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Kitty McKenzie # 1
AnneMarie Brear
Leabhar Books
O desejo da mariposa pela estrela, da noite pelo dia seguinte, a
devoção a algo distante, da esfera do nosso sofrimento.
- Shelley.
Índice
Página do título
Epígrafe
Direitos autorais
Capítulo Um
Capítulo Dois
Capítulo Três
Capítulo Quatro
Capítulo Cinco
Capítulo Seis
Capítulo Sete
Capítulo Oito
Capítulo Nove
Capítulo Dez
Capítulo Onze
Capítulo Doze
Capítulo Treze
Capítulo Quatorze
Capítulo Quinze
Sobre o autor
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Título Original: Kitty Mckenzie
Copyright©2014 por AnneMarie Brear
Copyright da tradução©2020 Leabhar Books Editora Ltda.
Todos os direitos reservados, no Brasil e língua portuguesa, por Leabhar Books Editora Ltda.
CP: 5008 CEP: 14026-970 - RP/SP - Brasil
E-mail: leabharbooksbr@gmail.com
www.leabharbooks.com
Capítulo Um
O FRIO ÚMIDO acordou Kitty. Ela teve uma noite agitada. O som de rangidos nos andares superiores do edifício a
impediu de dormir. Sem um relógio para saber as horas, acordou muito antes de ouvir alguém mover-se nos andares superiores.
Depois de colocar seu vestido de lã preto, do luto, acendeu o fogo e, em seguida, acordou Martin.
— Que horas são? – Perguntou ele, esfregando seus olhos sonolentos.
— Não sei. Eu diria por volta das cinco horas, embora ainda não tenha
ouvido o homem que bate à porta. – Ela tremeu e vestiu o casaco. Não
tendo criados para acordá-los na hora certa, eles agora dependiam do
homem que caminhava pelos corredores escuros todas as manhãs, batendo
nas janelas daqueles que precisavam se levantar e ir trabalhar. Tanta coisa
tinha mudado e eles não tinham outra escolha senão adaptar-se à sua nova
vida.
— Venha para junto do fogo ele está produzindo um pouco de calor.
Eu pus a chaleira para ferver.
Martin estendeu as mãos para as chamas. — Ainda bem que sabe
como fazer uma xícara de chá.
— Sim, sei, macaquinho atrevido. – Ela levantou uma sobrancelha
para ele. — Mas também tenho de aprender a fazer refeições adequadas.
Não podemos viver de sanduíches para o resto das nossas vidas.
— Talvez a Sra. Spencer te ensine. – Ele pôs várias colheres de açúcar
no copo.
— Ei! Não tanto assim. – Ela tirou o açúcar. — Isso tem que durar
algum tempo. Tudo terá de ser em pequenas quantidades a partir de agora.
Logo, o restante dos irmãos despertou, reclamando de fome. Com água
quente aquecida no fogo, Kitty e Mary ajudaram os mais jovens a se lavar.
Passos acima de suas cabeças foram como um sinal para Kitty calçar
suas luvas. — Vem, Martin, está na hora de ir. – Ela virou-se para a Mary.
— Ficarão bem. Arrume algo para o café da manhã e fique perto do porão.
Voltaremos ao fim da tarde.
Ela apontou o dedo ao Joe e à Clara. — Ajudem a Mary a cuidar da
Rosie e comportem-se.
No topo dos degraus, eles encontraram Max.
— Bom dia – ele cumprimentou. — Porque estão acordados tão cedo?
Tem formiga nas camas?
Kitty balançou a cabeça enquanto ela e Martin desciam os degraus ao
lado dele. — Tenho certeza de que tem, mas na verdade estamos à procura
de trabalho. Sabe de algum?
— Não, menina, não há muitos que trabalhem por aqui. Os empregos
são difíceis por estas bandas.
— Onde é que você trabalha? – Martin perguntou.
— No rio. Eu trabalho em um armazém que possui barcaças
próprias. Enviamos nossas coisas pelos portos fluviais ao longo da costa.
— Acha que haveria chance de Martin conseguir um emprego lá? –
Kitty empurrou as mãos profundamente nos bolsos de seu casaco para se
aquecer.
— Bem, moça, não fará mal tentar – rosnou Max, dando um tapa
nas costas de Martin. — Vamos lá, rapaz, vamos ver o que há para o dia.
Kitty e eles se afastaram em direção ao rio.
Kitty parou no fim da rua e ponderou sobre o que fazer a seguir. Hoje
era o seu vigésimo primeiro aniversário. Ninguém se lembrava, mas isso
não importava. Iria celebrá-lo, arranjando um emprego. Marchou para o
mercado cheia de confiança.
Mesmo naquela madrugada, o mercado fervilhava de gente. Os donos
das barracas preparavam tudo e as mulheres faziam as compras. Grandes
multidões passavam pela praça do mercado a caminho do trabalho, nas
inúmeras lojas, fábricas e moinhos.
Em cada barraca, Kitty perguntava por trabalho; cada um dos
barraqueiros sacudia a cabeça para ela. Saiu do mercado e foi para as ruas
vizinhas.
A primeira rua começava com a chapelaria. Olhou para a exibição de
chapéus coloridos em tamanhos diferentes. Para além da exposição, viu
uma vendedora limpando o balcão. Sorrindo, Kitty entrou na loja. Ela
conhecia um pouco de chapéus, não a sua fabricação, mas possuía um bom
gosto de estilo e tinha usado muitas criações que ela e sua mãe tinham
adornado.
A comerciante deu um firme não ao seu pedido de emprego e disse-lhe
que usar chapéus não lhe dava talento para fazê-los. Castigada, e um pouco
envergonhada, ela entrou e pediu emprego uma tabacaria. O lojista irritante
disse-lhe que não empregava mulheres.
As ruas pareciam intermináveis conforme Kitty procurava
emprego. Foi repetidamente humilhada quando lhe pediram experiências e
referências anteriores. Claro, ela não tinha nada disso e foi continuamente
recusada.
Cansada e infeliz, decidiu voltar para o porão. Ela olhou com inveja
para os coches que passavam, mas quanto menos dinheiro gastasse, mais
tempo eles conseguiriam ficar longe do orfanato. Contra todas as
probabilidades, estava determinada a manter a família unida e construir uma
vida boa para eles.
Seus pés latejavam e o estômago roncava de fome. Ela não tinha
comido nada o dia todo e de repente estremeceu. Sua cabeça latejava de dor
e estendeu as mãos para encostar-se a uma parede de tijolos. Crianças
brincando na sarjeta pararam para encará-la antes de saírem correndo. Ela
fechou os olhos momentaneamente, mas se forçou a andar.
No topo dos degraus do porão, ela hesitou, endireitou os ombros e
convocou um sorriso. Com a cabeça erguida, entrou para cumprimentar sua
família.
A porta na parte inferior estava fechada, devidamente fechada. Alguém
colocou de volta nas dobradiças.
Girando a maçaneta, Kitty espiou. Um fogo quente brilhava. Comida
de dar água na boca borbulhava em uma panela grande na prateleira
ardente.
Um tapete de trapo multicolorido estava em frente à lareira. Acima do
fogo havia um espelho quebrado e, na prateleira, um relógio de carrilhão
manchado.
Entrando ainda mais no quarto, ela viu as camas feitas e as roupas
arrumadas. Um pano remendado, de cor creme, cobria a velha mesa. De
onde todas essas coisas vieram e onde estava sua família?
O som das vozes das crianças flutuou para ela pouco antes de
descerem os degraus do porão de braços estendidos.
Connie se conteve mais perto da porta, observando Mary e os mais
novos, explicando seu dia.
— Shh, shh! Devagar, não posso abraçá-los todos de uma vez. – Kitty
riu. — Mary, pode me dizer de onde veio tudo isto? – Ela abriu os braços
para abarcar todos os seus novos pertences.
— Sim, são da Sra. Spencer. – Mary olhou com gratidão para Connie.
— Ela nos deu.
Kitty se soltou dos bracinhos enrolados ao seu redor e caminhou até
Connie. — Muito obrigada.
— Não – Connie dando um tapinha em suas mãos — são apenas
algumas coisinhas e eu não gostava delas.
— Quer tomar uma xícara de chá conosco?
— Hum... bem...
— Oh, sim, venha e tome um chá, Sra. Spencer. – Disse Clara, com
covinhas.
— Sim, tudo bem então. – Connie sentou-se à mesa enquanto Mary
enchia a chaleira com o balde de água.
Kitty ouviu o tom de Connie suavizar quando falou com as crianças e
viu como o seu olhar seguia os movimentos delas com atenção arrebatada.
Mary passou as xícaras ao redor. — Conseguiram trabalho, Kitty?
— Não, eu não. – Seus ombros caíram. — Mas o Max levou Martin
para ver se ele pode trabalhar no depósito também.
— Se arranjar esse emprego estiver ao alcance do meu Max, ele
arranjará. – Connie acenou com a cabeça.
