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Fundamentos de Electrónica

Teoria
Cap.1 - Semicondutores

Jorge Manuel Torres Pereira


IST-2010
ÍNDICE

CAP. 1 - SEMICONDUTORES

Pág.
1.1 Introdução ................................................................................................................... 1.1
1.2 Semicondutores simples e compostos ....................................................................... 1.2
1.3 Modelo das ligações covalentes e das bandas de energia ........................................ 1.8
1.4 Semicondutores compostos ternários e quaternários.
Variação das propriedades com a composição ...................................................... 1.13
1.5 Semicondutores intrínsecos e extrínsecos em equilíbrio termodinâmico ............ 1.18
1.5.1 Semicondutores intrínsecos ......................................................................... 1.18
1.5.2 Semicondutores extrínsecos ......................................................................... 1.22
1.6 Geração e Recombinação ........................................................................................ 1.29
1.6.1 Efeito fotoeléctrico interno .......................................................................... 1.31
1.7 Cálculo de n e p em semicondutores não degenerados ......................................... 1.34
1.7.1 Electrão num poço de potencial de altura infinita .................................... 1.34
1.7.2 Densidade de estados em energia ............................................................... 1.36
1.7.3 Densidade de estados em energia para os electrões num cristal .............. 1.39
1.7.4 Estatística de Fermi-Dirac ........................................................................... 1.40
1.7.5 Cálculo da densidade de electrões e buracos no semicondutor ................ 1.44
1.7.5.1 Localização do nível de Fremi no semicondutor
intrínseco e extrínseco .................................................................... 1.46
1.7.5.2 Densidade intrínseca. Variação com a temperatura ................... 1.47
1.8 Condução .................................................................................................................. 1.49
1.9 Efeito de Hall ............................................................................................................ 1.60
1.10 Difusão ....................................................................................................................... 1.64
1.11 Equação da continuidade ........................................................................................ 1.66
1.11.1 Exemplos de aplicação da equação da continuidade a
várias situações importantes ....................................................................... 1.68
SEMICONDUTORES

1.1. Introdução

Os materiais semicondutores vão colher a sua designação ao facto de, em geral,


possuírem um valor de condutividade eléctrica que é inferior ao dos materiais condutores mas
superior ao dos materiais isolantes. Contudo, nos extremos do intervalo, os valores de
condutividade para os semicondutores podem sobrepor-se aos valores referenciados para os
isolantes e condutores. Sendo assim o valor da condutividade por si só não é em geral
suficiente para determinar se o material é ou não semicondutor. Esta classificação exige ainda
a análise do tipo de variação de condutividade com a temperatura e do tipo de portadores de
carga responsáveis pela condução eléctrica.
Na Tabela 1.1 apresentam-se, de forma simplificada, algumas características associadas
à condutividade eléctrica e que permitem estabelecer uma classificação mais precisa dos
vários tipos de materiais.

Tabela 1.1
Condutividade eléctrica para vários tipos de materiais.
Material Condutividade Variação com a subida Tipo de portadores
(S/m) da temperatura de carga
Condutor 10 5 – 10 8 diminui Electrões
Semicondutor 10 -8 – 10 6 aumenta Electrões e buracos
-16 -7
Isolante 10 – 10 aumenta Iões e electrões

A estrutura do material semicondutor pode ser cristalina, amorfa ou policristalina. Uma


estrutura cristalina é caracterizada por uma disposição ordenada e regular dos átomos no
espaço. O material policristalino engloba todas as situações em que o material pode ser visto
como um agregado de cristais com várias orientações e tamanhos. No entanto é usual designar
por microcristal todo aquele em que o tamanho dos cristais constituintes é suficientemente
pequeno para só poderem ser observados com ajuda dum microscópio. No material amorfo a
ordem só é mantida a curta distância, isto é, entre os átomos vizinhos mais próximos.
Alterações muito pequenas nos ângulos de ligação e nas distâncias entre os átomos são
1.2 SEMICONDUTORES

suficientes para que a estrutura resultante deixe de apresentar a regularidade e ordem


característica dos cristais, que possuem centros, eixos ou planos de simetria claramente
definidos. Os materiais amorfos são isotrópicos enquanto que os materiais cristalinos, em
geral, são anisotrópicos.

1.2. Semicondutores simples e compostos

Os materiais semicondutores simples puros são constituidos por átomos de um único


elemento da Tabela Periódica, como é o caso do Silício (Si) ou do Germânio (Ge). Os
semicondutores compostos puros possuem átomos de vários elementos da Tabela Periódica,
por exemplo, SiGe, GaAs, InGaAs, InGaAsP, etc. É de realçar que quer os semicondutores
simples quer os semicondutores compostos podem ter alguns dos seus átomos de base
substituídos por outros, designados por impurezas de substituição que, embora numa
concentração muito reduzida relativamente aos átomos de base, são responsáveis por uma
alteração significativa das suas propriedades eléctricas e ópticas.
Os semicondutores simples mais importantes são o Si e o Ge, que pertencem ao grupo
IV da Tabela Periódica, Tabela 1.2. Estes elementos possuem uma configuração electrónica
caracterizada por quatro electrões de valência, com orbitais p parcialmente preenchidas. A
configuração electrónica estável, isto é, com as orbitais p completamente preenchidas, exige a
inclusão de mais quatro electrões que, para o Si e Ge, se obtêm através de ligações covalentes
entre um átomo do elemento com quatro átomos vizinhos. A disposição espacial dos átomos
corresponde a ter um deles no centro dum tetraedro e os quatro átomos vizinhos nos vértices
do tetraedro, Fig. 1.1.

Si

Si Si

Si
Si

Fig. 1.1 – Disposição espacial dos átomos de Si no cristal onde se evidencia a ligação covalente de um
átomo de Si, no centro do tetraedro, aos 4 átomos vizinhos nos vértices do tetraedro.
SEMICONDUTORES 1.3

Tabela 1.2
Parte da Tabela periódica onde se indicam os grupos que contêm
elementos que entram na constituição dos semicondutores.
Gases Raros
Legenda
Nome Nº atómico Hélio 2
Boro 5 Símbolo
He
Constante de 3,57 0,179
rede (Å) B Massa específica
(g/cm3) 1 /26atm) HEX
8,73 2,34
3A 4A 5A 6A 7A 1s2
2600 TET
2 2 1
Temperatura 1s 2s 2p Boro 5 Carbono 6 Azoto 7 Oxigénio 8 Flúor 9 Néon 10
de fusão (K)
B C N O F Ne
Configuração Rede
Electrónica cristalina 8,73 2,34 3,57 2,26 4,039 1,03 6,83 1,43 1,97 4,43 1,56
2600 TET 4300 DIA 63,3 HEX 54,7 CUB 53,5 MCL 24,5 CFC
1s22s22p1 1s22s22p2 1s22s22p3 1s22s22p4 1s22s22p5 1s22s22p6
Alumínio 13 Silício 14 Fósforo 15 Enxofre 16 Cloro 17 Argon 18
Al Si P S Cl Ar
4,05 2,70 5,43 2,33 7,17 1,82 10,47 2,07 6,24 2,09 5,26 1,78
933 CFC 1683 DIA 317,3 CUB 386 ORT 172,2 ORT 83,9 CFC
2 1 2 2 2 3 2 4 2 5 2 6
1B 2B [Ne]3s 3p [Ne]3s 3p [Ne]3s 3p [Ne]3s 3p [Ne]3s 3p [Ne]3s 3p
Cobre 29 Zinco 30 Gálio 31 Germânio 32 Arsénico 33 Selénio 34 Bromo 35 Kripton 36
Cu Zn Ga Ge As Se Br Kr
3,61 8,96 2,66 7,14 4,51 5,91 5,66 5,32 4,13 5,72 4,36 4,79 6,67 4,10 5,72 3,07
1356 CFC 693 HEX 303 ORT 1211 DIA 1090 ROM 490 HEX 266 ORT 116,5 CFC
10 1 10 2 10 2 1 10 2 2 10 2 3 10 2 4 10 2 5 10 2 6
[Ar]3d 4p [Ar]3d 4s [Ar]3d 4s p [Ar]3d 4s p [Ar]3d 4s p [Ar]3d 4s p [Ar]3d 4s p [Ar]3d 4s p
Prata 47 Cádmio 48 Índio 49 Estanho 50 Antimónio 51 Telúrio 52 Iodo 53 Xenon 54
Ag Cd In Sn Sb Te I Xe
4,09 10,5 2,96 8,65 4,59 7,31 5,82 7,30 4,51 6,62 4,45 6,24 7,27 4,94 6,20 3,77
1234 CFC 594 HEX 429,8 TET 505 TET 904 ROM 723 HEX 387 ORT 161,3 CFC
[Kr]4d105s1 [Kr]4d105s2 [Kr]4d105s25p1 [Kr]4d105s25p2 [Kr]4d105s25p3 [Kr]4d105s25p4 [Kr]4d105s25p5 [Kr]4d105s25p6
Ouro 79 Mercúrio 80 Tálio 81 Chumbo 82 Bismuto 83 Polónio 84 Astato 85 Radon 86
Au Hg Ti Pb Bi Po At Rn
4,06 19,3 2,99 13,6 3,46 11,85 4,95 11,4 4,75 9,8 3,75 9,4 (4,4)
1337 CFC 234,3 RBD 577 HEX 601 CFC 544,5 ROM 527 CUB (575) (202) CFC
14 10 2 1 14 10 2 2 14 10 2 3
14 10 1
[Xe]4f 5d s 14 10 2
[Xe]4f 5d s [Xe]4f 5d 6s 6p [Xe]4f 5d 6s 6p [Xe]4f 5d 6s 6p [Xe]4f 5d 6s 6p4 [Xe]4f145d106s26p5
14 10 2
[Xe]4f 5d 6s26p6
14 10

Uma certa disposição no espaço de quatro destes tetraedros é que vai dar origem à
célula básica da estrutura cristalina, Fig. 1.2. Esta célula básica, designada por rede do
diamante, é um cubo caracterizado pelo valor da sua aresta, a constante de rede. É a repetição
periódica deste cubo nas três direcções do espaço que vai dar origem ao cristal. A rede do
diamante possui 8 átomos (4 do interior mais 6×1/2 das faces mais 8×1/8 dos vértices) e pode
ser visualizada em termos de duas redes cúbicas de faces centradas, em que uma delas de
deslocou relativamente à outra ao longo de uma diagonal interior.

Exemplo 1.1 – Determinar o número de átomos de Si num cm3 e num m3.

Solução:

A constante de rede para o Si é 5,43 x10-8 cm e por isso o volume da célula unitária é
1,6x10-22 cm3. Havendo 8 átomos por célula unitária então o número de átomos de Si num
cm3 é 8/1,6x10-22= 5x1022. Num m3 há 106 vezes mais, isto é 5x1028 átomos.

Para ter uma ideia das ordens de grandeza em causa tentemos imaginar os 5x1022
átomos dispostos em linha. Se tomarmos o raio do átomo de Si como sendo 1 Ǻ o
comprimento total é de 1010 km. Este valor corresponde à distância de ida e volta da Terra
a Plutão !!! Convém recordar que a distância Terra-Lua é muito menor ~4x105 km.
1.4 SEMICONDUTORES

Fig. 1.2 – Rede do diamante.

Os semicondutores compostos são designados por binários, ternários ou quaternários


consoante sejam constituídos por 2, 3 ou 4 elementos diferentes.
Os semicondutores compostos binários mais importantes são obtidos por combinação de
dois elementos do grupo IV da Tabela Periódica: SiC, SiGe; dois elementos dos grupos III-V:
InP, GaAs, GaP,...; ou dois elementos dos grupos II-VI: ZnS, ZnTe, CdS, ....
Os semicondutores compostos ternários são obtidos a partir de dois semicondutores
binários que, para além de possuirem um elemento em comum, os outros dois elementos
pertencem ao mesmo grupo da Tabela Periódica. Com os binários AB e CB é então possível
obter o ternário
AxC1− x B em que 0 ≤ x ≤ 1.

O parâmetro x traduz a concentração de A relativamente a C. O ternário resulta da


substituição de átomos C em CB por átomos A de AB ou vice-versa. Esta substituição é
possível pois A e C são átomos do mesmo grupo da Tabela Periódica. É de realçar que para
x = 0 se tem o semicondutor binário CB e que para x = 1 se tem AB. A associação de x ao
átomo A rege-se pela convenção de que para x = 0 o binário correspondente, neste caso CB,
deve ter a banda proibida mais baixa.
Na Tabela 1.3 referem-se alguns semicondutores binários constituidos por elementos
dos grupos III-V e os semicondutores compostos ternários correpondentes.
Os semicondutores compostos quaternários são constituídos por quatro elementos
diferentes e são obtidos a partir de 4 semicondutores binários. Genericamente, o semicondutor
SEMICONDUTORES 1.5

quaternário pode ser escrito como


Ax B1− xC y D1− y em que (0 ≤ x ≤ 1 e 0 ≤ y ≤ 1) .

Os elementos de cada conjunto, (A,B) e (C,D), pertencem ao mesmo grupo da Tabela


Periódica. Os binários de partida são portanto AC; AD; BC e BD. Um dos semicondutores
quaternários mais importantes é o InxGa1-xAsyP1-y, derivado dos binários InAs; InP; GaAs e
GaP. Outros quaternários obtidos experimentalmente são o In Ga As Sb e
x 1− x y 1− y

Al Ga As Sb .
x 1− x y 1− y

Tabela 1.3
Alguns semicondutores compostos binários e os ternários correspondentes

Binários Ternários
AlAs
AlxGa1-xAs
GaAs
GaP
GaAs1-xPx
GaAs
GaP
In1-xGaxP
InP
InAs
InAs1-xPx
InP
GaSb In1-xGaxSb
InSb
GaAs In1-xGaxAs
InAs

A utilização dos semicondutores compostos no fabrico de lasers e fotodetectores com


elevado desempenho tem sido objecto de intensa investigação. Contudo, nas aplicações mais
correntes, que não envolvem a emissão de luz, o Si continua a ser o semicondutor mais
utilizado. Não só o Si é o segundo elemento mais abundante na crosta terrestre, a seguir ao
oxigénio, como a sua tecnologia de fabrico permite obter cristais de elevada perfeição. A
existência de mais que um elemento na rede cristalina exige uma tecnologia mais exigente no
fabrico dos cristais. Os quaternários constituem por isso os materiais mais difíceis de obter e
portanto com um processo de fabrico mais caro. Só as suas propriedades excepcionais é que
os tornam economicamente viáveis no fabrico de dispositivos comerciais.
A maior parte dos semicondutores compostos cristalizam na rede de zincoblenda,
Fig. 1.3. No caso dos semicondutores compostos binários a célula básica é idêntica à do
diamante no entanto, os átomos no interior da célula são de tipo diferente dos que estão nos
1.6 SEMICONDUTORES

vértices e faces do cubo. Esta configuração deve-se a que, na ligação entre vizinhos mais
próximos, os átomos no centro do tetraedro são diferentes dos que estão nos vértices. Neste
caso a ligação entre um átomo e os seus vizinhos mais próximos não é covalente pura, possui
uma componente iónica, devido a haver distorção das nuvens electrónicas em virtude dos
átomos pertencerem a grupos diferentes na Tabela Periódica. Nos semicondutores ternários só
os átomos de um dado elemento é que são substituídos por átomos de outro elemento do
mesmo grupo cuja concentração relativa aos átomos que substitui é medida em termos do
parâmetro x. Nos quaternários são dois elementos de grupos diferentes que irão ser parcial ou
totalmente substituídos por outros dois elementos dos grupos correspondentes.

Fig. 1.3 – Rede de Zincoblenda.

Há alguns semicondutores que, cristalizam noutro tipo de redes cristalinas: a rede da


Wurtzite e do Sal das Rochas, Fig. 1.4. A rede da Wurtzite pode ser olhada como duas redes
hexagonais compactas deslocadas, uma relativamente à outra ao longo da altura, cada uma
com o seu tipo de átomos, e.g., GaN, CdS. A constante de rede, neste caso, envolve dois
parãmetros: a aresta da base a e a altura do prisma c. A rede do Sal das Rochas é uma rede
cúbica simples em que os átomos são alternadamente do mesmo tipo, ou duas redes cúbicas
de faces centradas, cada uma delas com o seu tipo de átomo, e.g., NaCl, PbS. A constante de
rede é o valor da aresta do cubo. Pode acontecer que o mesmo semicondutor possa manifestar
mais que uma estrutura cristalina, dependendo das condições de fabrico. É o caso do ZnS e
CdS que podem ser obtidos com a rede de zincoblenda ou a rede da wurtzite.
SEMICONDUTORES 1.7

Fig. 1.4 – Rede da Wurtzite (a) e do Sal das Rochas (b).

