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Por Roberto José Soares dos Santos* e Helena Isabel Barroso Saraiva** | Artigo recebido em março de 2016
N
a atualidade, em Portugal e privado em Portugal, na versão apre- contabilística em Portugal tendo
no mundo, muitos esforços sentada pela recente legislação que uma duração de 12 anos.
têm sido feitos no sentido implica a aplicação de um novo nor- O segundo POC português foi apro-
de harmonizar sistemas de conta- mativo a partir de 2016. Estes setores, vado pelo Decreto-Lei n.º 410/89,
bilidade. Estes esforços advêm de embora em progressiva convergên- que nasceu da necessidade de adap-
uma crescente necessidade de har- cia, têm um tratamento diferencia- tação da legislação nacional à co-
monizar informação económica no do derivado das suas características, munitária aquando da adesão de
sentido em que seja possível a sua finalidades e estruturas. Portugal à Comunidade Europeia.
comparação nos diferentes âmbitos Nesta altura, o POC era utilizado pe-
económicos. Essa necessidade resul- Evolução histórica da contabilidade las entidades privadas mas os seus
ta da criação de agrupamentos eco- em Portugal preceitos eram também utilizados
nómicos, quer seja a nível regional, Para melhor compreender os sis- pelo setor público.
nacional ou internacional. temas contabilísticos em Portugal, Numa fase posterior, o Estado, com o
Foi assim impulsionado um conjun- começamos por fazer um breve en- objetivo de fazer face aos novos de-
to de reformas que permitissem a quadramento histórico do processo, safios da gestão lança a RAFE (refor-
comparabilidade entre os diferentes baseando-nos no trabalho de Sarai- ma da administração financeira do
agrupamentos. Um dos mais impor- va, Alves e Gabriel (2015). Estado) reformando, entre outros,
tantes no nosso contexto é a União Em 1977, é instituído o primei- o sistema de contabilidade pública
Europeia. ro Plano Oficial de Contabilidade através do diploma Decreto-Lei n.º
Este trabalho focar-se-á especifica- (POC) aprovado pelo Decreto-Lei 144/92, reforçando a utilização de
mente na comparação entre a conta- n.º 47/77. Este primeiro plano foi o métodos da administração privada
bilidade do setor público e a do setor início do processo de normalização na administração pública.
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para efeitos de responsabilização pela prestação de contas e útil a um vasto leque de utentes na tomada de decisões económicas.
para tomada de decisões.
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%
proporcionar informação útil aos utilizadores das demonstrações comuns da maior parte dos utentes. Contudo, as demonstrações
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estas decisões podem incluir, por exemplo, deter ou vender o seu inves-
timento na entidade ou reconduzir ou substituir o órgão de gestão.
Fonte: Elaboração própria com base nas estruturas conceptuais do SNC e do SNC-AP
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+
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(
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1
-
para prestar os serviços e pagar as responsabilidades existentes mação é útil ao proporcionar ao utente uma base para determinar a
em relação aos recursos da entidade. capacidade de uma entidade para gerar caixa e equivalentes de caixa...
Fonte: Elaboração própria com base nas estruturas conceptuais do SNC e do SNC-AP
*
potenciais nos recursos económicos.
qualquer indicador de resultados contabilísticos. Por isso, o seu
resultado deve ser avaliado no contexto da prossecução dos ob-
jetivos do serviço.
4
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0
(
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/
acerca da prestação de serviços efetuados e outras realizações que a entidade pode empregar recursos adicionais.
durante o período de relato proporcionará uma base para ava-
2
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#
3
e doadores.
A informação relativa aos fatores mais importantes subjacentes
ao desempenho do serviço das entidades públicas no período de
relato e os pressupostos que suportam as expetativas sobre as
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Fonte: Elaboração própria com base nas estruturas conceptuais do SNC e do SNC-AP
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a que representa o desempenho da por outro tipo de relatórios e indi- Características qualitativas
entidade (ver quadro 4). cadores que geralmente são de ín- da informação financeira
Quanto à informação relativa aos dole legislativo. Outro fato é que o nos sistemas de normalização
fluxos de caixa, a mesma só é apre- controlo e planeamento operacio- pública e privada
sentada na estrutura conceptual do nal é feito através de orçamentos Neste âmbito, as características de
SNC-AP, tal como foi já evidenciado anuais, legislados em sede pró- ambos os sistemas são muito simi-
(ver quadro 5). pria, sendo que o próprio SNC-AP lares, usando o mesmo tipo de ter-
ajuda a formulação desse mesmo minologia, ainda que apresentem
orçamento. os pressupostos e qualidades de
6
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<
O SNC e o SNC-AP são contu- forma diferenciada, aprofundan-
sistemas do coincidentes em matéria de do mais certos aspetos inerentes
demonstração financeiras ne- às diferenças existentes entre cada
SNC-AP SNC
cessárias como, por exemplo, a setor.
A informação sobre os
*+
+
- análise de fluxos de caixa e outras Assim, tendo em conta o conteúdo
dade pública contribui necessárias para a análise de de- apresentado em cada uma das es-
para a avaliação do seu
sempenho e de posição. truturas conceptuais, procedemos à
e da sua liquidez e sol- É importante também referir que sistematização do mesmo no quadro
vência.
no SNC se dá mais relevância ao 6, evidenciado os aspetos dos pres-
Tipicamente, uma enti- tema de solvência e liquidez, as- supostos da informação financeira e
dade pública prepara,
aprova e torna público sim como no que diz respeito a lu- o das características qualitativas da
o orçamento anual... É
cros atuais e futuros. informação financeira.
a obtenção de recursos
dos contribuintes e
outros fornecedores de
recursos e estabelece
as competências para
realizar despesas. Os
6
=8'::
elementos estruturantes >3
5
da informação orça-
mental são tratados em
norma própria.