— Sei que Martin foi educado para ser um cavalheiro e não tem
experiência em trabalho manual, mas é forte e inteligente. – Kitty passou
uma das mãos sobre os seus olhos cansados. Muita coisa dependia de
Martin ter trabalho.
Joe pôs a mão no braço dela. — Podemos comer agora? Estou com
fome.
Mary virou-se para ele. — Não faz nada além de comer, Joseph
McKenzie.
— Ele é um rapaz em crescimento. – Connie soprou sobre o chá para
esfriá-lo. — Suba as escadas, Joe, e pegue mais lenha da minha cesta, bom
rapaz.
Kitty viu-o partir e depois olhou para vestígios dos pertences de Rory.
Connie abanou a cabeça. — Ele não voltou, menina.
Ela virou as costas, desconfortável por Connie conhecer os seus
pensamentos. — Ainda há tempo. Talvez esteja nos arranjando um lugar
para ficar ou até pode ter arranjado trabalho. Ele poderia se tornar um
escrivão ou algo assim...
— Sim, talvez. – O murmúrio silencioso de Connie não pareceu
convincente, e Kitty encolheu por dentro.
Mary agarrou as mãos da Kitty. — Esta manhã foi horrível. Pus
demasiada lenha na fogueira e apaguei-a. A Sra. Spencer ouviu-me
chorando enquanto passava e desceu para ver se eu precisava de ajuda. Ela
levou-nos para o seu quarto. Ficamos perto da lareira dela enquanto ela nos
dava o café da manhã. Tivemos tanto frio!
— Como posso agradecer-lhe, Sra. Spencer? – Kitty sorriu, mas as
lágrimas vieram com muita facilidade e ela as enxugou apressadamente.
— Não foi nada demais. E não vai demorar muito até a Mary ter tudo
resolvido. – Connie deu a Mary um aceno tranquilizador. — Basta um
pouco de aprendizagem, é só isso.
Joe voltou com a madeira e atirou-a ao chão com um estalido. —
Fomos com a Sra. Spencer a uma loja de penhores. – Os olhos dele se
arregalaram em excitação. — Nunca tinha estado dentro de uma loja de
penhores.
Connie fungou. — Bem, esperemos que não tenha necessidade de ir
outra vez, rapaz, e empilha bem essa madeira.
— E a porta? Kitty perguntou. — Quem fez isso?
Joe olhou para cima da lenha que empilhava. Um sujeito lá de cima
deu-nos uma ajuda quando nos viu a tentando arrumar a porta. Ele
consertou as dobradiças e pôs a maçaneta, era dele. Mas ele disse que íamos
precisar dela mais do que ele.
— Um amigo? – A Kitty levantou as sobrancelhas. — Então, fizemos
outro amigo?
— Tash McNeal vive no último andar – disse Connie. — E é um
escocês, mas simpático o suficiente. A mulher dele morreu há dois anos. —
Não o vemos muito agora, ele mesmo mantém assim. – Ela virou-se para a
Mary. — Mexe o guisado, Mary.
Mary levantou-se para obedecer.
Connie inclinou-se para mais perto da Kitty. — Vai sair à procura de
trabalho amanhã?
Kitty acenou com a cabeça. — Embora eu pense que já andei em todas
as ruas e caminhos de York. Os empregadores me recusam porque não
tenho experiência nem referências.
— Pode ler e escrever, isso é o que deve dizer a eles. Pode ser que faça
a diferença.
Kitty conversou com Connie um pouco mais antes de ouvirem a voz
estrondosa de Max e o tom mais baixo de Martin. O ar frio atingiu a sala
quando eles entraram.
— Foi contratado? – Kitty perguntou a Martin.
Ele sorriu. — Sim!
Kitty pulou para abraçá-lo, assim como os outros.
— Sou apenas um entregador por enquanto, mas logo quero tentar
entrar nos barcos e ir para os portos ao longo da costa.
— Acho que devemos dar um passo de cada vez, não é mesmo? –
Kitty riu e abraçou-o novamente.
— Muito bem, rapaz – disse Connie.
Kitty girou para agarrar a mão grande de Max. — Não posso lhe
agradecer o suficiente, Max.
— Não, moça, não foi por minha conta. O garoto se saiu bem com as
perguntas do supervisor.
— Vai ficar e jantar conosco? – Kitty sorriu. — Deveria, já que foi
sua esposa quem cozinhou. – Ela sorriu para Connie.
Espremidos ao redor da pequena mesa com cadeiras extras trazidas dos
aposentos de Spencer, sentaram-se e comeram o ensopado caudaloso e
saboroso. Depois, Mary e Clara lavaram a louça, usando o balde como
pia. Martin foi até a torneira e encheu o balde, deixando-o pronto para a
manhã seguinte.
Connie brincou com Rosie, enquanto Kitty e Joe ajudaram Max a
construir uma engenhoca de guarda-fogo a partir de peças que ele guardara
ao longo dos anos. O novo sistema significava que eles poderiam comprar
carvão barato e manter o fogo aceso durante a maior parte da noite para
evitar o frio.
No pequeno quintal nos fundos do prédio, Kitty segurou a lanterna
para Max enquanto ele vasculhava suas preciosas pilhas de ferramentas
caseiras alojadas em um galpão.
— Sou muito grata por terem nos ajudado – disse Kitty, olhando em
volta para cada pequeno movimento na escuridão.
— Não pense nisso, moça – Max falou por cima do ombro.
— Temo imaginar o que poderia ter acontecido conosco se não os
tivéssemos conhecido.
Max se endireitou e encarou-a na luz fraca da lanterna. — Minha
Connie não tem amigos e me surpreendeu como ela tem estado com sua
família. Me agrada tê-la tão alegre quanto ultimamente. – Ele sentou-se em
uma caixa virada. — Nós nos casamos há dez anos e ela é solitária. Tem
sido difícil para ela, pois ela perdeu muitos de nossos bebês e isso a deixou
um pouco defensiva. Ela não sabe como demonstrar seus sentimentos, mas
tem um bom coração se olhar além de sua rudeza.
Kitty sorriu. — Ela tem sido uma dádiva de Deus, de verdade. Serei
sua amiga enquanto ela me quiser.
— Ela teve uma vida difícil, cuidando de pais egoístas e inválidos até
os dois morrerem. Ela não tinha família, a não ser eles e, portanto, todas as
suas demandas caíram nela. Eles não a deixavam sair e se divertir. Faziam
com que ela se sentisse culpada por ficar muito tempo nas lojas. – Ele fez
uma pausa para inspecionar um pote sujo cheio de pregos dobrados
enferrujados. — Eu estava feliz por ter casado com ela. No entanto, acho
que demorei seis meses para fazê-la sorrir. – Ele olhou para cima e sorriu.
Kitty devolveu. — Talvez ela tenha demorado muito para perceber a
sorte dela em se casar com você.
Ele rugiu de tanto rir. — Eu gosto de você, Kitty McKenzie.
K ITTY SE MANTEVE ocupada durante os dias seguintes, preparando o salão de chá para o dia da abertura, anunciado
para dentro de uma semana. Ela e Benjamin passaram o maior tempo possível um com o outro. Ele organizou os empregados da
a mudança de todos os seus pertences às acomodações acima
mansão para virem fazer
da loja. Ele a acompanhou na compra das mesas e cadeiras necessárias.
Compraram samambaias verdes altas e folhosas e as colocaram nos salões
de chá para oferecer um pouco de privacidade aos clientes. Ben insistiu em
pagar por todas as toalhas e guardanapos de linho, vasos para cada mesa,
talheres e louças. Procuraram nos armazéns por balcões e cortinas e
passaram a tarde inteira comprando os ingredientes necessários para fazer
bolos e sanduíches sofisticados. A ajuda e o apoio de Ben significavam
muito para ela. Pela primeira vez em meses, ela foi capaz de se apoiar um
pouco em outra pessoa e gostou da sensação.
Na quarta-feira, todos estavam exaustos, mas, felizmente, a maior
parte do trabalho estava concluída.
Kitty estava sentada nos fundos da loja, cercada por caixas e caixotes
de estoque.
Connie e Mary levaram Rosie para um passeio até o rio.
Os outros estavam no trabalho e na escola.
Isso a deixou sozinha para dizer adeus a Ben. Seu coração doeu com o
pensamento. Ela não sabia como sobreviveria ao tempo longe dele. Era
como se ela estivesse esperando a vida inteira para encontrá-lo, para, então,
ser cruelmente separada tão cedo. Isso lhe parecia muito errado. Houve
momentos em que desejou ignorar seus deveres, sua família e apenas
concordar em navegar com ele.
Connie se ofereceu para cuidar das crianças, caso desejasse ir com
Ben, mas Kitty sabia que essa não era a decisão correta. Ela ficaria infeliz
por estar do outro lado do mundo, longe deles e sem saber como se saíam
dia após dia. E se Rory voltasse? Como poderia culpá-lo por abandoná-los
quando ela teria feito a mesma coisa? Não. Ficar era a única resposta. Além
disso, dezoito meses passariam rapidamente estando trabalhando nos salões
de chá, para que ela pudesse esperar.