As redes cristalinas dos materiais semicondutores podem ser olhadas em termos


de redes cristalinas mais simples. Este aspecto é muito importante no contexto da
descrição matemática das redes cristalinas mais complexas com vista à obtenção
dos correspondentes diagrama de bandas. Estes diagramas são as peças
essenciais para a compreensão das propriedades eléctricas e ópticas dos
materiais e subsequente fabrico de dispositivos.
As redes cristalinas elementares são: rede cúbica simples (C.S.), rede cúbica de
corpo centrado (C.C.C.), rede cúbica de faces centradas (C.F.C.) e rede
hexagonal (H.S.). É interessante notar que a rede C.C.C. pode ser obtida a partir
de duas redes C.S..

a a a
a
C.S. C.C.C. C.F.C. H.S.
(1 átomo/Célula) (2 átomos/Célula) (4 átomos/Célula) (3 átomos/Célula)

Na Tabela 1.4 indicam-se a rede cristalina e a constante de rede para vários


semicondutores simples e compostos.
1.8 SEMICONDUTORES

Tabela 1.4
Rede cristalina e constante de rede para vários semicondutores.

Constante de rede a
Elemento ou Rede
Grupo Nome 300 K
Composto Cristalina*
(Å)
IV C Carbono (diamante) D 3.56683
Si Silício D 5.43095
Ge Germânio D 5.64613
Sn Estanho D 6.48920

IV-IV SiC Silício carbono W a=3.086, c=15.117

III-V AlAs Arsenieto de alumínio Z 5.6605


AlP Fosforeto de alumínio Z 5.4510
AlSb Antimonieto de alumínio Z 6.1355
BN Nitreto de boro Z 3.6150
BP Fosforeto de boro Z 4.5380
GaAs Arsenieto de Gálio Z 5.6533
GaN Nitreto de Gálio W a=3.189, c=5.185
GaP Fosforeto de Gálio Z 5.4512
GaSb Antimonieto de Gálio Z 6.0959
InAs Arsenieto de Índio Z 6.0584
InP Fosforeto de Índio Z 5.8686
InSb Antimonieto de Índio Z 6.4794

II-VI CdS Sulfureto de Cádmio Z 5.8320


CdS Sulfureto de Cádmio W a=4.16, c=6.756
CdSe Seleneto de Cádmio Z 6.050
CdTe Telureto de Cádmio Z 6.482
ZnO Óxido de Zinco R 4.580
ZnS Sulfureto de Zinco Z 5.420
ZnS Sulfureto de Zinco W a=3.82, c=6.26

IV-VI PbS Sulfureto de Chumbo R 5.9362


PbTe Telureto de Chumbo R 6.4620

* D = Diamante, W = Wurtzite, Z = Zincoblenda, R = Sal das rochas; 1 Å= 10-8 cm.

1.3. Modelo das ligações covalentes e das bandas de energia

As propriedades eléctricas e ópticas dos materiais semicondutores podem ser analisadas


de forma simplificada recorrendo ao modelo das ligações covalentes e/ou ao do modelo das
bandas de energia. Estes modelos estão representados simplificadamente na Fig. 1.5, para o
Si.
SEMICONDUTORES 1.9

T=0K

+4 +4 +4 +4

+4 +4 +4 +4
WC
WG
+4 +4 +4 +4
WV
+4 +4 +4 +4

T=0K
(a) (b)
Fig. 1.5 – (a) Modelo das ligações covalentes; (b) Modelo das bandas, para o Si a 0 K.

O modelo das ligações covalentes consiste numa representação bidimensional dos


átomos no espaço onde se explicitam as ligações entre cada átomo e os 4 átomos vizinhos
correspondentes à partilha de 2 electrões com cada um deles. Um electrão partilhado é
representado por um segmento de recta que une dois átomos. Um electrão que se soltou da
ligação covalente deixou de estar partilhado pelos átomos. Por cada electrão nestas condições
haverá uma ligação incompleta que é usualmente representada por uma linha a tracejado
unindo os dois átomos. A 0 K as ligações estão todas completas e portanto a representação é a
que se indica na Fig.1.5(a). Este modelo deve ser utilizado com precaução pois apresenta
algumas limitações importantes nomeadamente no que se refere a algumas características
inerentes ao electrão como partícula quântica: é o caso da indescernibilidade e da
impossibilidade de localização precisa do electrão num dado ponto do espaço.
O modelo das bandas simplificado está representado na Fig.1.5(b), em que se mostra a
evolução da energia dos electrões em função da distância. WC neste diagrama está associado
ao mínimo absoluto da banda de condução e WV ao máximo absoluto da banda de valência.
Os valores de energia entre WC e WV constituem uma banda proibida com uma altura
WG = WC − WV que, para uma dada temperatura, é um parâmetro característico dos

semicondutores, normalmente expresso em eV (electrão-Volt). Define-se electrão-Volt (eV)


como sendo a variação de energia cinética dum electrão quando submetido a uma diferença de
potencial de 1 V e portanto 1 eV= 1,6x10-19J. A existência duma banda proibida é
1.10 SEMICONDUTORES

característica dos semicondutores e isolantes. Contudo WG dos semicondutores é menor que


WG dos isolantes. Em princípio, um isolante possui WG > 4 eV. Nos metais as bandas de

condução e valência sobrepõem-se não havendo portanto uma banda de energia proibida.
Os electrões partilhados possuem energias na banda de valência que, a 0 K, está
totalmente preenchida. A uma temperatura superior a 0 K há ligações que se partem pelo que
vai haver electrões na banda de condução com energias próximas de WC. De acordo com o
modelo das bandas referido só é possível caracterizar as transições entre bandas em termos da
alteração do valor da energia do electrão. No entanto, em geral, há que incluir também
alterações do momento.
A relação energia-momento é uma forma mais elaborada e mais completa para
apresentar o andamento das bandas. Há duas representações básicas possíveis e que envolvem
o que se designa por semicondutores de banda directa e semicondutores de banda indirecta.
Nos semicondutores de banda directa o topo da banda de valência e o mínimo absoluto da
banda de condução estão associados ao mesmo valor do momento. Nos semicondutores de
banda indirecta o mínimo absoluto da banda de condução e o máximo absoluto da banda de
valência estão associados a valores diferentes do momento, Fig. 1.6.

W W

WC WC
WG WG
WV WV
p p

(a) (b)

Fig. 1.6 – (a) Semicondutores de banda directa; (b) Semicondutores de banda indirecta.

Nos semicondutores de banda directa as transições de electrões envolvem basicamente


variações de energia e portanto quando um electrão transita da banda de condução para a
banda de valência a energia é fornecida sob a forma dum fotão com um valor próximo de WG.
SEMICONDUTORES 1.11

Estes materiais são os mais adequados para o fabrico de dispositivos emissores de luz. As
transições nos semicondutores de banda indirecta envolvem energia e momento, o que conduz
a rendimentos de emissão muito baixos, e portanto impedem na prática a sua utilização no
fabrico de dispositivos emissores de luz.
Na Tabela 1.5 referem-se os valores da altura da banda proibida a 0 e a 300 K e indica-
se o tipo de banda para vários semicondutores.

Tabela 1.5
Altura da banda proibida e tipo de banda para vários semicondutores.

Altura da banda
proibida (eV)
Semicondutor 300 K 0K Banda
Elemento C 5.47 5.48 I
Si 1.12 1.17 I
Ge 0.66 0.74 I
Sn 0.082 D
IV-IV α-SiC 2.996 3.03 I
III-V AlAs 2.16 2.23 I
AlSb 1.58 1.68 I
GaN 3.46 3.50 D
GaSb 0.72 0.81 D
GaAs 1.42 1.52 D
GaP 2.26 2.34 I
InSb 0.17 0.23 D
InAs 0.36 0.42 D
InP 1.35 1.42 D
II-VI CdS 2.42 2.56 D
CdSe 1.70 1.85 D
CdTe 1.48 1.56 D
ZnO 3.35 3.42 D
ZnS 3.68 3.84 D
IV-VI PbS 0.41 0.28 I
PbTe 0.31 0.19 I

A altura da banda proibida determina o comprimento de onda da radiação emitida e


traduz a energia mínima dos fotões que são absorvidos.
A relação entre WG e o comprimento de onda λ parte da definição da energia associada
a um fotão dada por:

 =h f
W fotao (1.1)

em que h é a constante de Planck, h = 6, 63 × 10−34 Js .


1.12 SEMICONDUTORES

No vazio
c
f = (1.2)
λ

em que c é a velocidade de propagação da luz no vácuo c  3 × 108 m / s


Deste modo
hc
 =
W fotao (1.3)
λ

Identificando a energia do fotão com WG, a relação entre WG e λ será então


hc
WG = (1.4)
λ

Com WG expresso em eV e λ em μm, a relação acima pode ser escrita como


1, 243
W (eV ) = (1.5)
G λ (μm)

Na Fig. 1.7 mostra-se a correspondência entre WG e λ para vários semicondutores e


compara-se este valor com o espectro da radiação visível.

Resposta do
olho humano

Infravermelho Vermelho Verde Violeta Ultravioleta


Laranja Amarelo Azul

CdTe

InSb PbS Ge Si GaAs CdSe GaP CdS SiC GaN ZnS

HgCdTe GaAs1-yPy
λ (μm)
6.0 3.0 2.0 1.5 1.0 0.9 0.8 0.7 0.6 0.5 0.45 0.4 0.35

0.0 0.2 0.4 0.6 0.8 1.0 1.2 1.4 1.6 1.8 2.0 2.2 2.4 2.6 2.8 3.0 3.2 3.4 3.6
WG (e.V.)
Fig. 1.7 – Correspondência entre WG e λ para vários semicondutores
SEMICONDUTORES 1.13

Exemplo 1.2 – O ternário AlxGa1-xAs é utilizado no fabrico de díodos emissores de luz


(LED). Sabendo que, para x<0,45, o semicondutor é de banda directa, determinar a gama
de comprimentos de onda que é possível emitir com estes materiais sabendo que, para x=
0,45, WG= 1,98 eV. Qual deverá ser WG se se pretender emitir no azul?
Solução:
Para que haja emissão de luz o semicondutor deve ser de banda directa, i.e., x<0,45.
Sendo assim a altura da banda proibida deve verificar a relação 1,42< WG<1,98 eV. Como
λ(μm)=1,243/ WG (eV) ter-se-à 0,628<λ<0,875 μm. Para esta gama de comprimentos de
onda a emissão é no vermelho ou infravermelho. Para emitir no azul λ~0,47 μm ou seja
WG~2,64 eV e portanto este ternário não seria adequado.

1.4. Semicondutores compostos ternários e quaternários. Variação das


propriedades com a composição

As propriedades dos semicondutores compostos ternários e quaternários dependem das


propriedades dos binários associados e os seus valores podem-se relacionar com a
composição x de forma linear ou não. As grandezas que possuem uma variação linear com a
composição são: a constante de rede, a; o coeficiente de dilatação, α; e a permitividade
eléctrica, ε. Apresentam uma variação não-linear com a composição a altura da banda
proibida, WG, a mobilidade, μ, e a condutividade térmica, χ.
Na Fig. 1.8 mostra-se a evolução da constante da rede em função da composição para
vários semicondutores ternários. Devido à linearidade observada a constante de rede do
ternário pode escrever-se em termos de constante de rede dos binários correspondentes como:
a Ax B1− xC = x a AC + (1 − x) aBC (1.6)

É de realçar que, em geral, é necessário que as superfícies em contacto entre dois


materiais diferentes possuam o mínimo de irregularidades de modo a optimizar o
funcionamento do dispositivo. Na prática este objectivo pode ser alcançado desde que os
materiais em contacto possuam a mesma constante de rede. Diz-se então que as redes dos dois
materiais estão adaptadas. Na Fig. 1.8 verifica-se que o ternário Al1-xGaxAs, para toda a
composição x, possui uma constante de rede praticamente independente da composição. Esta
propriedade está na base do fabrico de dispositivos electrónicos comerciais com elevado
desempenho, e.g., díodos emissores de luz, a partir dos materiais semicondutores desta
família.
1.14 SEMICONDUTORES

6.80

6.60
InSb
6.40

6.20
a (Ǻ) InAs GaSb
6.00
x=0.47
InP
5.80
AlAs
5.60
GaAs
GaP
5.40
0 0.2 0.4 0.6 0.8 1.0
x

Fig. 1.8 – Constante de rede em função da composição para vários semicondutores ternários.

Exemplo 1.3 – Em comunicação óptica utiliza-se como fotodetector um fotodíodo que, na


sua constituição, envolve dois materiais semicondutores em contacto com redes
adaptadas, o binário InP e o ternário In1-xGaxAs. Determinar a composição x que garante a
adaptação de redes.
Solução:
Se as redes estão adaptadas a constante de rede do ternário é igual à constante de rede
do binário aIn1-x Ga x As = aInP . Por sua vez aIn1-x Ga x As = (1 − x ) aInAs + x aGaAs . Da Tabela 1.4

tira-se, aInAs =6,0584 Ǻ, aGaAs =5,6533 Ǻ e aInP =5,8686 Ǻ pelo que

(1 − x ) 6,0584 + x 5,6533 = 5,8686 . Por resolução da equação anterior tira-se x  0, 47 e


portanto o ternário utilizado é o In0,53Ga0,47As.
Este valor da composição podia ser obtido graficamente a partir da Fig. 1.8 traçando uma
recta horizontal que passa pelo valor da constante de rede do InP. Ao ponto de
intersecção desta recta com a recta que une as constantes de rede do InAs e GaAs está
associado o valor de x pretendido.

Para os quaternários a constante de rede é obtida de forma idêntica à utilizada para os


ternários:
a Ax B1− xC y D1− y = x y a AC + x(1 − y ) a AD + (1 − x) y aBC + (1 − x)(1 − y ) aBD (1.7)

Se, para o ternário, o valor de x está associado ao valor de uma dada grandeza à nossa
escolha, e.g., a constante de rede, no quaternário podem-se fixar os valores de duas grandezas
à escolha através das composições x e y que são independentes. Como se vê pela equação
SEMICONDUTORES 1.15

(1.7), ao fixarmos o valor da constante de rede obtém-se uma equação em x e y. Ao fixarmos


um valor para outra grandeza de interesse, e.g., a altura da banda proibida, obter-se-à uma
nova equação em x e y que, em conjunto com a anterior, permite determinar a composição do
quaternário pretendido. Esta flexibilidade assim como outras propriedades inerentes aos
semicondutores compostos quaternários estão na base do desenvolvimento e utilização destes
semicondutores no fabrico de dispositivos optoelectrónicos avançados.
Atendendo a que o coeficiente de dilatação linear e a permitividade eléctrica também
apresentam uma variação linear com a composição as relações a utilizar no seu cálculo para
os ternários e quaternários serão escritas de forma idêntica a (1.6) e (1.7).

Exemplo 1.4 – Pretende-se obter a composição do quaternário InxGa1-xAsyP1-y que


possua uma constante de rede a = 5,87 Ǻ e uma permitividade eléctrica relativa εr= 11,4.

Dados da Tabela 1.4 e ainda εrGaAs=11,1 ; εrInP=9,6 ; εrInAs=12,3 ; εrGaP= 8,5.


Solução:
Da Tabela 1.4 tira-se aInP =5,8686 Ǻ, aInAs =6,0584 Ǻ, aGaAs =5,6533 Ǻ, aGaP = 5, 4512 Ǻ.

De acordo com equação (1.7) tem-se


5,87 = xy 6,0584 + x(1 − y )5,8686 + (1 − x) y 5,6533 + (1 − x)(1 − y )5, 4512 .
De igual modo pode escrever-se para a permitividade eléctrica
11, 4 = xy12,3 + x(1 − y )9,6 + (1 − x) y11,1 + (1 − x)(1 − y )8,5 . A solução do sistema de
equações dá x  0,6; y = 0,84 . O quaternário que satisfaz as especificações referidas é
então o In0,6Ga0,4As0,84P0,16.

A evolução de WG com a composição não é linear, e depende do tipo de banda


associada a cada um dos semicondutores binários. Na Fig. 1.9 mostra-se a evolução de WG
com x para o ternário In1-xGaxAs , em que ambos os binários envolvidos são de banda directa.
No caso em que um dos binários é de banda directa e o outro é de banda indirecta, e.g.,
o AlxGa1-xAs , a curva apresenta dois troços distintos, Fig. 1.10. A composição x=0,45, para a
qual se passa dum troço ao outro, estabelece a transição do ternário de banda directa para
banda indirecta.
Para uma variação de WG do tipo representado na Fig. 1.10, cada um dos troços pode ser
aproximado por um polinómio do 2º grau

WG ( x) = WG1 + a1x + a2 x 2 (1.8)


1.16 SEMICONDUTORES

1.6

1.4

1.2 In1-xGaxAs

1.0
WG (eV)

0.8

0.6

0.4

0.2
0 0.1 0.2 0.3 0.4 0.5 0.6 0.7 0.8 0.9 1
x
Fig. 1.9 – Variação de WG com x para o In1-xGaxAs.

