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Márcia Divina Bueno Rosa

ANÁLISE DA CONDUTA ÉTICADOS


PROFISSIONAIS DE COMUNICAÇÃO NA
ELABORAÇÃO DOS HOUSE-ORGANS

Universidade Federal de Goiás

Junho 2007

Márcia Divina Bueno Rosa


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A ética dos profissionais de comunicação na utilização do house-organ nas


instituições

House-organ: conceito, história e aplicação

Antes de darmos início à análise desse importante instrumento de


comunicação, torna-se necessário delinear o conceito, o conteúdo e a sua
aplicabilidade para as instituições que adotaram o house-organ como meio de
informação junto a seus diversos públicos. Senão vejamos:

Popularmente conhecido como informativo de empresas ou jornal, o house-


organ inicialmente era um meio de comunicação totalmente dirigido aos
funcionários. Sua principal função era aperfeiçoar a comunicação da administração
com esse público, com vistas a repassar informações institucionais. Para torná-lo
mais atrativo, boa parte do conteúdo era direcionada para o entretenimento.

No Brasil, o house-organ foi introduzido nos anos 70 juntamente com a


comunicação empresarial, novidade adotada primeiramente nos Estados Unidos.
Sua aplicação segue o entendimento da Teoria Funcionalista, que vê a comunicação
como ferramenta para o aperfeiçoamento das relações entre os diversos grupos que
integram a sociedade e, num universo mais específico, as instituições.

Inicialmente, a produção editorial era doméstica e de custo elevado, pois


exigia um número considerável de profissionais. A definição do conteúdo sofria forte
interferência da diretoria da empresa ou instituição. Devido à falta de recursos
tecnológicos os house-organs tinham um leiaute simplificado, pouco atraente. O
conteúdo era focado nos aspectos físicos e técnicos das empresas, com forte
exaltação dos aspectos positivos e oferecia um bom espaço para o entretenimento
do funcionário.

No entanto, não havia espaço para o debate, o leitor era visto como ser
passivo que deveria responder positivamente ao estímulo das informações
repassadas pela administração. Esses informativos serviam também como meio de
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promoção pessoal dos diretores. Pelo custo elevado e dificuldades técnicas de


impressão era um instrumento utilizado basicamente pelas grandes organizações.

Posteriormente, graças aos avanços tecnológicos e o barateamento de


produção, o uso dessa ferramenta de comunicação difundiu-se nos anos 90. A partir
de então, observa-se uma melhora considerável na produção visual. Mesmo tendo o
público interno como prioritário, na maioria dos casos o house-organ é distribuído
para todos os públicos de interesse da empresa. É o chamado informativo "Bombril",
característica que causa indefinição quanto ao conteúdo e à linguagem. Apesar das
modificações, continua focado no elogio à empresa, principalmente no caso das
instituições públicas, mas já não há policiamento tão ostensivo no controle da
informação.

Persiste, ainda, o temor à controvérsia, mas em determinadas situações a


expressão de opiniões em alguns temas e permitida. As instituições temem
compartilhar informações estratégicas, restrigindo-se a registrar fatos. Mais atentas
à segmentação, algumas empresas começam a produzir mais de um house-organ,
adaptando-o a linha editorial ao substrato cultural do seu público de interesse.

Situação atual

Pesquisa apresentada no site Comunicação Empresarial faz uma radiografia


da situação desse importante meio de comunicação institucional. Desse estudo pode
extrair as seguintes conclusões:

Cerca da metade dos house-organs foram fundados antes dos anos 90, de
vida longeva, eles têm pouca participação dos funcionários, que na maioria dos
casos atuam apenas como colaboradores, sem estar presente do processo de
produção. Com veiculação predominantemente mensal, no formato boletim, a
tiragem na maioria dos casos é inferior a cinco mil exemplares. A área de
comunicação responde pela maioria dos house-organs, mas eles ainda são
aprovados por outros setores da instituição. Observa-se que vem crescendo a
participação de terceiros na prestação desse serviço, principalmente no tocante à
produção de revistas, mais voltadas ao público externo.

Ao fazer uma análise da breve história dessa ferramenta de comunicação


no país, verifica-se que houve modificação no entendimento da função do house-
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organ. Essa mudança de perspectiva deve-se em muita a popularização de seu uso


e ao próprio avanço democrático por que passou o país. Atualmente, o maior
objetivo de um informativo não é agradar aos dirigentes, às chefias ou funcionários,
mais sim disseminar cultura, fortalecer a imagem institucional da empresa e criar
vínculos com os diversos públicos de interesse. Essa regra não é genérica, não raro
nos surpreendemos com informativos que nada mais são do que uma apologia à
instituição ou uma forma mascarada de promover a imagem pessoal de um diretor
ou autoridade pública.