Assim que ele chegou, pouco antes do meio dia, ela se jogou em seus
braços tão logo ele entrou pela porta dos fundos. Silenciosamente, se
abraçaram, saboreando o momento. Depois de um tempo, o levou para o
andar de cima e eles se sentaram juntos no novo sofá de veludo verde-
escuro que Ben havia comprado para ela.
— Como vou suportar ficar sem você? – Kitty levantou as mãos dele
para beijá-las. — Fez muito por mim, por todos nós. Os salões de chá nunca
ficariam tão elegantes sem a sua ajuda.
— Dinheiro é para ser gasto, minha querida. Quero te dar tudo. – Ele
beijou o nariz dela. — E como não me deixa comprar uma casa para você
morar até que nos casemos, preciso garantir que esse negócio a mantenha
financeiramente até que eu volte.
— Sinto-me culpada o suficiente por tudo que já nos comprou sem que
me mantenha.
— Que bobagem está falando, minha querida. Sua recusa de uma conta
bancária em seu nome fará com que eu me preocupe o tempo todo que
estivermos separados. No entanto, se encontrar dificuldades e precisar de
ajuda, vá até o meu pai. Ele irá ajudá-la.
—Não, Ben. Essa responsabilidade é minha.
— E, como minha noiva, agora é minha responsabilidade.
Kitty balançou a cabeça com tristeza. — Nada está formalizado ainda.
Sua mãe...
— Estará assim que você aceitar. Pesquisando no bolso do casaco, Ben
pegou uma caixa preta coberta de veludo e entregou a ela.
Ela abriu a caixa e engasgou com o lindo anel de esmeralda aninhado
em um acolchoado de cetim branco. — Oh. Oh, Ben. – Lágrimas
escorreram de seus olhos. — É tão bonito
— Combina com seus olhos, meu amor.
Toda formalidade a deixou quando passou os braços em volta do
pescoço dele e chorou. A partida dele causava dor a ponto de estilhaçar seu
coração.
— Oh meu amor, não chore. Por favor, pare ou eu vou me juntar a
você. – Ele tentou aliviar o momento, no entanto, sua voz desaguou de
emoção.
— Kitty, Kitty, meu amor.
Ele a acalmou com palavras suaves enquanto a abraçava até que ela se
sentiu recomposta o suficiente para se soltar dele.
— Perdoe-me. – Kitty enxugou as lágrimas com um lenço que ele lhe
deu do próprio bolso. — É demais para se pensar. E quanto à sua mãe? Ela
nos desaprova.
— Deixe minha mãe comigo. – Ele respirou fundo. — Vai usar meu
anel? E se casará comigo quando eu voltar?
— Sim. Claro que sim.
— Olhe para você. – Ele passou os dedos pelos cabelos dela que
escorregavam de seus dedos.
Seu glorioso cabelo de cobre estava todo bagunçado. —Posso
guardar uma lembrança?
— Claro.
Ele estendeu a mão para a cesta de costura apoiada em uma mesa
lateral. Fazendo uso de uma tesoura cortou habilmente uma pequena mecha
do cabelo de Kitty. — Tem algo onde eu possa guardar isso?
Kitty pensou por um momento e depois tirou de baixo da gola do
vestido uma corrente de ouro e medalhão – o último presente de aniversário
que ela recebeu de seus pais.
Ben ergueu as sobrancelhas quando ela lhe deu o medalhão. — Tem
certeza?
— Sim. Quero que o leve consigo e, pela primeira vez, meu coração e
minha mente concordam.
— Como eu te amo. – Ben a apertou contra ele, beijando-a com um
rigor que a deixou sem fôlego. Ela se arqueou contra ele, querendo tudo o
que lhe dava e muito mais. Quando as bocas de ambos se desencontraram,
ele procurou a ternura do pescoço, ela jogou a cabeça para trás, permitindo-
lhe mais acesso.
A respiração dele, quente contra o pescoço dela, enviou calor
inundando seu ventre. Sua coluna estava doendo, latejava e ela estremeceu
nos braços dele.
— Céus, Kitty, devo parar... tenho que parar...
Ela sentiu as batidas do coração dele em seu peito, um eco da sua
própria batida. Kitty escondeu o rosto no ombro dele, desejando que seu
corpo desacelerasse. Respirou seu aroma particular de sândalo, guardando
na lembrança para quando estivesse sozinha. — Escreva para mim o mais
rápido possível.
— Eu vou. Prometo. – Ele segurou o rosto dela nas mãos e a beijou.
— Ben... – Todo instinto nela queria agarrá-lo e nunca deixá-lo partir.
Ele era dela e eles não deveriam se separar, não agora, não justo quando o
encontrou.
— Adeus, meu amor, mantenha-se segura. – Depois de mais um beijo
doce, ele se afastou.
Ela não enxugou as lágrimas que escorriam por suas faces ensopando
seu vestido.
O que importava sua aparência agora? Um soluço partiu dela.
Rapidamente, ela correu para a despensa e vasculhou as caixas e
caixotes até encontrar um calendário. Tirando um lápis pequeno do bolso,
com os dedos tremendo, riscou a data de hoje. Preferiu não pensar quantas
mais precisaria marcar.
KITTY SE DESPEDIU de Joe e Clara do portão lateral quando eles foram para a escola. O cansaço já apertava em seus
por mais uma noite sem dormir devido à
ossos e o dia havia apenas começado. Ela passou
discussão com Georgina Kingsley. Ela estava preocupada com o fato de o
relacionamento delas ser tão ácido.
A mulher seria um dia sua sogra, mas elas mal podiam suportar a visão
uma da outra. Preocupava-a que Benjamin estivesse dividido entre elas.
— Bom dia, senhorita. – Um carteiro com uma grande bolsa vermelha
cheia de correspondências sorriu para ela.
— Bom dia. – Kitty assentiu. Seu uniforme de colete, casaco azul com
gola escarlate, punhos e canos estavam tão bem passados que pareciam
novos.
— É a Srta. McKenzie, dos salões de chá da McKenzie?
— Sim, sou eu. É novo por aqui?
— Sim, Srta. Art Tilsby, é o meu nome. Aqui está sua
correspondência.
Kitty pegou as duas cartas. — Prazer em conhecê-lo, Sr. Tilsby.
— Bom dia para a senhorita. – O carteiro inclinou o chapéu pontudo.
Voltando ao pátio, ela abriu a primeira carta. Ela sabia que era de
Benjamin e seu coração disparou. Ela fez uma pausa para ler a breve carta.
Minha querida,
Escrevo esta breve missiva após embarcar no navio e enquanto espero
a partida, que será dentro de uma hora. Embora esta embarcação me afaste
de você, não posso deixar de me animar com minha jornada.
Ao aceitar meu anel, você me fez o homem mais feliz do mundo inteiro.
Eu te amo tanto. Já sinto sua falta e escreverei novamente a bordo e
postarei no próximo porto da minha escala.
Viu o anúncio no The Times? Está satisfeita? Eu devo ir agora, meu
amor, pois o último apito soou para os visitantes deixarem o navio e enviar
a correspondência.
Meus melhores votos a toda a família e novamente meu amor para
você.
Benjamin.
NA LUXUOSA SALA de jantar vermelha da mansão Kingsley, Dorothea colocou delicadamente o guardanapo de linho
jantar, sua filha estava sentada majestosamente,
ao lado do prato. No final da mesa de
mordiscando sua comida. Dorothea olhou para John antes de endireitar os
ombros. — Hoje cedo, fui para conhecer a noiva de Benjamin.
Georgina engasgou com a comida e seus olhos se estreitaram. — Posso
pedir para não mencionar essa mulher na minha presença, mãe?
— Por quê? Ela é de um tipo decente e será para Benjamin uma ótima
esposa – insistiu Dorothea. — Ele a ama. Por que não está feliz por ele ter
encontrado uma mulher que o fará feliz?
— Eu não ficarei feliz com tudo isso! Está ouvindo? – Georgina
levantou-se rapidamente, dispensando um servo prestativo com um
movimento de cabeça.
— Acalme-se.
— Não interfira, mãe. Não verei Benjamin casado com alguma
caçadora de fortunas que possui uma loja de chá! Por que a vergonha disso
me mataria.
John abaixou a faca e o garfo. — Minha querida, Dorothea está certa.
Benjamin precisa de uma esposa com inteligência. Ele ficaria louco dentro
de um mês com algo menos que isso.
O olhar frio de Georgina o silenciou. — Essa mulherzinha nunca será
minha nora. Ela também não governará esta casa! – As duas criadas se
entreolharam com medo.
—Você é mimada, Georgina. Foi desde o berço. Só que desta vez não
conseguirá o que quer. – Dorothea também se levantou, essa era a
determinação dela. — Não deixarei que arruíne a chance de felicidade desse
menino. Ele a ama e ela o ama. Eu farei tudo ao meu alcance para vê-los
casados.
