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Majjhima Nikaya 13

Mahadukkhakkhandha Sutta

O Grande Discurso da Massa de Sofrimento


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1. Assim ouvi. Em certa ocasião o Abençoado estava em Savatthi no Bosque de Jeta, no


Parque de Anathapindika.
2. Então, ao amanhecer, vários bhikkhus se vestiram e tomando as suas tigelas e os mantos
externos foram para Savatthi para esmolar alimentos. Então eles pensaram: “Ainda é muito
cedo para esmolar alimentos em Savatthi. E se nós fossemos até o parque dos errantes de
outras seitas,” e assim eles foram até o parque dos errantes de outras seitas e ao chegar os
cumprimentaram. Quando a conversa amigável e cortês havia terminado, eles sentaram a um
lado. Os errantes lhes disseram:
3. “Amigos, o contemplativo Gotama descreve a completa compreensão dos prazeres sensuais
e nós também; o contemplativo Gotama descreve a completa compreensão da forma material e
nós também; o contemplativo Gotama descreve a completa compreensão das sensações e nós
também. Qual é então a distinção, amigos, qual é a variação, qual é a diferença entre o
ensinamento do Dhamma do contemplativo Gotama e o nosso, entre as instruções dele e as
nossas?” [1]
4. Então, aqueles bhikkhus nem aprovaram nem desaprovaram as palavras dos errantes. Sem
dizer isto ou aquilo eles se levantaram dos seus assentos e foram embora, pensando:
“Devemos entender o significado dessas palavras na presença do Abençoado.”
5. Depois de haver esmolado alimentos em Savatthi e de haver retornado, após a refeição eles
foram até o Abençoado e depois de cumprimentá-lo sentaram a um lado e relataram o que
havia ocorrido. [O Abençoado disse:]
6. “Bhikkhus, os errantes de outras seitas que assim falam devem ser questionados da seguinte
forma: ‘Mas, amigos, qual é a gratificação, qual é o perigo e qual é a escapatória no caso dos
prazeres sensuais? Qual é a gratificação, qual é o perigo e qual é a escapatória no caso da
forma material? Qual é a gratificação, qual é o perigo e qual é a escapatória no caso
das sensações?’ Sendo questionados dessa forma, os errantes de outras seitas irão fracassar
na exposição desse assunto, e mais ainda, eles irão se meter em dificuldades. Por que isso?
Porque não é o território deles. Bhikkhus, eu não vejo ninguém no mundo com os seus devas,
Maras e Brahmas, esta população com os seus contemplativos e brâmanes, seus príncipes e o
povo, que pudesse satisfazer a mente com uma resposta a essas questões, exceto o
Tathagata, ou os seus discípulos, ou alguém que tenha aprendido com eles.
(PRAZERES SENSUAIS)
7. (i) “E o que, bhikkhus, é a gratificação no caso dos prazeres sensuais? Bhikkhus,
existemesses cinco elementos do prazer sensual. Quais cinco? Formas percebidas pelo olho
que são desejáveis, agradáveis e fáceis de serem gostadas, conectadas com o desejo sensual
e que provocam a cobiça. Sons percebidos pelo ouvido ... Aromas percebidos pelo nariz ...
Sabores percebidos pela língua ... Tangíveis percebidos pelo corpo que são desejáveis,
agradáveis e fáceis de serem gostados, conectados com o desejo sensual e que provocam a
cobiça. Esses são os cinco elementos do prazer sensual. Agora o prazer e a alegria que
surgem na dependência desses cinco elementos do prazer sensual são a gratificação no caso
dos prazeres sensuais.
8. (ii) “E o que , bhikkhus, é o perigo no caso dos prazeres sensuais? Aqui, bhikkhus, por conta
da atividade pela qual um membro de um clã ganha a vida – quer seja registrando ou
contabilizando, ou calculando, ou cultivando, ou comerciando, ou administrando, ou como
arqueiro, ou a serviço do rei, ou qualquer outra atividade que seja – ele tem que enfrentar o frio,
ele tem que enfrentar o calor, ele se fere pelo contato com moscas, mosquitos, vento, sol e
criaturas rastejantes; ele se arrisca a morrer de fome e sede. Agora, esse é um perigo no caso
dos prazeres sensuais, uma massa de sofrimento visível no aqui e agora, tendo o prazer
sensual como condição, tendo o prazer sensual como fonte, tendo o prazer sensual como base,
tendo como causa, simplesmente, os prazeres sensuais.
9. “Se nenhum bem é recebido pelo membro de um clã ao se empenhar e se esforçar no seu
trabalho, ele fica triste, se angustia e lamenta, ele chora batendo no peito e fica perturbado,
clamando: ‘Meu trabalho é em vão, meu esforço infrutífero!’ Agora, esse também é um perigo
no caso dos prazeres sensuais ... tendo como causa, simplesmente, os prazeres sensuais.
