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EDUCAR Luiz Eduardo W. Wanderley % Tereja Catélica 6 ica no Movimento | deEducacéode Base. [a= 2 LUIZ EDUARDO W. WANDERLEY EDUCAR PARA TRANSFORMAR Educacio popular, Igreja Catélica e politica no Movimento de Educagio de Base AGRADECIMENTOS, Inicialmente, quero dizer aos amigos que me instaram a desen- volver este tema que tenho a esperanca de que a producao desta andlise possa corresponder A expectativa depositada em minba pessoa, Enumerar aqui a todos a quem devo agradecer seria dificil pelos riscos de esquecer alguém. Vou citar apenas os mais ligados & pesquisa. Aos membros dos quadros efetivos do MEB daquele periodo, que enfrentaram juntos as vicissitudes de um Movimento dinamico em constante mutagio, com grandes limitagdes mas com enorme dedi cagio as tarefas assumidas, com esforgo e vontade ¢, sobretudo, com muita esperanga. Guardo um carinho especial para aqueles que me ajudaram diretamente na coleta dos dados ¢ nas entrevistas. Nas horas amargas e ras horas alegres, enquanto eu Tedigia este texto, era pensando no trabalho que todos aqueles companheiros desenvo veram, em suas lutas e, para alguns, em sua morte em combate, que eu recebia os estimulos para ficar firme. Aos monitores ¢ animadores populares, hersis anénimos do MEB, que com seu desprendimento e com seu drévo trabalho escreveram uma pégina de gldria no processo de libertaco do povo brasileiro. Seus sacrificios, perseguigdes e sofrimentos, bem como os dos alunos © pessoas das comunidades que aguele MEB atingiu, e perticular- mente os de todos aqueles que permancceram firmes na luta, fize- ram e fazem acreditar que eles vencerao 0 cativeiro da terra Ao amigo Osmar Favero, companheiro de trabalho no MEB, que convidado por mim a colaborar na revisdo final deste texto, mesmo discardando de alguns pontos bésicos, com um “olhar de lince” ert ico e observador, com um espfrito académico hicido, e com enorme boa vontade, soube apontar erros, omissées, retificacdes e acréscimos que, sem dtivida, propiciaram mais rigor e preciso ao trabalho. Ao meu orientador José de Souza Martins que, de forma amiga © confiante, me acolheu num momento critico de minha vida acadé mica. Suas argutas observacées me ajudaram a explicitar cerlos 5 Angulos fundamentais. 1% importante registrar, desde 1 s. % 10g, que ele nfo pode ‘ser responsabilizado por eventuals erros que comet! ‘c pela erspectiva de interpretagio que segui, pois toda a responsabilidade do que estd escrito cabe unicamente a mim. Aos professores da PUCSP que tiveram a paciéneia de aguart por tanto tempo o término da felturs desta tese, estimulandonae & até o fim, As colaboradoras Gilda dos Santos, Stela Leite, Deize Robim Rodri- Sues ¢ Sueli de Sousa que, em momentos diferentes, com muita pacién- Gia ¢ atencio, ajudaram na ingente tarefa de datilograter este longo SUMARIO Agradecimentos, 5 Introducéo, 11 Parte 1: CONJUNTURA, IGREJA CATOLICA & SURGIMENTO DO ‘MEB, 31 Capitulo 1 — A irrupelio das classes populares, 33 Capitulo 2 — MEB: origem, estrutura e aspectos da dindmica in- tera, 47 Capitulo 3 — A caminhada por uma igreja popular, 63 Parte 2: CONCEPGAO DE EDUCAGAO DE BASE E AS PRATICAS EDUCATIVAS DO MEB, 97 Copitulo 4 — Educacéio popular e educagéo de base, 99 Capitulo 5 — Conscientizacéo, 113, Capitulo 6 — Politizagio, 157 Capitulo 7 — Animacio popular (ANPO), 223, Capitulo 8 — Desenvolvimento de comunidade, 243 Capitulo 9 — Sindicalismo rural: educagdo sindicalista e acSo sindical, 273 Parte 3: DIMENSOES DAS CONCEPGOES DE MUNDO © DE EDU- CACAO DO MEB, 321 Capitulo 10 — Cultura e cultura popular, 323 Capitulo 11 — Pessoa, 933 Capitulo 12 — Povo, 347 Parte 4: PERFIL DOS QUADROS DO MEB E IMPACTO DO MOVI- MENTO NA REALIDADE, 369 Capitulo 13 — Os quadros do MEB: intelectuais orginicos ou tra: Gicionais?, 371 Capitulo 14 — Os monitores e animadores populares: 0 elo com a ase, 409 J Capitulo 15 — O MEB e suas relag6es internas e externas, Conflitos e@ reagdes, 425 Resultados e novas interrogag6es, £45 Bibliogratia, 481 Anexos, 493 Meu caro Luiz Eduardo, A leitura de sett livro virou razGo de alegrias. A de ter nas mdos © resgate necessdrio ¢ inadidvel de um dos mais sérios movimentos de nossa recente historia da Educagdo: a acdo do MEB é uma des- tas alegrias. A maior, ao lado de outras como, por exemplo, a de me ter feito inlensamente reviver, a0 1-10, pedacos de tempo que tanto me marcaram também. Se hd algo que precisamos, os brasileiros, realizar mats amiudada- ‘mente, sent ligeirezas, com rigor, € anotar o tempo vivido, o tempo fazendose e em que nos fazemos. Me parece fundamental ir mais ‘além dos timites de nossa memsria oral e intensificar a necessdria prdtica de registrar o que ocorre. Nunca me esqueco de que, indo a Paris em junto de 68 — a cidade inquicta, denunciante, a juventude eserevendo recados nos muras, nas paredes’ das casas, nas portas das igrejas, a repressao arrogantemente presente — comprei uma dezent de Uoros sobre maio de 68. Em 1983, possivelmente néo escrevemos ainda 30 livros sobre 0 que jizemos @ 0 que vivemos tdo apaizonadamente, no campo da edu. cacao popular, nos anos 60. Preenchendo wm vazio, que 0 seu livro excelente vire também desa- fio e estimulo @ que outros comecem iguatmente a resgatar, com a ‘mesma seriedade com que vocé trabatha, aspectos de nossa meméria, tio fundamentais & formagao de nossa juventude, Fraternatmente, Paulo Freire, Introdugio pu queria que coda trabattador nudesse acreditar nna sua prépria eapacidade de conhecer do transjormar coletieamente a realidad, (...) E eu aoredito que esto textativa de pensar, iscutir, elaborar as cofsas.coletioamento, na medida em que ofete reatmente alguma ‘olsa na experidneia de vida do pessoah € uma fentatioa que ew nZo set onde pat dar mas ‘vat dar ‘em algum lugar, Aquilo que é sentido, ‘aguilo ‘que ¢ tomeda pela pessoal como uma coisa Sut, Goma uma colsa assim de real utilidede ‘para. st, nao precisa nevessariamente estar escrito ‘nd: esta historicamente tomado pelos trabalhadores ‘ninguéra val destruir fsg0 260", (Um operirio, "Depoimento: fala um operdris”, Cadernos de Raweacdo Popular 2, Petrépalis, Vosss/NOVA, 1981). +08 {i6sojos timitaramse a intorpretar © mundo de forma dyerente; traiase porém de ‘ransformslo". (Marx, Karl, XI Tese sobre Feuerbach). Mw Um pequeno grupo de minha geragio viveu o fascinio histérico da elaboragao de um projeto global alternativo de mudanga social Para o Brasil, dando os primetros passos para tentar concretizélo, Trabalhando com paixio, doandose integralmente, adiando gratiti. cagdes prdprias da juventude em fungtio dos objetivos tragados, ou Samos construir umn mimdo novo. Participamos do processo de irrupgio Gas classes emergentos ¢ das vitérias e derrotas que cercaram a con- Solidago do movimento popular. Acreditamos na utopia concreta Ga edificacso de uma sociedade mais justa e humana, que superasse © eapitalismo @ fosse além dos impasses do socialismo. Com muito idealismo © iluséo no soubemos ler na conjuntura as tendéncias estruturais em movimento, nem avallar em toda a sua profundidade 8 complexidade do real numa época de intensa mobilizacdo politica, de “acenttiaeio” da crise sdcio-econdmico-ideolégica, Com muito volun. tarismo, imagindvaros que 4 tinhamos a Historia em nossas mos, ignorando a correlagéo de forcas existente. Caudatérfos das ambigll. dades tipleas da pequena burguesia a que 8 maioria pertencia, bem Poucas Yewes comproendemos em profunditiude as aspiragbes’¢ os interesses concretos dns classes populares. Muitos dentre nds hauri ‘mos nossas primeiras idéias e motivagies inovadoras dentro da Acao Catdlica Especializada, com destague para a Juventude Universitaria Catélica (JUC), e ali vivenciamos as venturas e desventuras de ser eristilos numa instituicdo que oscila entre ser profética e burocratica, entre homens que praticam ¢ amor e o desamor. Outras contradicées foram enfrentadas na dindmica e nas limitagdes do movimento estu. Gantll @ no interior das universidades, carentes e impotentes. Decan- tamos principios, valores ¢ idéias do humanismo e personalismo cris. 80s, andllises do subdesenvolvimento e exigencias do desenvolvimento, € Tudimentos da interpretago dialética marxista sobre o capitatismo. ‘Tudo contribui para 2 opgdo pelo povo brasileiro, pela necessidade de mudancas estruturais feltas por este mesmo povo como sujeito ativo @ eritico, por exercer uma profissio engajada e comprometida com esta orientagio. A vida privada ligavase intensamente a vida social. Procurdvamos unir a teorla com a prética, participande