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A TEORIA DA CEGUEIRA DELIBERADA

Nivaldo David João Pereira


Lucas da Silva Rangel
Derick Moura Jorge

RESUMO: O presente trabalho tem por escopo a apresentação da Teoria da Cegueira


Deliberada também conhecida por outros nomes, tais como Teoria do Avestruz, Teoria do Ato
de Ignorância Consciente e “Willful Blindness Doctrine” este último seu nome originário. O
trabalho tem ainda o objetivo de diferenciar a cegueira deliberada das modalidades de dolo e
culpa e sua dificuldade de inserção no direito penal brasileiro a partir do método da revisão de
leitura.

PALAVRAS CHAVE: Cegueira deliberada. Dolo. Dolo Eventual. Culpa. Culpa


Consciente.

INTRODUÇÃO.

Surgida na Suprema Corte dos Estados Unidos, a “Willful Blindness Doctrine”, ou em


tradução livre Doutrina da Cegueira Intencional tem por objetivo punir as situações onde o
agente, intencionalmente, se põe em situação de ignorância ao fingir não enxergar a ilicitude da
origem de seus bens, direitos e valores. A doutrina é também conhecida por nome de Teoria do
Avestruz, pois tal como o animal que enfia a cabeça na terra para e olvida-se do mundo ao seu
redor, o agente blinda-se de tal maneira que faz crer que apesar de todos os indícios jamais
suspeitou da ilicitude praticada.

Para que a teoria seja aplicada é imprescindível que o autor tenha conhecimento da alta
probabilidade de que os valores ou bens advenham de ilícitos penais e tenha ficado de modo
inerte a esse conhecimento.

Tal Doutrina permite que haja condenação nos casos em que o Estado não consegue
produzir provas acerca do real conhecimento do réu sobre uma situação fática suspeita. Seus
defensores afirmam que apesar do acusado não ter conhecimento dos fatos, essa ignorância
advém de sua conduta para evitar a descoberta de uma situação possivelmente ilícita.

Trataremos agora sobre Dolo eventual e culpa consciente, o conceito de cada Instituto
e diferença entre eles. Começaremos a falar sobre dolo, posteriormente sua vertente de eventual.
Quando falamos sobre dolo, como cediço é a vontade livre e consciente de praticar
determinado ato. Mais claro ainda, sobre o tema, nos fala o doutrinador Fernando Capez: "dolo
é a vontade e a consciência de realizar os elementos constantes do tipo legal. Mais amplamente,
é a vontade manifesta pela pessoa humana de realizar a conduta".

Para que não reste dúvida quanto o elemento dolo, é imprescindível tecer comentários
sobre sua composição, formada por consciência e a vontade do agente na prática da conduta.

Consciência, também chamada de elemento cognitivo, diz respeito à situação fática em


que se encontra o agente. Atual, a previsão que deve abranger todos os elementos do tipo penal
(descritivos, normativos ou subjetivos). Como conclusão, o dolo deve recair sobre os elementos
(tipo fundamental) e sobre as circunstâncias (tipo derivado).

Vontade, é chamada de elemento volitivo. A vontade pressupõe a possibilidade de


influir no curso causal. Concluindo que, quer o resultado delitivo como consequência de sua
própria ação e atribui alguma influência em sua produção.

Como já tratamos sobre dolo, falaremos mais especificamente sobre dolo eventual.

Quando tratamos de dolo eventual, percebemos que o agente que está praticando
determinada conduta, sabe o resultado que pode ocorrer, não pretende o resultado, mas prática
a conduta de uma forma tão exagerada e arriscada, demonstrando que não se importa se o
resultado ocorrer.

Para Fernando Capez: "o sujeito prevê o resultado e, embora não o queira propriamente
atingi-lo, pouco se importa com sua ocorrência. Fica claro que no dolo eventual, vemos a
indiferença que o agente demonstra quanto ao resultado que pode vir a surgir.

Como já tratamos de dolo e sua vertente eventual, nos resta tratar sobre culpa, e mais
especificamente, culpa consciente.

Assim como o dolo, a culpa integra o fato típico sendo o elemento normativo da conduta,
desta forma, para aferir a culpa é necessário fazer um juízo de valor do operador do direito.

Segundo Masson, "crime culposo é aquele que se verifica quando o agente, deixando de
observar o dever objetivo de cuidado, por imprudência, negligência ou imperícia, realiza uma
conduta voluntária que produz um resultado naturalístico não previsto nem requerido, mas
objetivamente previsível, e excepcionalmente previsto e querido, o qual podia, com a devida
atenção, ter evitado".

