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SÉRIE TRADUÇÃO

04

SUCESSÃO À CHEFIA EM TIKOPIA1

RAYMOND FIRTH
Brasília, 2011

Universidade de Brasília
Departamento de Antropologia
Brasília
2011
1
T raduz i do por Mari a Apareci da T . Ferrei ra d o ori gi nal " Succession to chieftainship
in Tikopia", Oceania , Vol . XXX, n. 3, Mel I murn c, 1960,
pp. 161 -180.
E s te arti go foi republ i cado como capí tul o VI do l i vro de Raymond Fi rth Essays
on Social Organization and Values , London School of E conomi cs Monographs
on Soci al Anth ropol ogy, n. 28, T he Athl one Pres s , U ni vers i ty of London,
Londres , 1964.

Originalmente publicado nos Cadernos de Antropologia da Editora UnB com a permi s s ão do


E di tor de Oceania e do A utor.
Série Tradução é editada pelo Departamento de Antropologia
da Universidade de Brasília com o objetivo de divulgar textos
traduzidos para o português por docentes e discentes no campo
da Antropologia Social.

1. Antropologia 2. Tradução. Departamento de Antropologia da


Universidade de Brasília

Solicita-se permuta.

Série Tradução Vol. 01, Brasília: DAN/UnB, 2011.


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Cristiane Costa Romão
EDITORIAL

A Série Tradução é uma iniciativa do Departamento de Antropologia da


Universidade de Brasília apoiada pelo Decanato de Extensão desta Universidade
via Edital DEX 1/2010. Como atividade de extensão, o objetivo desta Série é
reunir e disponibilizar a um público mais amplo traduções em formato digital e
com acesso livre por intermédio do sítio do Departamento de Antropologia. Tais
traduções vêm sendo realizadas, há alguns anos, no âmbito do Departamento
de Antropologia. Até então, estes materiais, em sua maioria, estiveram
circulando de forma artesanal e informal, como documentos eletrônicos e/ou
cópias xerográficas ou mimeografadas.

Os textos foram traduzidos por docentes e discentes do Departamento


de Antropologia, geralmente para fins didáticos. São materiais referenciais para
o corpus teórico da disciplina e sua ampla demanda e utilização justificam que
versões em português sejam produzidas, sobretudo para o público graduando,
nem sempre versado em uma segunda língua.

Cada número da Série é dedicado a um só artigo, ensaio ou material


traduzido. Novas traduções serão sempre bem vindas e, sendo acolhidas e
aprovadas pelo Conselho Editorial bem como garantidas pelo direito autoral da
publicação de origem, poderão ser publicados em nossa Série Tradução.

Conselho Editorial
SUCESSÃO À CHEF IA EM T IKOPIA

A inst ituição d a ch efia é b ásica para o sist ema político dos


Tikop ia e, trad icionalmente, era um dos asp ectos chav es n o seu
desemp enho religioso. Ê interessante, ent ão, examinar os
princíp ios e o processo de sucessão p elo qual os papéis de chef ia
eram preench idos.

A sucessão, n o sentido social, é u m processo d e subst ituição,


com reconh eciment o público, segund o o qu al os títu los, cargos,
autorid ade, p apéis e outros indicadores de statu s são transf eridos
de uma pessoa (incumb ida) para out ra. A sucessão pode se fazer
por geração, quando o período socialmente at ivo do incumb ido se
completa por renúncia ou mort e, ou pode ser p eriódica, segundo
um intervalo def inido. A sucessão a um cargo ou título raramente é
aberta a qu alqu er membro da comun id ade sem critérios específ icos
exigidos do candidat o; geralment e é restrit a e en volve uma
limitação d e sexo, qualidad es d e maturidad e, a condição d e
membro de um d ado grupo social etc. Parte da restrição pode ser
em termos de um elo de p arent esco, torn ando a sucessão
hered itária.

Em Tikopia, a sucessão à ch ef ia se f az por geração, é restrit a


ao sex o masculino e h ered itária. Normalmente dá -se ap enas no
caso de morte do incumbid o; não há rotação de cargo nem
disposit ivo reconhecido para ren úncia.

A sucessão a cargo e posição de autoridade implica em uma


necessidade, por part e da sociedad e, de continu idad e de pessoal.
Em qualquer comunidad e esp era-se que o mecanismo para
escolh er um novo incumb ido funcion e tão logo quanto possível
para que a aut oridad e e ordem social tenham uma continu idade e
os serviços essenciais tenham seu fu ncion ário. Onde o in cumbido
tem a aut orid ade e as f unções mú ltip las de um ch efe, a escolh a
rápida de um subst ituto é particu larmente import ante. Uma
interrupção dá oportun idades ã d esordem no corpo polít ico e pod e
deixar o grupo sem representante fren te a outros grupos e suposta
monte (n a Tikop ia tradicion al) frent e aos de u ses. Quando uma
vaga é aberta por renún cia, o planejamento da sucessão é
facilit ado e o momento para su a ocorrência p ode ser arranjado.
Quando a v aga é aberta por morte, o planejamento é impedid o e a
neces sidade d e sucessão pode ch eg ar a qualquer momento . A
sucessão, quando da morte de um chefe, ex ige um princípio de
substitu ição aceito p ela socied ade. A vaga pode chegar de um
momento para outro. Após a mort e d e um h omem de posição, a
tansão emocional t ende a ser grande e é funcion almente útil u m
mecan ismo que possa ser acion ado para assegurar uma
substitu ição ráp ida.

Em algumas sociedades este prob loma n ão foi muit o


clarament e resolv ido. Um p eríodo de confusão se segue á morte de
um chef e, e d isputas faccionais violentas [p odem d esenrolar -se at é
uma pessoa surgir como v itoriosa no processo de sucessão. Em
algumas outras sociedades é costume a mort e de u m líder ser
anunciada com a proclamação de seu sucessor, anteriorment e
apresentado. Le Roi est mort, vive le Uni . Em Tikop ia, o sist ema
não era de comp etiç ão confusa entre candidatos, n em de su cessão
automát ica. Era um sist ema interessante de eleição, em qu e o
papel prin cipal era desempenh ado por "fazedores -de-rei", ao inv és
de candidat os competidores.

Ao examin ar este sistema em detalhe quero primeiro


considerar o tipo de qualidades num chefe, vist as como desejáv el
pela sociedad e Tik opia.

QUALIDADES DESEJADAS EM UM CHEFE TIKOPIA

Se alguém perguntar o qu e se requ er de um chef e em Tikopia


que quaIidades dev e possu ir, não se tem uma formu lação b em
delinead a d e uma personalidade id eal que atenda a um conjunto
clarament e demarcado de obrigações. A imagem d e um chef e ideal
só pode ser extraída gradualmente das opin iões expressas sobre o
seu comportamento em situações concret as, e de assert ivas
isolad as sobre o pr incíp io freqüentemente emanado d estas
situações. As generalizações mais ex plícitas têm vindo, não do
povo, mas dos próprios chef es e dos membros de su as famílias,
cada vez mais conscientizados de seu papel de chefe. Pela minha
experiência em 1928 -29 e 1952, pode-se d izer, de modo
abrangent e, que todos os Tikopia garantiam serem os ch efes
guardiães de seu povo, e isto demand ava do chef e cert os tipos de
conduta, incluind o ab stenção da in júria direta a seu pov o por
motivos eg oísticos, e limit ações ã su a lib erd ade de ação onde t al
liberdade pudesse ser -lhes indiretamente prejudicial.
Tradicionalment e esta posição era correlata às suas funções como
sacerdotes, ou seja, como represent antes e intermediários dos
deuses Tikop ia. O ch efe Tikopia p odia ser, teoricament e, u m
ditador. Na prát ica, seu poder e autorid ade eram sujeit os a
limitações impostas pelo próprio caráter dessa autoridade. A
eficácia das limitações sobre ele dependia, em larg a escala, da su a
concepção da natureza do cargo.