Atualmente há uma tênue, mas fundamental diferença na utilização desse


instrumento comunicacional. Enquanto alguns profissionais acreditam na sua
utilização como forma de manutenção do clima organizacional e do status quo, há
quem defenda que o house-organ deve servir como um espaço de formação de
opiniões e fomentar o debate.

Diante desses dois vieses, qual deve ser a conduta do profissional de


comunicação?

RELAÇÕES PÚBLICAS - CONFLITO PROFISSIONAL

Questionar qual deve ser o uso que um profissional deve fazer de uma de um
instrumento de trabalho passa necessariamente pela análise do resultado que ele
pretende alcançar. O bisturi é apenas um instrumento de corte que pode inclusive
levar um paciente a óbito se mal manipulado ou ser a forma mais recomendável
para a retirada de um abscesso (tumor), salvando a vida de um outro. Depende da
qualidade e do intento do médico. A ferramenta em si não representa perigo nem
solução, é apenas mais meio colocado à nossa disposição. Depende, em última
análise, da postura ética do profissional, que deverá inclusive questionar-se se tem
habilidade suficiente para manipulá-lo.

Quando voltamos os olhares para a atuação dos profissionais de


comunicação, essa concepção maniqueísta – bem ou mal - do exemplo dado é
menos perceptível. A má utilização de uma ferramenta ou, melhor dizendo, a sua
utilização para a manutenção de uma situação conservadora ou que atenda
exclusivamente aos interesses da organização, no caso específico do house-organ,
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em princípio não vai conduzir ninguém a uma situação limite de vida ou morte. Caso
haja algum outro interesse senão o de informar, ele está embutido no processo
comunicacional e vem embalada em editoriais descontraídos e textos redigidos com
uso das técnicas de jornalismo, conferindo a informação caráter de verdade
inquestionável.

Cerca da metade dos house-organs foram fundados antes dos anos 90, de
vida longeva, eles têm pouca participação dos funcionários, que na maioria dos
casos atuam apenas como colaboradores, sem estar presente do processo de
produção. Com veiculação predominantemente mensal, no formato boletim, a
tiragem na maioria dos casos é inferior a cinco mil exemplares. A área de
comunicação responde pela maioria dos house-organs, mas eles ainda são
aprovados por outros setores da instituição. Observa-se que vem crescendo a
participação de terceiros na prestação desse serviço, principalmente no tocante à
produção de revistas, mais voltadas ao público externo.

Ao fazer uma análise da breve história dessa ferramenta de comunicação no


país, verifica-se que houve modificação no entendimento da função do house-organ.
Essa mudança de perspectiva deve-se em muita a popularização de seu uso e ao
próprio avanço democrático por que passou o país. Atualmente, o maior objetivo de
um informativo não é agradar aos dirigentes, às chefias ou funcionários, mais sim
disseminar cultura, fortalecer a imagem institucional da empresa e criar vínculos com
os diversos públicos de interesse. Essa regra não é genérica, não raro nos
surpreendemos com informativos que nada mais são do que uma apologia à
instituição ou uma forma mascarada de promover a imagem pessoal de um diretor
ou autoridade pública.

Em muitos house-organs a comunicação se dá de maneira vertical, as


informações partem precipuamente da administração para os servidores, com culto
ao personalismo, com excessiva quantidade de fotografias do dirigente e de
matérias que enfocam apenas a divulgação positiva das ações da administração. Na
edição em comento, não há nenhuma matéria de opinião, muito menos
questionando ou sugerindo postura diferenciada da cultura pré-estabelecida. Em
muitas organizações, o questionamento não é bem visto, pelo contrário, questionar
seria desautorizar um poder que se impõe pela aplicação legitima da força, como
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explica Max Weber ao conceituar o que e o Estado, no qual o Poder Judiciário


integra-se.

O dilema da utilização do house-organ para o profissional de Relações


Públicas reside no fato de ele ter em seu discurso, como premissas da profissão, o
comprometimento com a livre circulação de informações e a defesa da transparência
das atividades da organização, sendo essas propostas que o legitimam para atuar
na construção de relacionamentos com os públicos que afetam ou podem ser
afetados pela organização.

Esse posicionamento consta, inclusive, no Art. 28 do Código de Ética:


“Defender a livre manifestação do pensamento, a democratização e a popularização
das informações e o aprimoramento de novas técnicas de debate é função
obrigatória do profissional de Relações Públicas”. Ao questionar o que deve
transparecer Clóvis de Barros Filho e Arthur Meucci respondem que é a própria
constituição da organização, ou seja, as ações em relação. Eles afirmam que se é
necessário assegurar a transparência é porque essas ações são, pelo menos em
parte, opacas ou camufladas.

