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Júlia de Castro Mendes - 1º Período - Arquitetura e Urbanismo - 19.2.

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Professora: Sulamita Lino
No século 20, Hannah Arendt inaugurou um conceito: a noção de banalidade do mal.
Em “Eichmann em Jerusalém – Um Relato sobre a Banalidade do Mal”, a pensadora constata o
contraste entre a brutalidade dos crimes cometidos e a personalidade “terrivelmente normal” do
oficial da Gestapo. Para compor uma analogia, o violento, irônico e engenhoso “Pulp Fiction”,
será fragmentado de modo que traduza o que Arendt elaborou em sua obra.
O longa é introduzido com um diálogo banal de um jovem casal, que discorre sobre
assaltos. A cena, aparentemente episódica, introduz o tema do filme, no qual os criminosos não
são gênios do crime, mas pessoas normais executando um ofício como outro qualquer. Eles
conversam sobre a liberalidade das drogas na Holanda, massagens nos pés e hambúrgueres do
McDonald`s. Só que depois matam pessoas.
Essa composição de Tarantino é na medida do possível, muito semelhante as
circunstâncias da vida de Eichmann. O responsável pela solução final era nada mais que um
burocrata, um homem comum, inteligente e educado, interessado em agradar os chefes para
galgar posições. No entanto, teve uma presença ativa no processo de extermínio dos judeus. Em
seu julgamento, ele argumenta que tudo que fez poderia ter sido feito por qualquer um,
demonstrando uma incapacidade de senso crítico frente a realidade e um conformismo em
seguir os líderes e fazer o que todos fazem.
Vincent Vega e Jules Winnfield perpetuam desse mesmo conformismo. A falta
de sentido e de significado de suas vidas cria um vácuo em suas existências, dificultando com
que façam julgamentos morais. Esse vazio é preenchido pelo gângster Marsellus Wallace, que
lhes dá um sistema de valores, agora, qualquer coisa tem valor, se Marsellus assim decidir. Fora
das telas, a massificação da sociedade criou uma multidão incapaz de questionar ordens e fazer
julgamentos, e com o pensamento de estarem cumprindo seu dever de cidadão para com
Alemanha Nazista, deixaram ludibriarem-se por um discurso que causou o genocídio do povo
judeu. A medida que o filme avança fora da ordem cronológica, fica claro a
violência enquanto preocupação estética. Corpos explodem a bala, há sangue por toda parte,
mas a violência é tão constante que se torna banal. Mia sofre uma overdose, Butch escolhe
objetos para agredir os dois maníacos, ele pega martelo, depois o taco de baseball, a motosserra,
e então a espada de samurai. Vincent e Jules limpam restinhos de miolos de um carro em plena
luz do dia...como levar a violência a sério depois de tudo isso?
Podemos traçar a partir do universo fictício de Tarantino, um paralelo à
conjuntura do holocausto e do antissemitismo da Alemanha Nazista. A violência e a tortura
infligida aos prisioneiros nos campos de concentração, eram tão constantes que faziam com que
as vítimas e os criminosos, na proporção possível, se acostumassem com essas ocorrências. Para
Hannah Arendt é a normalidade e frequência em que ocorrem os crimes e a incapacidade de
refletir, que fazem com que homens comuns sejam responsáveis pelos crimes mais bárbaros.
A diferença entre a realidade e a obra de ficção é que Tarantino utiliza a
violência como instrumento para entreter. As cenas são tão absurdas que atingem um tom
irônico e humorístico. Não conseguimos sentir empatia pelas vítimas de “Pulp Fiction”, no
entanto, nos sensibilizamos profundamente com as vítimas do holocausto. Já as cenas de
violência não incomodam, pelo contrário, chegam a ser belas, funcionam como cartase,
purificando e liberando os sentimentos por meio das imagens.
Gosto que minhas histórias sejam engraçadas. Gosto de manipular o público, é uma das
minhas coisas favoritas. Do tipo: “Ria, ria, ria, agora pare de rir, pare de rir, ria de
novo!” (risos). Eu me sinto orgulhoso de poder fazer as pessoas rirem de coisas que não
são engraçadas. Quero fazê-las rir pensando: “Oh, meu Deus, será que eu deveria estar
rindo disso?”. – Quentin Tarantino
Referências Bibliográficas
PULP Fiction. Direção de Quentin Tarantino. Los Angeles: Miramax Films, 1994. ( 154 min.)
ARENDT, Hannah. Eichmann em Jerusalém. São Paulo: Companhia das Letras, 2000

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