— Ama? Ela quer o dinheiro dele e a possibilidade de se casar em uma
família rica. Seríamos motivo de riso para todos os nossos amigos e
conhecidos. – O rosto outrora lindo de Georgina se retorceu com despeito.
— Isso nunca acontecerá, mãe. Eu não deixarei! Prefiro que ele morra antes
de se casar com aquela moça. – Ela saiu da sala de jantar com um farfalhar
de saias de seda e perfume persistente.
Dorothea sentou-se cautelosamente, seus ossos rangendo com o
esforço. — Ela deve ser parada, John. Eu a amo, mas às vezes não gosto
dela. – Ela balançou a cabeça e pegou o vinho.
— Juntos, garantiremos que eles se casem. Escreverei para Benjamin e
pedirei para ele falar com Kitty. Levará meses para a carta chegar e meses
para uma resposta. No entanto, é mais sensato que eles estejam na Austrália
do que aqui, pois Georgina nunca lhes dará um momento de paz.
Dorothea olhou ao redor da bela sala com seus móveis, papel de
parede de seda chinês raro e utensílios de mesa luxuosos. Ela podia ver
claramente Kitty como dona de tudo isso e sabia em seu coração que era
onde a jovem pertencia, mas isso realmente aconteceria? – Um arrepio
repentino formigou em sua espinha.
Capítulo Onze
NOS AGRADÁVEIS DIAS de verão de junho e julho, o comércio cresceu nos salões de chá. A cidade de York se
fins de semana, os habitantes da cidade
deliciava com o céu azul e os raios dourados do sol. Nos
aproveitavam o bom tempo para descansar e se divertir. As tão esperadas
notícias do fim da guerra civil americana despertaram o ânimo de todos. Os
operários esperavam que os estados do sul retomassem o transporte de
algodão para as numerosas usinas de Yorkshire. As pessoas demitidas nos
últimos anos poderiam novamente obter trabalho.
Nas partes mais pobres da cidade, as crianças morriam de rir enquanto
corriam descalças pelas ruas, aproveitando o sol no rosto e a liberdade da
juventude. Esses problemas mundiais não as preocupavam enquanto
brincavam. Os idosos sentavam-se em bancos, fumando cachimbos de
barro, enquanto observavam os jovens e fofocavam com os vizinhos.
Enormes cortinas de roupa pendiam secando entre prédios em filas
intermináveis, subindo e descendo os cortiços.
Os ricos, do outro lado da cidade, levavam suas carruagens e shows
abertos.
As damas passeavam em belos jardins e colhiam flores para inalar suas
fragrâncias enquanto se protegiam com bonitos guarda-sóis em tons pastel.
Festas de chá e bailes de verão foram organizados, enquanto aqueles que
ficavam em Londres no inverno voltavam para suas casas de campo,
prontos para socializar com os amigos. Era uma época tão movimentada do
ano, com caçadas a raposas e passeios pelo vasto campo, bem como
piqueniques, saraus musicais e concertos.
Dentro dos salões de chá em Petergate, no entanto, prevalecia um
clima sombrio. Kitty trabalhava como alguém possuído. Ela vivia e
respirava a loja de chá. Se levantava antes da primeira luz e ia para a cama
pouco antes da meia-noite. Se preocupava com a loja, as crianças, Connie e
Ben.
Ela perdeu peso com o estresse, mas acima de tudo, perdeu o humor.
Kitty estava sentada em seu escritório, fingindo trabalhar em suas
contas, mas sua mente vagava para longe das fileiras organizadas. Se não
fossem três as causas de sua ansiedade, ela ficaria mais feliz, mas os três
problemas a preocupavam além do desespero.
— Aí está. – Dorothea Cannon bateu com a bengala com ponta de
ouro no chão, na porta do pequeno escritório. — Você deveria estar ao sol.
Kitty levantou-se para cumprimentar sua visita. — Como está hoje? –
Ela beijou sua bochecha.
— Me parece doente, menina. – Dorothea sentou-se em uma cadeira
próxima. Sua crinolina cor de camelo se espalhava como gelo sobre um
bolo.
— Não, na verdade, não estou.
Dorothea a olhou. — Eu posso sentir que algo está errado. Não confia
em mim?
Kitty recostou-se na cadeira. Ela encolheu os ombros e mexeu na saia
cinza escura. — Tenho algumas preocupações, nada para incomodá-la.
— Deixe-me julgar isso. – A mulher mais velha inclinou a cabeça e a
pena roxa em seu chapéu balançou alegremente.
— Estou preocupada com meu irmão Joe. Recentemente, soube que
ele estava se associando a um grupo de meninos de caráter duvidoso. Ele
ficou fora até tarde e tornou-se rude com outros membros da família. Hoje
de manhã, recebi uma carta da escola dele, que me informou de suas muitas
ausências. Então, preciso lidar com ele e estabelecer algumas regras
básicas, porque obviamente permiti que ele se safasse demais ultimamente.
— Pequeno espertinho – zombou Dorothea. — Quer que ele seja
enviado para a marinha? Eu tenho um primo aposentado que pode colocá-lo
em um navio.
Kitty pôs a mão na cabeça, alarmada. — Não, obrigado, falarei com
ele.
Dorothea suspirou dramaticamente. — Muito bem então. O que mais?
— É Connie. Eu acho que ela está doente. Ela não quer ir consultar um
médico. Por duas vezes ela desmaiou esta semana. Alice e eu quase tivemos
um ataque cardíaco quando ela caiu. Connie acredita que tudo isso é pela
mudança.
— Por desencargo de consciência, chame um médico no minuto em
que ela parecer mal e não dê ouvidos a suas desculpas. – Dorothea se
inclinou para mais perto para dar um tapinha em seu braço. — E com meu
neto também está preocupada?
Ela admitiu que sim. — Embora eu não possa fazer nada sobre isso.
Não receber uma carta em meses dói profundamente. Ele disse que
escreveria uma carta a bordo do navio e a enviaria no primeiro porto de
escala. Se ele tivesse feito isso, então agora eu já deveria ter recebido. É
julho. Ele deveria estar lá agora. Teve notícias sobre ele?
— Não, e John e Georgina também não. Tenho certeza de que ele
escreveu, mas os navios no oceano estão além do nosso controle.
— Acho que estou muito impaciente. – Ela não revelou sua ansiedade
de que Georgina pusesse em prática sua ameaça de escrever cartas
envenenadas sobre ela.
Dorothea se levantou. Seus joelhos estalaram ao fazê-lo. — Me ajude,
querida menina, eu sou muito velha.
Kitty correu para ajudá-la e juntas saíram para a frente da loja.
Ao lado da carruagem, Dorothea parou. — Não desanime, querida
Kitty McKenzie. Tudo ficará bem.
A carruagem partiu, mas Kitty ficou na calçada. Ela mordeu o lábio
inferior quando os pensamentos sobre Ben inundaram sua mente. Ele levava
uma vida emocionante em um país novo e maravilhoso. Ela queria estar
com ele.
“Tudo ficará bem “. As palavras de Dorothea tocaram como um sino
de igreja em sua cabeça. Mas realmente ficaria?
Com um suspiro, ela voltou ao seu pequeno escritório. Fechou o livro
de contas e o guardou na gaveta. Quatro pequenas pilhas de moedas
estavam em cima da mesa; salários.
Kitty olhou para o dinheiro. Ela havia se saído bem o suficiente para
empregar uma menina de quatorze anos, Mildred Hollings. Mildred ajudava
na loja e nos fundos da maneira que podia e, embora mal falasse uma
palavra com as pessoas, podia trabalhar melhor do que alguém com o dobro
de sua idade.
Assim como Mildred, Kitty havia contratado uma faxineira. Uma
viúva sem filhos chamada Hetta Smith, que vinha todos os dias para limpar,
lavar e passar. A diferença óbvia entre Mildred e Hetta, além da idade, era o
barulho. Mildred não era apenas quieta, mas também terrivelmente tímida,
enquanto Hetta era alta, falante e fofoqueira. No entanto, felizmente, a
faxineira também era uma alma gentil e generosa.
Ao som da porta dos fundos se abrindo, Kitty saiu da sala.
— Está quente o suficiente para fritar um ovo nas bandeiras – declarou
Hetta quando ela e Connie entraram carregando mantimentos.
Kitty sorriu ao ver as bochechas coradas de Hetta e pegou uma bandeja
de biscoitos, mas o rosto pálido de Connie, em comparação, a preocupou.
Alice cortou um limão e o adicionou a uma jarra de água gelada. —
No verão, eu gosto de passar os domingos perto da praia.
Connie pousou a cesta e pegou o jarro. — Vou levá-lo ao balcão.
Um momento depois, um estilhaço estridente e depois um baque
quebraram a quietude dos salões.
Kitty correu para o salão de chá e encontrou Connie deitada no chão.
— Connie! – Ela caiu de joelhos ao lado de sua amiga doente. — Querida,
fale comigo. – Ela olhou para Hetta. — Diga a Mary para procurar um
médico!