2.2

2.1
x = 0.45
2.0

1.9
WG (eV)

1.8
AlxGa1-xAs
1.7

1.6

1.5

1.4
0 0.1 0.2 0.3 0.4 0.5 0.6 0.7 0.8 0.9 1
x
Fig. 1.10 – Variação de WG com a composição para AlxGa1-xAs.

Sendo ambos os binários de banda directa a expressão é válida para 0 ≤ x ≤ 1 . Neste


caso
⎧ x = 0 → WG1
⎨ (1.9)
⎩ x = 1→ WG 2 = WG1 + a1 + a2

ou seja:
WG ( x) = WG1 (1 − x) + WG 2 x + a2 x 2 − x


( ) (1.10)
Termo que contabiliza
o afastamento da
relação linear
Na Tabela 1.6 indicam-se os valores dos coeficientes a1 e a2 para alguns ternários
SEMICONDUTORES 1.17

obtidos a partir de binários de banda directa.

Tabela 1.6
Coeficientes do polinómio para cálculo de WG(x)
Composto a1 (eV) a2 (eV)
In1-xGaxAs 0,63 0,45
InAs1-xSbx -0,771 0,596
InAs1-xPx 0,891 0,101
GaAsxSb1-x -0,32 1,005

A Fig. 1.11 mostra o gráfico que permite relacionar a altura da banda proibida com a
constante da rede para vários materiais semicondutores simples e compostos. Neste gráfico as
linhas que unem os pontos relativos aos semicondutores binários referem os semicondutores
ternários correspondentes. As linhas contínuas indicam semicondutores de banda directa e as
linhas a tracejado os semicondutores de banda indirecta. A área a sombreado refere-se ao
quaternário InGaAsP e cada ponto nesta superfície está associado a uma determinada
concentração x e y.

Fig. 1.11 – Altura de banda proibida em termos de constante de rede para vários semicondutores.
1.18 SEMICONDUTORES

1.5. Semicondutores intrínsecos e extrínsecos em equilíbrio termodinâmico

Designam-se por semicondutores intrínsecos aqueles que possuem na sua composição


só os átomos dos elementos básicos. Semicondutores extrínsecos são aqueles em que alguns
dos átomos de base são substituídos por outros designado por impurezas de substituição. A
concentração destes átomos de impurezas é, em geral, extremamente baixa, podendo ser da
ordem de 1 para 1 milhão de átomos de base. Deste modo a sua inclusão na rede cristalina não
modifica apreciávelmente a estrutura de bandas do semicondutor mas, como se verá mais
adiante, pode alterar significativamente as suas propriedades eléctricas. As impurezas de
substituição, no caso do Si, pertencem ao grupo V e ao grupo III e designam-se por impurezas
dadoras e aceitadoras respectivamente. Para o Si as impurezas dadoras mais utilizadas são o
P, As e Sb e a impureza aceitadora é o B. Nos semicondutores compostos as impurezas
utilizadas podem eventualmente actuar como impureza dadora ou aceitadora, dependendo do
átomo que substituem. É o caso do GaAs em que o Si pode actuar como impureza dadora se
substituir o Ga e aceitadora se substituir o As. Convém referir que no processo de fabrico
podem ser incorporados no cristal outros átomos de impurezas que não são necessariamente
impurezas de substituição. Em geral é necessário reduzir ao mínimo a concentração destas
impurezas pois degradam as propriedades do material semicondutor.

1.5.1. Semicondutores intrínsecos

O modelo das ligações de covalência e o modelo das bandas, às temperaturas de T= 0 K

e T≠ 0 K, estão representados na Fig.1.12 para um semicondutor intrínseco, e.g., o Si.

Para este material semicondutor, a 0 K, a banda de valência está completamente


preenchida e a banda de condução completamente vazia. Ao aplicar-se um campo eléctrico
não há corrente em virtude de os estados de movimento possíveis da banda de valência
estarem todos preenchidos por electrões e por isso estes não podem alterar o seu estado de
movimento. Para T ≠ 0 K é possível que alguns electrões da banda de valência adquiram
energia suficiente para passarem para a banda de condução, deixando na banda de valência
um número igual de ligações incompletas, a que correspondem estados de movimento
disponíveis para os electrões de valência. Define-se ritmo de geração térmica, Gter [m-3s-1],
como sendo o número de electrões na unidade de volume e na unidade de tempo que, devido à
temperatura, transitam de banda de valência para a banda de condução. Existe um processo
inverso, designado por recombinação, que envolve a passagem de electrões da banda de
SEMICONDUTORES 1.19

condução para a banda de valência. Em equilíbrio termodinâmico o ritmo de recombinação

R ⎡ m −3 s −1 ⎤ tem que verificar a condição


⎣ ⎦
Gter = R (1.11)

+4 +4 +4 +4 +4 +4 +4 +4

+4 +4 +4 +4 +4 +4 +4 +4

+4 +4 +4 +4 +4 +4 +4 +4

+4 +4 +4 +4 +4 +4 +4 +4

T=0k T≠0k

WC WC
WG WG
WV WV

n 0 = p0 = n i
Fig. 1.12 – Modelo das ligações de valência e das bandas para um semicondutor intrínseco.

Do equilíbrio destes dois processos resulta, para uma dada temperatura, uma densidade
fixa de electrões na banda de condução, igual à densidade de ligações incompletas na banda
de valência. Um acréscimo de temperatura conduz a um aumento da densidade de electrões e

consequentemente de ligações incompletas. Ao aplicar um campo eléctrico, para T≠ 0 K, vai

haver corrente eléctrica pois os electrões da banda de condução e da banda de valência já


podem alterar o seu estado de movimento, Fig. 1.13. A corrente eléctrica deverá portanto
incluir o efeito do campo eléctrico nos electrões das duas bandas de energia. Na banda de
valência contudo só nos interessa contabilizar os electrões que transitam de ligação
incompleta em ligação incompleta, em número muito inferior aos que existem nessa banda,
mas que são em número igual aos da banda de condução. Deste modo o movimento do
electrão de valência para uma ligação incompleta pode ser olhado como sendo equivalente ao
1.20 SEMICONDUTORES

movimento duma partícula com carga positiva, igual ao módulo da carga do electrão, e
deslocando-se em sentido oposto. Designar-se-á esta partícula por buraco.
Acção do campo eléctrico
G
E

+4 +4 +4 +4
Jn G
Fe
+4 +4 +4 +4
Jp
+4 +4 +4 +4

JG JG JG
J = Jn + J p

Fig. 1.13 – Acção do campo eléctrico nos electrões de condução e de valência.

A densidade de buracos p é igual à densidade de ligações incompletas e, no caso do


semicondutor intrínseco, é igual à densidade de electrões n na banda de condução.
Em equilíbrio termodinâmico tem-se então:

n0 = p0 = ni ⎡ m −3 ⎤ (1.12)
⎣ ⎦

em que ni se designa por densidade intrínseca. A densidade intrínseca é uma grandeza muito
importante e característica de cada semicondutor a uma dada temperatura. Na Tabela 1.7
indicam-se os valores de ni para vários semicondutores a 300 K.

Tabela 1.7
Valores de ni para vários semicondutores a 300 K.

Semicondutor ni (m-3) WG (eV)


Si 1,02×1016 1,124
Ge 2,33×1019 0,664
GaAs 2,1×1012 1,424
InAs 1,3×1021 0,354
InP 1,2×1014 1,344
SEMICONDUTORES 1.21

Os electrões na banda de condução, aos quais nos iremos referir simplesmente como
electrões, e os buracos, vão ser olhados como partículas clássicas livres. Esta simplificação
exige que se associe a cada partícula uma massa eficaz m*, que engloba no seu valor os
efeitos da periodicidade da rede cristalina na estrutura das bandas. O fundamento e validade
desta analogia assentam na mecânica quântica. As massas eficazes do electrão e do buraco,

que designaremos por mn* e m*p , respectivamente, são em geral diferentes pois à banda de

condução e de valência estão associadas relações W(p) diferentes. Para uma rede anisotrópica
a massa eficaz será em geral um tensor 3×3. Sem perda de generalidade e por forma a
simplificar análises e cálculos futuros iremos considerar a massa eficaz como sendo um
escalar.
Para além da massa eficaz os electrões e os buracos são também caracterizados por
possuirem carga eléctrica que para o buraco é positiva e igual em módulo à carga do electrão,

q = 1, 6 × 10−19 C . É de realçar a importância desta caracterização dos portadores de carga que


permite, num grande número de situações de interesse, a utilização dum tratamento clássico,
com vantagens óbvias ao tratamento quântico, mais rigoroso, mas bastante mais complexo.
Como se verá mais à frente a dependência de ni com a temperatura e a altura da banda
proibida pode ser expressa através da relação
ni ∝ T 3 / 2 e−WG 2 kT
(1.13)

em que T é a temperatura absoluta (em graus Kelvin), WG a altura da banda proibida e k a


constante de Boltzmann, k = 1,3806 × 10−23 JK −1 . Ao produto kT costuma designar-se por
energia característica da temperatura T e kT (300 K)= 4,1418x10-21J  0,026 eV. Desprezando
a variação de WG com a temperatura, ni aumenta quando a temperatura aumenta. Embora ni
dependa da temperatura através do termo T3/2 e da exponencial verifica-se que, para a gama
usual de temperaturas, é o termo associado à exponencial que domina.

Exemplo 1.5 – Calcular valor de ni a 0 ºC e 60 ºC para o Si e GaAs. Utilizar os dados da


Tabela 1.7 e desprezar a variação de WG com a temperatura.
Solução:
De acordo com a equação (1.13) pode-se escrever
WG
3/ 2 −
'
n ⎛T '⎞ e 2 kT '
=⎜ ⎟
i
em que ni e ni' são os valores da densidade intrínseca à temperatura
ni ⎝ T ⎠ W
− G
2 kT
e
T e T’ respectivamente. A relação anterior pode ainda tomar a forma
1.22 SEMICONDUTORES

3/ 2 WG (T ' −T )
ni' ⎛ T ' ⎞
= 2 kTT '
. Conhecido o valor de ni e WG à temperatura T pode-se então
ni ⎜⎝ T ⎟⎠
e

calcular o valor de ni' a qualquer temperatura. Nas relações anteriores a temperatura é


expressa em K e portanto a 0ºC corresponde T’=273 K e a 60ºC ter-se-à T’=333 K.
Utilizando os valores da Tabela 1.7 para 300 K obtém-se então:

ni (300 K) ni' / ni (T’=273K) ni' (T’=273K) ni' / ni (T’=333K) ni' (T’=333K)


-3 -3
Material (m ) (m ) (m-3)
Si 1,02×1016 0,1 1,02×1015 9,96 1×1017

GaAs 2,1×1012 0,058 1,2×1011 17,64 3,7×1013

1.5.2. Semicondutores extrínsecos

Os semicondurores extrínsecos possuem, para além dos átomos de base, impurezas de


substituição que, mesmo em número relativamente reduzido, são responsáveis por uma
alteração significativa da densidade de electrões ou buracos no semicondutor.
A título exemplificativo admita-se que o semicondutor considerado é o Si ao qual se
adicionaram impurezas de substituição do tipo dador, Fig. 1.14. A 0 K os electrões de
valência mantêm-se nas suas ligações de valência. É o caso dos electrões partilhados entre os
átomos de Si. No entanto as impurezas de substituição do tipo dador, e.g. o P para o Si,
possuem 5 electrões de valência dos quais só 4 é que são necessários para a ligação covalente
com os 4 átomos de Si vizinhos. A energia destes electrões está na banda de valência. O
electrão do átomo da impureza dadora que não está envolvido na ligação covalente possui
uma energia superior à dos electrões ligados, com valores próximos de WC , e, embora ligado
ao átomo da impureza, possui uma incerteza na sua localização que permite que ele possa ser
encontrado num raio que envolve várias dezenas de átomos de base. Sob o ponto de vista do
modelo das bandas, a cada impureza dadora corresponde um dado estado de energia,WD, na
banda proibida junto à banda de condução. A diferença de energias WC-WD é tipicamente da
ordem de centésimas de electrão-Volt o que faz com que um pequeno aumento da temperatura
seja suficiente para ionizar positivamente a impureza, isto é, fazer transitar o electrão para a
banda de condução sem que tenha qualquer efeito apreciável sobre electrões de banda de
valência, que requerem uma energia bastante mais elevada. Deste modo é possível criar na
banda de condução uma população de electrões muito maior que a população de buracos na
banda de valência. Obtém-se assim um semicondutor extrínseco tipo-n. Nesta altura é
SEMICONDUTORES 1.23

importante realçar que se continua a admitir que o modelo das bandas para o semicondutor
extrínseco é idêntico ao do semicondutor intrínseco, o que só é válido se a densidade de
impurezas for muito pequena comparada com a densidade de átomos de base do
semicondutor. A estes semicondutores é usual chamar de não-degenerados. Os
semicondutores degenerados possuem propriedades interessantes mas não irão ser estudadas,
pois caem fora do âmbito deste estudo.

+4 +4 +4 +4 +4 +4 +4 +4
_ _
+4 +4 +4
_ +4 +4 +4 +4 +4

+4 +5 +4 +4 +4 +5 +4 +4
_
+4 +4 +4 +4 +4 +4 +4 +4

tipo-n

T=0 k T≠0 k

WC
0,05 e.V. WC − − − − − − − −
WD WD

WV WV
+ + +

EQUILÍBRIO TERMODINÂMICO → n 0 p0 = n i2
(Semicondutor não degenerado)
Fig. 1.14 – Modelo das ligações de valência e das bandas para um semicondutor extrínseco com
impurezas do tipo dador.

A introdução de impurezas de tipo aceitador, e.g. o Boro no Si, pode ser analisada de
forma idêntica, Fig. 1.15. Neste caso, a 0 K, a impureza possui só três electrões para partilhar
1.24 SEMICONDUTORES

com os 4 átomos de Si vizinhos pelo que fica uma ligação incompleta. A energia associada a
esta ligação incompleta é superior a WV mas relativamente próxima. Um pequeno aumento da
temperatura é suficiente para ionizar negativamente estas impurezas, dando origem a buracos
na banda de valência sem a correspondente criação de electrões na banda de condução.
Poder-se-á ter então um semicondutor extrínseco tipo-p em que a densidade de buracos é
muito maior que a de electrões. Um semicondutor em que coexistem os dois tipos de
impurezas é um semicondutor compensado. Se a densidade de impurezas dadoras for igual à
das impurezas aceitadoras a compensação é total e, em equilíbrio termodinâmico n0 = p0 = ni .

+4 +4 +4 +4 +4 _ +4 +4 +4

+4 +3 +4 +4 +4 +3 +4 +4
_
+4 +4 +4 +4 +4 +4 +4 +4

+4 +4 +4 +4 +4 +4 +4 +4

tipo-p
T=0 k T≠0 k

_ _ _
WC WC

WA WA
WV WV
0,05 e.V.
+ +++++++

EQUILÍBRIO TERMODINÂMICO → n 0 p0 = n i2
(Semicondutor não degenerado)
Fig. 1.15 – Modelo das ligações de valência e das bandas para um semicondutor extrínseco com
impurezas do tipo aceitador.
SEMICONDUTORES 1.25

Como se viu anteriormente ni é uma medida do número de ligações de valência que se


partiram, devido à temperatura. Sendo assim ni pode ser usada como valor de referência nos
semicondutores extrínsecos. Atendendo a que a densidade de electrões, num semicondutor
com impurezas dadoras a uma dada temperatura, possui a contribuição das impurezas
ionizadas e das ligações partidas poder-se-á dizer que:
n0  N d+ se N d+ >> ni (1.14)

em que N d+ é a densidade de impurezas dadoras ionizadas.


Para um semicondutor tipo-p ter-se-á então:
p0  N a− se N a− >> ni (1.15)

em que N a− é a densidade de impurezas aceitadoras ionizadas.


É importante realçar que n0 ≠ N d+ + ni e p0 ≠ ni no semicondutor tipo-n devido à
recombinação. Para o semicondutor tipo-p também será p0 ≠ N a− + ni e n0 ≠ ni pelas mesmas
razões.
No entanto provar-se-á mais à frente que, para um semicondutor não-degenerado em
equilíbrio termodinâmico, se verifica a relação

p0 n0 = ni2 , (1.16)

independentemente de o semicondutor ser do tipo-n ou do tipo-p. A relação (1.16) é muito


importante no cálculo da densidade dos portadores. Um caso particular é o da determinação
da densidade de portadores minoritários, nas situações em que é possível obter facilmente a
densidade dos portadores maioritários, por estarmos nas condições de (1.14) ou (1.15).

