mesmo tempo,
Único de Saúde (SUS) promover posições de ruptura com as
e proteger a saúde de todos os velhas práticas do MT
brasileiros, prevenir as doenças a subordinadas aos interesses das
que estariam expostos, empresas.
diagnosticá-las e tratá-las com Regulamentações As respostas, porém, ficaram
precocidade, garantindo, sempre aquém da questão. O movimento
que possível, a recuperação de
e sistema viciado sindical mal alimentando a criança
sua saúde para que possam se de fiscalização que gerou, e o Estado, ao embalá-
reintegrar a vida produtiva. la, vestindo-lhe a roupagem que
Com pouco mais de dez anos emperram o SUS mais lhe convinha, obviamente
de existência, o SUS vem conservadora, amamentando-a
cumprindo a sua missão, dando também com parcimônia e
passos significativos para o SESMT e CIPAS, fundamentado emprestando-lhe feições de
controle das epidemias, endemias na legislação trabalhista e serviços de diagnóstico e atenção
e doenças infecto-contagiosas e acidentária e em acordos individual. Após duas décadas, os
assumindo a assistência médica e corporativos mambembes. PST, concentrados nas regiões
hospitalar de três quartos da O descaso empresarial é sudeste e sul, são grãos de areia
população brasileira. O SUS tem herança, em parte, do regime de em uma praia imensa.
muitas dificuldades de ordem trabalho escravo no Brasil, mas é,
operacional e financeira; porém, também, "moderno", como
seu maior entrave está em conseqüência da abundância da TIRO CERTEIRO
desenvolver projetos e ações oferta de mão de obra no
dentro das empresas para mercado. A concepção dos O deputado federal Roberto
proteger a saúde dos que empresários é de que a força de Gouveia (PT/SP) acaba de
trabalham, uma população trabalho assalariada continua, apresentar projeto de lei que, se
formidável de 80 milhões de como a escrava, a ser um bem de vingar, poderá ser um tiro
pessoas. uso. certeiro nessas mazelas ao trazer
Dentro desta lógica crua não toda a vigilância em saúde do
de surpreender que o trabalho trabalhador para o SUS, ao
VISÃO ESCRAVOCRATA continue como categoria científica substituir a lógica fiscalizadora por
sem importância na determinação uma abordagem epidenniológica e
Organizados em poderosas do processo saúde/doença. sanitária. Resta uma indagação:
confederações, federações e O resultado é que, nas empresas, porque não fazer da Fundacentro
sindicatos, os empresários temem a questão permanece confinada um órgão de vigilância em saúde
que o SUS queira, como deve, ir aos seus serviços de medicina do do trabalhador?
mais além do que foi o Ministério trabalho, engenharia de
do Trabalho (MT) na proteção da segurança e CIPAS e, nos órgãos
saúde dos trabalhadores, com seu públicos de saúde, aos seus Final Pina Ribeiro é professor-doutor em saúde pública
sistema viciado de fiscalização, Programas de Saúde do e pesquisador cla Faculdade de Saúde Pública da
normas regulannentadoras, Trabalhador (PST). Universidade de Sao Paulo
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