Kitty acariciou a testa de Connie. — Connie, querida, pode me ouvir?
– Connie abriu os olhos lentamente e focou nela. — Fique quieta, querida, o
médico foi chamado. Ficará bem.
— Moça... o que há de errado... comigo?
— Em breve descobriremos.
Mais tarde, Kitty, Mary e Alice ficaram sentadas por uma hora em
volta da mesa nos fundos, enquanto Mildred e Hetta fechavam a loja. Max,
chamado às pressas, esperou no andar de cima até o médico terminar o
exame.
Kitty se levantou e andou de um lado para o outro, suas saias
balançando ruidosamente na quietude da sala.
Impaciente por ouvir qualquer notícia, ela desejava subir as escadas
correndo para ver Connie e falar com o médico, mas sabia que Max queria
um tempo a sós com o médico primeiro.
— Vou aquecer a chaleira, senhorita. – Alice preparou outro bule de
chá que ninguém bebeu.
O movimento todo cessou enquanto o médico descia as escadas. Hetta
e Mildred pararam de limpar o salão de chá para ouvir.
O medo entupiu a garganta de Kitty. — Quais são as novidades, doutor
Myers?
— Bem, Srta. McKenzie, não é o que a senhorita esperaria, acredito
eu. – O médico suspirou e encolheu os ombros ao colocar o casaco que
Mary lhe entregou. — A Sra. Spencer está grávida. Quase seis meses, eu
diria.
— Uma criança? – Chocada, Kitty olhou para o homem como se ele
tivesse duas cabeças. — Ela pensou que estava passando pela mudança.
— Por que ela pensava isso está além da minha compreensão. Tem
cansaço, desmaios e inchaço à volta da cintura, embora não tanto como
deveria, o que é motivado pela ansiedade. Na verdade, há muitas causas de
ansiedade para o parto da Sra. Spencer. – Ele lançou seu olhar cansado para
os rostos preocupados olhando fixamente para ele. — Ela sofreu muitos
abortos no passado quando era muito mais jovem. Para ser sincero com
todos, e como já disse ao Sr. Spencer, duvido que ela conseguirá levar essa
gravidez até o final. Se ela o fizer, não posso garantir que ela ou a criança
sobrevivam ao parto.
Todos ouviram uma respiração alta.
— Por que isso, doutor? – perguntou Hetta, cruzando os braços sobre o
enorme peito, bufando, enquanto seus pequenos olhos castanhos se fixavam
para ele. — Nossa Sra. Spencer é uma mulher forte.
— Sua história passada me diz que essa gravidez não é o que ela
deveria ter neste momento de sua vida. – Ele pegou sua maleta do chão.
— Fala como se ela estivesse em perigo – zombou Hetta.
— Hetta, por favor – calou-a Kitty.
O médico virou-se para Kitty, ignorando a explosão da mulher mais
velha. — Ela deve ter repouso absoluto e com os pés da cama sempre
elevados. O sangramento dela deve ser controlado, ou, bem... pode
imaginar as consequências.
— Ela receberá o melhor atendimento possível, doutor – Kitty disse
calmamente. — Certamente isso e boa comida serão tudo o que ela precisa.
A natureza cuidará do resto, não é?
— Sim, a natureza cuidará do resto, Srta. McKenzie, de um jeito ou de
outro.
Assim que o médico saiu, Kitty subiu as escadas. Essa notícia
inesperada a desnorteou.
Max estava fechando suavemente a porta do quarto quando ela entrou
na sala de estar. Ele envolveu Kitty nos braços. — Oh moça. O que
faremos? Ela não deveria ter bebês. Ela quase morreu da última vez. Eu não
poderia aguentar se algo acontecesse com ela.
— Nada vai acontecer, Max, e nunca mais diga nada assim. Eu
cuidarei dela e tudo ficará bem. – As palavras de Dorothea desapareceram e
Kitty engoliu suas lágrimas repentinas. — No final, será um pai orgulhoso
de um lindo bebê.
— Rezo para que esteja certa, minha menina, realmente é o que quero.
– Max beijou-a na testa, depois desceu as escadas e voltou ao trabalho.
Kitty entrou no quarto de Connie para sentar-se calmamente em uma
cadeira ao lado da cama. Connie parecia pálida, mas descansada.
Kitty segurou a mão da amiga. — Como se sente, querida?
— Melhor.
— Muito bom. Vou descer e lhe fazer um chá.
— Espere. – Connie agarrou a mão de Kitty quando ela ia se afastar.
— Falou com o médico?
— Sim. – Kitty sorriu. — Então, vamos ter um bebê para estragar?
Connie fez uma careta. — Não fique muito animada. O médico me
disse que as chances são pequenas.
— Bem, provaremos que ele está errado, não é?
— Já passei por isso antes, querida. Não é bom, acredite em mim. –
Connie fungou. — Estou surpresa por ter me dado muito bem. Seis meses.
É um recorde para mim.
— Bem, esse é um bom presságio para começar e terá o melhor de
tudo para vê-lo com um final feliz.
— Oh, querida. – Lágrimas caíram nos cílios de Connie e correram por
suas bochechas.
— Não! Pare com isso, Connie. Sem lágrimas. Guarde-as para a
alegria que sentirá quando estiver segurando seu bebê, em alguns meses.
Precisamos pensar positivamente sobre isso, quero dizer. – Kitty apontou
um dedo para ela. – Sente-se, vou providenciar um chá e uma refeição leve.
KITTY SENTOU-SE À mesa da cozinha no andar de cima, afastada de olhares indiscretos, incapaz de oferecer um
rosto feliz aos clientes. Ela sabia que os outros poderiam organizar os salões
de chá.
Vencida pelo desespero, Kitty olhou para o fogo e esperava que,
quando tomasse o chá com Connie, ela não fizesse muitas perguntas sobre a
atmosfera tensa que permeava a casa.
O farfalhar das saias precedeu Dorothea quando ela deslizou para a
sala de estar.
Kitty se levantou para beijar sua bochecha. — Recebeu minha carta?
— De fato.
— Sinto muito incomodá-la com meus problemas, mas não tinha mais
ninguém a quem recorrer.
— Bobagem. Somos uma família ou em breve seremos. Agora, conte-
me tudo.
Quando Kitty terminou de contar a história, Dorothea balançou a
cabeça.
— Uma boa confusão em que o menino se meteu, mas não se
desespere, querida menina. Será resolvido.
— Como? – Kitty andava de um lado para o outro. — Aquele homem
guarda apenas rancor de meu pai para se vingar contra nós. Não posso
acreditar que ainda estejamos pagando pela loucura de nossos pais. Morar
em um porão não foi o suficiente? Eu já perdi um irmão e não posso me dar
ao luxo de perder outro. – Kitty massageou as têmporas. Ela tinha que
permanecer calma. Connie não deveria ouvi-la e ficar chateada.
— Venha, sente-se, querida.
— Não suporto pensar em Joe apodrecendo em alguma prisão...
— Está se tornando dramática, minha querida. Por favor, sente-se e me
escute.
Dorothea acenou e esperou enquanto ela se sentava no sofá. — Não
fiquei parada ontem depois de ouvir as notícias. Fui ver um advogado
amigo meu que está indo para a prisão esta manhã. Teremos o jovem Joseph
em casa antes que perceba. – Dorothea deu um tapinha na mão de Kitty e
sorriu.
— Sério? Quer dizer que Joe pode vir para a casa? – O alívio a deixou
tonta.
— Estou certa disso. Tenho muitos amigos influentes e alguns favores
que me são devidos. Além disso, falei com John e ele também atuará em
seu nome.
— Isso libertará Joe?
— Não duvido. No entanto, Georgina não está muito satisfeita com
esta última provação. Isso lhe deu mais desculpas para argumentar que você
não está em condições de se casar com Benjamin. Deve garantir que Joe
fique longe de mais problemas. Caso contrário, minha filha terá prazer em
usar isso para manter você e Benjamin separados.
— Eu entendo. – Kitty assentiu, sua estima por Georgina havia
diminuído mais um pouco. — Imagino que Georgina tenha gostado do meu
desespero?
— Não foi prazer, não, mas ela mencionou isso como mais uma prova
de que sua união com Benjamin seria desastrosa. – Dorothea se endireitou.
— Chega disso. Precisamos nos concentrar em Joe e sua libertação.
— Oh, Dorothea. Como posso retribuí-la?
Dorothea piscou. — Bem, um bom começo seria fazer um chá para
nós enquanto eu vou sentar com Connie.
Passava das seis da noite quando Joe entrou na sala de estar para uma
enorme recepção. Ele estava sujo, com fome e um pouco abatido, mas Kitty
e Mary logo o colocaram no banho e o esfregaram.
Em uma camisa de dormir limpa, ele comia carne e legumes cozidos
como se não comesse há meses. Em pouco tempo, sua cabeça caiu de
fadiga.
— Venha, Joe. – Kitty o ajudou a sair da mesa.