Esta concepção de resp onsab il idad e e de cargo recebeu


expressão explícit a nas af irmativ as dos próprios chef es sobre seu s
próprios motiv os, e nas crít icas das ações de outros chefes, em
tais t ermos. Deram -se t ambém most ras con cret as em atos: um
chefe se colocou em situ ação inconven ient e ou t eve perd a
econômica pelo bem de seu povo.
Em mu itos cont extos era imp lícito que um chefe d evia ser u m
homem maduro, capaz de tomar decisões resp onsáveis. O Arik i
Tafua d escrev eu para mim, em 1952, como seu pai, qu ando mu ito
doente, fez considerações a respeito de seu f ilh o torn ado adulto
( ku tangata ) e prep arou -se p ara ab an donar a v ida, acred itando ser
hora do filho suceder -lh e na chef ia. E creio ser signif icativ o que
embora t enha an otado ap enas um caso de um c h e f e ter sid o eleito
enquanto men or de idade, não há caso algum de um chefe ter sido
eleito in absentia — enqu anto em v iag em além dos seu s domín ios.
As qualidades requ erid as de um ch efe, era uma a saúd e
física. Se seu corpo não estav a são, ele não p odia servir
eficient emente como representant e de seu povo e um intermed iário
entre os deu ses. Isto foi exemp lificad o por Ariki Kaf ika, Pepe, h á
aproximadamente n ove gerações, de acordo com a tradição.
Diziam -no ter sido atormentado por sev era bouba tropical
(framboésia), abd icando, portant o, em favor de seu irmão mais
novo, Tuisifo. Comentando sobre esta est ória, um dos h omen s d e
mais posição em Kaf ika disse: "Se h á um chefe qu e contrai bouba,
então ele é passado para trás. É p assado para trás, pois tornou -se
mau. Mesmo enqu anto a bouba é leve, ele v ai para trás, pois ela é
uma coisa má. Qu ando a bouba fica (no corp o de) ch efe, é um ato
dos deu ses. Ê ru im, port anto é posto de lado, pra outro chef e, qu e
seja bom, pod er ser escolh ido". A razão preponderante para deixar
este chef e de lado, de acordo com a crença em Tik opia, não era a
doença em si ser contag iosa ou rit ualmente destrutiv a, mas a
manif est ação de um descont entament o dos deuses em relação ao
chefe. Hav ia susp eita de hav er ele feito algo errado. D e qualquer
modo, seu poder com os deuses dev ia ter perdido o efeito ou ele
não estaria sofrendo. Ainda assim, tal prin cíp io geral n ão era
necessariament e observado na prática. Em 1929, o Ariki Fang arere,
um homem idoso, estav a afligido por uma úlcera tropical
debilitant e no pé, já h avia alguns anos, mas aind a desempenh av a
suas fun ções como chef e, e não ouv i sugestão alguma que dev ia d e
renunciar. Ele próprio não expressou qualquer d esejo de abdicar.
Isto pode se d ever ao fato de t er sido extremament e dinâmico em
negócios e conômicos e rituais a despeit o de sua claudicação.
Ocasionalment e, era-lh e feita u ma concessão, como quando,
durante os ritos do Trab alh o dos Deu ses, veio d e canoa pelo lago,
ao inv és d e andar ao redor d ele com seus colegas chef es. Como vi,
em 1952, tal concessão também pod ia ser feita a um chefe em
conseqüência da fraqueza causad a pela idade av ançad a. A af lição
do Arik i Fangarere era tratad a, então, mais como fraqueza do qu e
como falta. Mas as op iniões, em 1952, con stataram ser a fraqueza
do Ariki Kaf ika, cau sada por sua velh ice, con sid erada delet éria para
o bem est ar e prosperidade da terra.
Aliada à pureza física, acredit ava -se que um chefe de via ter
certa pureza moral. O lado ético da religião dos Tikopia não era
fortemente enf atizado por eles, todavia assegurav a-se que a
feit içaria dev eria ficar fora da província de um chefe. Em 1929, o
Arik i Taumako falou -me: "Um chefe deveria continuar a v iver
belamente, a fazer kava ; este só é f eito para o bem est ar, para o
alimento ser bom". O termo tradu zid o como " belamente" também
poderia sê-lo como "de modo apropriado", ou seja, "sem má
intenção". A san ção dada a tal t ipo de comportamento era uma
referência à morte trad icional do grande herói cultural Tikop ia, a
primeira d ivind ade da comun idade in teira, o qual tin ha ido sem
pecados para o reino dos deu ses sem vingar -se do seu assassin o.
Dizia-se então que ele objetou a qualquer "discurso de
amaldiçoamento" ( tarang a tautuku ), i.e., quaisqu er fórmulas d e
feit içaria por ch efes que em tantos ritos e ativ idades eram
seguidores do modelo criado por ele. O Ariki Tau mako, tamb ém me
contou que seu pai lhe d isse: "Nós qu e fazemos o kava , segu imos o
único deu s, a div indade de Kaf ika". De acordo com seu pai, u m
chefe que u sasse feitiçaria p erdia seu manu , a pot ência do seu
kava ; um chef e que prat icasse feitiçaria teria f eit o mal, seu manu
se haveria d irig ido por esse meio para a f eit içaria. Seu kava só
seria eficaz em ocasiões do ritual descritiv o em si. Em outras
ocasiões o ch efe inv ocaria os deu ses, mas eles não o ou viriam; nã o
mais o desejariam. A chuv a não mais cairia a uma palavra sua,
nem os mares se acalmariam. Como o suposto controle de tais
fenômenos ajudava o ch efe a mant er a opinião favorável de seu
povo, esta crença poderia d issuadi -lo de usar indev idamente o seu
relacionamento com os deu ses. Em 1929, Pa Fenuat ara disse: "S e
um chef e está zangado, ele só ralha com palavras boas, ele mald iz
em nome do pai (i.e. "Qu e seu pai co ma sujeira") f mas ele n ão usa
feit içaria. Todav ia, continu ou: Ê verdade mesmo, algun s chefes s ão
maus." O Ariki Tafu a me f oi mencion ado (conf iden cialmente) como
um dos cau sadores das mortes de várias pessoas e da d oença d e
outros, inv ocando seu s deu ses contra eles, e isto era conden ado
como má condut a por quantos me falaram do assunto. Pa
Fenuat ara foi ao ponto de admit ir q ue seu p ai, o Ariki Kaf ika,
tivesse u sado f eit içaria contra um h omem, "Ele morreria mesmo;
ele não v eria a n oit e; não h averia i d emora; ele morreria n o mesmo
instant e". Porém, d isse ele: "O Arik i Kaf ika t em compaixão d a
terra; cada ind ivíduo permanece n o seu pen samento. Se u m
homem está doente algures e a notícia chega ao Ariki Kafik a, ele
recit ará a fórmu la para o ho mem ficar bom."
A atitude dos chef es de Tikop ia em relação a f eit içaria não
era de simples ad erência ao código ético tradicional. On d e
adotada, o era, part e em d eferência a um senso de
respon sab ilidade e parte pelo medo de perder o pod er de dirigir
rituais. Além disso, embora lhe fosse dada fidelidade verbal, por
vezes ela era ignorada, ou h avia suf icient e falta de f é, por parte
do povo, em su a observ ância para q ue eles fizessem acusações
específ icas de violação. Mas o ef eit o de tal cód igo de abst inência
de feit içaria era difundido entre as f amílias dos ch efes, e o povo
também o achava ind icado como p arte do con ceito g eral do dever
do chefe em relação a seu povo. '

Todav ia, correlata a esta at itude de respon sabilidade e


obrigação concern ente ao povo e su a comunid ade como um todo,
estav a o orgulh o sent ido por um chef e e sua família de vid o a su a
posição. Em sua v ida cotid ia na, cada chefe estava cont inuament e
afirmando a t ese de su a supremacia e seu papel ú nico no seu clã.
Ele aceitav a present es como u ma espécie de tributo dev ido;
acred itava n a prodigalidad e como um direito seu; comportava -se
de um modo que em outros homens seria descrito como arrogant e;
apressav a-se em criticar as ações dos homens comun s que a seu
ver u ltrapassavam os limites de seus status; t inha crises d e fúria
quando qualquer coisa lh e parecia u ma afronta. Indo além dos
seus interesses pessoais imediatos, falava aprov ando as ações d e
outros ch efes com ref erên cia ao clã d eles, cu idav a da manut enção
de seus int eresses comun s e se pront ificava a estar presente em
ocasiões crít icas e a apoiá-los com a sua aut orid ade. Um chef e
estav a apto a ex emplif icar seu st atus com expressões f igurat ivas
especiais. O Arik i Kaf ika me disse, em 1929: "Eu que h abito aqu i
sou o urua rompedor de rede, o tuba rão comedor-d e-homem" —
comparando-se com o peixe fu rioso d o oceano. Em outra ocasião,
deu-me nova série d e metáforas. O Arikl Kaf ika é "a b oca da t erra,
a conf irmação de todas as coisas, aq uele ao qu al a terra ouve, o
famoso ch efe". Explicando -me uma fórmu la secret a, chamou
atenção para u ma f rase qu e n ela ocorria: "A d ivindad e da terra é
única". Esta d ivindad e, segundo ele, era o chef e que em seu pod er
perman ece acima dos comuns como um deus. S e um h omem
comum de seu clã p erturba a paz da terra, en tão o ch efe ouvi -lo-á
e fá-lo-á pagar por isto. Em termos da es trutura social, o povo era
considerado pelas famílias dos ch e fes como de men or importân cia.
Pa Fenuatara disse-me, em 1929: "A história ancestral do homem
do povo é a do ch efe; sua d iv in dad e não p esa e n ão v ai p ara
muitos lugares. Isto signif icava qu e o indiv íduo comum do clã não
tinha h istória nem orig ens tradicion ais, além das do seu chef e,
que superav am as suas. Os deu ses a quem ele invocava tinh am
pouca influ ência ("lu z"). Eles não desempenhav am f açanh as
relevant es qu e demonst rassem seu poder, n em t iveram aventuras
de tal variedad e ou int eresse que os autorizasse a u ma posição
numa hierarqu ia espiritual.
Esperava-se, então, que um chef e, em relação ao povo, fosse
alguém superior, um pouco distant e, capaz de mostrar fúria
quando zangado, mas sendo complacente. No circu lo f amiliar do
Arik i Tafua, em 1929, f oram -me citad as v árias frases de elog ios a
um chef e ref erent es a sua gen erosidade para com seu povo.
Dirig iam -se a ele assim: "O senhor é o chef e que alimenta filhos
viajantes, um ch efe de aparência compassiva, um chef e que
aliment a filhos órf ãos." Ag ora, é v erdade que ouv i algumas destas
frases d os láb ios de p essoas do p ovo e foram-me dados exemp los
de canções nas quais estas expressões eram u sadas para
agradecimentos e elog ios formais. Mas é sign ificativ o que foi nos
círcu los familiares dos chef es onde as ouvi mais citad as.