de 12 grupos € movimentos socfats educativos ¢ politicos, nos quais rede- finimos caminhos ¢ intengdes, amadurecemos, cometemos desvios € erros, plantamos muita coisa que deu bom fruto e outras tantas coisas ciijos efeitos so impossiveis de serem medidos. Velo uma noite mais escura e um longo perfodo de sofrimento. Um pequeno mimero Tevott sett compromisso politico as witimas conseqtiéncias, com muita doagic © heroismo, e, ainda que se discorde dos rumos que seguiram € priticas que realizaram, ntio se pode simplesmente julgélos a frio e apenas teoricamente, Uma parcela expressiva deu continuldade & orientagio anterior, sofrendo os condicionamentos e impactos da realidade sdversa, reestruturando-se pessoal e profissionalmente, adquirindo novos impulsos e esperancas em outros Iugares e ativida- des, mas dentro da mesma caminhada. Uma parte também ponderdvel se prendeu nas malhas da engrenagem, [oi ccoptada pelo sistema, ressalvando-se que muitos deles guardam como residuo sementes que néo germinaram, mas que podem, quem sabe, renascer das cinzas. E um poqueno ‘contingente passou deliberadamente para o outro lado. Recuperar a meméria de partes desta histdria e propdla & medi- tacdo e reflexdo dos interessados, sugerir quest6es e fornecer subsi- dios a partir da andlise de uma experiénoia conereta que vivi, com seus saldos positives e negatives, constituem algumas das metas gerais deste trabalho. Bsta pesquisa tenta se inserir na dificit caminhada por uma cién- cla comprometida com a realidade, na qual 0 conhecimento seja transtormagdo. Ela esta ligada com questées com as. quais venho trabalhando Ja hé algum tempo, que te parecem importantes. para quem desenvolve um trabalho intolectual, principalmente na. univer sidade, e para quem se questiona sobre o significado da vida ¢ de sua fungéo na sociedade. Como romper com a dicotomia infra-estru- tura e superestrutura, articulando-as na prética? Quais as consealién- cias de uma “aceleragio” do pracesso ideoldgico, através por exemplo da conscientizagéo e do uso de técnicas pedagdgicas ndo-diretivas, em suas relagdes com o econdmico e o politico? Partindo da cons- tatagio de que as classes populares e subalternas tém saberes espe- eificos, permeados pela ideologia dominante, quais os fatores de alic- nagio e de lberiagio que eles apresentam? Quais sio © como se definem as caracteristicas da educacdo popular? Que critérios utilizar para uma avaliaedo das experiéncias educativas populares no passado, ue vé além da intencionalidade de seus protagonistas, e em que sen- tido aquelas experiéncias podem ser validas para as miltiplas praé- ticas populares que se realizam no presente? Como se formar os intelectuais organicos das classes sutbalternas? Quais os procedimentos e mecanismos de atuaco de uma instituicho educativa que tornem eficaz a concretizagio de mudangas estruturais? Como resgatar 3 I6gica do oprimido no mundo académico, sem impor a l6gica do saber do opressor? B Evidentemente, a amplitude destes quest6es vai muito além do escopo pretendido nesta Investigacao, mas constituem o pano de fundo das preceupagées gerais que presidiram a minha empreitada, “Zducar para Transformar” tem como referéncia fundamental um movimento educativo de responsabitidade da Igreja Catélica do Brasil, dirigido As populagdes das regides mais subdesenvolvidas do Pais (Norte, Nordeste e CentroOeste) — campesinato e setores do prole- tariado rural — numa conjuntura de acirramento da erise do capita. liso no Brasil, Trata-se do Movimento de Edueac&o de Base (MEB), ho periodo de 1961-1965, estipulado no 1° Convénio com o Governo Federal. Grosso modo, hd um consenso entre a maioria dos cientistas socials no sentido de afirmar 0 eardter autoritario e elitista que os setores dominantes impuseram nas Telagdes entre grupos e classes sociais na realidade brasileira, desde 2 spoca colonial até nossos dias. Sem des- considerar outros fatores, deriva desta constatacao 0 fato de que & nossa histéria conhecida e divulgada 6 a histéria dos dominadores & vencedores. Neste estudo, tomei como fonte um Movimento que se ealocou ao Jado © om prol dos dominadas ¢ vencidos, e que, portanto, com raras excegies, esteve sempre ocultado, A propésito, & reconhe. cida também a falta de memGria social no Brasil — ainda que se zeleve 0 esforgo atual dos estudos histdricos que vém recuperando © nosso paseado e fornocendo dados mais veridices para a inteligibi lidade do presente — 0 que me levou a resgatéla a partir do MER. Quem acompanha de perta as experiéncias de educacio popular em curso no pais nota, de uma parte, insistentes solicitagdes de informa es mais precisas sobre as Priticas educativas do periodo imediata- mente anterior a abril de 1964, e, por outra parte, a reiteragio de ert0s, @ repeticso de atividades, 0 nfoapraveitamento dos acertos, exatamente pelo desconhecimento daquelas préticas. Minha pretensao hao ¢ a de efazer aqui a histdrla riquissima do MEB, mesmo porque me falta “engenho © arte’, mas a de recuperi-la em aspectos rele: vanies e com base neles selecionar elementos titeis aos objetivos pro- ostos. Existem estudos mais ou menos relevantes sobre educaglo popular com dados do MEB* ¢, no momento, hd um grupo de pes- 15 aa, te = nein do. ten cpr npn de team i ot yaaa ir en Seema eh eae sic cn cn maa te a oe dese Tatas, Sonatina el de Ol yall sromy nga. mace a ee ee ee Bieciexa. ih Denes deg B. Briago e cease’ popula Shs Faules Paci Da, aes ERG Pola ohh "a ee eer, Sateen Peony Seal Rn GA Sia abr ee ah Posie ne Soca 2 iaee aah Slee ame cee eal ray Sere is ent ia cee, yh me eee dese en ae u ——— quisadores analisando outras dimens6es do MEB nacional e escre- vendo partes da mosma hist6ria para alguns Estados do Brasil. Os objetivos centrais que me propus podem ser expressos no se guinte conjunto de indagagées, que tentel responder no trabalho. Iniclalmente, tratei de compreender por que um Movimento edu cative por definicao, patrocinado pela Igreja Catdliea e financlado elo Governo Federal, com um referencial tedrico fragmentado, em curto prazo de tempo transformou sua orientagiio © priticas, prod zindo efeitos significativos na propria Tgreja © na realidade sécio- ‘econémico-politico-cultural, nos agentes, @ tendendo 2 colaborar no estabelecimento de tuma contra-hogemonia dirigida pelas classes subal- temas.‘ Compreender, também, em que sentida se cometeram erros ra condugdo do processo, ressaltandose desde logo que, a se aceitar as interpretagées feltas por pesquisadores de outros movimentos de alfabetizagéo e de cultura popular desenvolvidos naquela conjuntura, © fato de eles no estarem ligados & Tgreja e de deterem um dominio teGrico mafs definido nfo os vacinou do cometimento de erros simi- lates, e mesmo mais graves se se considera exatamente a posse por eles desse dominio. ‘Tenclo como aceite que a coneretiza¢io do capitalismo se fax sem pre por um proceso de desenvolvimento desigual e combinade, quis, provar que fanio 0 MEB — como os demais movimentos de alfabeti- zag e de cultura popular no periodo — propiciaram uma “acelera- a ee ed Se era: Smee ectdn me eas o nem waar todos ott Matis, as ae Sas nah ge See eee Seren neat Reena ea et Foitien © Sconisiien, montane, um forte “bloe “isoldgioo™. sea irecac. © doxninaglo. Gx forihalto See gains Sia MECN Sameer So cena eae ee ee eae facie ver aes meee tee Sur hese ys eee ee meee eae ee ie hg gre egg Rin Sec oes shee Lee Pe eee a, ae eee ea Re SPREE Sage Ga as al Dt a att ak eine SOE Sekt Sa RSs cate ak Soa SESE Seana’ id) BS Geno emacs 2 cle se ai setrece coed et ea. ‘lidoe'e reprise Ge itroton ces clase" aslligrg, "AO" scons” comrapes 8 TOS tines ae ESSE ostnara, st © manne etaia? ac it 15 $40 do ideclogico” sem correspondéncia organica com as demais estruturas da realidade. Assim, os processos de conseientizacio nao encontraram respaide numa teorin sistematica que partisse da pratica. As mobilizagdes, criagiio © dinamizaglo de formas de organizacao social, que estavam fortalecendo elementos hegemdnicos das classes populares, no encontraram 0 escoadouro politico indispensavel, cor- porificado num projeto politico globalizanie, em canais de represen- tagdo e de restruturac&o politicos, em movimentos ou partidos poli- ticos capazes de dirigir e dar expresso aos interesses das classes populares emergentes, No caso dos catdlicos se fard alusio & tenta- tiva felta de uma saida allerativa através da criacko da Agio Popu- lar, As prdprias mediagSes com a estrutura econémica nao foram ajustadas com a dindmica 0 supetestrutural. ‘Objetivei mostrar que o MEB, juntamente com o sindicalisno rural © a JUC, ¢ em parte a JHC, se constitufram nos movimentos da Igreja catélica' que redefiniram @ atuaco da prética dos cristfos na socie- dade brasileira. A partir deles os leigos assumiram novas tarefas, forcaram 0 reconhecimento de sua autonomia, trouxeram novas refle- x0e6 tedricas e teoldgicas para o interior da Tgreja no Brasil ¢ intro- duziram a questo da politica de uma maneira aguda, que iria se reacender nos anos pds-70. Atrayés deles foram firmadas as estacas da irrupedo coletiva de uma “Tgreja popular”. Demonstraram, ainda, ‘a fora e necessidade de uma orientacéo nacional que superasse 2 provincianizagio ¢ diocesanizagéo existentes na historia da Igreja. Em fumcao dessas praticas dos cristdos, houve transformagées na estrutura eclesidstica ¢ na personalidade do clero e do episcopado, que tiveram de se atualizar.