Uma outra relação importante resulta do facto de, num semicondutor homogéneo em
equilíbrio termodinâmico, o material exibir neutralidade eléctrica local, ou seja, a densidade
de carga é zero em cada ponto do semicondutor. Atendendo a que a origem das cargas
eléctricas está nos electrões, buracos e impurezas ionizadas, poder-se-á escrever então com
generalidade:

( ) (
ρ = 0 = − q n0 + N a− + q p0 + N d+ ) (1.17)

ou seja
n0 − p0 = N d+ − N a− (1.18)

n0 − N d+ = p0 − N a− (1.19)
1.26 SEMICONDUTORES

As equações (1.18) e (1.19) permitem duas interpretações diferentes da mesma equação.


A equação (1.18) evidencia a influência de cada tipo de impurezas na densidade de
portadores. Se N d+ − N a− > 0 então n0 > p0 e portanto o semicondutor é tipo-n. Quando

N d+ − N a− < 0 p0 > n0 e o semicondutor é tipo-p. Em particular se N d+ = N a− ⇒ n0 = p0 = ni e o

material semicondutor diz-se que está totalmente compensado e comporta-se como um


semicondutor intrínseco. Durante o processo de fabrico do semicondutor a adição não
intencional de impurezas é normal, e o material resultante ou é do tipo-p ou do tipo-n. Só a
adição de impurezas de substituição de sinal contrário, de modo a compensar totalmente o
semicondutor, é que possibilita a obtenção de semicondutores intrínsecos.
Por sua vez na equação (1.19) n0 − N d+ representa a densidade efectiva de electrões com
origem na geração térmica, pois traduz a diferença entre a densidade total de electrões e a
densidade de electrões devida às impurezas dadoras. A igualdade é consistente com o facto de
que por cada electrão gerado termicamente há também um buraco pois p0 − N a− representa a
densidade efectiva de buracos gerados termicamente.
No caso das impurezas dadoras e aceitadoras estarem totalmente ionizadas à
temperatura considerada, ter-se-á:

N d+ ≈ N d e N a− ≈ N a (1.20)

e portanto, neste caso,


n0 − p0 ≈ N d − N a (1.21)

Se, para um dado semicondutor homogéneo a uma dada temperatura, se conhecer a


densidade intrínseca e a densidade de impurezas ionizadas poder-se-ão calcular os valores de
n0 e p0 a essa temperatura por resolução do sistema de equações que envolve (1.16) e (1.18).

Exemplo 1.6 – Considerar um cristal de Si homogéneo com impurezas do tipo aceitador


Na= 1019m-3. Calcular a densidade de electrões e buracos, em equilíbrio termodinâmico, à
temperatura de T= 300K e T= 450K. Si: ni( 300K)= 1016 m-3; WG= 1,124 eV.
Solução:
T= 300K Admite-se que a 300K todas as impurezas estão ionizadas ou seja N a−  N a .

Atendendo a que N a  ni então p0  N a = 1019 m −3 . De (1.16) tira-se então n0 = 1013 m −3 .

Sendo p0  n0 o semicondutor a 300K é fortemente extrínseco tipo-p. Uma chamada de

atenção para a ordem de grandeza dos valores obtidos: sendo p0  n0 não é possível
SEMICONDUTORES 1.27

obter n0 a partir da equação da neutralidade eléctrica, (1.18).

T= 450K A esta temperatura a densidade intrínseca é superior à de 300K, mantendo-se a


densidade de impurezas ionizadas. Ter-se-à pois que calcular primeiro a densidade
intrínseca a 450K para verificar se continuamos nas condições referidas a 300K. No
WG (T ' −T )
cálculo de ni a 450K utilizaremos a relação ni' = ni (T '/ T )
3/ 2 2 kTT '
e obtendo-se

ni (450K)= 2,47x1019m-3. É então claro que, a 450K, já não estamos nas condições
N a  ni . Para obter n0 e p0 deveremos então resolver o sistema de equações que
2
N a− ± N a− + 4ni2
envolve (1.16) e (1.18). O valor de p0 pode obter-se a partir de p0 =
2
em que só a solução positiva é que tem significado físico. Os cálculos dão então
p0 =3,02x1019m-3 e n0 =2,02x1019m-3. Para T= 450K n0  p0  ni e o semicondutor passa
a comportar-se como intrínseco.

É oportuno referir que, mesmo em equilíbrio termodinâmico, se o semicondutor não for


homogéneo, isto é, a distribuição das impurezas não for uniforme no volume do material, não
se verifica a condição de neutralidade eléctrica local, embora o semicondutor continue a ser
globalmente neutro. Este facto deve-se à natureza das cargas eléctricas, que são móveis no
caso dos electrões e buracos, e fixas no caso das impurezas ionizadas. Tome-se como
exemplo um semicondutor que possui densidade de dadores diferente em duas regiões do
semicondutor ( N d1 > N d 2 ) . Em qualquer ponto do semicondutor, em equilíbrio

termodinâmico verifica-se que n1 p1 = n2 p2 = ni2 , isto é n1 > n2 e p1 < p2 . O gradiente de


densidades de portadores móveis de carga que se estabelece dá origem ao movimento dos
portadores da região de maior densidade para regiões de menor densidade e conduz a uma
distribuição de electrões e buracos que quebra a neutralidade eléctrica local, responsável
pelo aparecimento de campos eléctricos locais, junto à interface das duas regiões. Neste
exemplo a carga positiva está do lado da região 1, em que N d é mais elevado.

O andamento da densidade de portadores em função da temperatura, para um


semicondutor extrínseco tipo-n, está representado na Fig. 1.16. É possível identificar três
regiões de funcionamento: a região de ionização, de saturação e intrínseca. Na região de
ionização o aumento de temperatura conduz fundamentalmente a um aumento da densidade
dos portadores que têm origem nas impurezas de substituição, neste caso electrões, pois
1.28 SEMICONDUTORES

envolve uma energia de activação WC-WD que é muito inferior à altura da banda proibida. Na
escala semi-logaritmica utilizada o andamento é aproximadamente linear evidenciando por
isso uma dependência exponencial com 1/T. Logo que as impurezas estão todas ionizadas
entra-se na zona de saturação na qual a densidade de electrões é aproximadamente constante.
Contudo a densidade de buracos continua a aumentar com o aumento de temperatura pois
cresce a densidade intrínseca. Finalmente, após uma dada temperatura Ti , entra-se na zona
intrínseca de funcionamento a que corresponde uma densidade intrínseca elevada,
relativamente à densidade de impurezas, e em que as densidades de electrões e buracos são
idênticas. Conhecido o andamento da densidade de maioritários e da densidade intrínseca é
fácil de obter o gráfico da densidade de minoritários numa escala logaritmica atendendo a que
ln ni = (ln n0 + ln p0 ) / 2.

ln (n)
ln (p)
ln (ni)
declive
W
− G
2k
zona
intrínseca zona de saturação
zona de ionização

ln (Nd)
declive
ΔE

n 2k
p
ni

1/Ti 1/T
Fig. 1.16 – Densidade de portadores em função da temperatura para um semicondutor tipo n

A determinação de Ti , designada por temperatura intrínseca, pode ser efectuada desde


que se estabeleça a condição que deve verificar o valor da densidade intrínseca. Admitindo
que ni (Ti ) = N , N = N d e conhecida a relação entre ni (Ti ) e ni (T ) , sendo T uma temperatura

conhecida, dada por

ni (Ti )⎛T ⎞
3 2 −WG 2 kTi
e
=⎜ i ⎟ (1.22)
ni (T ) ⎝ T ⎠ e−WG 2 kT

é possível obter, para um dado material, a temperatura Ti .


SEMICONDUTORES 1.29

Um valor apoximado de Ti pode ser obtido a partir da relação

ni (Ti ) ∝ e −WG 2 kTi


(1.23)

Se se considerar que a densidade de impurezas é a mesma em dois materiais com WG


diferentes, então o que tiver maior WG tem maior Ti pois deve verificar-se a igualdade
W W′
− G − G
2 kTi 2 kTi′
e e (1.24)

Nestas condições o Si possui um Ti superior ao do Ge. Este facto torna o Si bastante


atractivo no fabrico de dispositivos por poderem funcionar a temperaturas mais elevadas.

Exemplo 1.7 – Calcular a temperatura Ti para o Si e para o Ge supondo que ambos os


materiais possuem Nd=1021m-3 Si: ni( 300K)= 1016 m-3; WG= 1,124 eV; Ge: ni( 300K)=
2,3x1019 m-3; WG= 0,664 eV.
Solução:
Com base na relação (1.23) tira-se 1/ Ti = 1/ T + ( 2k / WG ) ln ( ni (T ) / ni (Ti ) ) . Partindo do
princípio que a temperatura Ti é definida para a condição ni (Ti ) = N , N = N d obtém-se
então Ti=639K para o Si e Ti=425K para o Ge.

1.6. Geração e recombinação

Como se viu anteriormente, ao processo de geração, quantificado em termos dum ritmo


de geração G[m-3s-1], contrapõe-se sempre um processo de recombinação caracterizado por
um ritmo de recombinação R[m-3s-1]. Em equilíbrio termodinâmico
G=R (1.25)

e G depende, para cada material, somente de temperatura.


Pretendemos relacionar G e R com a densidade n e p. Consideraremos as situações em
que G é independente de n e de p. Esta condição verifica-se em geral porque não só temos um
número muito elevado de electrões na banda de valência como de estados disponíveis na
banda de condução. Contudo a recombinação exige electrões na banda de condução e buracos
na banda de valência e portanto depende de n e de p. Sendo assim, para valores baixos de n e
p (semicondutores não degenerados) e recombinação banda a banda pode escrever-se, em
primeira aproximação,
R (T , n, p) = r (T ) n p (1.26)
1.30 SEMICONDUTORES

em que r(T) é uma constante que depende do material e da temperatura. A relação (1.26) pode
ser interpretada mais facilmente se se escrever R (T , n, p) como um desenvolvimento em série
de Taylor em termos de n e p:

R (T , n, p ) = A + Bn + Cp + Dn 2 + Ep 2 + Fnp + Gn3 + Hp3 + In 2 p + Jnp 2 + " (1.27)

Os termos associados aos coeficientes A, B, C, D, E, G, H,... devem ser zero porque R


tem que ser zero se n ou p for zero. O primeiro termo não zero é Fnp. Os termos de ordem

superior In 2 p e Jnp 2 designam-se por termos de Auger e poderão, numa aproximação de 1ª


ordem, ser desprezados. Estes termos serão importantes e não deverão ser desprezados nos

casos em que n e p são elevados. O termo n 2 p traduz a recombinação que envolve dois
electrões e um buraco. Neste caso a energia e o momento associados à recombinação dum
electrão com um buraco são transferidos para outro electrão na banda de condução. Por sua

vez o termo np 2 envolve um electrão e dois buracos no processo de recombinação, com a


energia e momento da recombinação transferidos para um buraco.
Em equilíbrio termodinâmico
G = R = r (T ) n0 p0 (1.28)

N
Se se admitir a existência de vários mecanismos de geração ter-se-à G = ∑ Gi . A
i =1

condição de equilíbrio termodinâmico obriga a que se verifique o princípio de equilíbrio


detalhado, isto é, que (1.28) se aplique a cada processo de geração-recombinação. Assim, em
equilibrio termodinâmico ter-se-à
N N
∑ Gi = ∑ Ri (1.29)
i =1 i =1

e também
G1 = r1 (T ) n0 p0 = R1
G2 = r2 (T ) n0 p0 = R2
(1.30)
#
GN = rN (T ) n0 p0 = RN

Como há processos de geração-recombinação que não envolvem dadores ou


aceitadores, uma adição de dopantes não altera a respectiva equação correspondente ao
princípio de equilíbrio detalhado
SEMICONDUTORES 1.31

Gi = ri (T ) n0 p0 (1.31)

Contudo, como n0 e p0 se alteram com a densidade de dopante, então o produto

n0 p0 = C te . Sabendo que n0 e p0 para o semicondutor intrínseco valem ni , então o produto

n0 p0 = ni2 para qualquer semicondutor.


Deste modo pode-se escrever:

G = r (T ) ni2 (1.32)

que , para cada material, só depende da temperatura.


Nalguns semicondutores, nomeadamente no Si, a geração e a recombinação não são
banda a banda, mas fazem-se através de estados intermédios na banda proibida designados
por ratoeiras. Este processo designa-se por SRH (Schokley, Read, Hall).

1.6.1. Efeito fotoeléctrico interno

Se o semicondutor, a uma dada temperatura, for iluminado uniformemente com


radiação monocromática de energia W ≥ WG , haverá um processo adicional de geração de
pares electrão-buraco ao qual se pode associar uma taxa de geração por efeito fotoeléctrico

que designaremos por G fe ⎡ m −3s −1 ⎤ . Em regime estacionário a taxa de geração e de


⎣ ⎦
recombinação equilibram-se pelo que:
G = R = rnil pil (1.33)
com
G = Gter + G fe (1.34)

e
nil = n0 + Δ
(1.35)
pil = p0 + Δ
Δ é o excesso de portadores resultantes da iluminação que será igual para electrões e buracos
quando a iluminação é uniforme.
É de realçar que a relação (1.33) só é válida para o regime estacionário. Quando se

estabelece a iluminação G = G fe + Gter e R = r ni2 = Gter e portanto G > R . O aumento de n e

p acarreta um aumento de R que só pára de aumentar quando R = G fe + Gter e as densidades


1.32 SEMICONDUTORES

de portadores alcançam o valor final de nil e pil .


Combinando as duas expressões anteriores ter-se-á:
Gter + G fe = r nil pil (1.36)

ou
G fe r nil pil
1+ = (1.37)
Gter Gter

Como Gter = r ni2 , e admitindo que a temperatura não sofreu uma variação apreciável,
ter-se-á
⎛ G fe ⎞
nil pil = ni2 ⎜1 + ⎟ (1.38)
⎝ Gter ⎠

Exemplo 1.8 – Considere uma amostra de Si a 300 K com impurezas dadoras,


Nd=1019m-3. Sob iluminação uniforme, e na situação estacionária, calcular a densidade de
electrões e buracos se Gfe= 100Gter. Si: ni(300K)= 1016 m-3.
Solução:
Ir-se-à admitir que a 300 K as impurezas estão todas ionizadas. Atendendo a que

N d  ni então n0  N d e p0 = ni2 / n0 . Portanto, em equilibrio termodinâmico, n0=1019m-3


e p0=1013m-3. Com iluminação uniforme e na situação estacionária pode-se utilizar a
equação (1.38) que, em conjunto com (1.35), dá origem a uma equação do 2º grau em
termos da densidade de excessos Δ:

Δ 2 + ( n0 + p0 ) Δ − ni 2G fe / Gter = 0 . Por aplicação dos valores numéricos obtém-se

Δ 2 + 1019 Δ − 1034 = 0 . Das duas soluções só a solução positiva tem significado físico e
vale Δ= 1015m-3. Deste modo, com iluminação, nil = n0 + Δ  n0 = 1019 m −3 e

pil = p0 + Δ  Δ = 1015 m −3 . Como se vê pelos resultados só a densidade dos minoritários


foi alterada, mantendo-se a densidade dos maioritários. Esta perturbação do equilíbrio é
por isso designada por injecção fraca.

A taxa de geração por efeito fotoeléctrico está associada a uma grandeza característica
do material e que é o coeficiente de absorção, α [m-1]. O coeficiente de absorção representa o
número de fotões, de um dado comprimento de onda, que em média são absorvidos por
unidade de comprimento do semicondutor. A quantidade 1/α associa-se à distância que em
média o fotão percorre no semicondutor até ser absorvido. O coeficiente de absorção depende
SEMICONDUTORES 1.33

da energia dos fotões e do material. Na Fig. 1.17 mostra-se o coeficiente de absorção em


função da energia dos fotões para vários materiais semicondutores.
Se se designar por φ [m-2s-1] o fluxo de fotões, com uma dada energia, que incide na
face de uma amostra de semicondutor, a sua taxa de variação com a distância é proporcional
ao seu valor. A constante de proporcionalidade é designada por coeficiente de absorção.
d φ( x)
− = +αφ( x) e assim φ( x) = φ0 e −αx (1.39)
dx

d φ( x)
Define-se o ritmo de geração por efeito fotoeléctrico G fe = − , se se admitir que
dx
por cada fotão absorvido há a criação de um par electrão-buraco. Pode então escrever-se

G fe = αφ0 e−αx (1.40)

Na Fig. 1.18 mostra-se o andamento de Gfe(x) e dá-se a interpretação geométrica de 1/α.

Fig. 1.17 – Coeficiente de absorção em função da energia para vários semicondutores.


1.34 SEMICONDUTORES

0
G fe
αφ0

0 x
1/α

Fig. 1.18 – Evolução de Gfe(x) num semicondutor.

É de notar que se α1 > α 2 ⇒ 1/ α1 < 1/ α 2 , isto é, os fotões a que correspondem maiores


energias são absorvidos mais em superfície.