Este estereót ipo do ideal para o caráter e conduta do ch ef e


era aceito pelo povo, embora formulado princip almente pelos
chefes e seus parentes mais próximos. O sociologicament e
important e sobre est e código era que introduzia uma categoria
moral, que tinh a o ef eit o prático de manter a posição dos chef es.
Até certo ponto, poderia ser considerada como uma
conscient ização da necessidade de colocar um halo em redor da
autocracia e de f azer o chefe serv ir aos int eresses públicos se
quisesse e x e r c e r s e u s priv ilégios.

Um indício para a posição especial de um chefe em Ti kopia o


cuidado observad o a propósito do casamento do herd eiro
potencial, o filho mais v elh o de um chefe. A história das uniões
marit ais do Arik i Tau mako de 1952, antes de torn ar-se ch efe,
mostra isto.

Quando jovem ele primeiro desposou uma mu lh er da


linh agem d e Fetauta. A primeira esposa tinh a sido escolh ida por Pa
Tarikitong a, o filho do irmão do pai do pai do jovem. A escolh a foi
feita pelos parent es agn áticos, mas nunca foi aprovada pelo
marido — ele nunca se dirigira a ela como sua amada. Nu nca lh e
dera bét el ou tabaco. Contudo, a mulher fora trazida pelos
parentes dele, de acordo com o costume tradicion al de tu- kung a
nofine. Eles f oram morar juntos, mas após algum tempo o jovem
colocou objeções, dizendo que ela n ão era boa esposa. Assim, ela
o deixou e depois casou novamente, t endo por marido um homem
do distrito d e Rofaea. Então, o jov em desposou Tauviitev asa, u ma
jovem da linhag em Akitunu , de Namo. Ele próprio a escolh eu,
trouxe-a, fez-se a festa de casamento, e eles foram mo rar juntos.
Mas, então, su a esposa atu al v eio de Faea para ele sozinh a. Ele se
havia dirig ido a ela como su a amad a antes e, segundo diziam, ela
foi casar-se com ele por vontad e do pai dela, o Ariki Ta fu a
(anteriormente Pa Rangifreri). O pai dela queria qu e su a f ilh a se
tornasse a esp osa do h omem o qual algum dia seria o chef e —
queria qu e Taumako a acolh esse. O jovem obviament e est ava feliz
em receb ê-la como su a esposa e a f esta de casamento f oi feita.
Então, o ciúme d a nov a esposa af astou a antig a. Esta segunda
mulher v olt ou para a casa e casou nov amente , torn ando-se Nau Te
Aroaro. Não t eve f ilhos com o jov em; foi para casa gráv ida, mas
nada se sabe dos resultad os provav elmente tentou um aborto,
dizem.
O pai do jov em, o Ariki Taumako, ain da vivo na época tinh a -
se impression ado com a segunda esposa e f icou furioso qu ando ela
foi mandada embora. Ela era u ma p essoa in struída, sabia cu idar
dos assunt os domésticos e, principalmente, prov er alimento para
os m embros do clã. A terceira esposa, como dizem, não alimentav a
bem o povo. Em 1952, meu informan te disse: "Rep arou que não
vamos com freqüência a Motuat a?" (Motuata era a residência
princip al d o ch efe d e Taumak o). "O lugar de reunião d est e clã
outrora era Motuata, o lugar de assembléia do povo. A razão pela
qual os irmãos do chef e e outras pessoas do clã não vão mu ito à
casa de Arik i Taumak o é 'por causa da mulh er ’ . Um ch efe é bom,
outro é mais ou men os (na atamai e fefea ). S eus irmãos o
observ am e se comport am de acordo. Cada um perman ece em su a
própria casa."
Quando as primeiras duas esposas casaram d e novo, os
homen s de Pa Taumak o, em ambos os casos, formaram uma
comit iva e foram mostrar -se contra seus casamentos. Asseguravam
que uma mulh er, tendo sido espo sa d e um chefe ou de um chef e
em poten cial, não dev eria casar nov amente, mesmo t endo sido ele
a abandon á-la. Quand o protestei, meu informante f ez u ma caret a e
disse: "Não sei, é o costume da terra."

A fest a de casamento da jovem d e Fetauta foi feita n a cas a


de Vangatau; a da jov em de Ak itunu, na casa de Te Aorere; e a da
terceira esposa, que permaneceu como Nau Taumak o, em Motu ata,
a própria casa d o ch efe. Em 1952, os três casamentos do ch efe
não eram bem vistos por algun s membros do seu clã. Meu
informante disse: "Objetamos — os valores, a corda do sin ete e os
remos desapareceram, porque ele casou três vezes. Os valores e o
alimento do clã de Taumako e nosso, a linhag em de Tau mako aqu i,
simp lesment e se f oram e se foram e se foram. Tijelas e re mos
chegaram ao f im." ( Matou ne teke — ku leku ko te koroa, te kafa
ma te fe — ku avanga fakatoru. Poi, p oi, poi ko te koroa ma te kai
te kainanga sa Taumako ma matou sa Taumako nei — oti ko te
kumete ma te fe. )
Além da objeção ao casamento triplo, dois pontos de
importân cia estão implícitos nesta afirmativ a. Um é que os
assunt os maritais de um chefe ou mesmo de um ch efe em
potencial também dizem respeito ao clã. S eus membros se
consideram autorizados a arran jar -lh e uma esposa e prontif icam -se
a protestar se a esposa o abandon a, apesar de ser induzida a fazê -
lo. Em segundo lugar, o grau de lig ação entre clã e chef e é até
certo ponto depend ente da hosp italidade que sua esposa of erecer.
Ela é resp onsável por t omar prov idências para os membros do
clã,que v isitam o chef e, serem bem receb idos e alimentados. Por
sua conduta n est e sent ido ela pode f azer mu ito para const ruir ou
destruir a reputação do chef e e suas relações com o clã, mesmo
com seu s parent es agnát icos íntimos. O int eresse do clã ao
arrumar uma esposa para o ch ef e está, portant o, d iret ament e
relacionado a qualidade de suas próprias futuras relações com ele.
Os Tikop ia n ão têm qu alqu er expressão equiv alente ã africana: "A
esposa do chef e é a esposa da trib o." Porém, em v erdade seu
comportamento tem quase o mesmo si gnificado.

PRINCÍP IOS DE SUCESSÃO

Como eram tais id eais reconh ecid os e postos em


execução quando surgiam problemas de sucessão? Arist óteles
formulou três qualificações requeridas para os que tem de
preench er o cargo mais alto. São: lealdade a con stitu ição
estab elecid a; a maior capacidad e administrat iva; e v irtude e
justiça apropriada a forma de g overno. Como todas estas
qualid ades n ão se en contram obrig atoriamente n a mesma pessoa,
é necessária uma seleção. Aristót eles aconselhou -nos fazer a
escolh a a lu z do t ipo d e funções que o in cumbido tem d e exercer.
Selecionando um gen eral, por ex emplo, dev íamos escolher um
homem hab ilidoso ao invés de um virtuoso sem hab ilidade, pois
capacidade militar é supost ament e rara. Mas dev íamos escolh er
virtude em um h omem procurado para intendente, pois a
capacidade administrat iva exig ida por este cargo é comu m
(conforme op inião su a).
Em geral, o modo Tik opia de pen sar p ode ser relacionado aos
conceitos de Aristót eles. Eles n ão parecem sent ir n e cessidade d e
aptidão militar no sent ido organ izacional. Seu s líderes, em
combates como tinham, parecem ter sido lut adores ind ividu ais
agressiv os ( toa ) mais do que generais. A lealdad e a constitu ição
da sociedad e pode ser pressuposta, já que at é recente mente
todos os T ikop ia parecem ter participado dos mesmos valores
gerais e da sat isf ação com seu modo de vida, inclu indo a estrutura
social trad icional. À med ida que a ocidentalização se aprox ima de
Tikop ia, o interesse maior de alguns homen s pelos meios
modernos tem apen as começado a lev antar o problema da leald ade
básica como uma questão con scient e. A capacidade administrat iva
como crit ério para a chef ia parece ter sido desprezada pelos
Tikop ia — ou melh or parece t er -se p resumido (como Arist óteles)
que todos os homen s a possu em em um grau suf iciente para
exercer o cargo. Além disto, um chefe pode ter bons conselh eiros.
A virtud e foi considerada u m det ermin ante de importância, embora
não necessariamente f inal, na seleção para o cargo.

Isto aconteceu porque os Tikopia reali sticament e pod em ter


considerado mais simples assegurar a conduta virtu osa em um
chefe exig indo-a após su a eleição, d o que procurá -la de antemão.
Em outros termos, com uma visão u m pouco cín ica d a fraqu eza
humana, eles parecem t er conf iado mais no ef eit o r egula dor do
código social em um titular de cargo, do que em qualquer indução
anterior de v irtude p er se . Parecem ter dado muito mais
importân cia a uma forma regular de sucessão do que a uma
procura das qualidades ideais na pessoa que seria sucessor,
embora tais qualidades não f ossem ignorad as. Este t ipo de
assertiva int electual e abstrata não é, obviamente, o dos Tik opia é
inferência minha da ev idên cia dada por eles.