* ‘Com base numa anélise conceitual sobre 0 contetido ¢ o significado dos processos de edueacéo popular, procure! evidenciar que a educa- ‘eo de base pretendida, e em parte desenvolvida pelo Movimento, foi, juntamente com 0 Sistema Paulo Freire, a que mais se aproximott progressivamente de sua concretizacio, produzindo efeitos eficazes. Atvayés das suas mulltiplas atividades de alfabetizacio, conscientizacko, politizacdo, educacdo sindicalista, instrumentalizagao das comunidades e animacao popular, o MEB desenvolveu uma original pedagogia popu- lar, engendrando subsidios concretos para uma efetiva integracdo da teoria com a pratica, para a investigacdo militante, para a educagao Ubertadora. A pratica educative, que se desdobrou em outras. pré- ek epee eee oe weg roe is Teresi ee) Reser’ Alena lore," Deantalimente Haat Runaoto ost Aart, Pole Sete SSk hie camara Seca cea eet 5 ‘ie oaig Cara, “Sega e” Ente no niaal fo "Séauo" Beale, muopamas Tocca sobre Brat, “in “esi amorioa RucrpelHgslew. Wot, Thy ad ta, eho, Paglo dea Jane ee a ee ee 16 ticas, propieiou condigées de desenvolvimento de comunidades, mas visualizadas dentro dos condicionamentos da realidade inclusiva, o que estava concuzindo ao surgimento embriondrio de uma democra- cia de base, calcada em atividades coneretas que estavam dando substantividade a um poder local, débil mas efetivo, Desejei explicitar 0 contetido de alguns dos termoschave empre- gados na programagio do MEB, buscando desvendar os limites ¢ as possibiidades que eles abriram na trajetéria do Movimento, Deste modo, foram analisados oS temas: conscientizacio, politiracio, ani macio popular, pessoa, povo, desenvolvimento de comunidade, educa- cao sindicatista e sindicalismo rural, Para cada um deles, procurel interpretar como foram vistos nos documentos oficlals, nos textos de estudos © de treinamentos, nos programas radiofOnicos, e, sempre que possivel, na prétiea roaimente executada. Tendo em vista o lugar social em que o Movimento foi se colocando, de defesa e intérprete ‘dos interesses do povo, progressivamente entendido como “pélo domi- nado”, mais dizetamente dirigido aos trabalhadores rurais — campe- sinato e assalariados —, tenfel interpretar no que cada ume delas contribuiu para aleangar este desiderato © no que elas opresentaram lacunas e caréncias, Busquef, ademais, analisar a origem, as caracteristicas e 0 projeto dos agentes do MEB — membros das equipes, a nivel local, estadual e nacional — ¢ alguns dados sobre os monitores, representantes do povo que trabalhavam para o MEB num sistema de voluntariado, em como as relagdes entre eles e determinadas reperoussées nos alunos © na populago atingida pela programagéo. Partindo de uma reflexio mais tedrica sobre a identificacéo dos membros como possi- yeis “‘intelectuais organicos” das classes populares, passando por algumas de suas relagdes com os grupos de referéncia mais expres- sivos, referi-me também aos atributos individuais e coletivos caracte: risticos de sua formagao, visio do movimento e priticas, que cont: tmiram para o seu desenvolvimenty ¢ mudanga pessoal e para 2 eficacia do trabalho. Por fim, nas relagdes que os agentes mantiveram entre si nas ‘equipes e com pessoas, grupos e movimentos extemnos, situel os tipos de conflitos que seus membros engendraram com suas atividades, em como as reagdes de proprietarios da terra, autoridades gover- namentais, representantes do clero (padres e bispos), na fase pré-64 fe cesses mesmos setores @ 0s ligados & repressio no pés64. Esses conflitos ¢ reagdes, em que pese o fato da resistencia das equipes, levou a uma Tedefinigéo gradual da orientacio e do sentido do MEB, com alguns dos principais sistemas radiceducativos fechando, outros permanecendo com limitac6es, até que todo 0 Movimento fosse quase completamente modificado, 1 Discrimimando, & guisa de sintese, as questdes tedricas de fundo que desenvolvi, umas mais trabalhadas, outras apenas esbocadas para aprofundamentos posteriores, menciono ns seguintes: 8) 0s limites @ as possibilidades concretas das pritleas educativas em suas articulag6es com a pratica politica; ) a falta de correspondéncia entre a rapidez imprimida & conquis- ta da hegemonia ideologica pelos setores vinculados aos inte. Tesses das classes populares emergeutes @ a inexisténcia de um projeto e conduto politicos que a coneretizassem, 0 que expres. Sava, na conjuntura analisada, as assincronias de ritmo e sentido geradas pelo proceso de expanséo do capitalismo no Brasil; ©) a8 praticas sdcio-educativo-politicas de um determinado grupo de cristios, numa dada conjuntura da Igreja Catoliea, a nivel nacional e mundial, gerando modifieagées significativas nas concepgdes de Igreja e de religiio em seus vinculos com a realidade; ) & educagdo de base sendo progressivamente redefinida a partir das préticas educativas executadas, aproximandose de uma con- cepedo de educagio popular que, oscilando entre os limites da comunidade e da classe social, foi desvelando o sentido de uma educagao @ partir dos interesses de classe das classes populares: ©) as tens6es entre uma teoria tragmentada e nfo sistematiznda com uma pritica variada em constante avaliagéo que, com base em certas caracteristicas metodoldgicas e de comunicagao com © povo, permitiu um especial equilfbrio entre a teorla e a pritiea no Movimento; £) uma visio da pessoa do camponés como eidadio, capaz de autopromoverse ¢ tornar-se sujeito critica e responstvel, © do ovo como agente de transformacio, vivendo as ambigtiidades do populismo & do indutivismo dos agentes educadores, que r0- formulou 0 Movimento e produziu efeitos relevantes nos alunos, monitores, animadores © pessoas das comunidades; 8) as atividades tedrico-praticas do Movimento nas comunidades, propiciando elementos concretos para a construgéo de uma democracia de base; h) 0 desenvolvimento de comunidades, em crescente conscientiza- 80 e organizacao, podendo expressar uma superago do tradi- cionalismo, uma negacao do capiialismo, e uma antecipacao his. t6rica na construgéo da nova sociedade; a escola como centro da comunidade, extrapolando o ambito meramente educativo e sendo assumida pelas liderancas treinadas; 18 J) as condigdes segundo as quais agentes ndo-pertencentes as clas- 28 fundamentals do modo de producéo capitalista puderam ten- dencialmente se transformar em intelectuais orginicos das clas. ses subalternas; ) as téonicas pedagégicas necessitam fundarse em teorias educa. tivas que explicitem sua funcio na sociedade inchisiva © so utilizadas por educacores com uma dada coneepcdo de mundo; as mesmas técnicas, com contetidas tedricos diferentes, aplica das por educadores com outra visio de mundo produzem con- seqtncias opostas — assim acontece com 0 governo no pés64. 