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Na sala de espelhos

Inconformado com a escolha que fiz, o que ele entendia como desperdí
cio, ele me perguntou: “mas estudar tanto para contar história para me
nino?” Sei que sua intenção não era acabar com a alegria do momento,
mas foi inevitável. Este comentário, com outras palavras, claro, tornou
a se repetir por várias vezes, quando ele via submeter-me a trabalhos
com remunerações irrisórias, bem como quando me via estudando nas
madrugadas para dar conta da infinidade de leituras incondizentes com
a vida de trabalhadora que levava nos tempos de graduação. Suas pala
vras, porém, tornaram-se antídotos para o cansaço, e me motivavam a
superar e mostrar para ele que buscara ser uma das melhores naquilo
que me propus a ser.
No quarto semestre da graduação, numa atividade de campo de uma
disciplina de Psicologia Social II, acompanhada, na época, por duas co
legas, entrevistamos uma professora que tinha cerca de 10 anos de pro
fissão e atuava em uma escola pública estadual de Feira de Santana. Após
a professora entrevistada compartilhar o gosto que tinha em trabalhar
com História e as maravilhosas experiências vivenciadas na graduação,
nós a questionamos sobre como ela avaliava sua atuação profissional e
ela, repentinamente entristecida, respondeu: "a utopia é maravilhosa,
mas na prática tudo é diferente. Sinto-me enganada e frustrada!”. Estas
palavras me marcaram profundamente.
Vale ainda destacar um último episódio que marcou minha forma
ção profissional. Certa vez, trabalhei em um estabelecimento de ensino
por mais de um ano na condição de auxiliar de secretaria, mas, por con
ta da minha formação, desempenhava atividades diversas que se aproxi
mavam daquelas relacionadas a uma Coordenação Pedagógica. Embora
me percebesse explorada (já que muitas vezes extrapolava meu hora
rio de trabalho), não reagia a essa situação porque tinha consciência da
aprendizagem que dela advinha. Além disso, alimentava a possibilidade
de ser contratada como estagiária na função de professora de História,
já que tinha cursado mais da metade da graduação e percebia que havia
muitos outros professores nesta condição. Quando surgiu a oportunida
de, explicitei minhas intenções à diretora e fui surpreendida quando ela
disse: “De jeito nenhum! É mais fácil achar uma professora de História

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