10. “Se algum bem é recebido pelo membro de um clã ao se empenhar e se esforçar no seu
trabalho, ele experimenta dor e angústia ao protegê-lo: ‘Como farei para que nem reis nem
ladrões roubem os meus bens, nem o fogo os queime, nem as águas os carreguem, nem
herdeiros odiosos os levem?’ E enquanto ele guarda e protege os seus bens, reis ou ladrões os
roubam ou o fogo os queima, ou as águas os carregam, ou herdeiros odiosos os levam. E ele
fica triste, se angustia e lamenta, ele chora batendo no peito e fica perturbado, clamando: ‘O
que eu tinha não tenho mais!’ Agora, esse também é um perigo no caso dos prazeres sensuais
... tendo como causa, simplesmente, os prazeres sensuais.
11. “Além disso, tendo o prazer sensual como condição, tendo o prazer sensual como fonte,
tendo o prazer sensual como base, tendo como causa, simplesmente, os prazeres sensuais,
reis brigam com reis, nobres com nobres, brâmanes com brâmanes, chefes de família com
chefes de família; a mãe briga com o filho, o filho com a mãe, o pai com o filho, o filho com o
pai, o irmão briga com o irmão, o irmão com a irmã, a irmã com o irmão, o amigo com o amigo.
E nas suas brigas, rixas e disputas eles se atacam uns aos outros com as mãos, pedras, paus
ou facas e com isso eles causam a si próprios a morte ou sofrimento igual à morte. Agora esse
também é um perigo no caso dos prazeres sensuais ... tendo como causa, simplesmente, os
prazeres sensuais.
12. “Além disso, tendo o prazer sensual como condição ... os homens tomam espadas e
escudos e afivelam arcos e coldres e eles se lançam na batalha, concentrados em fila dupla
com flechas e lanças voando e espadas cintilando; e ali eles são feridos por flechas e lanças e
as suas cabeças são decepadas por espadas e com isso eles causam a si próprios a morte ou
sofrimento igual à morte. Agora esse também é um perigo no caso dos prazeres sensuais ...
tendo como causa, simplesmente, os prazeres sensuais.
13. “Além disso, tendo o prazer sensual como condição ... os homens tomam espadas e
escudos e afivelam arcos e coldres, e eles se lançam contra bastiões escorregadios, com
flechas e lanças voando e espadas cintilando; e ali eles são feridos por flechas e lanças e
molhados com líquidos ferventes e esmagados sob objetos pesados e as suas cabeças são
decepadas por espadas e com isso eles causam a si próprios a morte ou sofrimento igual à
morte. Agora esse também é um perigo no caso dos prazeres sensuais ... tendo como causa,
simplesmente, os prazeres sensuais.
14. “Além disso, tendo o prazer sensual como condição ... homens arrombam casas, pilham
riquezas, cometem roubo, emboscam nas estradas, seduzem as mulheres dos outros e quando
capturados, os reis lhes infligem muitos tipos de tortura. Os reis fazem com que eles sejam
açoitados com chicotes, golpeados com varas, golpeados com clavas; as mãos são cortadas,
os pés são cortados, as mãos e os pés são cortados; as orelhas são cortadas, o nariz é
cortado, as orelhas e o nariz são cortados; eles são sujeitos ao ‘pote de mingau,’ ao ‘barbeado
com a concha polida,’ à ‘boca de Rahu,’ à ‘grinalda ardente,’ à ‘mão ardente,’ às ‘lâminas de
capim,’ à ‘túnica de casca de árvore,’ ao ‘antílope,’ aos ‘ganchos de carne,’ às ‘moedas,’ à
‘conserva em desinfetante’ ao ‘pino que gira,’ ao ‘colchão de palha enrolado’; [2] eles são
molhados com óleo fervente, atirados para serem devorados pelos cães, empalados vivos em
estacas, decapitados com espadas – e com isso eles causam a si próprios a morte ou
sofrimento igual à morte. Agora esse também é um perigo no caso dos prazeres sensuais ...
tendo como causa, simplesmente, os prazeres sensuais.
15. “Além disso, tendo o prazer sensual como condição, tendo o prazer sensual como fonte,
tendo o prazer sensual como base, tendo como causa, simplesmente, os prazeres sensuais, as
pessoas se entregam ao comportamento impróprio com o corpo, linguagem e mente. Tendo
feito isso, na dissolução do corpo, após a morte, elas reaparecem num estado de privação,
num destino infeliz, nos reinos inferiores, até mesmo no inferno. Agora esse também é um
perigo no caso dos prazeres sensuais, uma massa de sofrimento na vida que está por vir
[3] tendo o prazer sensual como causa, o prazer sensual como fonte, o prazer sensual como
base, tendo como causa, simplesmente, os prazeres sensuais.