Nem em 1929, nem em 1952, ocorreu um caso real de


sucessão a chef ia em Tikopia. Mas foram -me dadas inúmeras
informações descrit ivas sobre casos recentes e tamb ém pude levar
em consideração a massa de mat erial genealógico sobre as
linh agens d e chef es d e Tikopia. Embora ist o não possa ser tomad o
como material especif icamente histórico, os tipos d e sucessão
indica dos assemelham -se aos de ocorrência mais recente e pod em
ser tomados como exemp los da t eoria Tik opia e, prov avelmente,
da prática.
A sucessão a ch ef ia em Tik opia t em sido hered itária, com
descendência p atrilin ear. Nenhuma mulher n em qu alq u er
descendente mat rilin ear f oi su cessor de alguém na ch efia. Com
exceção d e um ancestral fundador, n inguém podia ser sucessor se
não fosse um agnato na linh agem do chefe.

O material de sucessão a chef ia Tikop ia é obt ido das


genealogias das qu atro linh agen s de chefes, e comportava, em um
total de 49 casos de sucessão, 13 em Kafik a, 13 em Talua, 15 em
Taumak o e 8 em Fang arere. A sucessão tem sido dos seguint es
tipos:

Filho foi sucessor em ............ 27


Filho do filho ........................ 3
Irmão ..... ............................ 5
Filho do irmão ....................... 7
Outros agnatos ..................... 7
______________________________
49 casos

O princípio de transmissão heredit ária diret a do cargo est á


claro no mat erial. Havia também uma ênfase na primogen itura.

Enquanto coletav a material genealógico, foi -me dito, em


várias ocasiões, qu e um homem d etermin ado — geralment e um
perdido no mar — tin ha sido te ariki fakasomo , o "ch efe
crescente", te pupura , o "rebento" ou "a p lant a nov a", ou te
pupura nga atua a "planta n ova d os deu ses". Os termos eram
usados, em cada caso, apenas com referência ao f ilho mais velho
de um chef e, e as an alogias com plan tas em cresci mento mostram
como os Tik opia consideram o f ilh o mais velho como o provável
herdeiro do chefe. Tamb ém podia ser dado a tal filho mais velho
um tratamento especial, como lev ar -lhe alimentos como present e,
"já que ele é o próximo chef e". A primogen itura, ent ão, era o
modo normal de su cessão em Tikop ia.
Em 11 dos 27 casos onde f ilh os eram sucessores, o escolhid o
era o f ilh o mais v elh o em ordem de id ade; em quatro outros casos
um filh o único foi o su cessor; e no resto o filho mais v elho viv o ou
o único filho viv o, tendo outros herd eiros em potencial perecido
(geralment e perd idos no mar). Não consta caso algum ond e um
filh o mais novo tenh a suced ido a seu pai como chef e quando seu
irmão mais velho ainda v iv ia. (Só há um caso, o d e Kaf ika — já
mencionado — onde u m irmão mais novo sucedeu a seu irmão mais
velho, estando o ú ltimo ainda v ivo, mas d oente). O padrão de
sucessão f ilial era comum a tod os os clãs. Em Kafik a e em Tafu a, o
filh o su cedeu ao pai em oito casos ent re 13, em Taumako em sete
casos entre 15, em Fang arere em quatro casos ent re oito. Em
geral, onde um filho n ão f oi o sucessor, o n ormal parece ter sido
selecion ar um irmão ou outro agnato tão próximo quanto possível
do chefe morto. Um problema surgia, porém, quando da mort e
deste homem — ele dev ia ser su ced id o por seu próprio f ilho ou a
chefia rev erteria a linha de seu predecessor? Aqui os Tik opia
parecem t er adotado o princípio de reversão, mas não
automat icamente. A adoção dest e princípio parecia depender da
dispon ibilidad e relativ a de sucessores prováv eis nas diferentes
linh as, e era aqu i talvez que as qu alid ades consideradas desejáveis
em um chef e surg iam como critério mais import ante de seleção.
Mas a sucessão no caso dos filhos d o irmão era, na maioria das
vezes, uma rev ersão a uma linha mais antiga.
Em Kaf ika aparentemente ex ist em três casos nos quais a
reversão ao ramo mais velho não ocorreu após a sucessão ter s i
do quebrada deste jeito. O primeiro foi quando o ch efe Pep e,
que abdicou por mot ivo de d oença, fundou a casa de Tav i.
Nenhuma tentativ a p arece ter sido feita para procurar chefe s
posteriores d e Kafik a nesta casa. O segundo caso ocorreu dua s
gerações depois. O chef e, Tan akif orau, tinha sucedido seu pai;
ele era o segundo filh o, mas seu irmão mais v elh o, Mourongo, te
pupura , a "semente de chef e", hav ia morrido no mar. Como
Tanak iforau envelheceu, foi n eglig enciado p or seus filhos. Eles
costumavam sair em bu sca d e aliment o, mas não lh e traziam as
pequenas guloseimas dev idas a um p ai idoso — frut as silv estres,
carangu ejos terrestres, pássaros. E g oist icamente, eles próprios
os comiam na f lorest a. V endo isto, um de seus parent es mais
novos Vakauk e, uma criança adot ada na casa, costumav a trazer -
lhes tais coisas p ara seu deleite. Isto durou bastant e tempo e u m
dia o ch efe d isse ao rap az: "Quando eu m e for, aqu ilo que est á
pendurado em meu p escoço dev erá ser seu" — isto é, o rapaz
herdaria o colar feit o de palma de coq ueiro, usado por um chef e
nos rituais. Tan akif orau f icou d oent e e estav a para morrer.
Todos parentes se reun iram. Tereit eata, o Arik i Ta fu a, fo i
convocado. Quand o ele ch egou, o chef e de Kaf ika est av a
aparent e morto, mas v ez por outra u m long o su spiro assegurav a
ao povo que ele estav a viv o. (A prop ósit o, disse o Arik i Taf ua,
que ele cont ava est a lenda, em 1929 , o chef e estav a realment e
morto, e o deu s em seu corpo só estava esperando o Ariki Tafu a
chegar antes d e deixar o cad áver sem morador.) O Arik i Tafu a
veio e perguntou: "O que ele d isse? Ond e está o d iscurso
deixado por ele?" Todos responderam: "Ele não d isse n ada."
Então voltou-se par a o agonizant e, ag ora parad o, e disse: "Fala -
nos, deixa -nos sab er a qu em o colar d e chef e dev e ser dado". O
corpo n ão deu qualquer sin al de v id a. Ele dirigiu -se ao corp o
repetid as vezes, mas não houve resposta alguma. Então começou
a rep etir os nomes dos f ilhos do mort o, mas n ão houve qualquer
indicio do ch efe quanto a f avorecer a um deles ou não. O Arik i
Tafua falou os nomes de todos os filhos e outros agnatos
próximos e n ovamente repet iu: "Dig a -nos quem deve receber o
colar de chef e". Não houve resposta a lguma. Por f im, v irou -se e
disse: "Ê est a coisa saqueadora, sentada ali?", ind icand o
Vakauke e usando um termo denot ador de desprezo. O corp o
aparent ement e sem v ida ergueu -se, acenou su a cab eça
assentind o, e caiu de v olta, sem outro movimento, ag ora
realment e morto. Assim a sucessão foi conf irmada e Vakau k e
tornou-se ch efe. Ele f oi o ancestral da present e linhagem d e
chefes que são, p ortanto, os frutos de um ramo men or d a
linh agem de Kaf ika.
Tal é a lenda trad icional, que t em certos asp ectos estranhos,
inclu sive a especificação pouco usu al de um sucessor feita por um
chefe agon izante. Pode ser int erpret ada, em parte, como uma
estória moral para influ enciar os f ilh os e fazê -los comportar-se
bem em relação aos seu s pais. Mas o Arik i Tafua contou para mim
dando ênf ase ao aspect o polít ico para explicar — e até certo ponto
se regozijar com ela — a quebra da linha d iret a de Kaf ik a.
Realment e eu já havia descobert o ser impossív el averiguar
precisamente quais eram os an cest rais de Vakauke; a estória pode
ter sid o uma recon strução originária do clã Kaf ika para apoiar a
eleição de um estranho. Contudo, se fosse assim, esp erar -se-ia
uma ligação mais d iret a na sucessão. Na estória relat ada pelo Arik i
Tafua, seu próprio ancestral toma parte import ante, e est a
interf erên cia de outro ch efe para f acilitar uma decisão quanto à
sucessão está de acord o com a regra tradicion al. O termo "coisa
saqueadora", denot ando desprezo, usado pelo chef e que dirigia a
reunião, indica a imprev isão da escolha. O motiv o da escolha ter
sido deixad a para o ch efe agon izante não é explicado. É notável
também que n este caso a seleção de um novo ch efe f oi
considerada como ef etiv ada atrav és de um sinal dos deuses. Como
um chefe Tikopia tinha trad icionalmen te, como função primária, a
tarefa de serv ir de intermediário dos deuses e, às vezes, como su a
person if icação, é interessant e que normalmente pareça n ão se ter
procurado n enhuma aprov ação sobre natural para a seleção
humana. O que est a lenda sugere é uma sucessão anômala,
provavelmente porqu e não hav ia de modo claro quaisqu er
candidatos dispon íveis; t alv ez seja significativ o que, embora os
filh os de Tan akif orau sejam mencionados na lenda, eu fu i in capaz
de descobrir seu s nomes, o que n ão é normal. Como especulação,
pode-se adiantar isto como exemp lo de ul timogenitu ra virtu al: o
velho ch ef e não tinh a filhos de bom calibre, a linh a mais velh a
como um todo n ão tinh a ind ivíduos de dest aque, a chef ia,
portanto, recaiu sobre um agnato muito novo, na realid ade
vivendo com o chef e e a ele serv indo. Um membro do ra mo mais
velho — um bisn eto do Mourongo mencionado acima — foi
escolh ido como chef e de Kafik a mais t arde. Entretanto, quando ele
morreu , o t ítulo revert eu a um irmão de seu predecessor e depois
ao filho de seu pred ecessor, e não a u m descend ente seu.