Ela o colocou na cama e sentou-se ao seu lado, cobrindo-o até o
queixo. Nunca em sua vida seria capaz de retribuir Dorothea por trazer Joe
para casa novamente. Ela não fez perguntas sobre como isso aconteceu.
Estava apenas agradecida pela libertação de Joe de volta aos seus cuidados.
Joe olhou para ela com olhos lacrimejantes. — Sinto muito, Kitty. Eu
não quis causar nenhum problema.
— Bem, você causou. Por que fez uma coisa dessas?
Joe encolheu os ombros. — Eu suponho que... para mostrar que eu
podia, isso é tudo.
— Roubou porque podia? – Kitty se virou, sua raiva latejando,
desesperada por libertação. — Me envergonha.
— Eu sinto muito.
Ela girou de volta para ele. — Reconheceu o homem?
— Não, ele estava exibindo seu dinheiro quando saiu de uma loja. Ele
é apenas um idiota!
— Como nós éramos?
A cor saiu do rosto de Joe. — Não somos mais, somos?
— Foi por esse motivo que fez isso, porque não temos mais uma casa
bonita e dinheiro?
Ele deu de ombros novamente e se recusou a encará-la.
—Discutiremos isso outra hora, mas estou informando agora,
Joseph McKenzie, se voltar a fazer uma coisa dessas, deixarei que o
mandem para a prisão. Me entendeu?
Uma lágrima lenta escorreu por sua bochecha. — Eu não farei isso de
novo, prometo.
— Bem, não terá a chance de fazê-lo novamente. Amanhã de manhã,
você e Clara vão começar em uma nova escola. Uma escola que possui um
nível um pouco mais alto do que a que frequentam agora. Vai me custar
muito dinheiro, mas valerá a pena se isso o mantiver longe de problemas.
— Eu não quero ir para outra escola, Kitty. Por favor, não nos envie
para outro lugar.
— É o melhor, Joe. Não quero que se misture com aqueles meninos
com quem brinca. Eles são piores que os filhos dos cortiços. Quando
saímos do porão, eu deveria ter mudado você e Clara para uma nova escola
mais próxima dos salões de chá. No entanto, pensei que você preferiria ficar
na mesma escola perto de Walmgate. Vejo agora que estava errada.
— Mas, Kitty...
— Não, Joe! Não fale mais. Minha decisão está tomada.
— Mas...
— Percebe o quão perto esteve de ficar na prisão por anos? – O tom
dela o açoitou, tentando fazê-lo ciente de quão perto ele estava da ruína.
Ele abaixou o olhar. — Sim.
— Bem, pense um pouco mais e seja grato por termos amigos
maravilhosos como Dorothea Cannon. Agora, vá dormir, tem um grande dia
amanhã, antes e depois da escola.
Joe lutou para se sentar quando Kitty se afastou. — O que quer dizer?
Kitty virou-se para a porta. — Você, jovem, tem um dia inteiro de
trabalho pela frente. Obviamente, eu o deixara ter muita liberdade, que
agora perdeu. Portanto, existem muitos pequenos trabalhos na loja que são
de sua responsabilidade a partir de agora. Não achou que poderia me
preocupar assim e se safar, não é? Mudar de escola será a menor das suas
preocupações, rapazinho.
Querida Kitty.
Meu amor, não posso começar a falar sobre as delícias da cidade.
Sydney é uma maravilha, mas primeiro devo perguntar por sua saúde e de
sua família. Rezo para que esteja bem.
Kitty, você adoraria, o senso de aventura que circunda a área. O porto
é uma delícia, uma beleza natural e muito emocionante, com navios
estrangeiros indo e vindo continuamente. Existem pessoas de todas as
nações que estão começando uma nova vida, mas é claro que a influência
britânica é proeminente em todos os lugares. Há momentos em que você
realmente sente que está em casa, na Inglaterra. Pode-se passar por
multidões e ouvir todos os sotaques do nosso país em uma única rua.
Desde que cheguei aqui, no último dia de maio, tenho estado
extremamente ocupado em encontrar pessoas conhecidas de meu pai.
Iniciar nosso próprio negócio não será tão difícil quanto eu imaginava.
Estou rapidamente fazendo muitos contatos e, de fato, bons amigos. Em
breve, terei tempo para investigar esta terra de oportunidades. Admito que
me excita o fato de que estarei me aventurando além das fronteiras de
Sydney e entrando em campo aberto.
Disseram-me que partes da expedição partem regularmente para
explorar a vastidão dessa terra quente e seca, e novos municípios estão
simplesmente evoluindo em questão de dias, em lugares onde, algumas
semanas antes, havia apenas arbustos impenetráveis. A atividade agitada
daqui Kitty, me deixa ansioso para terminar meu trabalho na cidade e estar
me aprofundando no campo.
Eu sinceramente espero que você esteja sentindo minha falta e que eu
ainda tenha seu amor.
Em meus pensamentos sempre,
Benjamin.
Kitty leu a carta mais uma vez antes de sair rumo ao quarto de Connie.
Ela bateu suavemente na porta e entrou. O último mês de descanso colocou
peso na estrutura magra de Connie e ela parecia mais saudável. Agora,
havia mais cabelos grisalhos entre o seu próprio marrom natural e algumas
linhas de preocupação extras adornavam seu rosto, mas o Dr. Meyers, que a
visitava uma vez por semana, estava feliz com seu progresso.
Connie reclinada contra travesseiros, tricotando uma meia, sorriu
quando Kitty entrou. — Como estão as coisas?
— Acabei de receber uma carta de Ben. – Kitty falou enquanto lhe
fazia um carinho.
— Oh, querida, estou muito feliz por você. Ele está bem?
— Sim, ele parece extremamente feliz. Ele envia seus cumprimentos a
todos. Ele enviou outra carta, mas eu não a recebi. – Isso a entristeceu por
um momento, mas ela rapidamente voltou a reluzir e beijou a carta.
— Bem, não importa, querida. Pelo menos tem essa aqui e é melhor
que nada.
Kitty sentou-se na cama. A carta havia tirado um peso de seu coração.
Ela duvidara que seu amor continuasse assim que ele a deixasse, mas a
prova contrária liberou uma onda de emoção.
Ela não sabia se ria ou chorava. — Quer que eu leia para você?
— Sim, prossiga, pois não terei paz até o faça. – Connie riu.
Capítulo Treze
K ITTY OLHOU AO redor do salão para as pessoas que estavam de pé ou sentadas nas mesas bebendo chá e comendo
sanduíches e bolos. Houve uma grande adesão. Deixariam Max orgulhoso. Muitos de seus colegas de trabalho e amigos foram até
o cemitério e a maioria voltou com a família para as homenagens, ali. Um bom número deles teve que ficar na sala dos fundos ou
no pátio devido à multidão. As pobres Alice, Mildred e Hetta, se encarregaram de servir a todos; até Clara fez a sua parte.
Kitty deu um sorriso encorajador enquanto ela passava com uma bandeja de
sanduíches.
Kitty percebeu que odiava a cor preta. Ela dominava a sala. Quase
todo mundo nos salões de chá a usava.
As meninas colocaram material preto nas janelas e amarraram fitas
pretas ao redor de cada vaso de flores em todas as mesas.
Parecia que todas as cores haviam desaparecido. Ela queria ver algo
brilhante e alegre e estava completamente envergonhada por ter pensado
nisso nesse dia terrível.
Dois dias era todo o tempo transcorrido. Dois dias. Para Kitty, parecia
dois anos. O tempo parou desde que Max morreu, e ela não sabia como
seguiriam em frente sem ele.
Ela olhou para Connie, sentada ao lado de Dorothea e Mary. Apesar de
sua provação, ela parecia bem, embora muito pálida, como se estivesse
envolta em uma aura pacífica. Kitty tremia. “Nada mais pode acontecer
com aqueles que eu amo, ou ficarei louca. “
—Você está bem? – Martin colocou a mão no ombro dela.
Ela estendeu a mão e acariciou seu rosto. Hoje ela também perdia o
irmão. Uma grande tristeza brotou por dentro, ameaçando sufocá-la. Ela
tinha que ser corajosa.
— A que horas sai o seu trem para Londres?
— Não vou. – Kitty franziu o cenho.
— Não vai?
— Não. Ficarei em casa! Precisará de mim agora.
Kitty se endireitou. — Ah, não. Não, Martin. Partirá naquele trem hoje
e navegará para uma nova vida. Uma pessoa nesta família sacrificando seus
sonhos já é suficiente. Eu não o deixarei fazer o mesmo.
— Mas sem Max para ajudar nos salões e sem seu salário, eu pensei...
— Não, Martin, não. Irá, e não discutirei mais sobre isso. – Ela sorriu
para aliviar suas palavras. — Eu te amo e sentirei sua falta, mas não o
deixarei ficar aqui quando tanta coisa lá fora o espera. Então, vá! Arrume
seus pertences e depois diga adeus a todos nós. – Kitty ficou na ponta dos
pés e beijou sua bochecha. — Oh, como sentirei sua falta.