Passamos agora para a caracterização de cada modalidade acima mencionada.


Imperícia, ocorre quando o agente não tem capacidade técnica para praticar a conduta, falta a
este, a capacitação para o ato. Diferentemente se vê quando falamos de imprudência, aqui, o
indivíduo que está praticando a conduta, tem a capacitação técnica para o ato, mas lhe falta zelo
e cuidado, sendo desleixado na hora de praticar o ato. Por último temos negligência, onde o
indivíduo deixa de praticar uma conduta a qual era esperada que fizesse. Um ponto que devemos
ressaltar é que, quando se trata de imprudência e imperícia, o agente que pratica o ato está
agindo, então temos uma conduta positiva. Já na negligência temos uma conduta omissiva, o
autor não age quando dele se esperava isso.

Diante da caracterização geral de culpa, traremos agora um pouco da modalidade de


culpa consciente, na qual o agente prática a conduta sabendo que pode gerar algo grave.
Tomamos por base o que aduz Capez: "culpa consciente ou com previsão é aquela em que o
agente prevê o resultado, embora não o aceite. Há no agente a representação da possiblidade do
resultado, mas ele a afasta, de pronto, por entender que a evitará e que sua habilidade impedirá
o evento lesivo previsto".

Por todo o exposto, fica ainda mais fácil a diferença entre dolo eventual e culpa
consciente. É só observarmos uma conduta, se qualquer indivíduo médio da sociedade a
praticaria, estamos diante de culpa consciente, se por outro lado, os indivíduos ditos comuns
não praticariam aquela conduta, estaremos diante de dolo eventual.

No tocante à aplicação da Teoria do Avestruz no Brasil, a doutrina majoritária aduz que


a modalidade aceita é a do dolo eventual. Como a intenção do autor é evitar o conhecimento da
origem ilícita dos valores, estaria ele incorrendo na modalidade de dolo eventual. Não há que
se falar em cegueira deliberada em crimes culposos, uma vez que o agente finge não enxergar
a origem ilícita dos valores ou bens com o intuito de levar vantagem, com efeito afirma: “exige-
se a prova de que o agente tenha conhecimento da elevada probabilidade de que os valores eram
objeto de crime e que isso lhe seja indiferente”.

Entretanto a grande problemática de sua aplicação no ordenamento jurídico brasileiro é


sua origem no direito estadunidense, onde não se diferencia dolo e culpa, bastando tão somente
existir o chamado mens rea (mente culpada), um elemento subjetivo do ilícito penal. Ainda,
uma das vertentes da mens rea é o knowledge, instituto amplamente utilizado para aplicação da
cegueira consciente e que sequer possui correspondência no direito pátrio, não podendo ser
comparado ao dolo eventual e muito menos com a culpa consciente.

A grande crítica da maior parte da doutrina atual quanto a Teoria do Avestruz, é que não
se pode simplesmente importar um instituto ou teoria do comum law, que possui raízes
totalmente diversas do sistema amplamente positivista nacional.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Não nos resta dúvidas de que a aplicação da Teoria da Cegueira Deliberada seria de
grande valia para o direito penal brasileiro, em especial para a condenação nos casos de crime
de lavagem de dinheiro, um dos mais difíceis de se reunir provas contra os agentes. Sua
aplicação no ordenamento jurídico brasileiro seria reflexo do chamado expansionismo do
Direito Penal.

Por fim, insta mencionar que o presente trabalho buscou, tão somente, apresentar a
teoria, sua origem, a diferenciação para dolo e culpa e sua dificuldade de inserção no
ordenamento jurídico pátrio.

BIBLIOGRAFIA

SYDOW, Spencer T. A Teoria da Cegueira Deliberada. Ed. D’Plácido. V. 1. 274 p. 2016.

ESTADOS UNIDOS. Suprema Corte dos Estados Unidos. In re Aimster Copyright Litigation
(2003). Disponível em: <http:/homepages.law.asu.edu/cyberlaw/inreaimster(9c-03-03).htm>

ABRAMOWITZ, E. & BOHRER, Barry A. Conscious Avoidance: A Substitute for Actual


Knowledge? New York Law Journal. Disponível em:
<http:maglaw.com.publications/data/130/res/id=as_File/07005070001Morvillo.pdf>

CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. 17 edição. Ed. Saraiva. 2003.

NUCCI, Guilherme de S. Manual de Direito Penal: Parte Geral e Parte Especial. 8 edição. Ed.
Revista dos Tribunais. 2013.

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