Em Tafua, a linha direta de sucessão f oi seguida


rigorosamente. A diverg ência mais marcant e foi no caso do
predecessor Ariki Tafua que conh eci em 1928 -29. Est e homem era
um filho do f ilh o do irmão do pai do pai de seu predecessores o
fruto d e uma terceira esposa . Qu an do ele morreu, f oi sucedido
pelo filho mais velh o da primeira esposa de seu predecessor e
nova ment e assumiu -se a linh a diret a.
Houve um caso, relatado p elo Ariki Tafua em 1929, onde u m
antigo ch efe de Tafua, Morit iak i, tent ou reservar o cargo de ch e fe
para seu f ilho mais n ovo. Com uma esposa Anuta ele t eve Taup e.
Embora o rapaz n ão fosse seu filho mais velho, o chef e desejava
que ele obtiv esse o kasoa , o colar d e ch efe, pois em virtud e da
origem estrangeira de sua mãe ele n ão tinh a qualquer grup o de
parentes para dar -lh e apoio em Tik opia. S eus meio irmãos, por
outro lado, tinh am posição, dev ido a seu s laços d e parentesco.
Mas quando os irmãos ouv iram as propostas do p ai ficaram mu ito
zangados, e todos d esertaram Uta, onde o pai viv ia. Vendo isto,
Taupe f icou enverg onhado por ser a causa d e tanta discórdia e foi
viver em Namo. Lá ele viv eu duran te longo t empo, p escando,
cozinhando, comendo peixes e dormin do só. Fin almente, casou -se
lá e torn ou-se pai da linh agem de Akitunu. Por fim seu pai
chamou -o para Uta. Lã deu -lh e uma cest inha de machadinh as
sagradas ( toki tapu ) para carregar e foram junt os p ara Maunga
Faea. Lã o chef e enterrou as mach ad inhas em vários lug ares, co
mo "ob stácu los" (p ipi) para tomar posse perpétu a da terra para
Taupe e seus descendent es e ev itar qualquer usu rpação possível
pelos seus irmãos ou descendentes deles. Após a mort e de seu
pai, o mais velho d os irmãos, Te Uru mua, tornou -se chef e, mas o
futuro econ ômico de Taupe estava assegurado.

Em Taumak o e Fangarere a linh a do filh o mais velh o foi


ignorad a, em algun s casos, prov avelmente por n ão hav er n enhum
candidato disponív el. Mas parece que, em qu ase todos os casos,
fez-se u ma t entativa de ret orno ã linh a mais ant iga tão logo
quanto possível. Em Taumak o, onde um irmão foi o su cessor em
três casos, quando ele morreu a sucessão foi feita por um f ilh o de
seu irmão mais velho em dois casos e, no outro, a chef ia revert eu
a um ramo mais v elho. Onde um f ilho do irmão f oi o su cessor,
quando ele morreu a sucessão voltou ao ramo mais v elh o
novament e. Em Taumako, a primogen itura com o direito do ramo
mais velho su ceder tem sido o princípio dominant e; salvo o ún ico
caso de recu sa, a idade jovem ou a ausên cia parecem ter sido a
única barreira.
Normalmente, um chef e Tikopia é u m homem casad o, na
época de su a eleição. Mas esta não é uma regra invariável. Pak i
moana d e Tau mako f oi eleit o quando ainda era criança (ver mais
adiant e), e Tereit eata f oi su cessor e era solt eiro. Ele se perdeu
no mar ant es de casar -se e n ão deixou descendentes, mas, d e
acordo c om uma prát ica Tikop ia de respeito a um ch efe, foi -lh e
dado um t ítulo, Pu Tafu a L asi, equiv alente ao d e um homem cas a
do, e um ancestral.
A exceção mais marcant e a sucessão normal a ch ef ia Tikop ia
foi o caso recent e de Fang arere. Como descobri em 1952, qua nd o
morreu o Arik i Fangarere, meu con hecido, dois chef es do clã
foram eleitos. Isto era um caso óbv io d e interesses faccionais
surgindo da d iverg ência relig iosa. O f ilho mais v elho do ex -chef e,
um cristão não muit o agradável pessoalment e, h avia sid o
nomead o "o Chef e do Evangelho" por insistência do Ariki Tafua. O
filh o mais novo, um p agão p essoalmen te mais adaptáv el ao cargo ,
tinha sido n omeado "o Chef e dos Chefes" pelos seus colegas
pagãos. Ele era o chef e de statu s mais elev ado.
Ao contrário da prát ica entre alguns povos africanos, Tik opia
não tem est ip ulações para uma regência. O clã t em de ter u m
chefe o mais cedo possível, após a morte de seu ex -líder, e quem
lidera o clã como ch efe t em de ter p lenos pod eres. Na sociedad e
Tikop ia trad icional est a ausência de regência poderia ser
correlacionada ã n eces sidad e de um chefe desempenh ar fu nções
rituais de relação direta com ancestrais e con scient e de que el e
próprio por sua v ez seria incorporado â linh a ancestral como u m
objeto d e ap elo espiritual. Ninguém que não tivesse sido própri a
e completamente empossa do como chefe poderia desempenh ar
esses pap éis. Geralmente, entend ia -se que, quando um chef e
vindo de um ramo mais nov o morresse, a sucessão provav elment e
retornaria a um descendent e de um ramo mais velho. Mas ta l
limitação só p odia estar implícita n o sist ema Tikop ia. Não era
estruturalmente expressa como uma limitação explícit a; em outros
termos, não h avia quaisquer poderes genuín os de regentes.
Não há caso algum de uma ch efia Tik opia ter sido tomada a
força, emb ora freqü entemente se faça ref erência, na tr adição, a
tentativ a de t omar o pod er como t al, pela violência, e as lend as d e
origem falem de disputas pelo cargo. Com cert eza, em épocas
quase h ist óricas, a combin ação de sanções ritu ais e sociais p ara a
chefia parece t er sido tal que n enhu ma legitimidad e poderia ser
esperada por uma tomad a de poder pela força. Naturalmente essa
tomada pode realment e ter acont ecid o, e ter sid o dissimulada sob
uma estória de sucessão n ormal, mas isto é impossív el, pois o
entrosament o de elos de parentesco dos outros clãs pr ov avelment e
tê-la-ia revelado.

MECANISMO DE ELEIÇÃO

É interessante que no sist ema Tikopia de sucessão, a


despeito da ênfase na primogen itura, não há regra aut omát ica pela
qual um herdeiro designado su cede a um chefe morto. Nenhu m
homem, mesmo o filho mai s v elh o, poderia reiv indicar a chef ia
para si adiantadamente. Ao invés disto, por um costume quase
único n a Polinésia, um ch efe é escolh ido pelo que pod e ser
chamado um sistema de eleição. Neste sistema, o papel at iv o
princip al é desempenh ado por líderes d e clãs distintos daquele ao
qual perten cia o chef e mort o.
A eleição se processa t ão logo qu anto possível após a morte
do chef e reinant e, geralment e no meio do tumult o e lamentações
que dão início às cerimôn ias funerárias. O ind ício for mal de
imposição do cargo ao novo ch efe é a demonstração pela qual é
agarrado e levant ado n o ar nos braços d e seu s eleitores. Esta
elevação pública o notifica de sua eleição. Também serv e como
sin al para o pov o em geral de que a sucessão f oi estab elecida.
Este é o único ato c erimon ial necessário para comp letar a eleição,
a parte a operação de vest ir o chefe recém -eleito com uma nova
tanga feita de córt ex. Não h á qualqu er ato de posse ritual formal
pela qual ele seja apresentado aos ancestrais ou de algum outro
modo con sagrado a seu n ovo trabalh o. A escolha do funeral como
lugar de eleição tem a vantag em de dar maior publicidad e ao fato,
pois durant e as exéqu ias de um chefe grande número de pessoas
está present e, vindo de todos os clãs e de todas as partes da ilha.
O at o da elev ação (qu e também p ode ser ef etuado com o chef e em
outras ocasiões) é descrito pelo termo sapai e expressa, em f orma
simbólica, o alto status do chef e em relação ao pov o em g eral. Por
este ato tamb ém os selecionadores d o chefe admit em formalment e
sua própria inf erioridade a ele.