Mais tarde naquela noite, Kitty e Connie sentaram-se em ambos os
lados do fogo na sala de estar. Com todos dormindo, o assobio do fogo era o
único som. Kitty olhou através da borda da xícara para Connie e novamente
teve a impressão de que ela estava em paz. Kitty se perguntou como poderia
estar depois de perder Max. — Está muito cansada?
Connie olhou para ela. — Não, moça.
— Posso pegar alguma coisa para você?
— Não, não há nada que possa pegar para mim.
Kitty hesitou. — Acho que lidou extremamente bem com esse
pesadelo, considerando as circunstâncias. – A voz dela falhou de emoção.
— Eu te admiro!
Connie sorriu. — Isso é porque não tenho mais medo.
Intrigada, Kitty franziu o cenho. — Medo? De quê?
— De ter esse bebê. Veja bem, agora Max está esperando por nós, não
tenho medo de morrer.
Chocada com essa confissão, Kitty ficou olhando-a. — M... mas você
não vai morrer, Connie, e esse bebê também não.
Connie se virou para encarar o fogo. — Não pode garantir isso, minha
querida. Não que isso importe, porque Max vai cuidar de nós. Ele foi
primeiro para não ser deixado para trás.
— Não vou ouvir esse tipo de conversa, Connie. – Disse isso,
apertando-lhe a mão. — Está me dizendo que está disposta a morrer, você e
esse bebê? É isso que está me dizendo?
Connie se levantou do sofá e olhou para Kitty com uma expressão
resoluta. — Tudo o que estou dizendo é que, se eu ou o bebê morrermos,
tudo ficará bem, já que Max estará lá para cuidar de nós!
— Bem, isso não acontecerá, e você precisa acreditar nisso também.
— Não cabe a nenhum de nós dizer o que vai acontecer, apenas o
destino pode decidir.
Connie se inclinou e deu um beijo na bochecha de Kitty. — Boa noite,
moça.
A noite trouxe uma cobertura de neve macia para a cidade de York. O
inverno ainda estava a um mês, mas a natureza decidiu alertar
antecipadamente o povo de que o frio estava ali e permaneceria por muito
tempo. As pessoas agiam um pouco mais rápido agora, tentando concluir
seus negócios para que pudessem estar em ambientes fechados, onde estava
mais quente.
Os idosos se queixavam de ossos doloridos e dores nas articulações ao
pensar em outro longo período de frio. Enquanto as mães pobres e
perseguidas se perguntavam se poderiam passar outro inverno com roupas
já muito curtas e gastas para seus filhos. O primeiro dia de abertura após o
funeral de Max mostrou-se movimentado. O tempo frio deu às pessoas a
desculpa para pedirem uma xícara de chá ou uma tigela de sopa saborosa
que as aquecesse antes de seguirem seus caminhos novamente. Alice fez
muitas tortas salgadas quentes e pastéis, que provaram ser tão populares
quanto seus bolos.
A porta dos fundos se abriu quando Hetta, com flocos de neve em seu
casaco e chapéu, marchou carregando uma cesta de vime cheia com as
roupas recém passadas da família. — A neve estará a um metro de
profundidade ao anoitecer, pode escrever o que estou dizendo! – Ela bufou,
colocando a cesta no chão e depois tirou o chapéu e o casaco. — Como
estão? – Ela as cumprimentou. Não esperando uma resposta, ela foi
diretamente a um conto sobre um inverno, que nevou por semanas a fio,
prendendo idosos em suas próprias casas.
— Pare de conversar, mulher e tome um chá – disse Connie. Indo até a
beira da cadeira, ela usou a mesa como apoio para conseguir se levantar.
— Se crescer mais, Sra. Spencer, explodirá! – Hetta balançou a cabeça
em desaprovação. — Não é o que eu gostaria.
Os olhos de Connie se estreitaram para a outra mulher. — Acha que
usar tendas como roupas é divertido?
Kitty se colocou entre elas e pegou o braço de Connie. —Subirá para
descansar? Dr. Myers...
— É um idiota – zombou Connie. Inesperadamente, ela gemeu e
balançou para o lado.
— Connie! – Kitty colocou suas costas na cadeira.
— Oh, querida! – Connie olhou para baixo. Uma mancha ensopada se
espalhou por suas saias. Todo mundo olhou, hipnotizadas pela visão.
— Eu tive uma dor estranha a noite toda. Só que pensei que era apenas
o bebê se mexendo.
Mary entrou na sala dos fundos com o pedido de um cliente. — O que
aconteceu? – Como se o tom de Mary provocasse algo em suas mentes,
todos se moveram ao mesmo tempo em pânico.
— Connie está tendo o bebê. – Kitty se perguntou se suas pernas a
sustentariam, tal era sua ansiedade.
— Precisamos ajudá-la a se deitar. – Alice começou a encher uma
panela grande com água da chaleira. — Água quente, precisamos de água
quente.
Kitty e Mary ajudaram Connie a subir.
— Precisamos das toalhas velhas para cobrir os lençóis, Mary –
instruiu Kitty.
Ela mordeu o lábio inferior. Por semanas, ela estava se organizando
silenciosamente para esse dia e agora que chegou, estava tão nervosa e com
medo de que tudo não corresse tão bem quanto ela planejara.
A declaração de Connie na noite do funeral de Max permanecia em
sua mente.
Connie segurou a mão de Kitty. — Ouça! Quero dizer isso agora, caso
não tenha chance mais tarde.
— Não, Connie, por favor...
— Ouça. Ninguém sabe o futuro, querida! Então, eu quero que saiba
que eu te amo. Eu amo todos vocês, e se eu ficar com Max e o bebê ficar
aqui, então lhe dirá que seus pais o amavam muito? Dirá isso? – Os olhos
dela imploravam a Kitty.
Kitty assentiu, com a voz embargada. — Venha, vamos ficar à
vontade. Então poderá tomar uma xícara de chá. Temos uma longa noite
pela frente. – Essas palavras assombraram Kitty quando a tarde chegou e
Connie só teve a dor estranha mais ou menos a cada hora. Por quase oito
horas, além da dor nas costas constante, Connie não sofreu mais dores.
Alice e sua mãe, Nora, a parteira local estavam conversando com Mary.
Hetta, Deus abençoe sua alma amável, levou Joe, Clara e Rosie para casa
com ela para salvá-los de ouvir os gemidos de Connie.
— Bem, Sra. Spencer. – Kitty sorriu. — Que tal um jogo de cartas?
— Sim, também, já que nada mais... – Connie contorceu seu rosto de
dor.
Imediatamente, Kitty acariciou sua mão. — Está muito difícil?
O gemido baixo de Connie chamou a atenção das mulheres na sala de
estar. Em segundos o quarto estava cheio. Nora foi direto para Connie e
esfregou suas costas enquanto ela se arqueava de dor.
— Agora, moça, é isso, vamos lá. Muito bem – murmurou Nora.
A dor recuou e Connie relaxou novamente. — Essa foi pior ainda.
Obviamente, o pequeno ser decidiu se mexer.
Nora assentiu, sorrindo. — Acho que deveria tentar dormir enquanto
pode. – Ela enxotou todo mundo de novo, exceto Kitty, que se recostou na
cadeira.
Pelas próximas três horas, Connie cochilou entre dores intensas. Os
outros sentiram que o trabalho de parto estava progredindo e Alice, em seu
nervosismo, tinha tanta água fervida pronta que fez todo mundo rir! Kitty
pediu que Mary sentasse com Connie enquanto ela se lavava. Em seu
quarto, Kitty ficou de pé junto à janela e olhou para a rua. A neve recém
caída dava uma aparência limpa. Ela ajoelhou-se no parapeito da janela
para rezar pelos destinos desconhecidos, pedindo que Connie e seu bebê
fossem poupados.
— Deus, eu sei que não tenho sido um crente obediente, mas eu
imploro que o Senhor me ouça agora. Deixe que tenham vidas longas e
felizes, por favor – ela sussurrou.
Abrindo os olhos, ela se levantou com uma sensação de paz.
Enquanto lavava o rosto e as mãos, o anel de noivado brilhava à luz da
lâmpada. Kitty beijou sua pedra esmeralda para dar sorte e sorriu. Sentia
falta de Ben mais esta noite do que qualquer outra. Ela desejava ver seu
sorriso e sentir os braços dele ao seu redor, ouvir sua voz e ver seus olhos
brilharem só para ela. Com um suspiro profundo, endireitou os ombros e
voltou para Connie e o destino que as esperava. Quando o relógio bateu
uma hora da manhã, Nora ficou entrincheirada no final da cama.
— Certo, agora Sra. Spencer, está com vontade de empurrar?
— Nãooooo! – Connie gemeu entre dentes enquanto a contração
atingia o pico.
— Isso é bom! Bem! Sentirá quando for a hora certa – disse Nora,
observando o movimento entre as pernas esticadas de Connie.