Seria então recomendável que o RRPP, ao produzir um informativo,


fomentasse a discussão e publicasse todos os fatos de interesse da sociedade, sob
pena de não o fazendo, mesmo que por determinação da diretoria da organização,
estar incorrendo em falta grave. E quando o house-organ é concebido pela
instituição tão somente com o objetivo de atender aos interesses de manipulação de
informações ou uma mudança comportamental que atenda aos interesses da
organização, sem colocar em discussão as pretensões dos demais agentes do
processo. Deve o profissional recusar o trabalho, mesmo sendo essa a cultura
organizacional, como e o caso do TRT de Minas Gerais?

Afinal o próprio Código de Ética em seu Art. 3º. Não afirma que o RRPP deve
respeitar a filosofia e os padrões gerais da organização. No mesmo dispositivo há
uma ressalva: a não ser quando esses padrões contrariam normas e costumes
vigentes. Então a pergunta seria a seguinte: utilizar o house-organ como meio
apenas de propagação das informações de interesse da organização estaria na
contramão das normas e costumes vigentes? Mesmo que essas informações sejam
de interesse público, muitos acreditam que é impossível a coexistência pacífica da
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responsabilidade social e do lucro ou da conquista do poder. Mas é justamente isso


que nesse terceiro milênio está se buscando.

Uma organização não é formada dentro de uma unicidade. Ela é a junção de


grupos de interesses distintos. Atuando o profissional justamente na administração
dos conflitos que deles decorrem. É possível que um espaço de conflito de
interesses possa ser transparente? Porque revelar as relações e ações estratégicas
de seus participantes pressuporia uma ação reveladora desinteressada,
comprometida só como Bem, com uma ética transcendente, pura, imune aos afetos.
Por outro lado a convicção na transparência não poderia colocar em risco os
próprios interesses da organização?

A ética de RRPP, ao menos preconizada pelo seu código, supõe a


possibilidade de uma denúncia imparcial, neutra e desinteressada. Seria isso
possível, sendo que o próprio profissional também está inserido nesse contexto? A
transparência significa revelar tudo para todos. O profissional de RRPP tem de
prezar, sobretudo, a democratização das informações, sem, contudo, comprometer a
saúde e os interesses da empresa. A primeira vista parece que esse posicionamento
e fácil de ser seguido, mas muitas vezes o profissional pode encontrar-se num
conflito. Suponhamos que na instituição pública haja um caso de corrupção, esse
assunto certamente é de interesse publico, mas seria o caso do house organ noticiar
o tema, mesmo diante das serias conseqüências que essa informação pode gerar
comprometendo a credibilidade institucional local?

Em nome das convicções pessoais do profissional de comunicação de


democratizar e transparecer as informações em razão do interesse social, ao
desnudar um fato que, em última análise, poderia prejudicar um órgão publico de
extrema importância para o cidadão comum estaria indo de encontro ao interesse
social que, em princípio, pretende atender. Nesse exemplo, ao seguir a ética pessoal
o RRPP estaria contrariando algo maior, o bem comum.

“Garantir a transparência implicaria, finalmente, a identificação da luta pela


definição politicamente interessada do espaço social do qual o próprio RRPP faz
parte. Seria, portanto, denunciar o próprio cinismo – no caso de consciência de
outras definições possíveis – ou a alienação – no caso de crença na imanência, isto
e, na correspondência perfeita entre espaço e definição de espaço. Seria denunciar
a conversão de uma concepção politicamente interessada na representação
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incontestável de toda a comunidade.”, afirmam Clóvis de Barros Filho e Arthur


Meucci. Ao questionar esse aspecto deve-se verificar se o profissional é capaz de
manter a paixão pela ética na comunicação e a fria medida para executar suas
ações, como contemporiza Weber.

Como bem analisa a Prfa. Dra. Maria Aparecida Ferrai (UMESP-USP) “Toda a
discussão em torno das profissões revela que elas se equilibram entre a lealdade
ao cliente e os interesses da sociedade. Estamos, mais uma vez, frente à dicotomia
cliente-organização (individual) e sociedade (coletivo).

De qualquer forma, a Relações Publicas Márcia Ceschini em seu artigo


"Comunicação e Ruído", por trás de todo canal, veículo ou meio de comunicação há
um segredo: o real interesse em criar é estabelecer comunicação. Essa
predisposição depende principalmente do interesse da empresa em se comunicar
efetivamente com os vários públicos que a integram ou são atingidos por suas
ações. Essa perspectiva tira das mãos do RRPP o poder de intervir na aplicação do
canal, outorgando-lhe o direito de agir como Poncio Pilatos?

