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Sobre a consciência animal

Em julho de 2012, um grupo de cientistas reunidos na Universidade de Cambridge proclamou que


humanos não são os únicos seres conscientes. “Animais não-humanos como mamíferos e aves, e vários
outros, incluindo o polvo, também possuem as faculdades neurológicas que geram consciência animal”,
declarou o grupo, na chamada Declaração de Cambridge.

Todo mundo sabe que os animais têm consciência. Eles percebem e entendem seu entorno. E muitos,
entre eles golfinhos, elefantes e alguns pássaros, são inclusive auto-conscientes. Eles possuem um certo
senso de si. Ok, pode ser que um cachorro não saiba quem é do mesmo jeito que eu e você sabemos
quem somos. Mas o ponto é: mesmo que não saibam quem são, eles têm consciência de sua própria
dor. Foi o que aconteceu comigo quando tive um acidente de bicicleta: bati a cabeça e tive amnésia.
Quando o médico me perguntou como me sentia, eu disse: “Estou sentindo muita dor”. E quando ele
perguntou quem eu era, respondi: “Não lembro meu nome.” Da mesma forma, é errado fazer um animal
sofrer só porque ele pode não saber quem é.

Os pesquisadores descobriram mais do que isso. Sabemos, por exemplo, que ratos e galinhas sentem
empatia. Eles conseguem se colocar no lugar dos bichos ao redor e sentem pena ao vê-los sofrer.
Elefantes vivenciam alegria, luto e depressão. Lamentam a perda dos amigos, assim como os cães,
chimpanzés e raposas vermelhas. Os polvos foram protegidos de pesquisas invasivas no Reino Unido
bem antes dos chimpanzés, pois os cientistas já haviam reconhecido que eles são conscientes e sentem
dor. Hoje muita gente ainda não quer admitir esses fatos científicos, pois terão de mudar a forma como
tratam os animais. Na verdade, temos de tratar todos os animais da mesma forma, com compaixão e
empatia – sejam eles os “animais humanos” como nós, sejam todas as outras espécies.

Não estou falando apenas dos abatedouros – embora seja óbvio que, se houvessem mais vegetarianos
no mundo, menos animais sofreriam. Estima-se que 25 milhões de ratos, pássaros, peixes e outros
animais sejam usados todo ano em experimentos de laboratório. Muitos passam por um sofrimento
terrível durante os testes e a maioria sofre “eutanásia” – são mortos – depois. As pessoas justificam
atitudes assim dizendo que vão ajudar os humanos. No entanto, mais de 90% das drogas que funcionam
em animais não têm o mesmo efeito em nós. Menos de 10% delas nos ajudam de fato. Além disso, já
existem formas de pesquisa que não maltratam os animais. Em lugar de gotejar xampu nos olhos de
coelhos imobilizados, por exemplo, podemos usar modelos de computador para simular a ação do
produto sem dano algum. Portanto, não se trata apenas de um desperdício de animais; é um desperdício
de tempo e dinheiro que poderiam ser investidos em outras alternativas.

Por isso, concluí que devemos aplaudir a Declaração de Cambridge. Ela não traz nada de novo, mas
mostra que cientistas famosos finalmente admitem que animais têm consciência. A declaração é mais
uma prova de que devemos tratar os animais com todo o respeito. E reconhecer que eles não querem
sentir dor, do mesmo jeito que nós não queremos. Seria perigoso fazer esse tipo de distinção. Todos os
animais devem ser tratados como indivíduos. Ainda vai levar tempo para que isso aconteça. Mas a boa
notícia é que cada vez mais pessoas aderem a essa ideia.

Por Marc Bekoff – professor de ecologia e biologia evolutiva na Universidade do Colorado, EUA. É autor
de O Manifesto dos Animais, entre outros livros. Em depoimento a Eduardo Szklarz.

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