Mary e Kitty, nos dois lados da cama, seguravam as mãos de Connie e
enxugavam a testa quando necessário.
— Está indo tão bem, querida, tão bem. Kitty a encorajou.
— Já me cansei – Connie bufou, com o rosto molhado de suor.
— Em breve tudo terminará, e seu bebê estará em seus braços! – Ela
ajudou Connie a tomar um gole de água em um copo.
— Não, não. Levará muito tempo. Sei que não vou conseguir. –
Connie entrou em pânico quando outra dor tomou conta dela. Ela apertou
suas mãos até o sangue parar de fluir, mas Mary e Kitty ignoraram isso
enquanto a ajudavam na provação. Sobre os telhados, o céu iluminou-se ao
longe, anunciando um novo amanhecer. Só que, acima dos salões de chá,
Connie enfraquecia. Meia hora antes, Nora havia enviado Alice até o
médico. Horas de constantes contrações e dores a haviam exaurido.
Nora puxou Kitty para o lado. — Estou preocupada que o bebê esteja
preso ou revirado no útero.
— Mas o médico saberá o que fazer? Kitty sussurrou.
— Sim, mas é um trabalho complicado. Com a força de suas dores,
essa bebê já deveria estar saindo e isso não está acontecendo.
Um gemido de Connie, tomado por outra contração, as interrompeu.
Desta vez houve uma mudança sutil nela quando a natureza se fez ouvir!
Connie agarrou suas coxas e empurrou. Um barulho áspero veio do fundo
de seu peito e seu rosto tornou-se rubro pelo esforço.
Gotas de suor irromperam na testa de Nora e seus cabelos grisalhos
ficaram grudados. Ela olhou para cima, do seu lugar no final da cama. —
Posso ver a cabeça, Sra. Spencer! Isso é bom! Agora, mais devagar, acabará
em um minuto, vá com calma.
Uma agitação na porta anunciou a chegada do doutor Myers com Alice
logo atrás dele. Ele entendeu a situação e chamou Nora um minuto para que
pudessem conversar em particular. A atenção deles foi logo desviada de
volta para Connie, quando ela se levantou novamente para segurar suas
pernas e empurrar. O doutor Myers falou com ela sobre isso e a elogiou
assim que terminou. Ele lavou as mãos e depois sentiu o estômago dela. Por
alguns minutos, ele ouviu e sondou seu monte estendido.
— Acho que são gêmeos, Sra. Spencer! – declarou ele, antes de se
retirar para o final da cama.
Connie, descansando entre dores, estremeceu com as palavras do
médico. — Não...
— Gêmeos! – Kitty e Mary falaram juntas! Connie olhou para elas
com medo quando outra onda de dor desceu sobre ela.
— Certo, Sra. Spencer, se esforce agora! Precisamos tirar esses
pequeninos – disse ele quando a cabeça do bebê surgiu. Rapidamente, ele
procurou o cordão umbilical em volta do pescoço. No momento seguinte, o
Dr. Meyers virou os ombros e o bebê deslizou sobre a cama. — É um
menino!
Kitty correu para beijar a bochecha vermelha e quente de Connie.
— Ele está vivo? – resmungou Connie.
Como se sentisse a dúvida de sua mãe, o sujeito minúsculo rugiu sua
fúria por ter sido, sem cerimônia, limpo com um pano quente por Nora.
— Ele tem um bom par de pulmões – declarou Nora, passando a
tesoura ao médico para ele amarrar e depois cortar o cordão. Logo depois,
Nora pegou o bebê e o envolveu em um cobertor macio de lã. — Mary,
venha. Segura este pequeno, pois há mais trabalho a ser feito.
Lágrimas se formaram nos olhos de Mary quando Nora lhe deu o bebê.
Lentamente, ela foi para a cama e se abaixou para mostrar a Connie seu
primeiro filho, seu filho. Connie levantou a cabeça para admirar o pequeno
milagre.
— Meu filho – ela sussurrou.
— Oh, Connie, como ele é bonito – Felicidade e alívio saíram de Kitty.
— Ele é tão bonito quanto seu pai.
— Acho que deve descansar um pouco antes que o próximo apareça,
Sra. Spencer – murmurou o Dr. Myers.
— Vou fazer uma xícara de chá para ela – disse Alice, saindo
correndo.
Dez minutos depois, Connie arfou e se esforçou para empurrar o
próximo bebê para fora.
— Espere, Sra. Spencer, espere – instruiu Myers. — A cabeça está
fora, mas preciso verificar o cordão.
Com a próxima contração, Connie empurrou.
— Tem uma filha, Sra. Spencer. Parabéns. – O doutor Myers limpou as
vias aéreas da bebê.
— Ela está bem? – Connie tentou se sentar, ansiosa porque o novo
bebê não havia chorado.
Antes que o médico pudesse responder, o menino nos braços de Mary
chorou e a pequena menina respondeu com seu primeiro lamento. Connie
recostou-se nos travesseiros e fechou os olhos. — Está feito, Max, eu
consegui, meu amor.
Apenas Kitty ouviu o sussurro de Connie.
— Connie! – Kitty, pensando que ela estava se afastando deles,
sacudiu os ombros de Connie com força. Assustados, os olhos de Connie se
abriram. Kitty gritou em seu rosto. — Não ouse me deixar.
— Estou cansada, querida, muito cansada – murmurou Connie. — Por
que está gritando?
Kitty inclinou a cabeça. Lágrimas tremeram na ponta de seus cílios. —
Eu sinto muito. Eu pensei... eu... não importa.
O doutor Myers espiou por cima das pernas dobradas de Connie. —
Seu trabalho ainda não terminou, Sra. Spencer. Há o pós-parto. Então
poderá dormir o dia inteiro. – Ele sorriu para ela.
Pouco tempo depois, Alice e Nora limparam Connie e arrumaram a
cama com lençóis limpos. Kitty sentou-se com a menina nos braços ao lado
de Mary, que segurava o menino. Eles viram como Connie, vestindo uma
camisola nova, recostava-se contra almofadas grossas e bebia uma xícara de
chá.
— Dois bebês. – Kitty sorriu para Connie. Seu medo de perder Connie
havia diminuído agora, quando a cor voltou às suas bochechas.
— Como serão chamados, então? – perguntou Nora, juntando os
lençóis sujos em uma cesta pronta para descer e ferver.
— Charles e Adelaide – anunciou Connie. — É um alívio
finalmente dizer o nome deles. Fiquei atormentada dia e noite pensando
que isso pudesse acabar em nada mais que um desastre.
Kitty agarrou a mão dela. — Isso é porque não me ouviu.
— Meu Deus, são nomes bonitos e não há erro – declarou Nora.
— Bem chique. – Connie sorriu. — Eu tive muito tempo para
examinar os livros de Kitty enquanto fiquei na cama por todos esses meses.
Eu estava olhando um livro sobre a Austrália e notei uma cidade chamada
Adelaide. Gostei e Max também. – O lábio inferior dela tremeu.
— E Charles? – Indagou Mary, segurando o recém-nomeado Charles
Spencer.
— Charles é o nome do pai de Max. Max queria. – Connie enxugou as
lágrimas e fungou.
— Os dois são bons nomes. – Kitty beijou a cabeça macia e delicada
de Adelaide. — Tenho certeza de que Max está sorrindo, muito orgulhoso
de seus bebês.
Capítulo Quatorze
Querida Kitty,
Serei breve, pois o tempo está contra mim, sou necessária a cada
passo.
John morreu na noite passada. Seu coração cedeu durante uma
discussão com Georgina. Estou em Kingsley Manor e permanecerei aqui
por ora. Não deve me visitar aqui, pois sinto que as consequências seriam
terríveis com relação a você e Georgina. O médico teme por sua sanidade.
Escreverei novamente em breve com relação aos nossos planos.
D.
Kitty mordeu o lábio. Pobre Sr. Kingsley. Ela olhou para o anel de
noivado e pensou em Ben. Levaria meses para que ele soubesse que seu pai
havia morrido. Ela leu a carta novamente e estremeceu em resposta ao aviso
de Dorothea.
“Não se preocupe, Dorothea, não desejo mais ver Georgina. “
1866 –
O caminho de Kitty McKenzie a levou das favelas de York para a selva
inóspita da Austrália colonial. No entanto, quando acredita que seus sonhos
nunca serão alcançados, a ela é mostrado que às vezes a vida pode ser ainda
melhor do que o que se deseja.
Kitty McKenzie ganha uma terra privilegiada no extremo norte de
Nova Gales do Sul. Ela enfrenta muitas dificuldades enquanto aprende a se
tornar uma proprietária de terras bem-sucedida. No entanto, sua força de
vontade e crença em si mesma, dão a Kitty uma coragem que a maioria das
mulheres de seu tempo nunca alcançaria.
Mas algo nas proximidades a incomoda.
É o arrogante e paternalista Miles Grayson, determinado conseguir
interromper seu caminho. Ele quer que ela vá embora para que ele possa ter
sua terra. O único problema é que ele quer a ela, ainda mais.
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