No entanto, caso não haja o interesse tão veemente por parte das
instituições em transparecer suas ações e compartilhar seus objetivos, fundando a
existência do informativo tão somente na intenção de utilizá-lo como meio
persuasivo, qual deve ser a conduta do profissional de comunicação?

CONCLUSAO

A análise de qual deve ser a conduta ética do comunicador esbarra na


própria área de atuação desse profissional, resultado da formação acadêmica de
cada habilitação. A diferença de abordagem pode ser percebida quanto ao enfoque
dado a um instrumento que pode ser de domínio tanto do Jornalista quanto do
Relações Públicas como é o caso dos house-organs. Enquanto o primeiro entende
ser o house-organ um veículo de comunicação, o segundo vê o informativo como
mais uma ferramenta para difusão da cultura organizacional que pode ser utilizada
para aproximar a instituição dos seus diversos públicos de interesse.
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Essa visão diferenciada faz com que os dilemas éticos sejam encarados por
esses dois profissionais também de maneira bem particular. No entanto, nota-se que
existe uma ética universal, que pode ser aplicada a todos os comunicadores, ou
mesmo, a todos os profissionais: a do bem maior. No caso do house-organ,
entenderíamos esse bem maior os interesses de todas as pessoas que participam
direta ou indiretamente das atividades da organização ou por ela são afetados.

A condução das ações do comunicador, contudo, não podem se pautar


apenas nas convicções de foro íntimo de cada profissional, que ao segui-las estará
agindo conforme seu entendimento sem considerar as conseqüências. Essa ética
da convicção que sem dúvida deve nortear as nossas ações enquanto indivíduo nem
sempre é a mais conveniente para guiar a pratica profissional. Weber faz uma crítica
contumaz aos adeptos desse ponto de vista: “O partidário da ética da convicção só
se sentirá responsável pela necessidade de velar em favor da chama da doutrina
pura... seus atos, que só podem e só devem ter valor exemplar, mas que,
considerados do ponto de vista do objetivo essencial, aparecem como totalmente
irracionais, visando apenas estimular a chama da própria convicção".

O contrário, igualmente, seria preocupante. Ao agir pensando apenas nos


fins almejados, ética da conseqüência, o comunicador poderia estar incorrendo no
grave risco de ignorar os seus próprios valores, admitindo, inclusive, o uso de meios
desonestos ou amorais para alcançar os objetivos. Essa atitude para Weber também
tem seus riscos, pois “somos compelidos, de outra parte, a contar com a
possibilidade e mesmo a eventualidade de conseqüências desagradáveis. E
nenhuma ética pode dizer-nos a que momento e em que medida um fim moralmente
bom justifica os meios e as conseqüências moralmente perigosos".

Voltando ao caso dos house-organs, em que o comunicador deve se pautar?


Defender a sua convicção ao livre acesso às informações, instigar o senso crítico,
que é certamente a justificativa da própria existência da profissão? Ou obedecer ao
senso de responsabilidade com que deve investir todo o profissional, e, em razão
dessa responsabilidade, renunciar as suas convicções e adotar as ações que melhor
atendem ao fim maior, a sobrevivência da organização em dado momento. Essas
duas vertentes parecem dissociadas e inconciliáveis.

A resposta a esse questionamento, e dada pelo próprio Weber ao analisar


as conseqüências que a aplicação de cada ética isoladamente deve trazer. “Vemos
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assim que a ética da convicção e a ética da responsabilidade não se contrapõem,


mas completam-se e, em conjunto, formam o homem autentico”. Isto é, um homem
que pode aspirar a “vocação política”. Assim, da mesma forma deve agir o
comunicador, considerando sempre as duas possibilidades. Sendo impossível
verificar qual a que, em dado momento, prevalecerá. Essa resposta será decisão de
foro íntimo de cada um, Jornalistas e Relações Públicas, dependendo das
circunstancias que se lhes apresentarem.

BIBLIOGRAFIA

BUENO, Wilson da Costa. Afinal de contas, o que e um house-organ?. 24/06/2007

FILHO, Clovis de Barros; Arthur Meucci. Transparência e estratégia: uma reflexão


sobre ética em relações publicas. www.comunicacaoempresarial.com.br.
06/06/2007.

Mitos e motes do house-organ no Brasil. www.comunicacaoempresarial.com.br.


22/06/07.

FERRARI, Maria Aparecida. Relações Publicas e a sua função estratégica.


www.comunicacaoempresarial.com.br 25/05/07.

HUMBERG, Mario Ernesto. Ética na política e na empresa: 12 anos de reflexões.


São Paulo : Editora CLA, 2002.

MARQUES, Gilnei. Por que minha internet não funciona?


www.baguet.com.br/coluna.php?id+264&nome+gilneimarques. 24/06/07.

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