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O vendedor de biscoito

Meu primeiro emprego foi aos oito anos. Meu segundo emprego também. O terceiro
foi aos nove. Eu dei um tempo. A crise foi muito convincente.
Vendedor de biscoitos da mãe, pintor de zarcão na serralheria do Ded e vendedor de
caldo de cana na praça da Estação Ferroviária da Vale. Contribuí muito com a
economia de Governador Valadares. Meu quarto emprego foi engraxate no mercado
do centro, aos dez, mas vamos focar nos biscoitos.
Eu estudava de manhã, ou de tarde, não sei. Lembro como se fosse há 40 anos. Vendia
pelas ruas distantes da minha casa, um menino de 8 anos vai ter vergonha de quê?
Eu saía com uma bacia de alumínio grande com 50 biscoitos, e tinha que ser na cabeça,
meus braços não conseguiam abarcar a bacia de lado. A mãe cobria os biscoitos com
um pano de prato. Ainda bem! Assim eu podia passar direto pela calçada sem chamar
muita atenção. Tinha até um filho de gente que perguntava o que tinha na bacia. Eu
comia dois pra não voltar pra casa com os 50.
Vendo esse sucesso a mãe me botou no portão da escola na hora da saída. Ali tinha o
do picolé, do shuk, chup chup, sacolé, dindin, geladinho... e eu. “Você tá vendendo
pano de prato?” perguntou o do picolé. “né nada não”. Vendi três naquela hora. Não
sei se era 05 centavos ou cinquenta. Lembro como se fosse há 40 anos. Queria dizer
que eu voltei pra casa correndo e gritando de alegria como no dia em que se passa de
ano.
Minha mãe chamou o Zé Antônio pra trabalhar comigo. Ele fazia rimas e até cantava.
Falava tudo, preço e produto. A rua ficava sonora com a voz dele. Lá vem o menino do
biscoito. Não era eu.

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