1.7. Cálculo de n e p em semicondutores não-degenerados

O comportamento dos electrões no material semicondutor rege-se pela equação de


Schrödinger cuja solução é a função de onda. Esta grandeza é, em geral, um número
complexo. O valor do módulo da função de onda ao quadrado é um número real que
representa a densidade de probabilidade de encontrar a partícula num dado instante numa
dada região do espaço.

1.7.1. Electrão num poço de potencial de altura infinita

Um dos resultados mais importantes da aplicação da equação de Schrödinger a um


electrão num cristal é a quantificação da energia. Considere-se a título de exemplo um
electrão num poço de potencial de altura infinita e largura L, Fig. 1.19.
Sendo o electrão uma partícula livre a sua energia potencial WP é constante . Se se
admitir que no interior do poço, WP=0 então a energia total do electrão, W, é igual à energia
cinética Wk, dada por

p2
W = Wk = (1.41)
2m
SEMICONDUTORES 1.35

WP

x
0 L

Fig. 1. 19 – Poço de potencial de altura infinita a uma dimensão.

em que p e m são o momento e a massa do electrão respectivamente. Por sua vez o momento
e o comprimento de onda λ verificam a relação de de Broglie
h
p= = =k (1.42)
λ

k é o número de ondas e = = h 2π .
Para garantir a continuidade da função de onda nas fronteiras
L=nλ 2 (1.43)
em que n é um inteiro.
Combinando as duas relações anteriores obtém-se
h
p= n (1.44)
2L
e portanto

h2
W = n2 (1.45)
8mL2
kn

Admitindo que m é a massa do electrão em repouso m0 = 9,11×1031 kg , ter-se-á:


3,8x10−19 2
W = n (1.46)
L2
kn

Este resultado mostra que o electrão num poço de potencial infinito não possui um

contínuo de valores de energia.

Na Fig.1.20 mostram-se, de forma esquemática, os valores de energia possíveis para o

electrão quando n = 1, 2,3 . Também se referem os valores da energia Wk1 para vários valores

da largura do poço que, de forma clara, indicam a importância da quantificação para os poços
1.36 SEMICONDUTORES

de dimensão reduzida. Para poços com dimensões macroscópicas os níveis de energias estão

tão próximos que podem ser olhados como formando um contínuo de energia.

Wk

L = 10 Å ⇒ Wk1 = 0, 4 eV
. . Wk3

L = 100 Å ⇒ Wk1 = 3,8 meV


. .

L = 1 mm ⇒ Wk1 = 3,8 × 10−13 eV


. . Wk 2

Wk1

Fig. 1.20 – Quantificação da energia para um electrão num poço de potencial de altura infinita.

Para um poço de potencial a três dimensões, com comprimentos Lx, Ly e Lz, a


quantificação da energia é expressa por

h 2 ⎛ n12 n22 n32 ⎞


Wk = ⎜ + + ⎟ (1.47)
8m ⎜⎝ L2x L2y L2z ⎟⎠

em que n1, n2 e n3 são números inteiros designados por números quânticos principais e

Lx Ly Lz = V0 é o volume do cristal.

Para cada conjunto ( n1, n2 , n3 ) , que define um dado estado de movimento,

correspondem dois estados quânticos associados ao spin do electrão, e que pode tomar os
valores ± 1 2 .

1.7.2. Densidade de estados em energia

O número de estados de movimento possíveis para o electrão obtém-se contando as


combinações n1, n2 e n3 .
A determinação do número de estados de movimento é mais fácil de determinar
tomando como base o espaço dos momentos, Fig. 1.21.
SEMICONDUTORES 1.37

pz

p+dp h/(2Lz) p
.
h/(2Lx) h/(2Ly) py

px
Fig. 1. 21 – Representação no 1º octante do espaço dos momentos do volume correspondente a um
estado de movimento.

A partir das relações para as componentes do momento do electrão segundo as três


direcções

h h h
px = n1 ; p y = n2 ; pz = n3 (1.48)
2 Lx 2 Ly 2 Lz

e tendo em linha de conta os valores positivos de n1, n2 e n3 , pode identificar-se o volume


correspondente a um estado de movimento expresso por

h3 ⎛ h ⎞ ⎛ h ⎞⎛ h ⎞
=⎜ ⎟⎜ ⎟⎜ (1.49)
8V0 ⎝ 2 Lx ⎠ ⎜⎝ 2 Ly ⎟ ⎝ 2 Lz ⎟⎠

Assim, no espaço dos momentos, o número de estados de movimento por unidade de

volume é dado por 8V0 h3 . Atendendo a que a cada estado de movimento correspondem dois

8V0
momentos de spin, o número de estados quânticos na unidade de volume é 2 × .
h3
O volume entre a esfera de raio p e a de raio p+dp é, para o primeiro quadrante

( 4π p2dp ) 8 e por isso o número de estados quânticos neste volume, dN(p) é dado por
8V0
dN ( p ) = π p 2 dp (1.50)
h3

Em termos da energia, atendendo a que:


1.38 SEMICONDUTORES

p2
Wk = , p = 2mWk
2m k
2 p dp = 2m d Wk (1.51)
m m
dp = d Wk = d Wk
p 2mWk

ter-se-á
8π V0
dN(Wk ) = m 2m Wk d Wk (1.52)
h3

em que dN (Wk ) é o número de estados quânticos possíveis entre Wk e Wk + d Wk . A

densidade de estados quânticos em energia, g (Wk ) é definida como

dN (Wk ) 8π V0
g (Wk ) = = m 2mWk (1.53)
d Wk h3

e está representada na Fig. 1.22.

Wk

0 g(W k )

Fig. 1.22 – Função densidade de estados quânticos em energia

Pode parecer estranho que se tenha obtido uma densidade de estados em energia onde a
quantificação parece estar ausente. Contudo, como se viu na secção anterior, nos cristais com
dimensões macroscópicas os estados discretos de energia estão tão próximos que podem ser
olhados como formando um contínuo de valores de energia. No caso de dispositivos de
dimensão reduzida a relação (1.53) não é válida e a quantificação deve transparecer na relação
e no gráfico da respectiva densidade de estados em energia.
SEMICONDUTORES 1.39

1.7.3. Densidade de estados em energia para os electrões num cristal

A periodicidade da rede cristalina é responsável pelo aparecimento de bandas de energia


permitidas e bandas de energia proibidas. Nos casos em que o cristal é isotrópico e, para
valores próximos de uma dada energia W0 , pode escrever-se

W = W0 + C0 p 2 (1.54)

Esta expressão pode ser interpretada, sob o ponto de vista clássico, como sendo a soma
1
de uma energia potencial W0, com uma energia cinética C0p2, em que C0 = .
2m0
Para os electrões de condução C0>0 e pode escrever-se:
(W > Wc )
2
W = Wc +
p
2mc*
( mc* > 0) (1.55)
( C0 > 0 )
enquanto que para os electrões de valência C0<0:

(W < WV )
2
W = WV +
p
2mV*
( mV* < 0) (1.56)
( C0 < 0 )

mc* , mV* são as massas eficazes dos electrões na banda de condução e de valência
respectivamente. No sentido de manter o formalismo clássico, introduz-se o conceito de

buraco com carga +q e massa eficaz m*p = − mV* > 0 .

Para os buracos ter-se-à então

p2
W = WV − (W < WV ) (1.57)
2m*p

Quer os electrões, quer os buracos são partículas livres (sob o ponto de vista clássico),
com energia de posição constante e igual a WC e WV respectivamente. As densidades de
estados quânticos em energia para os electrões e buracos podem então ser expressas por

8πV0
gc (W ) = 3
mn* 2mn* (W − Wc ) (W ≥ Wc ) (1.58)
h
1.40 SEMICONDUTORES

8πV0
gv (W ) = 3
m*p 2m*p (Wv − W ) (W ≤ WV ) (1.59)
h

em que mn* = mc* , e estão representadas na Fig.1.23.

1.7.4. Estatística de Fermi-Dirac

A distribuição dos electrões pelos estados quânticos obedece a uma função de


distribuição denominada por distribuição de Fermi-Dirac.
Esta distribuição assenta em dois pressupostos:
1) os electrões são indiscerníveis (princípio da indiscernibilidade)
2) não pode haver mais de um electrão por cada estado quântico (princípio de
exclusão de Pauli).

WC
gC (W)
WG
WV
gV(W)

Fig. 1. 23 – Representação de gC(W) e gV(W).

Baseado nestas condições e partindo da hipótese de que se tem um certo número N de


electrões com energia total W, eles irão ser distribuídos pelos diversos estados quânticos, de
modo a verificarem-se as condições impostas. Supõe-se que todos os estados quânticos têm
igual probabilidade de serem ocupados. Há várias maneiras de distribuir os N electrões pelos
vários estados quânticos possíveis de modo a que a energia total seja W. Uma distribuição
pode ser realizada de várias maneiras. A distribuição mais provável é a que se pode realizar de
um maior número de maneiras possível.
SEMICONDUTORES 1.41

A título de exemplo, considera-se que se têm N = 4 e W = 7 em que os estados de


energia possíveis são os estados 1, 2, 3 e que valem 1, 2, 3. Para cada um destes valores de
energia considerem-se três estados quânticos. Pretende-se descobrir qual a distribuição mais
provável. Neste caso só vai haver duas distribuições possíveis, (a) e (b), Fig.1.24.

W
3

(a) (b)
Fig.1. 24 – Distribuição de 4 electrões pelos estados quânticos de modo a garantir que a energia total é
igual a 7.

O número de maneiras associado à distribuição (a) ma é dada por

⎛ 3⎞ ⎛ 3⎞ ⎛ 3 ⎞
ma = ⎜ ⎟ ⎜ ⎟ ⎜ ⎟ = 27 (1.60)
⎝1⎠⎝1⎠⎝ 2⎠

e à distribuição (b) é
⎛ 3⎞ ⎛ 3⎞ ⎛ m⎞ m!
mb = ⎜ ⎟ ⎜ ⎟ = 3 ⎜ ⎟= (1.61)
⎝ 1⎠ ⎝ 3⎠ ⎝ n ⎠ ( m − n )!n !

Deste modo a distribuição (a) é a mais provável.


Para além da estatística de Fermi-Dirac, aplicável aos electrões, é importante referir a
estatística de Bose-Einstein e de Maxwell-Boltzmann. A estatística de Bose-Einstein assenta
no princípio da indiscernibilidade das partículas mas não no princípio de exclusão de Pauli.
Aplica-se a fotões. Quanto à estatística de Maxwell-Boltzmann não verifica os dois princípios
referidos e aplica-se às moléculas de um gás rarefeito.
As estatísticas referidas são representadas por funções de distribuição que traduzem o
grau de preenchimento dos estados quânticos com energia entre W e W+dW. Para a estatística
de Fermi-Dirac a função de Fermi-Dirac f (W ) é dada por

1
f (W ) = W −WF
0 ≤ f (W ) ≤ 1 (1.62)
1 + e kT
1.42 SEMICONDUTORES

em que WF é a energia de Fermi, T é a temperatura absoluta e k é a constante de Boltzmann,


k= 1,38x10-23 J/K. Para a estatística de Bose-Einstein a função de distribuição é dada por
1
f B − E (W ) = W −WF
(1.63)
e kT −1

enquanto que para a estatística de Maxwell-Boltzmann se tem


W −WF

f M − B (W ) = e kT (1.64)

Atendendo a que o nosso objectivo é estudar o comportamento dos electrões e buracos


no semicondutor ir-se-á dedicar um pouco mais de atenção à estatística de Fermi-Dirac. Como
foi referido a função f(W) indica o grau de preenchimento dos estados quânticos e toma
valores entre 0 e 1. Sendo assim a função 1 − f (W ) traduz o grau de desocupação dos
correspondentes estados quânticos e pode ser expressa como
1
1 − f (W ) = W −WF
(1.65)

1+ e kT

Os gráficos de f(W) e 1-f(W) são bastante elucidativos e estão representados na


Fig.1.25, tendo em linha de conta a transformação

W − WF
=u (1.66)
kT

Para T = 0 K se
W > Wf i.e. u > 0 , f (u ) = 0
(1.67)
W < WF i.e. u < 0 , f (u ) = 1

Para T ≠ 0 K →W = WF i.e. u = 0, f (u ) = 1/ 2

(W − WF ) >> kT i.e. u → +∞ , f (u ) → 0
(1.68)
(W − WF ) << −kT i.e. u → −∞ , f (u ) → 1

Há um aspecto importante ligado com a forma da curva associada à função f(u) que se
traduz no seguinte resultado: para qualquer u, a função f(u) toma o mesmo valor que a função
1-f(-u), isto é, o grau de ocupação para um dado valor de energia é igual ao grau de
desocupação para um valor de energia simétrico relativamente à energia de Fermi.
Nalgumas situações importantes é possível simplificar a função de Fermi-Dirac, como é
SEMICONDUTORES 1.43

o caso em que
W −WF
1 −
W − WF >> kT , f (W ) = W −WF
e kT (1.69)
1 + e kT

Esta aproximação chama-se de aproximação de Maxwell-Boltzmann, em virtude da


função de Fermi-Dirac ser aproximada pela função de distribuição associada à estatística de
Maxwell-Boltzmann.

T ≠0 K
1 − f (u )

0 1 f (u )
1/2

T =0 K

Fig. 1. 25 – Função de Fermi a T=0 K e T≠0 K.

O nível de Fermi, WF , em equilíbrio termodinâmico, é constante em qualquer região


do material, quer ele seja homogéneo ou não, porque a estatística de Fermi-Dirac é obtida sem
ter em linha de conta o número de estados quânticos em energia e a sua distribuição espacial.
O nível de Fermi varia com a temperatura. Para os metais WF decresce ligeiramente com o
aumento da temperatura. No entanto para os semicondutores a variação depende do tipo de
semicondutor, como será fácil de perceber pelas considerações feitas mais à frente. Pode-se
no entanto adiantar que nos semicondutores intrínsecos WF é praticamente independente da
temperatura, nos semicondutores tipo-n WF desce com o aumento de temperatura e que para
os semicondutores tipo-p WF sobe com o aumento de temperatura.
1.44 SEMICONDUTORES

1.7.5. Cálculo da densidade de electrões e buracos no semicondutor

Atendendo a que, gc (W ) dW é o número de estados quânticos existentes entre W e

W + dW e f (W ) é o grau de preenchimento dos estados quânticos, o número de electrões


que existe entre W e W + dW é dado por f (W ) gc (W ) dW .
Assim, o número total de electrões na banda de condução é calculado por

N= ∫ f (W ) gc (W ) dW (1.70)
Wc

ou seja,

⎛ 1 ⎞ 8πV0 * *
N= ∫ ⎜ W −WF ⎟ 3 mn 2n (W − Wc ) dW (1.71)
Wc ⎜ ⎟ h
⎝ 1 + e kT ⎠

Definindo a densidade de electrões n = N V0 e considerando Wc − WF >> kT , i.e.,


W −WF
1 −
W −WF
=e kT (1.72)
1 + e kT

tem-se
∞ W −WF
8π mn* −
n= 3 ∫ e kT 2mn* (W − Wc ) dW (1.73)
h Wc

Resolvendo o integral obtém-se


3/ 2 Wc − WF
⎛ 2πm* kT ⎞ −
n = 2⎜ n ⎟ e kT (1.74)
⎜ 2 ⎟
⎜ h ⎟
⎝ ⎠

que se pode escrever de forma mais compacta como


W −W
− c F
n = Nc e kT (1.75)

em que Nc é a densidade efectiva de estados na banda de condução dada por


3/ 2
⎛ 2πm* kT ⎞
N = 2⎜ n ⎟ (1.76)
c ⎜ 2 ⎟
⎜ h ⎟
⎝ ⎠

De igual modo a densidade de buracos p é obtida a partir da expressão


WV
P= ∫ gV (W ) ⎡⎣1 − f (W ) ⎤⎦ dW (1.77)
−∞
SEMICONDUTORES 1.45

que, após ter-se também utilizado a aproximação de Maxwell-Bolzmann, dá


32 W −W
P ⎛ 2πm*p kT ⎞ − F V
p= = 2⎜ ⎟ e kT (1.78)
V0 ⎜ h2 ⎟
⎝ ⎠

ou seja
W −W
− F V
p = NV e kT (1.79)

em que NV é a densidade efectiva de estados na banda de valência dada por


3/ 2
⎛ 2πm* kT ⎞
⎜ p ⎟
N = 2⎜ ⎟ (1.80)
V 2
⎜ h ⎟
⎝ ⎠

É importante ter em atenção que as relações (1.75)e(1.79) só são válidas para o


equilibrio termodinâmico e na aproximação de Maxwell-Bolzmann, isto é, o nível de Fermi
deve estar localizado na banda proibida e suficientemente afastado da banda de condução e da
de valência de alguns kT. Os semicondutores que verificam estas condições designam-se por
não-degenerados.
Na Fig.1.26 faz-se a representação gráfica do cálculo do número total de electrões N e
buracos P na banda de condução e na banda de valência respectivamente.