16. (iii) “E o que , bhikkhus, é a escapatória no caso dos prazeres sensuais? É a remoção do
desejo e cobiça, o abandono do desejo e cobiça pelos prazeres sensuais. [4] Essa é a
escapatória no caso dos prazeres sensuais.
17. “Que esses contemplativos e brâmanes, que não compreendem como na verdade é a
gratificação como gratificação, o perigo como perigo e a escapatória como escapatória no caso
dos prazeres sensuais, possam eles mesmos compreender completamente os prazeres
sensuais ou instruir outra pessoa de modo que ela possa compreender completamente os
prazeres sensuais – isso é impossível. Que esses contemplativos e brâmanes, que
compreendem como na verdade é a gratificação como gratificação, o perigo como perigo e a
escapatória como escapatória no caso dos prazeres sensuais, possam eles mesmos
compreender completamente os prazeres sensuais ou instruir outra pessoa de modo que ela
possa compreender completamente os prazeres sensuais – isso é possível.
(FORMA MATERIAL)
18. (i) “E o que, bhikkhus, é a gratificação no caso da forma material? Suponham que
houvesse uma jovem da classe dos nobres ou da classe dos brâmanes ou da casa de um
chefe de família, no seu décimo quinto ou décimo sexto aniversário, nem muito alta nem muito
baixa, nem muito magra nem muito gorda, nem com a tez muito escura nem muito clara. A sua
beleza e graciosidade estão no seu auge?” – “Sim, venerável senhor.” – “Agora o prazer e a
alegria que surgem na dependência dessa beleza e graciosidade são a gratificação no caso da
forma material.”
19. (ii) “E o que, bhikkhus, é o perigo no caso da forma material? Mais tarde alguém poderá ver
aquela mesma mulher com oitenta, noventa ou cem anos, idosa, curvada como o suporte de
um teto, redobrada, apoiada numa bengala, cambaleante, frágil, a juventude perdida, os dentes
quebrados, os cabelos grisalhos, careca, enrugada, com os membros todos manchados. O que
vocês pensam bhikkhus? A antiga beleza e graciosidade desapareceram e o perigo se tornou
evidente?” – “Sim, venerável senhor” – “Bhikkhus, esse é o perigo no caso da forma material.”
20. “Além disso, alguém poderá ver aquela mesma mulher aflita, sofrendo e gravemente
enferma, deitada suja em seu próprio excremento e urina, levantada por alguns e deitada por
outros. O que vocês pensam bhikkhus? A antiga beleza e graciosidade desapareceram e o
perigo se tornou evidente?” – “Sim, venerável senhor” – “Bhikkhus, esse também é o perigo no
caso da forma material.”
21. “Além disso, alguém poderá ver aquela mesma mulher como um cadáver descartado num
cemitério, um, dois ou três dias morta, inchada, lívida e ressumando matéria. O que vocês
pensam bhikkhus? A antiga beleza e graciosidade desapareceram e o perigo se tornou
evidente?” – “Sim, venerável senhor” – “Bhikkhus, esse também é o perigo no caso da forma
material.”
22-29. “Além disso, alguém poderá ver aquela mesma mulher como um cadáver descartado
num cemitério, sendo devorada por corvos, gaviões, urubus, cães, chacais ou vários tipos
de vermes ... um esqueleto com carne e sangue, mantidos unidos pelos tendões ... um
esqueleto descarnado lambuzado de sangue, mantido unido pelos tendões ... ossos
desconectados espalhados em todas as direções – aqui um osso da mão, ali um osso do pé,
aqui um osso da perna, ali um osso das costelas, aqui um osso do quadril, ali um osso da
coluna, aqui o crânio ... ossos esbranquiçados, com a cor das conchas ... ossos empilhados,
com mais de um ano ... ossos apodrecidos e convertidos em pó. O que vocês pensam
bhikkhus? A antiga beleza e graciosidade desapareceram e o perigo se tornou evidente?” –
“Sim, venerável senhor” – “Bhikkhus, esse também é o perigo no caso da forma material.”
30. (iii) “E o que, bhikkhus, é a escapatória no caso da forma material? É a remoção do desejo
e cobiça, o abandono do desejo e cobiça pela forma material. Essa é a escapatória no caso da
forma material.”