1) a atuacdo sindical rural, sem os vicios do sindicalismo tradi- clonal atrelado ao governo, péde gerar efeitos conscientizadores, mobilizadores e organizdores no campo, propiciando mudancas significativas nas relag6es politicas, juridieas ¢ nas relagées de ‘trabalho; m) 05 conflitos originados de préticas sécio-educative-politicas con- seqilentes produzem resultados positivos aa dinamica interna de uma instituigao. Para se ter um quadro panoramico do itinerdrio seguido no tra: palho, a Primeira Parte 6 composta de trés capitulos. O primeira capitulo, ambicioso como pretenséo mas contido por reconheoer suas Uimitagdes basicamente introdutdrias & situago em que 0 MEB se originou e se desenvolveu, procura dar conta de uma viséo de fotu- Itdade da reatidade brasileira, com base em fatores estruturais ¢ conjunturais: mals evidenciados pelos intérpretes, que mastre 0 mo- vimento de expansio do capitalismo no Brasil, assinalando predomi. nantemente as tendéucias geruis apontadas por varios analistas. Consciente da natureza polémica de um quadro tio amplo e das possiveis discordancias quanto % maio: ou menor importéncia de tal ‘ou qual fator, ou mesmo quanto as tendéncias expostas, meu desejo fol o de tragar pardmetros para a andlise do ME, aceitando a pro- posicdo de que ele foi um movimento histérico, cujas caracteristicas fundamentals foram dadas pelas condigSes econdmicas, politicas, sociais ¢ culturais existentes, ¢ que, de alguma maneira, foram por sua vez influenciadas pela atuacéo do Movimento, Tratei de estabe- lecer, desde logo, um confronto da Igreja e do proprio MEB com a realidade sintetizada no quadro, para que o leitor deste trabalho visualize a amplitude da temética e extraia inclusive outras inferén- cias a mais das que foram consideradas, © segundo capitulo descreve os motives que fizeram com que a Igreja e 0 Governo Federa) optassem pelo Convénio criador do MEB, a estruiura interna minima do Movimento, ¢ uma primeira aproxi- macdo, bastante resumida, de seu funcionamento, Objetiva mostrar 19 os marcos gerais de sua dindmica, uma iniciagdo ao objeto que pes- quisei e Teferénela necessdria para o desenvolvimento posterior. © terceiro capitulo situa as relagdes do Movimento com a Ioreja Catdtica. Estando sob a égide da hierarquia da Tgreja Catoliea, 0 MEB era dirigido tecno-administrativamente por leigos com razogvel grau de autonomia, fato que por si mesmo produzird alguns dos conflitos intraeclesiais e que traduziu em um dos grandes desafios enfrentados pelo Movimento. A tese central parte da constatagéo de que foram as praticas efetivas de setores catdlicos minoritérios ¢ 15 reflexbes dela originadas, sob o influxo da dinimica vivida pola Igreja aos nivels nacional @ mundial e de sua reflexio teoldgica, ‘que propiciaram 0 processo de comprometimento erescente de bispos, padres @ leigos, uns mais outros menos e sofrendo muitas pressdes contrérias, em assumir posigdes tedricas » préticas corajosas © cri ticas 20 sistema vigorante no periodo pré4. O Movimento foi um dos instrumentos impulsionadores importantes no proceso histérico de construed do que vem sendo chamado de “Igreja popular”. Ten- do como motor a agio do MEB, tencionel captar o movimento da Igreja na perspectiva de sua presenga na realidade brasileira, prio- rizando problemas que se repetem hoje nas conflitivas relagdes da Igreja com o mundo, e que irdo reaparecer em outros niveis nestes ‘iltimos anos. Naguela época histérica surgiram e se expandiram propostas de atuagio de grupos e instituigdes nos campos de alfabetizacao e da cultura popular: é yélido salientar, dentre os mais expressivos, O Movi- mento de Cultura Popular, os Centros Populares de Cultura, o Siste- ma Paulo Freire ¢ a Campanha de alfabetizaclo “De pé'no chio também se aprende a ler”. Inserindo o MB neste contexto, a Segunda Parte seré dedicada @ concepesio de educacdo de base formulada pelo ‘MEB nos documentos oficiais, tendo por refereneial uma dada con- ‘eepedo de educacio popular por mim desenhada, e A realidade mais Tica do Movimento engendrada por suas praticas educativas, Esta parte, a mais longa do trabalho, compreende seis capitulos. No quarto capitulo trato da problematica da educagio popular trabalhada por alguns estudiosos e formulo alguns elementos para a sua concejtuagao, mostrando comparativamente como 0 MEB elabo- rou a sua coricepedo de educago de base, progressivamente comple- tada e refeita a partir exatamente da evolugio das praticas efetivadas, expostas nos capftulos seguintes. No quinto capitulo empreendi a andlise do tema da conscientiza- ‘fo, relacionando-0 com o tema da consciéneia histériea *, apontando bi abe TI I eee oo” Butt, atlas Tg St gee ‘Giuisions", “in ‘Bewwe Perepectives ‘ae Cathet, ty BYunsios, 195, * 20 como 0 estudo de Area e contatos com as comunidades partiam de realidades concretas © necessidades reais, e indicando pistas de como © processo conscientizador foi conduzido a um paulatino equilibrio eniro a teoria e a pratiea em constante rearientagio. Apds exempli- flcar com a transcrigio de uma programacio de aulas da equipe de conseientizacdo de Recife, situo os vinculos entre 2 conscientizacao realizada no MEB e a conseiénela de classe, como houve uma acele- ragio da conscientizacio dada pela realidade ¢ independente da nfo- diretividade defendida pelo Movimento, e aspecios de uma conseienti- zagao que tinka como substrato uma concepedo erista da vida, No sexto capitulo, complete! o entendimento do processo conscien- timador com a dimensio politizacie, Vista como separada € até con- flitante no comeco das atividades do Movimento, pouco a pouco ela foi incorporada como parte integrante da conscientizacéo, principal- mente pelas equipes que trabalharam mais diretamente com a ant macdo popular, com realce para as atividades de sindicalizagio rural. Embora nao recebendo a atengio dada aos outros temas, ¢ mesmo ‘ado havendo um texto mais olaborado pela equipe nacional, foi atra- vvés da, politizagio que 0 MEB enfrentou de cheio a realidade envol- ‘vente, teve do so redefinir e se reorlentar, engendrou as reagbes € conflitos maiores a nivel interno e externo. No sétimo capitulo comparece o tema dx animacéo popular, pro~ cesso abrangente que englobava e extrapolava a escola radiofonica e que, apesar de ter produzido efeitos reais na fase pré64, val ser melhor sistematizado nos pés-64, quando as condicdes para o functo- namento das escolas foram sendo crescentemente cerceadas. Com a animaggo popular se avangou da alfabetizacdo e conscientizagio para um efetivo trabalho de formagao de liderangas e de agdo e so progre- din com as atividades de sindicalismo rural. Nos capftilos seguintes, recebem um tratamento minucioso exatamente as duas atividades que mais concretizaram 0 que 0 Movimento pretendia com a anima- ‘¢80 popular. Assim, outro tema bésico foi 0 desenvolvimento de comunidade desenvolvido no oitava capitulo. A escola radiofOnica era pensada como um centro da comunidads ©, ao mesmo tempo, um lugar de frradiagio para a comunidade. Mesmo considerando sua importancia no MEB, nfo houve uma tecrizagio adequada e as priticas eram oscilantes, Generalizando em forma de um espectro polar se pode afirmar que as coneepgies sobre 0 desenvolvimento de comunidade variaram de uma visio mais {diliea de imagindla como capaz de resolver todos os problemas locais, até uma vistio mais conereta, no Gevidamente internalizada e tornada consciente, no sentido de ir coneretizando formas de poder local, de construgio de uma demoora- cia de base, que foi descortinando para os partieipantes das comuni- dades os limites © as possibilidades da realidade inclusiva que as al determinavam. Para a edificagao dessa democracia de base, 0 MEB procurou fornecer subsidios por meio de clementos continuos de socia- Iizacdo € ressocializago, do conhetimento critico da realidade da. con- JugagSo da teoria com a pritica, das atividades experimentais e de avaliagdo, das relagées entre as liderangas e as bases, da participagio: politica ¢ de uma adequada pedagogia popular. Um destaque, que mereceu um tratamento especial no capitulo nono, foi dado ao estudo da edueagao sindicalista e 0 processo de sindicalizacda rural, Tida como atividado complomentar de assesso- ria e ajuda na programacdo do Movimento, a educacdo sindicalista se constituiu num instrumento preciaso de conscientizagao, mobiliza- fo © organiagao dos trabalhadores rurais, Pela propria dinamica da conjuntura, este setor teve que apurar a sua prética e foi, sem duvida, fator de propalsio dos demais setores, obrigando-os a Tefle- tir mais criticamente sobre 8 fungio da educagéo € a entrar num ritmo mais “quente”. Iniciei situando aspectos histiricos e institu. cionais do sindjcalismo rural, as diferencas de constituledo © atuagéo dos sindicatos e das Ligas Camponesas, e 9 presenga oficial da Terejs com comentarios sobre a agio dos grupos cristéos que funcionaram no sindicalismo rural no Nordeste. A partir da entrada, no processo sindiealizador, de outras forgas socisis e da avalanche da sindicaliza- do em massa, descrevi 0 envolvimento do MEB neste processo 0 as questdes politicas que ele levantou, bem como as dificuldades do compatibilizer atividades educativas com praticas sociais diferentes, que aquelas atividades ajudaram a criar ou desenvolver. Estio fal. tando pesquisas aprofundadas que déem conta da sindiealizacto no campo para aquele periodo, Na seqiiéncia, organizei uma Tercsira Parte, com mais trés capi tulos, articulando trés temas que embasaram a concepcdo