W
W W

1 − f (W )
N
WC WC
WF gC(W) WF gC(W) f(W)
WG WF WG
WV 1/2 1 f (W )
WV
gV(W) P gV(W) [1-f(W)]

Fig. 1. 26 – Representação gráfica do cálculo de N e P.


1.46 SEMICONDUTORES

1.7.5.1 Localização do nível de Fermi no semicondutor intrínseco e extrínseco

Num semicondutor intrínseco n=p=ni e portanto


W −W W −W
− c Fi − Fi V
Nc e kT = Nv e kT (1.81)

W −W
+ Fi V
multiplicando ambos os membros por e kT e dividindo por NC , vem:
−WC +WFi +WFi −WV
NV
e kT = (1.82)
NC

2WFi ⎛ WV + WC ⎞ ⎛ NV ⎞
−⎜ ⎟ = ln ⎜ N ⎟ (1.83)
kT ⎝ kT ⎠ ⎝ C⎠

WV + WC kT ⎛ NV ⎞
WFi = + ln ⎜ ⎟ (1.84)
kT 2 ⎝ NC ⎠

32
NV ⎛ m p ⎞ ⎛ NV ⎞ 3 ⎛ m p ⎞
* *
= ⎜ ⎟ → ln ⎜ ⎟ = ln ⎜ ⎟ (1.85)
NC ⎜ mn* ⎟ ⎝ C⎠
N 2 ⎜ * ⎟
⎝ ⎠ ⎝ mn ⎠

ou seja

WV + WC 3 ⎛ m*p ⎞
WFi = + kT ln ⎜ * ⎟ (1.86)
2 4 ⎜ mn ⎟
⎝ ⎠

Se m*p = mn* ⇒ WFi está exactamente a meio da banda proibida. Se o semicondutor for

extrínseco tipo-n WF aproxima-se da banda de condução e se for tipo-p aproxima-se da banda


de valência, Fig. 1.27. A variação de WF com a temperatura deverá ser agora fácil de perceber
se atendermos a que os semicondutores extrínsecos se comportam como intrínsecos a
temperaturas elevadas.

>>kT
WC WC WC
WF
WFi
WF
WV WV WV
>>kT

intrínseco tipo-n tipo-p

Fig. 1. 27 – Localização do nível de Fermi nos semicondutores não-degenerados.


SEMICONDUTORES 1.47

As densidades n e p podem ainda escrever-se em termos da densidade intrínseca e da


posição relativa do nível de Fermi ao nível de Fermi intrínseco.
W −W W −W +W −W W −W W −W
− F − F Fi Fi − Fi F Fi
n=N e kT =N e kT =N e kT e kT (1.87)
c c c
ou seja
W −W
F Fi
n=ne kT (1.88)
i
De igual modo se pode escrever
WFi −WF
p = ni e kT (1.89)

1.7.5.2 Densidade intrínseca. Variação com a temperatura

Num semicondutor não-degenerado ter-se-à, em equilíbrio termodinâmico,


−WC +WF −WF +WV W −W W
− C V − G
np = NC NV e kT = NC NV e kT = NC NV e kT (1.90)

Este resultado indica que o produto np é independente da localização do nível de Fermi


e portanto será válido para qualquer semicondutor, intrínseco ou extrínseco. Sendo que para o
semicondutor intrínseco n=p=ni, ter-se-à , para qualquer semicondutor não-degenerado em
equilíbrio termodinâmico,
W
− G
np = ni2 = NC NV e kT (1.91)
ou seja
WG

ni = NC NV e 2 kT (1.92)

Atendendo a que NC NV ∝ T 3 , ter-se-á

ni2 ∝ T 3 e −WG ( kT )
ou seja ni ∝ T 3 2 e −WG (2 kT )
(1.93)

As expressões anteriores mostram que a densidade intrínseca depende da temperatura


através de um termo exponencial e duma potência. Verifica-se que o termo exponencial é
dominante nas condições usuais. Na Fig. 1.28 mostra-se o andamento com a temperatura da
densidade intrínseca para vários semicondutores.
1.48 SEMICONDUTORES

10 20

10 15
ni (cm-3) Ge

Si
10
10

GaAs

105
1 2 3 4
-1
1000/T (K )

Fig. 1. 28 – Densidade intrínseca em função da temperatura para vários semicondutores.

As expressões anteriores só são válidas em equilíbrio termodinâmico para


semicondutores não-degenerados. Fora do equilíbrio termodinâmico podemos manter as
expressões para as concentrações de electrões e buracos desde que desdobremos o nível de
Fermi, WF, em dois pseudoníveis de Fermi ou imref (de “imaginary reference” ou a palavra
fermi escrita ao contrário), um para electrões e o outro para buracos. Deste modo as
relações, (1.75), (1.79), (1.88) e (1.89) serão escritas como
W −W WFp −WV WFn −WFi WFi −WFp
− c Fn −
n = Nc e kT , p = NV e kT , n = ni e kT e p = ni e kT (1.94)

em que WFn e WFp são os pseudoníveis de Fermi para electrões e buracos respectivamente.
Em situações de não-equilíbrio termodinâmico o produto np é diferente de ni2 e pode ser
expresso em termos da separação dos dois pseudoníveis de Fermi,
WFn −WFp
np = ni2 e kT (1.95)

Deste modo a separação dos dois pseudoníveis de Fermi é portanto uma medida do
desvio das concentrações de portadores relativamente à situação de equilíbrio
termodinâmico, para a qual o desvio é zero.
Quando o semicondutor possui densidades de impurezas de substituição elevadas, i.e.,
SEMICONDUTORES 1.49

próximas de NC ou NV (~1025 m-3 para o Si), já não é válida a aproximação de Maxwell-


-Bolzmann e portanto as relações (1.75) e (1.79) não estão correctas. Nomeadamente já não
se verifica a relação pn=ni2. Semicondutores fortemente dopados designam-se por
degenerados e são caracterizados por possuírem o nível de Fermi muito próximo ou mesmo
dentro da banda de condução ou de valência. A existência de estados de energia permitidos
junto ao nível de Fermi justifica que muitas das propriedades eléctricas dos semicondutores
degenerados sejam idênticas às dos metais. Adicionalmente existe uma diminuição da altura
da banda proibida em virtude dos estados associados à impurezas darem origem a bandas de
energia que se sobrepõem à banda de condução ou de valência. Para o Si, a diminuição da
altura da banda proibida pode ser desprezável para densidades de dopante inferiores a
1024m-3. Contudo verifica-se que, para uma densidade de impurezas dadoras de 1025m-3, já a
variação da altura da banda proibida pode ser superior a 10% do seu valor.

1.8. Condução

Os electrões e os buracos podem ser olhados como partículas livres desde que se lhes
associe uma massa eficaz. Num cristal perfeito e, sob o ponto de vista clássico, este tipo de
partículas tem um movimento rectilíneo e uniforme, limitado somente pelas paredes do
cristal. Na realidade este movimento é afectado pela existência de “choques” em vários
pontos do espaço e que obrigam a trajectória a desviar-se de forma aleatória. Estes “choques”
devem-se à alteração do andamento periódico ideal do potencial que pode ter origem na
temperatura, impurezas, ou imperfeições de rede cristalina. Variações do potencial no espaço
estão associadas a campos eléctricos locais, isto é forças de natureza eléctrica, que são
responsáveis pela alteração do estado de movimento do electrão.
Dos três tipos de “choques” o mais importante é o que está associado à temperatura, por
envolver todos os átomos do cristal. A temperatura faz com que os átomos oscilem em torno
das suas posições de equilíbrio conduzindo a alterações do potencial nessa região. Os
electrões ou os buracos que se movimentem junto aos átomos irão sentir estas perturbações e
portanto alterar a sua trajectória, como se mostra na Fig. 1.29. A densidade de impurezas é
normalmente muito inferior à dos átomos de base do semicondutor e não tem um efeito tão
importante quanto a temperatura. Por sua vez é possível, com a actual tecnologia, reduzir os
defeitos cristalinos a valores tais que se pode desprezar a sua influência no movimento dos
electrões ou dos buracos.
1.50 SEMICONDUTORES

Fig. 1.29 – Movimento dos electrões ou buracos devido à agitação térmica.

Este movimento de agitação térmica não dá origem a corrente eléctrica e por isso valor
G
médio da velocidade vth = 0 . Esta expressão pode ser interpretada como sendo o resultado

de observação no tempo da velocidade de uma só partícula ou a resultante da velocidade de


todas as partículas, de um dado tipo, num dado instante. Para os metais vth  106 m / s e para os

semicondutores vth  105 T / 300 m / s . Define-se tempo livre como o tempo que decorre entre
dois “choques”consecutivos e espaço livre como a distância percorrida correspondente.
Contudo, para a população de electrões e buracos presentes no semicondutor é mais adequado
falar em valores médios pois as propriedades macroscópicas do semicondutor estão
associadas ao comportamento do colectivo de partículas. Nesse sentido é mais importante
falar em espaço livre médio ou tempo livre médio para os portadores de carga.
G
Quando se aplica um campo eléctrico E , aparece uma força eléctrica que, para o
electrão é dado por:
G G
Fn = − qE (1.96)

e para o buraco é
G G
Fp = qE (1.97)

Sendo o campo constante, a força também o será e, de acordo com os resultados da


mecânica clássica o movimento é uniformemente variado e a trajectória destas partículas é em
G G
geral parabólica (só será rectilínea quando v e E forem paralelos), Fig. 1.30.
SEMICONDUTORES 1.51

G
G v th
v⊥

G
F
G
v&

Fig. 1.30 – Trajectória dum electrão sob a acção duma força constante.

Após vários choques a trajectória do electrão pode ser visualizada como sendo
constituida por vários arcos de parábola, Fig. 1.31. Se o campo eléctrico não for
suficientemente elevado pode escrever-se
G G G
v = vth + vF (1.98)
G
em que vF traduz o vector velocidade associado à força.
Em valores médios:
G G G G
v = vth + vF = vF (1.99)

Entre “choques” a componente da velocidade paralela à força aumenta de acordo com a


relação: G
G F
vF = t (1.100)
m*

G
E
G
Fn

Fig. 1.31 – Trajectória do electrão após vários choques quando sujeito a um campo eléctrico constante.
1.52 SEMICONDUTORES

e por isso G G
G F F
vF = t = τ (1.101)
m* m*

em que τ é o tempo livre médio.


Para os electrões ter-se-á então
G qτ G G
v = − n E = −μ E (1.102)
m*
F n n
n

em que

μ = n [m 2V −1s −1] (1.103)
n
m*
n

é designada por mobilidade dos electrões. De acordo com (1.102) pode-se interpretar a
mobilidade dos electrões como o valor médio do acréscimo da sua velocidade entre dois
choques consecutivos, segundo a direcção do campo eléctrico aplicado, quando este vale 1
V/m. De forma idêntica obtém-se para os buracos:
qτ G G
G p
v = E =μ E (1.104)
m*
F p p
p

em que

[m 2V −1s −1]
p
μ = (1.105)
p
m*
p

é a mobilidade dos buracos, que pode ser interpretada de forma idêntica à dos electrões.
As relações de proporcionalidade entre a velocidade média, também designada por velocidade
de deriva, e o campo eléctrico, (1.102) e (1.104), só são verificadas para campos eléctricos
baixos, isto é, quando não há alteração significativa da velocidade ou energia dos portadores.
A evolução da velocidade de deriva com o campo eléctrico depende do material semicondutor
e tende a saturar para campos eléctricos elevados, Fig 1.32. Este comportamento tem a sua
origem na estrutura das bandas do semicondutor e nos processos de colisão associados aos
electrões mais energéticos.
SEMICONDUTORES 1.53

3
InGaAs

InP

Velocidade dos electões (105m/s)


GaAs
2

T= 300K

Si

0
0 5 10 15 20
Campo Eléctrico (kV/cm)

Fig. 1. 32 – Velocidade de deriva dos electrões em função do campo eléctrico para vários materiais
semicondutores.

Na Tabela 1.8 indicam-se alguns valores típicos das mobilidades dos electrões e buracos
para vários semicondutores, a 300 K. É importante realçar que para um dado material a uma
dada temperatura se verifica sempre μ p < μ n .

Tabela 1.8
Mobilidades a 300 K para vários semicondutores

T=300 K Ge Si GaAs
μn (m2V-1s-1) 0,39 0,15 0,85
μp (m2V-1s-1) 0,19 0,045 0,04

Um aumento de temperatura, em geral, faz diminuir a mobilidade em virtude de


aumentar a frequência de “choques” com os átomos da rede. Contudo, para um semicondutor
com uma elevada densidade de impurezas e na gama de temperaturas baixas, um aumento de
temperatura pode conduzir a um aumento da mobilidade, Fig.1.33(a), em virtude de haver
uma diminuição de choques associados às impurezas e serem estas que determinam o valor da
mobilidade. Por sua vez, para uma dada temperatura, o aumento da densidade de impurezas
conduz sempre a uma diminuição das mobilidades, Fig.1.33(b).
1.54 SEMICONDUTORES

1 N D = 1021 m −3

Mobilidade dos electrões (m2/(V.s))


(a)

10−1
1023
Si
−2
10 1025

10−3
0 100 200 300 400 500
T (K)

0.20 T= 300K
Mobilidade dos electrões (m2/(V.s))

T= 348K
T= 398K
0.15

0.10 (b)
Si
0.05

0
1021 1022 1023 1024 1025 1026
-3
Concentração de dopante (m )

Fig.1.33 – Si: (a) Mobilidade em função da temperatura; (b) Mobilidade em função da densidade de
dopante.

No caso de os dois mecanismos de desvio serem independentes, a frequência média das


colisões é a soma das frequências médias devida a cada um dos mecanismos, podendo
escrever-se:
1 1 1
= + (1.106)
τ τ1 τ2

e portanto
μ1μ 2
μ= (1.107)
μ1 + μ 2

A existência duma velocidade média não nula segundo a direcção do campo, (1.102) e
(1.104), dá origem a um fluxo de partículas carregadas nessa direcção, ou seja a corrente
G G
eléctrica. Atendendo que a densidade de corrente é dada por J cond = ρ vF , ter-se-á:
G G
para os electrões: J ncond = + qnμ n E (1.108)
SEMICONDUTORES 1.55

G G
e para os buracos: J pcond = qpμ p E (1.109)

Num semicondutor a densidade de corrente total vai ter a contribuição de ambos os portadores
de carga e portanto
G G G
J =J +J (1.110)
cond n p
cond cond
Atendendo à lei de Ohm local
G G
J = σE (1.111)
cond

em que σ é a condutividade, obter-se-à para o semicondutor


σ = q(nμ + pμ )
n p [ S / m] (1.112)

Para o semicondutor intrínseco a condutividade pode escrever-se como:

(
σ = σi = q ni μ n + μ p ) (1.113)

No caso dum semicondutor extrínseco tipo-n ter-se-à


σ  σn = qn μ n ( n  ni ) (1.114)

e extrínseco tipo-p
σ  σ p = qp μ p ( p  ni ) (1.115)

Como se vê da relação (1.112) pode-se aumentar a condutividade aumentando a densidade de


portadores e/ou as mobilidades. Atendendo a que se pode alterar a densidade de portadores
em várias ordens de grandeza adicionando impurezas de substituição ao semicondutor, é fácil
de perceber que os semicondutores extrínsecos possuem valores de condutividade várias
ordens de grandeza superiores aos dos semicondutores intrínsecos. Convém relembrar que
este resultado pode ser obtido com densidades de impurezas de substituição muito pequenas,
e.g., uma impureza por um milhão de átomos de base.