Deve ser esp ecialment e notado nest e processo que a escolh a


e elev ação do ch efe são f eit as por pessoas a qu em ele não
governa. Como nenhum chef e morreu enquant o permaneci em
Tikop ia, não tenho dados de primeira mão, mas foram -me dadas
descrições capazes de torn ar claro o processo. Em 1929, o Arik i
Kaf ika d escrev eu para mim como o en tão Ariki Taumak o tinh a sido
escolh ido. Ele d isse: "O ch efe que est ava morand o lá foi escolh ido
por mim; meu ch ef e a qu em escolh i. Eu fui onde o povo est ava
chorando (i.e. lamentando p elo chefe recém -f alecido). Eu
perguntei: Onde está meu chefe? A multidão apontou -o com seus
dedos". Então o Arik i Kafik a chegou para o f ilho do morto, qu e
estav a lament a do por seu pai perto do cadáv er, e agarrou -o com
força a despeito de su a luta para libertar -se. Então um outro
homem, t ambém membro da família Kafik a, veio por trás do Ariki
para ajudá-lo. O Ariki disse: "S egure seu ch efe e levante -o ao colo
de um homem". Ele foi segurado com força e lev antado do chão
enquanto seu s parentes lutav am para soltá -lo. Est e, segundo o
Arik i Kaf ika, é o costume geral no sau ariki , a escolha d e um
chefe. O part ido que determin ou uma escolha segue num grande
grupo de parent es ( p aito soa ) para a casa de lamentações, e,
enquanto alguns segur am o homem que escolheram, os out ros
empenham-se numa briga com os membros de sua linh agem. "O
grupo de parentes do homem, escolhido para ser um ch efe, coloca
objeção à su a escolha. Grand e é a lu ta durante a escolha d e um
chefe. Qu ando um chef e é escolhid o , é terrív el. O povo sofre um
impacto e os parentes do novo chefe lamentam por seu filho
escolh ido para govern ar. Embora um chefe indique o h omem a ser
elevado, ao f azê-lo, deve ser n otado que ele não elev a o n ovo
chefe em seu s braços. I sso seria depreciad or para sua própria
dignidade. A tarefa d e elev ar é f eit a, em seu lugar, por um ou
mais de seu s part idários .

A luta dos p arent es do gov ernant e eleito para dissuad ir os


que elev am o n ovo chef e parece parad oxal. Por que os parentes de
um homem dev eriam colo car objeções tão en ergicament e? E por
que eles hav eriam de querer que u m chef e fosse escolh ido em
outra parte, como os próprios Tikop ia dizem querer? O Arik i Ka IIk a
deu-me duas razões para esta at itude. A primeira foi que o grupo
de parentes perde alguns d os serv iços de um homem quando é
eleito, pois ele não irá preparar alimento tanto quanto antes,
devido a seu nov o statu s e obrigações. Não me pareceu h a ver
muito p eso prát ico nesta objeção, porque, embora um chefe
Tikop ia part icip e pouco no preparo de ali mento, e nad a no
trabalh o de fogão, ele se ocupa no cu ltivo do solo, n a pesca e em
muitas outras ocup ações econômicas. Além d isso, existem outras
vantagen s econômicas passíveis de compensar a perd a imediata de
seus serviços. A segunda razão, talvez mais pl ausív el, era a de que
os parentes do ch ef e temem ser chamados "uma f amília d esejosa
de ser chef e" ( paito fia ariki ) — ou seja, temem ser acusa dos d e
ambição e gan ância. Contudo, essas duas razões provav elmente
sejam puramente nominais. A mostra de resist ê ncia parece ser, em
grande part e, um mov iment o trad icionalizado para "salv ar as
aparên cias". Esta interpretação emana do fato de eu não t er
obtido indicações de tal resistência t er sido alguma v ez levada a
ponto de imped ir a eleição.

Os parentes do escolhido n ão são os únicos a colocar


objeção. O próprio homem geralmen te dá mostras de ev itar a
eleição, lut ando ou fugindo. Em 1929, disseram -me como o então
Arik i Kaf ika fugiu , quando achou que sua eleição estava próx ima, e
se escondeu numa casa, n o topo de um a prateleira, arrumando
cuidadosamente ao seu red or algumas tigelas de madeira. Mas um
ho mem o d escobriu e anunciou seu paradeiro ã mult idão. Com
isto, o relutant e Ariki eleito desceu e correu , mas foi int erceptado
por braços estend idos; ele foi agarrado e levant ado como ch efe.
Nest a ev asão havia concebiv elmente um pouco de t imid ez por ser
jogado rep entin ament e no centro da atenção pública e pela
ameaça d e uma mudança radical em seu modo d e vid a. Mas tal
conduta tamb ém é trad icionalment e ditada como uma ex pressão d e
modést ia e ê adot ada para evit ar suspeita d e um d esejo de
assegurar o poder. O Tik opia é peculiarmente sen sív el a censura
de ser "uma pessoa que quer se engrandecer" ( tenea fia pasaki );
esta recusa simu lada da honraria está, portant o, em acordo com o
comporta mento de seus parentes.

A sen sib ilidade a tal censu ra pública dá uma exp licação


evident e p ara o costu me anômalo d a eleição d e um ch efe por
membros de um outro clã. Mas além de permit ir aos próprios
seguidores do ch efe preservar uma reputação de modést ia e
relut ância, o costume te m certas outras funções, talvez igualment e
important es, emb ora n ão sejam enf atizadas p elos Tik opia. Uma
referência as cond ições con stant es d e sucessão irá revelar tais
funções. P elo já dito, está claro que n ão existe qu alquer direito de
sucessão ao cargo d e ch efe. Entretant o, cert as probab ilidades são
informalmente reconhecidas na vid a cotidiana. Onde um f ilh o mais
velho do chef e é adu lto, casado e mostrou -se uma pessoa
amadurecida e habilid osa, então normalmente supoe -se que se rã
eleito após a mort e de se u pai. Em 1929, parecia quase cert o que
Pa Fenuatara seria o su cessor do Ariki Kaf ika, e Pa Rangifuri do
Arik i Tafu a. Durant e minh a permanên cia lá, quando o Arik i Taf ua
estav a mu ito enf ermo, pergunt ei ao líder da Missão quem seria
chefe se o velho morresse . Ele resp ondeu: "Não sab emos, mas
achamos que será Pa Rangifuri." Esta predição realmente se
confirmou. Em 19 52, soub e que P a Rangifuri t inha mesmo sido
sucessor de seu pai, e por su a vez tinha morrido e sid o suced ido
pelo seu único filho sobrev ivent e. I gualmente, em 1952, estav a
perfeitamente claro que t odos os Tik opia esperav am e desejav am
Pa Fenuatara como sucessor de seu p ai, o Arik i Kaf ik a.Qu ando não
exist e tal herd eiro óbvio ou quando o filho mais v elh o do chefe
ainda é crian ça, o sist ema de eleição pelo grupo externo torna -se
mais que formal. Ent ão parece est ar — literalmente — em mãos
desse grupo a decisão quanto a quem deve ser escolh ido, entre
várias possív eis pessoas. Neste caso a decisão deles afasta dos
membros do clã a n ecessidad e de fazer o que pod e ser uma
escolh a conturbada pela inveja. Altern ativ ament e, af asta a
possibilidade de desunião intern a no clã ant es de ch egar a uma
decisão. Desacordo e falt a de h armon ia, se existem, são
transf eridos para fora do clã, ond e provav elmente há menos
tendência para ressent iment o permanente e mais possib ilidade
para acalmar orgu lhos f eridos.