de mundo expressa pelos agentes do MEB, referidos diretamente as praticas educativas desenvolvidas. Estes temas — cultura © cultura popular, estos © Povo — foram os que, a meu juizo, aparecerain com maior freqliéncia nos textos e discussées, se ligaram permanentemente com todas as reflexdes sobre as afividades educativas, e completam de forma bastante util a andlise encaminhada na Segunda Parte. Eles Sofreram modificagdes de significado no decorrer do funcionamento do MEB e nortearam por sa vez a5 prdprias atividades oxecutadas. No décimo capitulo trato das abordagens feitas no interior do Movimento sobre a culture e a cultura popular, bem camo sues relacdes indispensdveis com a educagao de base proposta e executada, Cultura era 0 substrato necessdrio da educagio e cultura popular compreendia todas as formas de pensar e agir do povo. Havia na reflexio uma ligugSo intima entre tomada de consciéncia ¢ luta do povo, cultura comunicavel a0 povo, cultura ligada & consciéneia bi toriea, tudo ganhando sentido verdadeiro quando levando a realiz: go humana, No fundo, uma parcela signifieativa do Movimento acre- 22 Gitou numa “visio culturalista” da mudanga socisl, enfatizande que fa educagio teria o condo de transformar as pessoas e por conseaiién- ia as estruturas socials. A valorizagéo ds cultura popular propiciou jum respeito e maior eonhecimento das coisas das populagdes rurals e ‘bri pistas para um conhecimento mais amplo da vida. Pessoa tol o tema escolhido para o décimo capitulo. A arigem primeira das {déias que o influenctaram se acha na pedagogia da acao Sesenvolvida na Ag&o Catdlica, passando pela concepoao de conscién- cia histérica. Superando @ referencial doutrindrio da Igreja, pessoa extrapolava a convepgio de individuo difundida pelo liberalismo e Ga defesa retérica dos dircitos fundamentals do homem, ¢ era per cebida como sujeito critico, produtor de cultura, protagonista ativo, vivendo numa sociedade na qual as relagdes entre as pessoas sao assimétricas, desiguais e de exploracao. Apesar de uma forte tendén- Gia em entender a nocéo de uma pessoa numa visio meramente cal- furalista, na prética cla foi redefinida com base no enfrentamento de suas telagdes com 0 mundo ¢ com os outros homens, Deu-se realce ao trabalho como elemento mediador entre a pessoa e 0 mundo. As pessoas consclentes, mobilizadas e organizadas em comunidade, pode- iam produzir mudancas na sociedade através de condigdes que de- senvolvessem a dignidade da pessoa humana. Por conseguinte, esta nogao, quando se defrontou com a realidade da pessoa do camponés, conduaiu a afirmagio dele como sujeito do processo de transforma do e & dentincia dos impedimentos de sua realizagio, bem como & uta pelas reformas estruturals que eondusissem & sua consecucao. Este sentido de pessoa também exerceu efeitos benéficos nas rela- Ges entre os membros das equipes, que consolidou 9 Movimento com fortes componentes consensuais, © facititou as relagbes dos aged: tes cath os monitores € a populagso, Povo é a terceiro temacchave, desenvolvide no décimo segundo capitulo, e, como 6 sabido, um termo reconhecidamente vago ¢ ambi- guo. No MEB, ele também assim foi percebido. Povo era todo 0 homem, o homem rural explorado, trabalhador rural e urbano, a comunidade, todo 0 povo brasileiro, 0 pélo dominado, a classe social oprimida. © importante 2 registrar, no entanto, é que a partir de uma oneao pelo povo, feta no I Encontro Nacional de Coordenadores, realizado em Recife em dezembro de 1962, toda a programacao e as atividades foram mudando de orientaco. A falta de maior clareza fedrica nio impediu um compromisso conereto com os expropriados © explorados do capitalismo, e isto era 0 que importava. Os agentes mais bem preparados possuiam uma concep¢io de maior rigor, iden. tificavam povo com classe social, e pela influéneia desses agentes todo 0 conjunte ie amadurecendo.” As priticas do Movimento supers: yam a teorizagio, somavam-se ar fortalecimento do movimento popu- lar emergente no pais, sofriam as conseqtiéncias dos contlitos politico- ideoligicos de grupos e classes socials exisientes. Neste capitulo, 23 clabore! uma reflexiio sobre 0 significado do populism, tendo em visia as interpretagSes civergentes de alguns autores, estrangeiros * e nacionais’, e seu valor tedrico-prilice na andlise do Movimento. Na Quarta e witima Parte, tentei contigurar o perfil dos quadros 40 MEB — agentes, monitores e, com uma breve referéncia, os ani- madores populares —, que deram vida 20 Movimento, os sujeitos que fizeram 0 MIB, com seus erros e acertos, um pedago vivo da. historia, daa transiormoagdes socieis do Bras). Eis ¢ composia também de. cts capitulos. Os agentes das equipes looais, estaduais ¢ nacionais, constituia MEB oficial, Trabalhando com a nogéo de intelectual, organico etre Gicional, desenvolvida no universo gramsciano, procurei aplicéla no caso desses membros das equipes do BEB, redefinindo-a para a nossa situagdo concreta, Tracei o perfil dos agentes constitutivos desses quadros a partir dos elementos mais tipicos, com dados coletados por mim em entrevista e por outro pesquisador em 1966. Enfatizei a influénela decisiva que a Agio Catdlica ¢ particularmente a JUC tive- Yam nos gnupos mals expressivos. Sistematizel as respostas dos entre- vistados com referéncia aos fatores principals determinantes de sua formagio, ideologia e projeto politico, durante a sua permanéncia no MEB. E por fim, em func&o dos impactos que causou em varios membros, citel como estes membros se Telacionaram com a AciO Popular. Estes comentiirios compuseram o décimo terceiro capitulo. No décimo quarto capitulo, com relagdo aos monitores, destaquel sua origem, caracieristicas gerais, formagio e representacio que eles faziam dos menibros das equipes, bem como estes viam os monitores, © monitor era visto como 0 elo natural do Movimento com & com. nidade, com 08 alunos, porque, proveniente do meio rural, treinado para as tarefas que desempenhaya, vivendo dentro das comunidades, tinha as condig6es ideals para uma melhor effcdcia do trabalho alme- jado, Coneomitantemente 2 evolucso do Movimento eles foram tam- bém evoluindo, dando mostras de capacitacao e lideranca no seu meio. Ja mais para o final (1963-65), muitos foram um exemplo vivo de como, dadas certas condicSes favoraveis, em pouco tempo podem se conscientizar e assumir fungdes politicas da maior relevancia. Sabe-se que um grande niimero deles, superando obsticulos terriveis, con- tinua hoje firme na Tuta por sua emancipago e por uma real democra- cia neste pais. No tltimo capitulo, tratei das reiugdes internas e externas do MEB, € 0s conflitos e reacées que suas prdticas engendraram. Por tudo que ja se salientou, 0 Movimento conflitowse com os donos do poder, seculares e religiosos. Como Movimento li- eh Ge ae Oho cepte "to" ping ES, cnt Digna, tet, welt Frais 0 Wada beseadeimeritta, on, lt AMES Pre Ferns MF Pal va Pout of & Tgreja Catélica, ao afirmar a autonomia do leigo, ao Questionar pontos da doutrina social, ao integrar a £6 com o compro- jnisso no mundo e lutar por sua transformagio, de certa forma pre~ nuneiando ¢ {4 antecipando temas da teologia da libertacdo e o sur. gimento de uma “Igreja popular” na qual os pobres tenham voz @ Nez, os membros do MEB enfrentaram oposig6es e conflitos com eclesidaticos (bispos, padres e religiosos), com leigos de outros movi- mentos de Igreja, e aié entre si, no interior do Movimento, por diver- genies opinies sobre estes elementos. Com referéncia as relagdes com a Sociedade Civil e o Wstado, suas orientacées e atividades também atrairam as iras dos douses reinantes proprietdrios rurais, politicos profissionais, imprensa, governantes, representantes dos aparethos repressivos. AO exercer atividades educativas eriticas, em muitos casos apenas reformistas, como se verd, mas com uma cone ponente politica clara de mudanca social, com base em comunidades que se autopromoviam e em sujeitos politizados que assumiam o Seu processo de libertagéo, 0 Movimento se conflitava com a expecta: tiva dos governantes e grupos dominantes que viam na educagao um fator de integragio no sistema de domesticagio. A passagem da alfabetizago —— e mesmo esta com um conteddo inovador bem dis- tante do que era tido como conveniente — para a conscientizacao e animagdo popular, conduziu 0 MEB a se somar a todas as forcas progressistas da Nagdo que a0s poucos tentaram, e em alguns casos conseguiram, romper com cortas relagées de dominagao-suberdina- do vigorantes, desestabilizar as bases de controle politico e ideol6- $ico, tendendo a conquistar uma hegemonia cultural e politica que se opunha & ordem social injusta prevalecente. Antes de 64, j4 hhouve eampanhas de difamacéo, persegaicées, fechamentos de escolas © apreensdo de cartilhas. Depois de 64, a repressiio atingiu varios Setores do Movimento, com invasdes de sedes, destruicao de material, prisdes de agentes, amedrontamento de monitores, afaques & linha Seguida, fectiamento progressivo de sistemas radiceducativos (1800), © que levou a alteragio da programagio e da orientacdo geral, modi ficando = propria identidade e o sentido do Movimento, ainda que se releve a luta de algumas equipes © pessoas renianescentes que tudo fizeram para salvar o minimo e algumas atividades (1967-1972). 