SNCAP SNC
Fonte: Elaboração própria com base nas Regime do acréscimo (pressuposto)
estruturas conceptuais do SNC e do SNC-AP Continuidade (pressuposto)
Relevância
5
Relevância
9
"
"
Como vemos neste tema da estru-
Fiabilidade Fiabilidade
tura conceptual o SNC-AP é muito
3
&
-
mais extenso que o SNC. Isto ad- nómicos e outros: quando a descrição dos 3
fenómenos é completa, neutra e isenta de
vém da necessidade que o relato
' Substância sobre a forma
financeiro das entidades públicas
;<
2
*2
'
Neutralidade
tem a vertente de serviço público
=
"'
- Informação isenta de erros materiais. Prudência
e, assim sendo, necessita obri-
gatoriamente evidenciar no seu Plenitude
relato outros elementos como se- Materialidade
jam relatórios e/ou indicadores do
Compreensibilidade Compreensibilidade
estado de satisfação e de desem-
Comparabilidade
penho dos serviços públicos que Comparabilidade
presta. De notar que a continuida- ?5
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CONTABILIDADE
Elementos das
SNC-AP SNC
DF
Ativos 3
*
Recurso presentemente controlado pela entidade pública para a mesma benefícios económicos futuros.
como resultado de um evento passado.
Os benefícios económicos futuros incorporados num ati-
- Um recurso é um item que contém em si a capacidade vo são o potencial de contribuir, direta ou indiretamente,
*+
"
*+
+
"
+
-
benefícios económicos futuros, os benefícios podem ser tidade.
originados pelo recurso em si próprio ou pelo direito a
dispor desse recurso.
Passivos !
+*+
&
-
Um passivo é uma obrigação presente originada num
turos.
evento passado que gera uma saída de recursos.
- Uma obrigação é um dever ou responsabilidade para
- Uma obrigação presente é uma obrigação vinculativa,
+
'
- Rendimentos são aumentos no património líquido, que ganhos. Os réditos provêm do decurso das atividades cor-
não sejam os resultantes de contribuições para o patri- rentes (ou ordinárias) de uma entidade sendo referidos
mónio líquido. por uma variedade de nomes diferentes incluindo vendas,
honorários, juros, dividendos, royalties e rendas.
Fonte: Elaboração própria com base nas estruturas conceptuais do SNC e do SNC-AP
Relativamente aos pressupostos e financeiro, relacionando-se a carac- tendo embora em conta as diferen-
às qualidades que o relato financei- terística deste de prestação de ser- ças inerentes aos respetivos critérios
ro deve ter, as diferenças mais im- viços públicos e responsabilização de funcionamento.
portantes entre o SNC e o SNC-AP pela prestação de contas e tomada
dizem maioritariamente respeito a de decisões. Elementos
diferenças inerentes ao funciona- Já o princípio do acréscimo, parte das demonstrações financeiras
mento de cada setor. Por exemplo, fundamental num sistema conta- A seguir apresenta-se um resumo
o princípio da continuidade não faz bilístico privado, é um pouco ne- dos conceitos apresentados na es-
muito sentido no entorno estatal, gligenciado no SNC-AP, ainda que trutura base de cada um dos norma-
derivado da sua previsível perma- esteja amplamente prevista a aplica- tivos (ver quadro 7).
nência no tempo. O princípio da ção deste preceito em concorrência Como podemos ver, os conceitos de
oportunidade presente no SNC-AP com o regime de caixa. ativo são muito semelhantes, ainda que
pretende realçar a importância dos Nos restantes princípios ambos os no SNC-AP seja o mesmo considerado
tempos de apresentação do relato sistemas são bastante convergentes como um recurso e no SNC como o po-
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tencial de gerar um benefício. se advêm de atividades corrente e a verificar-se uma crescente com-
No conceito de passivo ambos os ganhos se advêm de benefícios eco- parabilidade entre as entidades do
sistemas consideram um passivo nómicos. setor público e as do setor privado,
uma obrigação presente. Contudo, o Já os gastos, em sentido inverso, re- em termos de relato financeiro.
SNC-AP enquadra um passivo com a presentam os gastos que resultem de Com a sucessiva implementação
pouca ou nenhuma probabilidade de atividades correntes ou perdas, to- do SNC-AP por parte das entidades
evitar a saída de recursos. Já o SNC mando geralmente a forma de exflu- públicas aumentará, sem dúvida, o
exemplifica como quantias que se xo ou depreciação de ativos. rigor como estas apresentam as suas
espera que sejam gastas. Relevamos que a terminologia ado- contas.
O SNC e o SNC-AP tratam de manei- tada é significativamente mais Não devemos, no entanto, deixar de
ra diferente o tema do capital pró- abrangente que no SNC AP, sendo, ter em conta que ainda existem dife-
prio, ou do património líquido, pois contudo, substancialmente muito renças relevantes entre os dois siste-
correspondem a conceitos realmen- similares. mas, mas tendo em conta o analisa-
te diferentes: se no setor privado po- do neste trabalho, entende-se que o
demos falar de capital próprio, pois Conclusão caminho futuro continuará a ser o de
este é detido pelos sócios/acionistas Neste estudo comparativo verifica- convergência. a
o mesmo não acontece no setor pú- mos que a aproximação dos sistemas
blico já que inerentemente este ca- normativos da contabilidade do se- >!
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pital não pertence exclusivamente a tor público e do setor privado é evi- - Publicações – Revista Contabilista –
ninguém, referindo-se assim a pa- dente. >!BH
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