31. “Que esses contemplativos e brâmanes, que não compreendem como na verdade é a
gratificação como gratificação, o perigo como perigo e a escapatória como escapatória no caso
da forma material, possam eles mesmos compreender completamente a forma material ou
instruir outra pessoa de modo que ela possa compreender completamente a forma material –
isso é impossível. Que esses contemplativos e brâmanes, que compreendem como na verdade
é a gratificação como gratificação, o perigo como perigo e a escapatória como escapatória no
caso da forma material, possam eles mesmos compreender completamente a forma material ou
instruir outra pessoa de modo que ela possa compreender completamente a forma material –
isso é possível.
(SENSAÇÕES)
32. (i) “E o que, bhikkhus, é a gratificação no caso das sensações? Aqui, bhikkhus, um bhikkhu
afastado dos prazeres sensuais, afastado das qualidades não hábeis, entra e permanece no
primeiro jhana, que é caracterizado pelo pensamento aplicado e sustentado, com o êxtase e
felicidade nascidos do afastamento. [5] Em tal ocasião ele não opta pela sua própria aflição,
pela aflição de outrem ou pela aflição de ambos. Nessa ocasião ele sente sensações que estão
isentas de aflições. A maior gratificação no caso das sensações é estar livre de aflições, eu
digo.
33-35. “Além disso, abandonando o pensamento aplicado e sustentado, um bhikkhu entra e
permanece no segundo jhana, que é caracterizado pela segurança interna e perfeita unicidade
da mente, sem o pensamento aplicado e sustentado, com o êxtase e felicidade nascidos da
concentração ... abandonando o êxtase ... ele entra e permanece no terceiro jhana ... com o
completo desaparecimento da felicidade ele entra e permanece no quarto jhana ... Em tal
ocasião ele não opta pela sua própria aflição, pela aflição de outrem ou pela aflição de ambos.
Nessa ocasião ele sente sensações que estão isentas de aflições. A maior gratificação no caso
das sensações é estar livre de aflições, eu digo.
36. (ii) “E o que, bhikkhus, é o perigo no caso das sensações? As sensações são
impermanentes, insatisfatórias e sujeitas à mudança. Esse é o perigo no caso das sensações.
37. (iii) “E o que, bhikkhus, é a escapatória no caso das sensações? ? É a remoção do desejo e
cobiça, o abandono do desejo e cobiça pelas sensações. Essa é a escapatória no caso das
sensações.
38. “Que esses contemplativos e brâmanes, que não compreendem como na verdade é a
gratificação como gratificação, o perigo como perigo e a escapatória como escapatória no caso
das sensações, possam eles mesmos compreender completamente as sensações ou instruir
outra pessoa de modo que ela possa compreender completamente as sensações – isso é
impossível. Que esses contemplativos e brâmanes, que compreendem como na verdade é a
gratificação como gratificação, o perigo como perigo e a escapatória como escapatória no caso
das sensações, possam eles mesmos compreender completamente as sensações ou instruir
outra pessoa de modo que ela possa compreender completamente as sensações – isso é
possível.”
Isso foi o que disse o Abençoado. Os bhikkhus ficaram satisfeitos e contentes com as palavras
do Abençoado.
 

 
Notas:
[1] MA: “Completa compreensão” (pariñña) neste caso significa a superação (samatikkama) ou
abandono (pahana). Os errantes de outras seitas identificam a completa compreensão dos
prazeres sensuais com o primeiro jhana, a completa compreensão da forma material com os
mundos de existência imaterial e a completa compreensão das sensações com o mundo de
existência sem percepção. O Buda, em contraste, descreve a completa compreensão dos
prazeres sensuais com o caminho do que não retorna e a completa compreensão de ambos,
forma material e sensações, com o caminho do arahant. [Retorna]
[2] MA proporciona uma impressionante descrição de cada uma destas formas de tortura.
[Retorna]
[3] Deve ser observado que enquanto os perigos anteriores eram chamados de “uma massa de
sofrimento visível no aqui e agora” (sanditthiko dukkhakkhandho), este é chamado de “uma
massa de sofrimento na vida que está por vir” (samparayiko dukkhakkhandho). De acordo com
Ajaan Brahm, “aqui e agora” deve ser interpretado como “nesta vida.”[Retorna]
[4] MA diz que Nibbana é a remoção e abandono do desejo e cobiça pelos prazeres sensuais,
pois na dependência de Nibbana, o desejo e a cobiça são abandonados. Pode-se também
considerar a inclusão do caminho do que não retorna, que realiza o abandono do desejo e
cobiça pelos prazeres sensuais. [Retorna]
[5] Para explicar o perigo nas sensações, o Buda escolhe o mais refinado e exaltado tipo de
prazer mundano, a felicidade e paz dos jhanas e mostra que mesmo esses estados são
impermanentes e por isso insatisfatórios. 

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