'A guisa de conclusio, resumi os resultados. Inicialmente, era meu gesejo avaliar os efeitos do MEB em algumas comunidades. Conside- rando, todavia, as dificuldades de uma avaliagéo profunda a poste- Hori, passados tantos anos, optei pelo estudo dos tépicos ja indica Gos. Apesar de tudo, alguma coisa foi possivel, embasado nas opinides dos entrevistados, observacbes pessoais pelos Estados, e pelos comen tdrios ao contetido de cartas de monitores produzidas naquele periodo, ¢ portanto préximas dos acontecimentos ¢ da realldade vivida. Prin- cipalmente na regio nordestina, conhecida que era até mundialmente pela extrema miséria da maioria absohuta da populacdo, quer como 25 revolta contra a sftuacio, quer como resultado da agio politica ¢ ideoldgica de Iideres, grupos ¢ movimentos, seja pelas conseqlléncias advindas da politica taclonaldesenvolvimentista executada no Pais, seja pela atuagio de setores da Igreja, houve uma intensa mobiliza- do (que também eclodiu em outras regices sob formas distintas) @ uma dinamizacdo social inusitada. Com as Ligas Camponesas e com Qs sindicatos rurais, aquela regio atraiu a atengéo tanto dos grupos Gominantes, preocupados com a “agitacko”, quanto dos grupos de esquerda, preocupados em consclentizar e Organlzar os camponeses segundo as suits propostas, As condigées econdmicas, sociais e cul- turais prodominantes, impeditivas de uma tomada de consciéncia ¢ de solidariedade organizativa, e a violéncia historica e estrutural tipica das relagdes entre proprietérios rurais e camponeses comeca- ram a ser questionadas e vencidas em determinados lugares, com alto grau de sensibilizacdo e de difusio. O que ficou demonstrado, pela agdo do MEB e demais forcas socials, 6 que setores da populagdo no campo, dadas condicées concretas que permitam suas manifesta- ges ¢ com apoio em inexploradas potencialidades existentes em suas relagdes sociais e em elementos de sua cultura popular — as quais exatamente os agentes do MEB buscaram despertar, animar e desen- volver — tém possibilidades de se conscientizar rapidamente, se orga- nizar, se elevar a um nivel cultural superior e participar como sujeitos plenos da vida nacional ¢ da construgio de uma sociedade mais juste ¢ humana. Do ponto de vista metodotégico, devo dizer que houve grande ousadia de minha parte, diligenolandome por analisar 0 MEB em fungao de fatores condicionantes e de determinagSes mais abrangentes @ nivel econdmico, politico, cultural @ social, que dessem conta de seu processo de génese, constituictio, funcionamento e sentido, £ complexa a tareta de compreender as articulagSes entre fatores exter nos ¢ infernos de um movimento educativo, ainda msis neste em que procurei observar nexos estruturais e conjunturais, aspectos do embate entre grupos e classes socials, relagdes com grupos de refe~ réncia significativos, tensbes intraTgreja e derivadas da sua insergio no contexto global, contradiedes originadas interna e externamente, integracio entre teoria e pratica, e tdpicos da vida cotidiana dos agentes envolvidos. Posto que estoja longe de mim me arvorar em intérprete de uma totalidade que conjugue esta constelagao de fatores, certamente a andlise ficaria empobrecida e haverla dificuldades em aleangar 0s objetives propostes sem tocar, de algum modo, nos prin- cipais deles. Fot 0 esforgo que empreendi, ciente da humildade meto. dolégica que o investigador deve ter para acompanhsr 0 objeto em suas metamorfoses, tendo presentes as limitagdes de minha formagio, e consciente de que foi dado um pequeno passo na direcio preten- dida. As lacunas existentes doverdo ser suprimidas com os estudos complementares de outros investigadores. 26 a Com relagéio & selegio dos agentes que optei por entrevistar, con- siderando 0 grau de dispersio dos quadros do MEB por varias regides do pats, apés 0 fechamento dos principais Sistemas, e 0 seu niimero geral conforme registro de 1903 « 1965 (ver 0 quadro a seguir), foram selecionados 40 membros das equipes, depois complementados ‘com 10 monitores. Os entrevistados das equipes foram selecionados inicialmente por sua roprosentatividade no Movimento global, dada pelo lugar que ocupavam nas equipes e pela presenca mais constante em atividades nacionais, ou seja, 05 coordenadores de equipes esta- duais ¢ locais. Em seguida, por indicaglio dos coordenadores e pela facilidade de contato, tendo em vista sua atuag&io no trabalho desen- volvide, foram selecionados alguns agentes das equipes que trabalha- yam como professores, supervisores ¢ locutores. E uns poucos, alea- toriamente, pela oportunidade de um encontro casual. Embora esta amostragem néo seje totalmente representativa, a mafor parte dos eseolhidos teve um papel bem ativo, vivenclando @ dinamica cotidiana das equipes 0 d4 uma idéla bem prdxima do conjunto. Outros dadas obtidos em estudos sobre os quadros do MEB e indicagdes de docu- mentos, utilizades nesta pesquisa, completam 0 seu pert QUADRO 1 — QUADRO DE PESSOAL DO MEB NOS ANOS DE 1263, 1004, 1665* ‘UNIDADES 1968 - 1865 0 2 = a Era ‘4 ™ 0 ir 2 n a s 0 s 0 35 2 3 : 95 108, 2 a 2 0 % 3 2. 5 5 oo a 0 0 2 m 1% io c 2 4 4 a ‘TOTAL DE IS "UNTDADES a om a a ‘SECRETARIADO ‘CENTRAL ” 2 Ey 2 ‘TOTAL GBRAE on oe 8 0 FONTE: MEB, MEB EM CINCO ANOS (199141086) — SEGUNDA PARTE. Sho inclu cs manitores| 2 Ainda que se tenham escolhido representantes de sete Estados, a maioria pertencla ao Nordeste, 0 que é explicdvel por uma série ‘de Faudes: a) foi a regifio foco de maior tens4o social no periodo; b) foL a res de presenga mais maciga do Movimento; ¢) foi a area onde o MIB comecou a operar de maneira sistemitica; d) a regiio de Natal (no Rio Grande do Norte) foi paleo da ago pioneira nas emissdes radiofonicas, teve atuagéo destacada na agio social da Igreja (pelo Movimento de Natal), e foi a que permaneceu sem grande solucio de continuldade até & época da pesquisa (anos de 1974-1976); @) Reci- fe (em Pernambuco) se constituiu na regio onde as alteragdes polt- ticas ganharam maior explosividade, com a mobilizagio no campo, @ atuagdo de grupos e institulgdes culturais, as alteragbes a nivel gover- namental, Uma lituitagio da amostra é a de que ela deixa de lado o Norte ©, no Centro-Deste, se restringiu a Goids. O Norte (de cujas eautipes foram exiraitios alguns textos) © Minas Gerais apresentaram, 0 lado dos elementos comuns, caracteristicas peculiares e varlacdes significativas que impedem uma generalizagio do que se analisou neste trabalho para aquelas regides. Uma limitagao a mais é a de que néo se entrevistou nem um elemento especificamente ligadlo & admt nistracso, setor importante do Movimento e geradar de uma dindmica prépria com conflitas especificos com as equipes téonicas, apesar da. ressaiva de que alguns dos sujeitos respondentes tivessem parti- ofpado de atividades neste setor. 28m meu primeiro plano de pesquisa, era intengtio dar énfase, além da andlise dos textos e da acdo dos quacros das equipes, a0 trabalho desenvolvido pelos monitores, agentes indispensiveis na vida do Movimento, elementos de lgagto com as escolas e as comunidades. Contudo, diticuldades pessoais torcaram a Umitar esta parte impor- tantissima do MEB. Tentando superar, em parte, esta lacuna, apro- vyeitei os dados fornecidos pela pesquisa de Ferrari (em meados de 1965), que entrevistou 248 monitores treinados e pertencentes a 31 municipios do interior da Arquidiocese de Natal. Entrevistel tambem pessoalmente 10 monitores, todos pertencentes a0 Rio Grande do Norte, pelo simples motivo da maior possibilidade que tive de um enconiro mais demorado naquela regio, senco dois de Mossoré na mesma cidade, dais da interior em Natal, todos estes selectonados por menibros das equipes locals, ¢ seis em S40 Paulo do Potengi, convidados aleatoriamente de uma outra reuniio que ali estava se realizando e que quiseram comparecer. Certamente € para com estes, Gados dos monitores que se deve ter maior cuidado ¢ qualquer deseo de generalizagio pata outras dreas do pais deve ser feito com muttas cautelas, Além das indicagées expostas no texto do trabalho, outros elementos podem ser vistos na Parte de “Anexos”. Considerando 0 total dos que pude entrevistar, a distribuicio final ficou. assim: 28 ‘Marenho Piaui . Ceard 0. i Rio Grande do Norte | Pernarabuco Sergipe .... Bahia ..... Goids . 