É importante realçar que para um campo eléctrico constante a corrente eléctrica também
é constante. Este resultado deve-se ao facto de a velocidade média ser constante e não
aumentar com o tempo, como acontece às partículas clássicas sujeitas a forças constantes.
Não há aqui qualquer contradição porque as partículas estão sujeitas a “choques” e em cada
“choque” o acréscimo de energia obtido, associado ao aumento da velocidade, é todo
transferido para a rede cristalina. Esta energia transferida para a rede cristalina, em valores
médios, dá origem a um aumento de temperatura do cristal usualmente referido como efeito
de Joule. Os “choques” funcionam como uma força de atrito que se opõe ao movimento dos
portadores de carga e permite obter uma velocidade média constante para cada valor do
1.56 SEMICONDUTORES

campo eléctrico. A condutividade está por isso ligada com a maior ou menor resistência à
passagem da corrente no semicondutor. Para um dado campo eléctrico quanto maior a
condutividade maior a corrente. O inverso da condutividade designa-se por resistividade,
ρ = 1/ σ [Ω.m] . Conhecida a condutividade/resistividade, o comprimento L, e a área da
secção transversal S dum semicondutor homogéneo pode-se calcular a sua resistência através
da expressão:

1L L
R= =ρ (1.116)
σS S

Exemplo 1.9 – Considerar uma resistência de germânio de tipo-n com 1 mm2 de secção
e 1 cm de comprimento que possui uma densidade de impurezas dadoras Nd=1,5x1021m-3.
Calcular a condutividade e a resistência da barra semicondutora a 300 K e a 410K. Admitir
que as mobilidades variam com o inverso da temperatura.
Dados: Ge(300K): ni=2,4x1019m-3; μn=0,4 m2V-1s-1; μp=0,2 m2V-1s-1; WG=0,66 eV.
Solução:
Ir-se-á admitir que a 300 K as impurezas estão todas ionizadas. Atendendo a que
N d  ni então n0  N d e p0 = ni2 / n0 . Portanto, em equilibrio termodinâmico,
n0=1,5x1021m-3 e p0=3,84x1017m-3. A condutividade σ = q (n0μ n + p0μ p ) e portanto σ = 96

S/m.De R = L / ( σS ) obtém-se R=104,2 Ω. Aumentando a temperatura aumenta ni. O

valor de ni(410K)= 1,16x1021 m-3, ver Exemplo 1.5. Neste caso já se não verifica N d  ni
e é necessário resolver o sistema que envolve as equações (1.16) e (1.18) obtendo-se
n0(410K)=2,1x1021m-3; p0(410K)=6,3x1020m-3. Por sua vez as mobilidades a T e a T’ estão
relacionadas através de μ(Τ’)=μ(T)(T/T’) pelo que μn(410K)= 0,293 m2V-1s-1 e

μp(410K)=0,146 m2V-1s-1. Tira-se então σ(410 K )  113 S / m . Verifica-se que

σ ( 410 K ) > σ ( 300 K ) ou seja, o aumento da densidade de portadores domina

relativamente à diminuição das mobilidades. O aumento de temperatura foi


suficientemente elevado para que o semicondutor deixasse de se comportar como
fortemente extrínseco tipo-n e se encontre no limiar da região intrínseca de
funcionamento. Desprezando as variações das dimensões com a temperatura obtém-se
R(410K)= 88,5 Ω.

Se o semicondutor não for homogéneo a condutividade será diferente em várias


regiões do semicondutor e a expressão (1.116) já não é válida. É esse o caso das resistências
de circuito integrado que possuem uma condutividade à superfície superior à condutividade
nas camadas mais profundas. Na Fig. 1.34 mostra-se, de forma esquemática , uma resistência
SEMICONDUTORES 1.57

de circuito integrado constituida por uma camada de semicondutor extrínseco, de tipo


diferente da que constitui o substrato. Nesta resistência a concentração de dopante é máxima à
superfície e decresce até a uma distância b, junto ao substrato.

Contacto
metálico
Isolante
w
0 y
p p+
p+ b
z
x
L
n

Fig. 1.34 - Resistência de circuito integrado.

Neste caso a resistência deve ser calculada de acordo com a relação:


1 L
R= b
(1.117)
W
∫ σ ( x ) dx
o

em que L é o comprimento, W a largura e b a profundidade da resistência. Conhecida a


evolução da densidade de impurezas e da mobilidade com x é possível calcular o integral e de
seguida obter o valor da resistência. O cálculo do integral pode ser contudo difícil a não ser
que se façam algumas simplificações. No caso de uma distribuição da densidade de impurezas
N(x) do tipo gaussiano e com a densidade de portadores maioritários igual a N(x), com uma
mobilidade constante μ , ter-se-à:
b

∫ σ ( x ) dx = qN μ
'
(1.118)
0

em N ' é a densidade de dopante por unidade de área. É importante realçar que o valor do
integral pode ser obtido através da medida duma resistência de semicondutor que possui uma
superfície quadrada (L=W). A relação (1.117) pode então escrever-se como
L
R = R, (1.119)
W
em que R, é a resistência da camada e L/W representa o número de quadrados que descrevem
as dimensões superficiais da resistência. R, tem as dimensões de Ω mas é especificado, por
convenção, em Ω /, . A título de exemplo, uma resistência de circuito integrado com L= 30
μm e largura W= 3 μm para a qual R, = 300 Ω /, possui um valor de 3 kΩ. A resistência da
camada ainda pode ser escrita na forma
1.58 SEMICONDUTORES

1
R, = (1.120)
σb
em que σ é a condutividade média da resistência calculada a partir de
b
1
σ ( x ) dx
b ∫0
σ= (1.121)

No exemplo anterior se se admitir que b= 5 μm então a condutividade média da resistência


vale 667 S/m.
A condutividade depende da temperatura através da mobilidade e da densidade de
portadores. Na Fig.1.35 mostra-se, para um semicondutor extrínseco, a variação da
condutividade com a temperatura. É possível distinguir três zonas: ionização, saturação e
intrínseca, correspondentes às zonas definidas para as curva da Fig. 1.16, relativa à variação
da densidade de portadores com a temperatura. É de realçar que só na zona de saturação há
uma diminuição da condutividade com o aumento da temperatura, em virtude de a densidade
de portadores se manter aproximadamente constante neste intervalo de temperaturas mas a
mobilidade descer.

log σ

saturação
ionização

intrínseca

Semicondutor tipo-n ou tipo-p

1/Ti 1/T

Fig. 1.35 – Variação da condutividade com a temperatura num semicondutor extrínseco.

Das considerações anteriores é importante notar que a condutividade, isto é, a


resistência dum semicondutor varia com a temperatura. Nos circuitos que envolvem
resistências de semicondutor poderá ser necessário ter em linha de conta este efeito para
garantir o seu funcionamento correcto.
A sensibilidade à temperatura das resistências de semicondutor pode no entanto ser
utilizada na implementação de sensores de temperatura. As resistências mais sensíveis à
temperatura são de semicondutor intrínseco e designam-se por termistores de coeficiente de
SEMICONDUTORES 1.59

temperatura negativo (NTC- Negative Temperature Coefficient) em virtude da resistência


diminuir com o aumento de temperatura. Termistores cuja resistência aumenta com o aumento
de temperatura designam-se por PTC - Positive Temperature Coefficient.
Os termistores NTC, independentemente de serem de material semicondutor ou não,
possuem uma lei de variação da resistência com a temperatura que é dada por
B
R = Ae T (1.122)

em que A é uma constante de proporcionalidade com dimensões de Ω e B é uma constante


positiva que toma valores típicos da ordem de milhares de graus Kelvin. Na expressão (1.122)
T é a temperatura em K. De acordo com a expressão (1.122) a resistência dum termistor varia
de forma exponencial com a temperatura, Fig.1.36.

R log R

O
(a) T (b) 1/T

Fig. 1.36 – Variação da resistência com a temperatura num termistor: (a) escala linear em função de T;
(b) escala logaritmica em função de 1/T.

1 L
Para um semicondutor intrínseco a resistência é dada por R = em que σi é a
σi S

condutividade intrínseca dada por (1.113). Atendendo a que as mobilidades variam com T −3/ 2
num semicondutor intrínseco, que a densidade intrínseca varia com a temperatura através da
expressão (1.13) e desprezando a variação das dimensões com a temperatura ter-se-à
− WG (2kT )
σi ∝ e (1.123)

e portanto
W (2kT )
R∝e G (1.124)
1.60 SEMICONDUTORES

Comparando (1.124) com (1.122) retira-se a constante A, que depende do material e das
dimensões, e a constante B que é expressa por
WG
B= (1.125)
2k

A maioria dos termistores comerciais do tipo NTC são de material cerâmico e não de material
semicondutor por razões de natureza económica.

1.9. Efeito de Hall

O efeito de Hall resulta da acção conjunta dum campo eléctrico e magnético no


movimento dos portadores de carga num semicondutor. O efeito de Hall manifesta-se
sobretudo nos semicondutores extrínsecos fracamente dopados embora, de forma menos
evidente, também esteja presente nos semicondutores intrínsecos e metais.
Para os semicondutores extrínsecos o efeito de Hall pode ser analisado de forma
relativamente simples pois é suficiente considerar um único tipo de portadores, os
maioritários. A título de exemplo vai-se analisar o efeito de Hall num semicondutor
extrínseco tipo-n de forma paralelepipédica, no qual se estabeleceram quatro contactos em
duas direcções perpendiculares, Fig. 1.37. Entre os contactos A e B faz-se passar uma corrente
G
eléctrica constante de intensidade I. Sem campo de indução magnética B , a tensão U H entre
G
os terminais C e D é igual a zero. Quando se aplica um campo estático B , não
necessariamente uniforme, aparece entre C e D uma tensão U H diferente de zero e negativa,
se for aplicado como se mostra na Fig. 1.37. O efeito de Hall consiste no aparecimento da
tensão U H , designada por tensão de Hall.
A existência de corrente eléctrica permite associar a cada tipo de portadores de carga
G
uma velocidade média não nula. Nestas condições a acção dum campo B dá origem a uma
força de natureza magnética, a força de Lorentz que, para os electrões, é dada por:
G G G
F = −q ⎡ v , B ⎤ (1.126)
B ⎣⎢ n ⎥⎦

e para os buracos
G G G
F = q ⎡⎣ v p , B ⎤⎦ (1.127)
B
SEMICONDUTORES 1.61

G
B I
A
UH
z
Ax
C tipo-n D
y
Ay
Az x

B I
Fig. 1.37 - Configuração utilizada para o estudo do efeito de Hall

O vector força magnética tem o sentido e direcção definidos pelo produto externo e pelo sinal
da carga e um módulo dado por
G G G
F = q v B sen(α) (1.128)
B
G
em que α é o ângulo que o vector velocidade faz com o vector B , Fig.1.38. Se os vectores
G G G
forem perpendiculares α=90º e portanto F = q v B .
B

JG
FB G
G vp
vn JG JG
α B
α B

JG
electrões buracos
FB
(a) (b)

Fig. 1.38 – Vector força magnética para: (a) electrões e (b) buracos.

Consideremos então um semicondutor tipo-n e desprezemos a contribuição para a


corrente dos portadores minoritários, os buracos, Fig.1.39(a). De acordo com a relação
G G G
(1.126) e atendendo aos sentidos para vn e B , a força de natureza magnética FB está
1.62 SEMICONDUTORES

G G G
dirigida segundo – y e vale F = q vn B . A força dá origem a acumulação de carga
B
negativa nas regiões do semicondutor junto ao contacto C, estabelecendo-se por isso uma
diferença de potencial entre C e D, com o campo eléctrico dirigido de D para C. Deste modo a
tensão de Hall é negativa de acordo com o sentido convencionado na Fig. 1.39. Devido ao
aparecimento de uma componente do campo segundo y, o campo total no semicondutor não
será dirigido só segundo x. Ao ângulo formado entre o vector campo eléctrico e a sua
componente segundo x, designa-se por ângulo de Hall, θ H , que será tanto maior quanto maior
for o efeito de Hall. É de realçar que se o semicondutor fosse do tipo p e mantendo as
G
restantes condições, i.e., sentidos de I, B , U H como na Fig. 1.39(b), então U H > 0 . Este facto
G
resulta de que FB tem o mesmo sentido que na situação em que o semicondutor é do tipo-n
pois há duas trocas de sinal: carga e velocidade. Assim, a acumulação de carga positiva é no
semicondutor junto a C. Deste modo, o efeito de Hall pode ser usado na determinação do tipo
de portadores maioritários de um semicondutor.

A A
I I
z y
− n G + + p G −
B B
− + x + −
− JG + + JG −
− Ey + + E −
− G + + −
vn
− + + −
C D C D
− + + FB FE −
− FB FE + + −
JG UH < 0 UH > 0
− + + −
Ey
− + + G −
− JG θH JG + + vp −
Ex
− E + + −

I I
B B

(a) (b)
Fig. 1. 39 – Efeito de Hall num semiconductor tipo-n (a) e num semiconductor tipo-p (b).

Nas condições da Fig. 1.39(a), e na situação estacionária, a força de natureza


G G G
magnética FB é equilibrada pela força de natureza eléctrica FE associada ao campo E y .
SEMICONDUTORES 1.63

G
A força de natureza eléctrica FE é dada por:
G G
F = − qE (1.129)
E y

em que:
G G
E =E u (1.130)
y y y

Da igualdade:
G G
F +F =0 (1.131)
E B

tira-se que:
vx B = E y (1.132)

É de notar que:
G
⎧v = v x u x

⎨G G (1.133)
⎪⎩ B = Bu z

Como:
I = − qnv A A (1.134)
x y z

então:
⎛ 1 ⎞ IB
E = ⎜− ⎟ (1.135)
y ⎝ qn ⎠ A A
y z

e portanto:
⎛ 1 ⎞ IB
U = E A = ⎜− ⎟ (1.136)
H y y ⎝ qn ⎠ A
z

que se pode escrever como


IB
U = RH (1.137)
H A
z

em que
1
R =− (1.138)
H qn

se designa por constante de Hall.


Para semicondutores fortemente dopados, ou metais, R é muito pequeno e portanto as
H
tensões de Hall são bastante baixas, e o efeito de Hall é dificilmente detectável. No sentido de
aumentar U H pode-se diminuir a espessura da amostra A . A importância do efeito de Hall é
z
enorme pois para além de permitir identificar o tipo de semicondutor extrínseco em análise,
1.64 SEMICONDUTORES

G
permite obter a densidade de portadores maioritários, conhecidos A , I, B e U H , e pode ainda
z
ser utilizado na medida do campo B. As sondas de Hall são sensores de medida de B que se
baseiam no efeito de Hall.
Para semicondutores extrínsecos tipo-p, a expressão para tensão de Hall é idêntica a (1.137),
mas com a constante de Hall positiva, dada por:
1
R = (1.139)
H qp

No caso em que ambos os portadores, electrões e buracos, contribuem para a corrente


eléctrica, a constante de Hall é dada por:
pμ 2p − nμ 2n
R = (1.140)
( )
H 2
q nμ n + pμ p

Esta relação é geral e permite obter as relações (1.138) e (1.139) no caso particular dos
semicondutores serem extrínsecos tipo-n e tipo-p, respectivamente.

Exemplo 1.10 – Considere-se uma sonda de Hall de Si tipo-n, com a configuração da Fig.
G
1.37, que vai ser utlizada na determinação dum campo B desconhecido existente numa
dada região do espaço. Admita que se mantém o sentido da corrente e o convencionado
para a tensão de Hall, UH, indicados na referida figura.
Ao estabelecer-se uma corrente I= 1mA obteve-se uma tensão de Hall UH= 0,5 V.
Sabendo que a densidade de electrões no semicondutor, a 300 K, é de 1017m-3 e que A =
z
G
1mm, determinar o valor do campo B e indicar o seu sentido.
Solução:
A partir da relação (1.136) obtém-se B= -8 mT. O sinal negativo significa que o sentido de
G
B é o oposto ao indicado na Fig. 1.36.

1.10. Difusão

A difusão é um processo de transporte de partículas que resulta do seu movimento


aleatório nas três direcções do espaço, a uma dada temperatura. Este processo é bem
conhecido para as moléculas dum gás e caracteriza o movimento de partículas de regiões de
maior densidade para regiões de menor densidade. Com efeito, havendo igual probabilidade
de as partículas se movimentarem numa dada direcção, deverá existir uma corrente efectiva
SEMICONDUTORES 1.65

de partículas no sentido das densidades mais baixas. A difusão também tem lugar em líquidos
e sólidos e pode envolver, para além das moléculas dum gás, electrões, buracos e átomos de
impurezas.
Os electrões e buracos regem-se pela estatística de Maxwell-Boltzmann, no caso dos
semicondutores não-degenerados, e portanto podem ser olhados como um gás rarefeito de
partículas carregadas. Num semicondutor as condições necessárias e suficientes para haver
difusão dos portadores, temperatura e gradiante de densidades, encontram-se: num
semicondutor não homogéneo, quando a iluminação não é uniforme, quando há temperaturas
diferentes em regiões diferentes do semicondutor, etc. É importante realçar que a difusão dos
electrões e buracos, envolvendo partículas carregadas, dá origem a corrente eléctrica o que
não acontece com a difusão de partículas não-carregadas.
A visualização do processo de difusão pode ser feita recorrendo a um modelo
unidimensional simplificado, Fig. 1.40. Considere-se então que na coordenada xA há 8
partículas e em xB há 4 partículas, todas elas com movimento perfeitamente aleatório. Deste
modo, das 8 partículas em xA 4 devem dirigir-se para a direita e 4 para a esquerda. Pela
mesma razão das 4 partículas em xB 2 devem deslocar-se para a direita e 2 para a esquerda.
Numa coordenada intermédia existe pois um movimento efectivo de duas partículas para a
direita. No espaço tridimensional a difusão está associada a um movimento equiprovável da
partícula em qualquer direcção e sentido que, associado ao gradiante de densidades, garante
um fluxo de partículas da região de maior densidade para a de menor densidade.

x
xA xB

Fig. 1.40 – Modelo unidimensional que exemplifica o processo de difusão.

