Você está na página 1de 2

Apostas e jogo online: como regulamentar?

No passado dia 29 de abril foi publicado o Regime dos Jogos e Apostas


Online, sendo esta mais uma etapa da evolução da legislação relativa ao jogo
em Portugal, decorrente das recomendações da Comissão Europeia e das
recentes alterações legislativas em Espanha, França, Itália, Reino Unido e
Dinamarca.

Até 1927 a resistência ao jogo era profunda, vigorando a proibição absoluta,


consagrada na legislação civil e penal. Todavia, porque era uma realidade
socialmente implementada, foram dados os primeiros passos no sentido da
sua regulamentação. Foi assim que, reconhecendo-se que a repressão de tal
prática não era eficaz, houve uma mudança de paradigma, criando-se zonas
de jogo, definindo-se quem o poderia fazer e em que termos. Procurou-se,
por essa via, combater o jogo clandestino e também assegurar alguma
proteção aos seus executantes.

Foi necessário aguardar por 1989 para que o jogo fosse novamente
regulamentado, dando-se novos passos, definindo-se modalidades e formas
de jogo existentes à data.

Entretanto, dá-se o advento da era da Informática e, principalmente, da


Internet, proliferando todo o tipo de plataformas de jogo, sem qualquer tipo de
regulação e controlo, tornando-se claro que as autoridades teriam de intervir,
quer para proteger os menores e as situações de risco, como também para
combater a fraude, o branqueamento de capitais e a viciação dos resultados.
Além disso, o Estado viu a oportunidade de encaixar receita fiscal
significativa.

É neste contexto e no da crise de que estamos agora a sair que surge o


Decreto Lei 66/2015. O regime que entrará em vigor a 28 de junho manterá o
monopólio do Estado na exploração do jogo, permitindo, todavia, a
concessão de licenças a privados para que explorem o jogo online,
verificados intricados requisitos, tais como sendo que as licenças terão a
duração de 3 anos, renováveis e em que serão intransmissíveis e sujeitas a
caducidade.

O legislador tinha à sua frente um desafio interessante: arrecadar receita sem


perder de vista a componente social do jogo. A opção cega pelo primeiro
implicaria o descontrolo do segundo, a opção pelo segundo implicaria um
incremento dos custos para o Estado.

O legislador tinha, portanto, de decidir se seguia um modelo mais liberal, que


implicava uma ruptura com a evolução legislativa (e social) do jogo ou se
implementava um modelo mais conservador, corrigindo os aspectos mais
importantes já identificados - como sejam a proliferação do jogo ilegal com o
consequente incremento do risco social, ausência de tributação, a fuga de
capitais e o combate ao crime - dando importantes passos em direcção a
uma legislação mais equilibrada e menos fracturante.
E nessa medida o Decreto Lei 66/2015, além de regulamentar as novas
formas de jogo (essencialmente o online), representa a opção pelo modelo
mais conservador, mas também mais equilibrado. Não descorando o desejo
de obter receita, o certo é que o legislador não caiu na tentação de um
modelo que quebra o status quo existente até então, em que há uma
dicotomia entre a exploração dos jogos mútuos ou sociais (totoloto,
euromilhões, etc.) por parte da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa e a
exploração dos jogos a cargo dos casinos e bingos. Não arriscou, portanto,
romper com os termos da exclusividade dos casinos e bingos, correndo o
risco de elevadas compensações indemnizatórias àqueles, não retirou da
Santa Casa receitas que revertem em larga medida para acções de cariz
social e salvaguardou o incremento do risco social expectável da concessão
generalizada de licenças.

Veremos se a opção do legislador na revisão obrigatória daqui a 2 anos


acentuará o conservadorismo ou optará por um modelo mais liberal.

João Baldaia, advogado (joao.baldaia@jpab.pt)

Você também pode gostar