O interesse do próprio clã pode ser expresso, por um lado,


quando os desejos d e um chef e qu anto à su cessão podem ser
exprimidos durante a su a vida. O Arik i Tafu a Puke nga, ch efe
anterior ao Ariki que conh eci em 1929, tinha sido selecionado
princip almente como um subst ituto, p ois o f ilho do chefe ante rior,
Fokimain iten i, ainda era novo. Antes da morte de Pukenga houv e
rumores de qu e seu filho, Pa Fen utapu, seria escolhid o para
suced ê-lo, mas o velho f ez objeção a isto. Ele instav a que a seu
filh o deveria ser "dado um esp aço p ara resp irar", isto é, que se
deveria permitir que continu asse como um homem comum para ele
poder serv ir como encarregado ex ecutivo ( maru ) do desced ente
em linh a direta. Mais tarde ele poderia ser eleit o, se as
circun stâncias assim o indicassem. O filho d e Fokimain iten i real
mente f oi eleit o e Pa Fenut apu e seu s descend entes "foram
superados". Por volta de 1929 eles estavam prat icament e fora da
classe dos chef es e em 1952 eles est avam completamente fora da
linh a de sucessão embora aind a fossem pessoas importantes.
Não é possível decid ir em todos os casos qual grau d e
certeza realmente presente na escolh a eletiv a ap arent ement e liv re.
O f ato de que a eleição n ão ocorre arbitrariamente é most rado no
caso do Ariki Kafik a que se escondeu , obviamente com a idéia de
que seria convocado. Além d isso, a h istória comp let a da sucessão
em Tik opia está impregnada do pressuposto de que um filh o mais
velho e maduro de um chefe é o mais passível de ser escolh ido.
Mas isso não parece ser automático. Quando o Arik i Tau mako, a
quem conheci em 1929, foi eleito, o Arik i Tafu a não estava
present e. Ele entrou em cen a depois e, conf orme dizem, ficou
muito zangado porque o pro b lema já tinha sido decidido. Afirmam
que ele desejava a eleição de P ae Avakofe, irmão mais n ovo do
chefe morto. Consta que emit iu uma série de gritos para expressar
sua ex asp eração por ter sido antecipado. Mas era t arde demais. O
costume Tikop ia prevê que , após a elevação f ormal, a sucessão
está irrevogavelment e decidid a. Para assegurar qual qu er ponto d e
vista ou int erferência pessoal é essencial ch egar log o ap ós a morte
do ex-govern ante. Ainda assim, no complexo funcionamento da
polít ica Tik opia, o ato d o Arik i Taf ua t alv ez não fosse um prot esto
genuíno. Pae Av akof e era o h omem mais respeitado e inf lu ente em
Tikop ia. Muito antes, Pa V eterei, o filh o mais velho de Pae
Avakof e, tinh a-se sobressaído por sua força física e grande
influ ência na área. Alegava -se qu e ele hav ia permitido a
insinuação de que dev eria ser escolhido como o próximo Arik i
Taumak o. Em v erdad e h avia um engano, segundo me af irmaram.
Um dia, a f amília de ch efes de Kafik a, numa reunião privada em
sua casa Mapusang a, concordou em escolh er o f ilho do velh o chefe
— o homem realmente escolhid o mais tarde pelo Arik i Kaf ik a. Mas
para acalmar Pa Veterei — o qual de outro modo poderia ter se
sentid o magoado — os membros de Kaf ika também concordaram
em fazer menção de segurá -lo, emb ora sem a int enção de lev antá-
lo. I sto era "para melh orar seu hu mor" ( fakamatamata laui ). À
moda t ípica de Tikopia, as not icias dessa decisão chegaram até o
velho Arik i Taumak o por uma de su as filh as, numa v ersão adu ltera
da: que o povo Kaf ika estav a planejando fazer de Pa V eterei o
chefe. O velho f icou zangado. Ele disse: "Vão deixar meu f ilh o
ficar in ativo, enquanto escolhem alg uém de trás?" — querendo
dizer que iam ignorar o filho em favor do ramo mais n ovo. Depois
disso, dizem qu e ap elou para seu s deuses, fazendo P a Veter ei ser
enven enado n o mar, por comer sumu , uma espécie de peixe, de
mo do que morresse. Essa era uma explicação post hoc da mort e
deste homem; foi-me dada em 1929 por Pae Sao, um proeminent e
líder ritu al. Esse in cident e mostra como os Tikop ia reconh ecem a
possibilidad e de um poderoso homem de posição aspirar a chef ia,
embora não sendo o h erdeiro mais direto. Pa Vet erei
provavelmente n ão t inha ambição p olít ica. Mas, planejando ou não
chegar a chef ia, a opin ião popular lhe atribu ía algum interesse
pessoal na sucessão. Na época da morte do Arik i Taumako pod er -
se-ia imaginar que I'ae Avak ofe tiv esse pensado na sucessão. A
necessidade de aliviar orgulh os ferid os é bem reconhecida pelos
Tikop ia. Freqü entemente, se faz alguma concessão com um
fingimento. O ato d e se gurar uma pessoa como se fosse para
lev antá-la implica que, embora ten ha acabado de perd er na
seleção, ela é de tão grande Importância qu e su as reivind icações
são seriamente considerad as. Assim, ainda qu e possa ficar
desapont ada, ela n ão se sent irá afron ta da. Ora, é possível que o
ato do Ariki Tafu a, ao emit ir grit os quando descobriu qu e tinh a
sido antecipado e que Pae Av akof e n ão tinh a sido eleito, p ossa ser
desse tipo de f ingimento. O fait accompli pod eria ter -lh e agradado,
mas seu prot esto era um cumprim ento formal a Pae Avak ofe,
talvez aind a ch orando a mor te d e seu f ilh o e ainda reconhecido
como o homem mais pod eroso em Tikopia depois dos ch ef es.

A compet ição real pela chef ia é quase desconhecida. Parece


ser possív el a um homem indicar, em particu lar, q ue gosta ria de
ser considerado. Mas um fator p oderoso que opera contra
qualquer p asso at ivo do candid ato é o medo de incorrer n a
reprovação púb lica e de assim prejudicar as chances d e su a
eleição. Anotei apenas um exemplo d e tal comp etição. Foi para a
chefia de Taumako h á cin co gerações. Em 1929, o Ariki Tafu a
contou-me como Pu Veterei, o ch efe do clã há um sécu lo atrás,
perdeu-se no mar. Seu f ilh o Pakimoan a aind a era uma criança, tão
nova que aind a não tinha v est ido uma tanga — o que aconteceria
mais ou m enos antes dos 10 an os de idade. Pu Nukuraro, u m
homem fort e do clã Kaf ika, quando soube da morte, pegou a
crian ça e colocou em volta de sua cint ura o riri , a tanga cerimon ial
de córtex , usa da por um chef e em ocasiões rituais e com qu e é
investido em su a eleição. Então, gritou para o pov o reun ido: "Eis
vosso chef e”. Mas Pu Kavasa, um h omem da casa de chef es de
Taumak o, embora não em linh a diret a, já tinha posto u ma nova
tanga em si mesmo como sin al que se tinh a nomeado ch efe.
Quando ouv iu a proclamação, r eplicou conciliatoriamente: "Eu vou
me sentar assim na habit ação de chefes e saborear os f rutos do
poder ant es do outro; qu ando eu morrer, o seu descend ente será
erguido para o lugar de chefe." Em outras p alavras, est ava muit o
otimisticamente oferecendo -se como um subst ituto, p leiteando
uma concessão, um tipo d e regência imaginária. Mas ele foi post o
de lado rud ement e por Pu Nukuraro e a criança foi aceita como
chefe.
Como a competição pela chef ia é q uase desconh ecid a, a
recusa ef etiv a da honraria tamb ém o é. Só tenh o um caso
anotado. Qu ando morreu Fak atonuara, o Arik i Taumak o há cin co
gerações, seu filho V akasau a n ão queria ser o sucessor e
recomendou qu e o colar ritual, símbolo da ch efia, f osse oferecido
ao irmão do seu p ai. Ele disse: "D ê p ara ser colocad o nele". Foi-
me sugeri do que aqueles tempos eram problemát icos e que ele
provavelmente n ão se sent ia suf icient ement e fort e para assumir
as dif icu ldades do cargo. Port anto, é claro qu e, quanto ã
sucessão p essoal, um h omem pode recusar a eleição, mas n ão
assegurá -la.

Os descendent es de Vak asaua, embora pertencentes a linh a


primogên ita d e chef es d e Tau mako, a partir daí começaram a ser
tidos como de posição inf erior. Eles formavam a linhag em d e
Maneve ou Resiak i. Este ramo superado não ret eve qu alqu er
primazia ritual. Eles cu ltuav am seus próprios ancestrais, mas o
chefe desemp enhav a os principais rit os da lin hagem e do clã.

Quais as razões que inf luen ciam as pessoas que fazem a


seleção? Geralmente p arece ser a sat isf ação com o desemp enho
do poder e com a tomad a de decisões. Nas d iferentes gerações,
homen s fort es p arecem t er tomado parte em mais de u ma
eleição. Por exemplo, Pu Nukuraro, que selecionou o ch ef e
Taumak o, também foi respon sáv el, dizem, pela eleição de
Tereiteata, um chef e de Tafu a. L igado a isso, es tá a sat isf ação de
ter o crédit o público p ela responsabilidade de f azer um ch efe. As
palavras sóbrias de Arik i Kafik a men cionadas acima mostram ist o.
Mas também podem hav er outros f at ores de interesse p essoal.
Não h á qualqu er liga ção especif icamente recon hecida de carát er
formal entre o nov o chef e e o povo que o eleg eu. Ele não lhes
agradece de mod o algum, nem reconh ece o serviço prestado por
eles, dando-lh es presentes, nem parece hav er qualquer
sentimento d e amizade entre eles. Mas em casos part iculares é
possível assegurar alguns ben efícios, tirando vant agem da
estrutura de parent esco. Em 1929, o Ariki Taíua fez -me a
significativ a afirmação de que as pessoas desejam t er um
sobrinh o matern o como chef e. "Eles se esforçam no senti do de o
tama tapu (f ilh o da irmã) poder ser erguid o; eles o empurram
para cima porque assim su a casa ganha poder." Ele não
especif icou ex atamente em qual aspecto, mas partind o do padrão
geral de relacionamento é claro que as possib ilidades de aument o
do prestig io, d e inf luen ciar as decisões do chef e e mesmo de ter
alguma v antagem econ ômica, pod em estar implícitas. Por outro
lado, por tradição, hav ia um lucro na esf era relig iosa, pois o
nome do chef e, após su a morte, poderia ser inv ocado no kava do
povo de sua mãe. Ist o não era uma va ntagem ilusória para os
Tikop ia.
Mas essa escolha de um chefe baseada na vantagem pessoal
dos selecion adores deve ser subord inada a outros fat ores. Ao
selecion ar o Ariki Taumak o de 1929, por exemplo, o Arik i Kaf ik a
não escolheu um sobrinho matern o seu, mas de Tafua, e o Arik i
Tafua, ao d esejar eleg er Pae Avakof e, estava promov endo u m
sobrinh o da linhag em Rarovi, de Kaf ika. Baseado na vant agem
pessoal, pareceria ser mais do int eresse d o Arik i Kaf ika promov er
Pae Avakof e, casado com uma mu lher de sua própria linhagem,
pois assim obteria, como ch efe, um cunhado t anto quanto um
homem que era um tama tapu da linhagem do seu clã. Além
disso, a linh agem Kafik a estaria con st ituída dos "irmãos d a mãe"
do filho de P ae Avakofe se ele, por sua v ez, fosse sucessor. A
esc olh a de Pa V eterei pela casa Kafika teria preenchid o esta
condição, mas, como mencionado anteriormente, ele f oi rejeit ado
por ela.
Os outros fatores de maior peso são as qualif icações
pessoais do candidato e part icularmente seu status esp ecíf ico em
termos de ant igüidad e na linh agem. Como discutid o antes, n enhum
membro d e uma linh agem d e comuns, aind a que su a posição se já
alta, pode se torn ar ch efe. Além disso, o princípio Tikop ia é que,
se um membro colateral da casa de ch efes traça sua d escendên cia
a part ir d e um ancestral que nunca fora ele próprio u m ch efe,
então sua elegib ilidade cai bastante. Ele é "lan çado para o lado",
como dizem os Tikop ia. O princíp io de legit imidade é claramente o
de primogen itura ou do subst ituto mais próximo.
Se o problema de sucessão é tão bem definido por princípio,
então p orque n ão é assumido como automático ao invés de tomar
a forma nominal d e seleção dentre um grupo de cand idatos?
Considerando o caráter formal e o alto grau de int egração da
estrutura relig iosa da comun idad e Tik opia, seria plau sível pensar
que após a mort e de um ch ef e um outro o su cederia
automat icamente pela regra relig iosa. A aparente lib erdade do
sistema de seleção requer para sua interpretação mais alguma
consideração d as relações entre o ch efe e o povo do clã qu e ele
representa, e da comunidad e Tik opia como um todo.