Admite-se que a densidade de corrente de partículas por difusão C ⎡ m −2 s −1 ⎤ é


dif ⎣⎢ ⎦⎥
proporcional ao gradiante de densidade sendo a constante de proporcionalidade o coeficiente

de difusão D ⎡ m2 s −1 ⎤ . Atendendo a que o gradiante de densidade é um vector dirigido no


⎣ ⎦
sentido das densidades crescentes, deverá escrever-se para os electrões
1.66 SEMICONDUTORES

G
Cndif = − Dn grad n (1.141)

e para os buracos
G
C pdif = − D p grad p (1.142)

As respectivas densidades de corrente são:


G
J ndif = −q Cndif = q Dn grad n (1.143)

G
J pdif = q C pdif = − q D p grad p (1.144)

Para os semicondutores não-degenerados os coeficientes de difusão e as mobilidades


estão ligados através das relações de Einstein:
D=u μ (1.145)
T
em que
kT
uT = (1.146)
q

se designa por tensão característica da tempertura T. A T=300 K u  0,026 V .


T
Assim, para os electrões e buracos, pode escrever-se
Dn = uT μ n
(1.147)
D p = uT μ p

Para cada tipo de portador, a densidade de corrente, em geral, deverá pois conter dois
termos: o de condução e o de difusão. A densidade de corrente total é então expressa como:
J = Jn + J p (1.148)

em que
J n = J ncond + J ndif
(1.149)
J p = J pcond + J pdif

1.11. Equação da Continuidade

A equação da continuidade é uma equação diferencial que estabelece a lei de variação


no espaço e no tempo da densidade de electrões e dos buracos, sendo particularmente
importante na análise de algumas situações associadas a perturbações do equilíbrio
termodinâmico. Esta equação obtém-se por via fenomenológica, como se descreve a seguir.
SEMICONDUTORES 1.67

Num elemento de volume δV de semicondutor, que envolve o ponto P, a densidade de


portadores pode variar no tempo devido a dois factores: (a) um desequilíbrio entre o ritmo de
geração G e o ritmo de recombinação R, (b) um processo de transporte, condução e/ou
difusão, responsável pelo movimento de portadores de ou para o elemento de volume, Fig.
1.41.
G
C
δS

P
*
δV
G
n

Fig. 1.41 – Elemento de volume utilizado na formulação da equação da continuidade. δS representa a


G G
superfície que envolve o elemento de volume δV, sendo n a sua normal exterior. C é a densidade de
G
corrente de partículas, dirigida segundo n .

G
O desequilíbrio entre G e R é contabilizado em termos de [G-R]δV. Designando por C a
G
densidade de corrente de partículas para o exterior, segundo a normal n , o número de
G
partículas que entra em δV na unidade de tempo, é o fluxo de C estendido a δS, a área que
envolve o volume considerado, e dado por
G G G
( )
− ∫ C , n dS = − ∫ divCdV (1.150)
δS δV

pelo teorema do fluxo de divergência. Com δV suficientemente pequeno e admitindo que não
há variações bruscas das densidades
G G
+ ∫ div C dV  div C δV (1.151)
δV

Assim pode-se escrever-se, para os electrões:


⎛ ∂n ⎞ G
⎜ ⎟ δV = ( G − R )n δV − div Cn δV (1.152)
⎝ ∂t ⎠

pelo que, para cada ponto do semicondutor


∂n G
= [G − R ]n − div Cn (1.153)
∂t

De igual modo para os buracos


1.68 SEMICONDUTORES

∂p G
= [G − R ] p − div C p (1.154)
∂t

Atendendo a que a corrente pode ser de condução ou difusão, ter-se-á em geral:


G G G
C = Cdif + Ccond (1.155)

com
G G G
Cndif = − Dn grad n Cncond = − n μ n E
(1.156)
G G G
C pdif = − D p grad p C pcond = p μ p E

Assim a equação da continuidade para os electrões e buracos poderá ser escrita como
∂n G
∂t
( )
= [G − R ]n + Dn lap n + μ n div n E

(1.157)
∂p G
∂t
( )
= [G − R ] p + D p lap p − μ p div p E

Do lado direito da igualdade o primeiro termo está associado a um efeito local e os dois
termos restantes ao efeito de transporte de portadores duma região para a outra do
semicondutor. O segundo termo tem em linha de conta a difusão e o terceiro termo a
condução.

1.11.1. Exemplos de aplicação da equação da continuidade a várias


situações importantes

Caso 1: Semicondutor homogéneo tipo-p, iluminado uniformemente. Analisar a


evolução da densidade de electrões a partir do instante t = 0 , em que se corta a
iluminação. Considera-se injecção fraca.

Se o semicondutor é homogéneo e está iluminado uniformemente


G
div C = 0 , (1.158)

pelo que, para os electrões, a equação da continuidade será escrita como


dn
=G−R (1.159)
dt
SEMICONDUTORES 1.69

Neste caso G = G = rn p pois procuram-se as soluções para t ≥ 0 , quando não há


ter 0 0
iluminação. Como
R =rn p (1.160)

ter-se-à:
dn
= r ( n0 p0 − np ) (1.161)
dt

Atendendo a que
n = n0 + n '
(1.162)
p = p0 + p '

virá:

np = n0 p0 + n0 p '+ n ' p0 + n ' p ' (1.163)

Admitindo a situação de injecção fraca, isto é, só os minoritários são perturbados,


p ' << p0 , pode escrever-se

np  n0 p0 + n ' p0 (1.164)

porque n0 p ' é desprezável face a n ' p0 , em virtude de p0 >> n0 , e n ' p ' é desprezável face

a n ' p0 pois p ' << p0 .


Deste modo

dn dn '
= = − r p0 n ' (1.165)
dt dt

Fazendo a substituição τn = 1 (rp0 ) , virá então

dn ' n'
=− (1.166)
dt τn

cuja solução é

n '(t ) = Ae−t τn (1.167)

em que A é uma constante de integração que vale A = n '(0) . A τn costuma chamar-se tempo
de vida médio dos electrões e pode ser interpretado como o tempo que o excesso de electrões
leva em média até desaparecer por recombinação. Atendendo a que só os minoritários são
perturbados só faz sentido definir o tempo de vida médio para este tipo de portadores. Para
1.70 SEMICONDUTORES

t = τn o excesso de electrões atinge o valor de 1/e do valor em t = 0 . Usualmente considera-

se que os excessos estão praticamente recombinados para t ≥ 4τn , a que corresponde a ter

uma densidade de excessos n ' ≤ e −4 n '(0) = 1,8% n '(0) . Os valores do tempo de vida médio
dos portadores minoritários apresentam grandes variações pois dependem da densidade e tipo
de centros de recombinação no semicondutor. No Sílicio os tempos de vida médio podem
variar de dezenas de μs a alguns ns.
Na Fig. 1.42 está representado o andamento de n '(t ) para dois valores do tempo de
vida dos electrões. No gráfico o tempo de vida é dado pela distância à origem do ponto de
intersecção, com o eixo das abcissas, da tangente à curva na origem.
O valor de n '(0) pode também ser obtido por aplicação da equação de continuidade
para os electrões. Se em t = 0− tivermos atingido a situação estacionária com iluminação e que
o ritmo de geração por efeito fotoeléctrico é dado por G fe poder-se-à escrever

0=G−R (1.168)

G = G fe + Gter
em que (1.169)
R = r nil pil

sendo nil e pil as densidades de electrões e buracos respectivamente sob iluminação


uniforme.
Nas condições de injecção fraca ter-se-á então
n '(0)
0 = G fe − ⇒ n '(0) = G fe τn (1.170)
τn

n’
n’(0)

0 τn1 t
τn2
Fig. 1.42 – Evolução de n’(t) a partir do instante em que se corta a iluminação
para dois valores do tempo de vida dos electrões τn2>τn1.
SEMICONDUTORES 1.71

Caso 2: Semicondutor homogéneo tipo-p, iluminado uniformemente. Analisar a


evolução da densidade de electrões a partir do instante t = 0 , em que se
estabelece a iluminação. Considera-se injecção fraca.

Para os electrões a equação da continuidade escreve-se como


dn
=G−R (1.171)
dt

Neste caso
G = G fe + Gter (1.172)

No seguimento do estudo feito para o Caso 1 pode escrever-se,


dn ' n' 1
= − + G fe τn = (1.173)
dt τn rp0
cuja solução é dada por
n '(t ) = Ae −t / τn + G fe τn (1.174)

em que o primeiro termo da expressão corresponde à solução da equação diferencial


homogénea e o segundo termo à solução particular da equação diferencial.
A constante de integração A é obtida pela condição de fronteira

t=0 n ' = 0 ⇒ A = −G fe τn (1.175)

pelo que

(
n '(t) = G fe τn 1 − e − t τn
) (1.176)

Na Fig. 1.43 está representada a evolução de n '(t) nestas condições.

n’
τn
Gfeτn

0 t

Fig. 1.43 – Evolução de n’(t) supondo que no instante t=0 se estabelece a iluminação.
1.72 SEMICONDUTORES

Neste caso, também se convenciona que a situação estacionária está praticamente


alcançada quando t ≥ 4τn . Nestas condições, a diferença entre o valor de n '(t ) e o valor final

(
é menor que G fe τn ) e4 ou seja um erro inferior a 1,8%. É de realçar que neste contexto τn

representa o tempo que em média o excesso de electrões leva a atingir o valor final.
Na Fig. 1.44 mostra-se a evolução dos excessos numa situação em que se combinam os
resultados obtidos nos casos anteriores e se admite que, durante a iluminação, foi atingida a
situação estacionária.

Gfe

t
n’
τn
Gfeτn

0 τn t
Fig. 1.44 – Evolução de n’(t) quando se combinam as soluções obtidas na Fig. 1.41 e 1.42.

Caso 3: Difusão com recombinação na situação estacionária. Despreza-se o efeito do


campo eléctrico.

A título de exemplo considere-se um semicondutor tipo-p em regime estacionário


sujeito a uma perturbação que só afecta os portadores minoritários, neste caso os electrões
(injecção fraca). Admita-se que na região em análise não há iluminação, isto é, G = G .
ter
Estas condições têm lugar numa situação muito importante e que envolve os díodos de
junção quando sujeitos a uma tensão constante entre os seus terminais, como se irá estudar em
pormenor no próximo capítulo. Pode-se contudo adiantar que a relação corrente-tensão para o
díodo assenta nas soluções da equação da continuidade para os portadores minoritários do
lado p e n nas condições referidas.
Uma outra situação que corresponde às condições indicadas está representada na Fig.
1.45. A iluminação é constante e absorvida numa fatia estreita junto à superfície do
SEMICONDUTORES 1.73

semicondutor. O caso em análise permite obter, fora da zona iluminada e na situação de


injecção fraca, a evolução no espaço dos portadores minoritários.

Na situação correspondente à Fig. 1.45 embora não haja campo eléctrico aplicado
exteriormente existe campo eléctrico local que está associado à diferença de mobilidades dos
electrões e buracos. É fácil de ver que havendo excesso de electrões e buracos na fatia
iluminada eles tendem a fluir por difusão para a fatia não iluminada. Como os electrões têm
mobilidade superior à dos buracos os electrões vão à frente e portanto estabelece-se um
campo eléctrico local dirigido do lado não iluminado para o lado iluminado. O efeito deste
campo é mais importante para os maioritários e portanto vai-se desprezar a sua contribuição
para os minoritários o que facilita a resolução da equação da continuidade correspondente.

Gfe

Semicondutor extrínseco

x
O b

Fig. 1.45 – Uma configuração possível para o estudo da difusão com recombinação dos minoritários.

Para os electrões a equação da continuidade deverá ser escrita como

0 = [G − R ]n + Dn lap n (1.177)

Se se assumir um modelo unidimensional e injecção fraca ter-se-à

n' d 2n
0=− + Dn 2 (1.178)
τn dx

d 2n d 2n '
Notando que = pois n = n0 + n ' a equação diferencial toma a forma
dx 2 dx 2

d 2n 'n'
− 2 =0
2
(1.179)
dx Ln

em que Ln = Dn τn [m] é designado por comprimento de difusão.


1.74 SEMICONDUTORES

A solução geral para a equação anterior é do tipo

n '( x) = A e− x Ln
+ B ex Ln
(1.180)

em que A, B são constantes de integração que dependem das condições de fronteira.


Analisaremos duas situações importantes (i) cristal semi-infinito; (ii) cristal finito.

(i) Cristal semi-infinito


x=0 n ' = n1′
x→∞ n' = 0
Estas condições de fronteira indicam que a perturbação estabelece um excesso n1′ em

x = 0 mas longe, quando x → ∞ , a perturbação deixa de se fazer sentir, ou seja


n ' = 0 ⇔ n = n0 o valor de equilíbrio termodinâmico. Esta última condição impõe

B = 0 e por isso A = n1′ .

Assim a solução para este tipo de perturbação é dada por

n '( x) = n1′ e − x Ln
(1.181)

e está representada na Fig. 1.46 onde se dá a interpretação gráfica de Ln .

n’
n1’

0 x
Ln

Fig. 1.46 – Evolução de n’(x) para um cristal semi-infinito.

No contexto deste resultado Ln representa a distância que em média os minoritários


percorrem por difusão até se recombinarem. Também neste caso se poderá dizer que a maioria
dos excessos se recombinam desde que estejamos a uma distância da origem maior ou igual a
4 Ln . Para x = Ln a densidade de excessos é n1′ e . A solução obtida para um cristal semi-
infinito será válida para os cristais cuja dimensão segundo x é muito maior que Ln.
É de realçar a semelhança dos gráficos relativos a esta situação e à correspondente ao
SEMICONDUTORES 1.75

Caso1. Contudo é bom realçar que no Caso 1 a densidade de excessos varia no tempo e não
no espaço e neste caso ela varia no espaço mas é invariante no tempo.

(ii) Cristal finito


Neste caso as condições de fronteira são:
x = 0 n ' = n1′
x = b n ' = n2′
isto é, a perturbação faz-se sentir em ambos os extremos da fronteira. Os valores de A e
B obtêm-se a partir do sistema de equações

⎧ n' = A + B
⎪1
⎨ (1.182)
−b / L b/ L
⎪n' = Ae n + Be n
⎩ 2

Após alguma manipulação matemática ter-se-à

1 ⎡ ⎛b−x⎞ ⎛ x ⎞⎤
n '( x) = ⎢ n1′ sh ⎜ ⎟ + n2′ sh ⎜ ⎟ ⎥ (1.183)
sh ( b Ln ) ⎢⎣ ⎝ Ln ⎠ ⎝ Ln ⎠ ⎥⎦

em que sh traduz a função seno-hiperbólico. A relação (1.183) está representada na


Fig.. 1.47 pela linha contínua. Para cristais curtos, b << Ln ,

n '(x)  n1′ −
( n1′ − n′2 ) x (1.184)
b

e encontra-se representada na Fig.1.47 pela recta a tracejado.


n’

n1’

n2 ’

0 b x

Fig. 1.47 – Evolução de n’(x) para um cristal finito (linha contínua)


e um cristal curto, b << Ln (linha a tracejado).
1.76 SEMICONDUTORES

Exemplo 1.11 – Suponha que nas condições da Fig. 1.45, em que o semicondutor é Si
tipo-n, com Nd = 1019m-3, existe em x=0 uma densidade de excessos de buracos Δp=
1014m-3. Pretende-se calcular a distância a partir da qual a densidade de buracos difere de
menos de 1% do valor de equilíbrio termodinâmico. Calcular também a densidade de
corrente de difusão em x=0 e x= Lp. Para o Si, a 300K, admite-se que τp= 10 μs, μp= 0,045
m2V-1s-1, ni = 1016m-3 e que o cristal possui um comprimento b= 1mm.
Solução:
A situação em estudo corresponde ao caso 3, analisado nos parágrafos anteriores. Antes
de mais vamos verificar se o cristal é ou não semi-infinito, para podermos escolher a
solução correcta para a evolução dos excessos com a distância x. Nesse sentido vai-se
calcular o valor de Lp. e vamos comparar o resultado com a distância b. Atendendo a que

D p = uT μ p e L p = D p τ p obtém-se Lp= 0,108 mm que é muito menor que b= 1 mm.

Verifica-se portanto a condição de cristal semi-infinito e a solução pretendida é dada por


(1.181). Pretende-se determinar a coordenada x1 tal que p(x1)-p0< 1% p0 ou seja p’(x1)<
− x / Lp − x1 / L p
1% p0. Atendendo a que p '( x ) = p '(0)e ter-se-à p '(0)e < 0,01 p0 . Como n0= 1019m-
3
ter-se-à p0= 1013 m-3 e portanto x1>0,75 mm. A densidade de corrente de difusão é dada
qD p p '(0) − x / Lp
por (1.144) e portanto J pdif ( x ) = e . Portanto Jpdif (0) 173 μA/m2 e
Lp

Jpdif (Lp)63,6 μA/m2.

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