4 Equipe Tecnica Nacional... Sl ove SGarw Equipe Nacional * Equibes Estaduats 1.11.11, Equipes Locais ... Coordenadores Membros das arpa Monitores ....... ORAM its ees OS) sean © material escrito fol colotado basicamente das publicagdes princi- pais da. equipe nacional e das produzidas pelas equipes de Pernambuco © Rio Grande do Norte. Dos outtos Sistemas, foram aproveitados raros textos, dada a sua inexisténcla em virtude do desaparecimento por motivo a repressio, A escolha das publicag6es da equipe nacional como dado mais pri- vilegiado devese ao fato de que elas expressavam, de forma mais sistematizada, 0. contetido da programacao do Movimento © a ideo- Jogia formulads e difundida. Como se verd, esses tentos exereeram Uma funciio homogeneizadora e de catalisagio, mesmo sendo assimilados do maneira bastante diferenciada pelas equipes. Além disso, parte deste material era uma sintese das préticas realizadas nas bases, infor. madas por relatdrios das equipes ¢ constatadas pela equipe nacional in loco, quando niio redigida pelos prdprios coordenadores em encon- tros nacionais. Sobre 0 material de Pernambuco e do Rio Grande do Norte, a escola foi muito pratica: do que sobrou daquele periodo, era o material mais amplo ¢ documentado, ainda que alguns docu- mentos estivessem em péssimo estado de conservacio. Sempre que possivel, transerevi os depoimentos dos entrevistados e Iongos trechos de textos elaborados para aulas e nos documentos, com a finalidade de ser fiel a0 seu inodo de ver as colsas e permitir a0 leitor uma avaliago mais rica das fontes empregadas. O traba. 29 Iho poderia ter utilizado, ademais, um grande mimero de cartas escritas por alunos e monitores Bs equipes, que constituem um mate- rial riguissimo A espera de novas pesauisas. Mas elas exigiriam um tratamento adequado e uma andlise de contetdo que iria muito além dos objetivos propostos. Mesmo assim, usel quando necessério tre chos selecionados ora pelas equipes, que os destacavam para serem lidos nas aulas ou para serem apresentados nas publicagées e relatd- ios, ora pela pesquisa de Ferrari. Do montante existente, basica- mente produzida por monitores ¢ alunos das escolas pertencentes 20 Sistema de Natal e a Sistemas do interior de Pernambuco, somente foram aproveitadas as mais expressivas que, obviamente, néio repre sentam 0 conjunto. Um quadro indicativo dos temas que mais apare- cem nessas cartas, comparando os anos de 1959 e 1962, para alunos ¢ monitores, encontra-se na tabela transcrita nos “Anexos”, Com respeito as entrevistas que realizei, foi seguido um rotelro semi-estruturado, com perguntas abertas, deixando plena liberdade 20 respondente para manifestar 0 que Ihe conviesse ¢ como o quisesse. As anotag6es das entrevistas foram feitas no transcurso das mesmas. No que se refere & bibliografia lida, procurel me fixar nos traba- thos mais diretamente vinculados A conjuntura objeto de estudo, nos textos sobre educagio em geral e educaco popular, nas obras que tratam do papel dos intelectuais orginicos, e enfim, naquela que, de uma forma ou outra, havia uma referéncia explicita 0 MEB ott as experiéncias de alfabetizacio ¢ de cultura popular da época. ‘Uma tiltima palavra sobre o trabalho como um todo. Tendo vivido intensamente aqueles tempos e a vida do Movimento, ressalvada a minha modestissima contribuicio nele, fiz um esforgo para manter © indispensavel distanciamento nas apreciagdes da andlise aqui exposta. Mas devo declarar a parcialidade do investigador no sentido de se identificar com muitas das orientagdes e posicées assumidas por setores daquele MHB. Crelo, ademais, que € preciso sentir e se apaixonar pelo tema e pelo objeto de estudo, educacao do povo ‘pessoas que lutaram juntas para conscientizar e organizar este povo, gente brasileira realizando a ingente tarefa de libertar parcelas imen- sas das classes subalternas, de construir uma sociedade mais livre € democratica. $6 assim a ciéncia traz vida e ndo ilusio ou mistificacio. 20 PARTE 1 Conjuntura, igreja catélica e surgimento do MEB CAPITULO 1 A irrupeaio das classes populares “assim, condicionadas desde 0 principio pela ‘enise interna ov grupos domivantes,. penetram fs ‘massas populares urbanas na politica brasileira (.). Podese, sem diivida, felar de classes populares’ ou de massas populares, erpressbes imprecisas porém iteis, de qualquer moto, para captar’ a. possivel’ Romogeneidade "deste ‘rande conjuto, de ‘pessoas que ocupam 08 escaldes sociais e acondmicos injeriores ‘tas diverscs dreos do ‘sistema capialista, Pigente no Brasil) ornase ainda mais importante o surgimento de formas de acdo popular que wo, em alguns Ges08, muito aiem dos esquemas. fradiclonais. As fregilentes greves de trabathadores, ‘@ ctescente. importancia. dos grupos nactonalistas, & ‘mobilfeagéo aa opiniao pulies em torno la eradtica das reformas de eatrutura fem particular @ reforma opraria), a extensio fos direitos sociats aos trabathadores do campo, ‘a. mobiligio dos. camponeses para a, rganizacto Sindical ow para as igas. camponesas’ de Francisco Jultéo, so alguns dos fatos (gue amamciam @ emerpencia de wm Movimento popular de am novo estilo. Fate, ‘ainaa gue fivera seu nascimento dentro dos quadros institucionais e mantivera relagdes de dependineia com a politica populista Ge Goulart, introdueia ‘problemas eujas solugdes Implicavem' mudlangas basleas "na composiogo dap forcas sociais em que se apoiava 0 regime. Wa realidade, 0 desdobramento. dos limites urbanos da manipalagaa de massas, com 0 comeco aq mobilizaeao das ‘massas rurais, significou que se comecaua a destocarse um dos elementos Ddsicos a estrutura de poder — a grande propriedade — 0 que jamais ousara fazer © poputismo em wenhum de seus momentos anteriores”, (Welfort, P. C., "0 populisma ma politica Twrasileir, in Brasit’ Hoy. Mexico, Siglo X31, 1966). 33 Neste capitulo procuro montar um quadro-sintese que dé conta de Contextualizar historicamente 0 MEB. Nao se trata de uma andlise em profundidade da reatidade brasileira, mas de tentar, com funda. mento em certos marcos estruturais e conjunturais, captar as ten. Géncias mais visiveis do processo de expansio do’ capitalismo no Brasil e, em particular, do Nordeste. Importa selientar 0 sentido que 0s grupos @ classes dominantes, naquelas condigées dadas, impu. seram @ este processo, e como as classes cmergentes — operariado urbano, campesinato © proletariado rural — se relacionarain com les. 2 inegivel a complexidede de se montar um quadro, ainda que Superficial, das tendéncias que déem conta do desenvolvimento capi. talista naquele perfodo historico, almejando obter uma visio de tot. 'dade realmente explicativa. Consciente deste fato e de minhas limi. tages, apresento no quadro a seguir esta tentativa arriscada com uma preocupaco bem definida. Se aceito a tese de que aquole MEB foi um Movimento historico (vale frisar que, dentre os que atuaram no campo da cultura popular, fol ele © tinico a continuar depois de 1854, mas mudando paulatinamente de orientagio), ele s6 foi o que foi precisamente por ter existido num momento ‘de nossa historia com as caraeteristicas apontadas para os planos econdmico, politico, Cultural e social, determinantes de sua existéncia e das demals expe. Hénclas entio existentes, e que foram influenciadas por estas mesmias experiéncias. E' mais, na presente amiilise, este quaciro vai me interes sar na medida exata do que significou para a Tgreja Catolics ¢ para © MEB. Deste modo, apresento destie logo uma constelacao de ele. mentos evitlenciados pela Igreja e pelo MEB, para efeito comparativo € com © objetivo de situé-los neste amplo quadro de referéncia, os quals sero retomados ¢ interpretados na seaiiéncia do trabalho Ainda uma palavra sobre a distingdo dos cortes em estrutural ¢ con: Juntural: estrutural concerne aos elementos que apresentavam padroes de Permanéneia e estabilidade na realidade brasileira, reconhecidos como mais recorrentes pelos analistas; conjuntural concerne 20s elementos que, fundados nos elementos estruturais, tomaram con figuraco propria no periodo, alguns acentuados pela aceleracso da crise, outros em refluxo, personagens e forcas sociais que entraram 34 éeie de pulsagdes da cena e outros que desapareceram, uma espé a fstrutara que genbaram colorido e tornaram mais Glare. 