O sistema de controle social Tik opia é expresso, por um lado,


em termos da san ção ind ividu al do chef e, e n ão h á qualquer
autorid ade central de coorden ação para resolver os possív eis
conflitos entre o ch efe e seu s seguidores, ou mesmo entre os
próprios chef es. Na prática, entretant o, as ações de um chefe são
de fato restritas pelas de outras pessoas de posição, tanto dentro
como f ora de seu clã; elas expressam por seu comporta mento um
corpo de opin ião geral. Este controle prático das idiossincrasias de
um chefe p arece est ar ref let ido n os meios p elos quais seu poder
lhe é conferido. Ele não sucede alguém automat icament e por
direito div ino. S e o fizesse, poderia ser mais dif ícil v erificar
qualquer imposição de suas atitudes in dividuais. Mas ele é eleito, e
nem mesmo pelo seu próprio clã. Ele recebe o mandato de uma
chefia, não pode reiv indicá -la. Então, há oportun idad e de controle
do chefe p elo p ovo mesmo f ora do seu clã. Não quero d izer que os
Tikop ia vêem a situação por este ângulo sociológ ico mu ito
conscient ement e e de um modo sofist icado. Mas afirmativ as
bruscas, como a feita pelo Arik i Tafu a em 1929, de que "um chefe
é feito pelo povo da t erra" expressam a essên cia dest e ponto de
vista. Em 1952, Pa Maneve me disse: "uma expressão antiga de
opinião, feita pelos deu ses, é d e que o chef e foi eleito p elo grupo
de pessoas da terra para cuidar do grupo de pessoas da terra. S e
um homem está faminto o ch efe o alimenta. Se um homem é mau
o chef e f alará com ele. Qualquer coisa que possa est ar errad a com
a terra, o chef e falará dist o de modo a poder torná -la boa."
No sist ema Tikop ia a eleição do chefe é f eit a por
proclamação e aclamação pública, não por qualquer processo d e
escolh a por voto. O sistema perm it e uma certa quant idade de
polít ica de poder para a operação de interesses faccionais. Estes
afirmam-se não tanto talv ez na lut a para levantar candidat os
competid ores a chef ia, quanto no imp ulso compet itivo de ch egar a
cena primeiro e t er o créd ito de ele var o cand idato óbvio. A
incid ência ocasional de casos cont estáveis quando a sucessão não
está clara serv e para ref orçar o prin cipio geral de que a eleição d e
um chef e depend e da vont ade do povo e n ão de u m direit o
automát ico.

Por algumas observações, tiro conclusões sobre os ef eit os d a


seleção sobre o homem mais env olv ido. A eleição de um homem
como ch efe sign ifica uma tran sformação abrupta em su a cond ição
social. At é então ele t inha sido um "h omem comum".
Repentinamente, como ariki , ele é investido com um nov o
conjunto d e priv ilégios e se torn a respon sáv el p or uma série
complexa de dev eres rituais. Não me é possív el descrev er em
detalh e como tal homem se comport a nesta ascensão ráp ida ao
poder, pois não v i qualqu er eleição, mas pode -se presumir que o
embaraço sentido por ele é su avizado até certo ponto por um
mecan ismo út il. Este mecan ismo é a prát ica conv encional dos
outros chefes de dar -lh e instru ções, em part icular, sobre assuntos
rituais e algumas v ezes até conselh os pessoais. Essa instru ção
quanto aos nov os de veres não é aut omática e nunca é exten sa.
Mas após sua eleição outros chefes rein antes con sid eram como
parte de su a responsabilidad e providenciar para que o recém -
chegado à p osição deles seja versado no cerimon ial de seu clã. De
acordo com a tradição, eles se reún em e lh e f azem perguntas
sobre seu kava — n ão como um exame para colocá -lo ã prova,
mas para dar-lh e assistên cia se o seu conhecimento deixa a
desejar. I sso é conh ecido como te fuatanga o paito ariki (o cant o
fúnebre das linh agen s de chefe s), segundo o Arik i Kaf ika, em
1929. Outros mecan ismos ajudam a separar o novo chef e dos seu s
antigos associados. A mudan ça em seu statu s é simbolizad a
lingu ist icamente. Logo ele assume u m novo t ítulo, o de líder d e
seu clã; tira seu antigo n ome de f amília e adota o do clã como um
todo. Assim qu em era Pa Teve torn ou -se Pa Kaf ika. Quem era Pa
Rangifuri tornou -se Pa Tafua. Qu em era Pa Ran in iu torn ou -se P a
Taumak o. Esse n ovo nome pode aju dar bast ante na criação d e
uma nova person alidade social. Nele também est á imp lícit a a idéia
de que o chef e é o cab eça ou pai de seu clã já qu e leva o nome
coletivo como parte de seu título. Também ocorrem algumas
mudanças no p arent esco. O ch ef e ten de a ser chamado "pai" mais
extensament e do que foi até então, e frequentemente o termo d e
parentesco é qualif icad o como "pai ch efe". Por ex emplo, em 1929
eu ouv i o f ilh o mais v elho do Arik i Taumako, falando do Arik i
Kaf ika, d izer: "O p ai chef e está cert o" ( e tonu e pa ariki ). Tal
expressão se conforma com os usos comuns de parentesco e aind a
preserva algo da dignidade especial do chefe. A série de tabus
pessoais en volv endo uma segregação corporal ent re o ch ef e e os
homen s comu ns e um comport amento de respeito por p arte d est es
em relação a ele dev em serv ir tamb ém para ajudar o chef e a
adaptar-se a sua nov a posição.

Além d isto, a tran sição n ão pode ser sempre imprev ist a.


Admite-se que nenhu m homem tem certeza absoluta de ser o
sucessor ã chef ia, mas o filho mais velho d e um chefe pod e ter
razoável cert eza, se for maduro. Quando tal homem obviament e
está na linha de sucessão, então seu p ai e outros h omen s
geralmente o instru em quanto a det alh es do comport amento d e
chefe e es pecialmente quanto ao conh ecimento d os deuses: ritual,
fórmulas e mitologia. Além disso, ele terá sido treinado no
exercício da responsabilidad e e con scient izado de qu e um ch efe
tem obrigações tanto quanto priv ilégios.

Depois de 1956 todos os chef es de Tikop ia t ornaram -se


crist ãos. Agora, então, eles n ão são mais aptos ou necessários
para desempen har os trab alhos da rel ig ião tradicion al e tomar a
respon sab ilidade ativ a no bem est ar d a terra. Mas o ch efe Tikop ia
ainda p arece ser um símbolo cultu ral para seu pov o e ter u ma
respon sab ilidade primária de mant er a ordem social. Os prin cíp ios
de sucessão a est e cargo, portanto, p resumivelmente cont inuarão
a ter signif icân cia durante mu ito temp o.
Um problema um pou co d elicad o pode surgir se o Govern o d o
Protetorado Britân ico das Ilh as Salomão f izer dos chef es
instrumentos de admin istração. Em tal caso os requisito s
admin istrativo s de ef iciên cia poderiam sugerir a conv en iência d a
sucessão d e um homem como chef e q ue não seria necessariament e
escolh ido pelo processo trad icional de eleição. É dif ícil prev er o
resu ltado d e tal situação. Mas se o interesse do governo n a
sucessão f or grande, poderia ser prudente f azer, antes, u ma
pesquisa discret a e privada de opin ião local, principalmente entre
os outros chef es. Em geral, o resp eit o à op inião pública mostrad o
pelos chef es pod eria in ibi -los de ag ir como in ovadores efet ivos da
polít ica em favor do gov erno, se qualquer procedimento de
"governo ind ireto" ( indirect rule ) for adotado. Por outro lado, a
deferência do povo ã autoridade d o chefe poderia dar a um
conselho d e chef es um poder maior do que o atual.
A lista completa dos títulos publicados pela Série
Tradução pode ser solicitada pelos interessados à
Secretaria do:
Departamento de Antropologia
Instituto de Ciências Sociais
Universidade de Brasília
70910-900 – Brasília, DF
Fone: (61) 3107-7299
Fone/Fax: (61) 3107-7300
E-mail: dan@unb.br
A Série Tradução encontra-se disponibilizada em
arquivo pdf no link: www.unb.br/ics/dan

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