8 percepes0 de componentes Istentes cu ocultos em épocas de maior normalidade. PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO 0 CAPITALISMO ESTRUTURAL — G0 a 60) apes centro no Gelso “io_capialamao em gerel_com concent Senstocntemacinalimgio Go mertad) Taterne any, 0, Gironineagto da staitigto de” imporiagdes e-Implaniacio, a" porcon nti ‘sao Cenlador da ionomia e promoter do desnvcviesto Sewausbane region cm, Twgwnouin so Contos, oncintsagio, ce propriedades e rendas, Gimmomis ‘ente™agriultre eTehmtiliogto; i Spglo tetris ‘pelo modelo de desenvolvimento naccealista auténomo; {Gro ‘ene’ ef polticas monetarsta estruturalisa ROONOMICO a eo SeaTac Coes oe ey oe eS ee Sepa Sas Te - eo eee Pournico Tinea ular ormameniak iacaa fora do lige Campaahas de allabetusrio de adultos, Porumiagem slowade de analabaion e educapio olin aro elites; Eor:iumanisco © nclcopedins dus unverstina, ESsoaieee dp uma, cute nasonalit alo Tomo grande ‘strum do comunlegto soca. CULTURAL, ee Sas Eirgussa nacional B4gi'e etoutote-aulancl coma’ s purple Srpaniio ou seiores de laws tata; Troriaiete lead steeds Go” pear, DIMENSOES DA REALIDADE BRASILEIRA SOCIAL a ee Ter aE ae aS curs: ee ed SXSEYAMGes as tes ¢ can mt sae i tek ata em 5 cen «om Re nat TGREJA CATSLICA 35 PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO DO CAFITALISMO PROCESO DE DESENVOLVIMENTO DO CAPIFALISMO CONJONTURAL — (a0 a 2) DIMENSORS DA REALIDADE BRASIEEIRA TOREA oxTOLACA SENTIDO — TENDENCTAS Sa (@ SUDENE. como meio}; 3 consolidagiio do capitalismo monopolista e internacionalizagio do omnes ct ‘iano raat «tira aiomtms 2 Stator Be ess ee ee ee BESS etal, pase ion wa ee Oe iessne vente & presses populares ‘pela redistribuigao da renda, i rade iutervenconsta © aoumulador de capita a aa Saas cas aR gies canta or eats ae See oe pees oe nee oer ee eer tarmac areca vn ) See g Riteecns cried? Sais SA 2 SRR ce set SE enon ae ee moras so Br bearer a, cial a ate ee avn, Bes rte Cees rer ee cra eee a rs a er le Tc See ee ee = Sipe EIN SCSI ca, res, con, wea, a a3 Say eee erraas ee ee emt ines eo 65 nin Se ceca domnane: Aen are é ; f RST Be co —— E Cc oe ae i ag esogo de goer eas © meso « redotmito B ‘Sistema Paulo Fretre; bal peé-onystat . B aria wii enna pe ea BES ae mm mince cami mm ‘nteresses diferenciados entre pequenos proprictérios, camponeses © urbanizagio reivindeagies do meios de consumo coletivos. 5 heen See ee eee een Oe eee ee ee agi a aah Rae PSs GS A a Bees ee et ee re itmemigey Se eee a ee ee SS ees: Seen ee frescente. “marginalidade” social urban; Imuliplleagio de étkiog sntcrmeaisrioe © pluralism de grupos ¢ tendéncias, ‘eclogia maieada pelo compromisc #€ « (wansfonnaglo do mundo; Imfluenels renovadera das etelelioas soulils Mater et Magistr, Pacem in Terris o do Coreflio Vatlesio 1, ‘rileas oficlais ao sistema capitalisia ¢ TelvindlcogGes de ‘reforms. estruturais; ‘Dssuras na vinculaglo ao bloco dominante e toclioagio para o povo no campo; lita pela maloridade do telgo na Agdo Catoica © pareularmenie na JUC; Tule pela domocratizagio da. edcigto; ‘purlcipagio politica ativa de grupos crislos em posigéee do caquerda Driuelios grupos defendende possibldades de opgdo pelo socialism; cam_relagdo 20 MEB: 2) objetives oftiis: svangellzaglo: ptamover © homem ¢ veveler o Cristo Servigo so povo rural: integrayio na vida social p reallaagko humana Seigos “orletando 'o movimento, com verificagso da Rieranula B) obletivos do. eto: = aftrmagdo ‘ma igre} @ campo para o trabalho protisslonal evangelisagio pelo taiemunno 2. trseaino eae iceias = Htcionalisar ‘wma alvidase ee Greig da lgreja = theajamento teanstormagcr ‘somo consenUensia da apgio_eristé 36 TOREIA cATOLICA ‘modifcagdes nt organtzacio, primelrss passos das comunidades ecleslate fe ase, Estado ‘Inlando em nome dos vilores crlstios @ deslegtimando a tluencie dircta' da Yercjar com relacto 40 MEB: nla em ‘certos aspectos © rejeigdo de outros da doutrina ‘ociel da tevela — Crises de {€ ¢ afastamonto da vide sacramental Sambrives de hove csiolicismo Inlemalindo ode vWncle ¢@ uma “Tgreja. popular” eee 3t MOVIMENTO DE EDUCAGAO DE BASE — nem (3961-1965) S.C (OBIETIVOS DDanmesia nernastonal » @ tacional, tendo o Estado coma mediation Twurtuesia CentroSs) contra Darguesia slgodoetra peeusria do WNordesie: proketariado conta umguesi® estado — Tote salarals Nonleste: projetarido buses guranur salgrio minima ® & ogtsingdo.trabainista: ‘pressoes extemae contra politica econdmies (ENED) BCONOMICO ‘presses exieraas contra Higes (programa assistoncial @ eoondmico — Hoban); ‘agentes extertos om sindicatos (CIA ¢ CLUS): fampanna das classes aominantes contra populieme ¢ siicaliano GES — BAD — imprensa — leyislativoy; selores populares, ftnnos © pursis, contra setores dominantes, fomper 0 subdeseavalvimento; Slur tu depeneolvimenta, nacionatista que garuntisse: SMraformas estraturais = tase no. soci integragio Chomem todo © tose os homens) comunidades. auto-sustoniadas. ‘eaueagio das massan com implicapies politica Shimetco popular, orwaniaglo do povo de grupos ma comunidad; fqicstionamento das extruturas de represealagio © neosidade fetucaclo tradiciona o modems, adequada & nova eccnomiR; Selores dominentes combate Sistemm Paulo Freire © movimentos de cultura popular; ‘Sctores populares feivindicam escolas © seess0 & cultura. conrurat. ) Pourrico ‘onjecivos @ confltos diarenciados para openirion © camponesen; {grupos de classe mddia radiclleads com apoio AS classes populares; Estado e. proprietirios com sicicates «© Dgas: % — industaialimagio e sbsorgd0 de miio-deobra, DIMENSOES DA RRALIDADE BRASIEIRA Polarizagao pollticoddeotiaicn de grupos oristios, dirita versus esquerda; Eivergonies Concepgéer sobre s misako da dgroje. temporal; femaneipagio to Iiesto © sesistencie dos ‘blspoe Sites ntgrogao entre € 6 poitice organimgio| da AgGo. Popular © tomar des Blspos: com relagdo a0 WEB: ‘MMutonomla do laiato versus controte ectesistieo eons entre legos 2 claro X bispow por divergentee coneepoties 4 trebaino ae etsugio da Equipe Tnies Nacional — orientagéos dlvergentes. sobre evsogelizagao © piuruieme IGREJA CATOLICA DIMENSOBS DA REALIDADE BRASILEIRA ‘alsabetwagho de adultos; teagho ae ase — conselontiengto: ‘enltura popular; yaloragho do eédigo oral CULTURAL) POLATICO | REONOMICO te ae , folditioar @ solidariedade das comuniaaaes; ociiaay ¢- rsoolalizay 0s eomponceos: Sitegree oe trebulhadores 2urais com 08 urbance; organiser grupos ¢ sssoclagoes de. trabalhadoros DIMENSOBS DA BEALIDADE BRASILEIRA ‘SOCIAL MOVIMENTO DE ERUCAGKO DE BASE — MER (19622965) PRATICAS owas téenicas agricolas; Imioro-ceperiencias coleiivas: mulirlo, cooperativas, rojas omuniarias, clupes de yendas, ariecanato: ‘efess da saido © procedimentos de lizicne yacowoxeico e0plas integradas na comunidades e agsamdan por ela; Programas de. politizagao radio’; Sindioatos: rural: Tremamento de animedores ¢ Videres; ‘yabulho en prupos de consclentizagéo © participsefo, jronertco esol como contro eultural: caravans do cultura popular; programas de promocto cultural; artis © livres de leltura; femmproges de téonicas no droves CULTURAL esonvolvimente, de comunidad, faueagio ligada 4 vida soci Aebates, rounides, encontros; sooperativs, sindicatos, clubes soctAL 30 ‘MOVIMENTO DE EDUCAGSO DE BASE — MEB (19611865) ‘SENFIDO — TENDENCIAS pivllegianente do formas comunitérias em contraposigio A competigio; fetesa do trabsltedar como sujelio do traluiho e cbjeto primelo ace a0. capital, eformes. de base mto-roformistas HBcoNoMIoO feditfesgio de um poder Toeal © popular: democratiaglo @ partir as Tases contra 0 populismo eo autorfarismo; ‘agentes como sinvelectunis orginicos", tencnelas das classes populares: incorporagio da nocessidade de um projeto politicelatluéneia da Aci Popular (AP). aléabettznglo com consclentinagto riobilidade ‘slat através dt modafidede educactonal formapio ‘de. quadeos; eriagdo de novas. tenteas eduontivas; valorizacio da cultura popula. ‘demoeracta sociat de base Dromogdo amare: aloragéo da pessoa do. cumponds; iguatdade soetaly eosa es comunidades a POLITICO cururat, DIMENSORS DA REALIDADE BRASILETRA socrat MOVIMENTO DE EDUCICAO DE BASE — MER (138.1985) cones Sree g © surmpane teas sate o ooze do centigrade ages ¢eglpet Goa Usdin tat alga duo, ance parte peroobendoo ern termina’ de economia Sargsens latte pride por taba cehoranons Ae Grated fg Sposlaio de proprietdtve « polticos questonaaos em seu pacer HF; Sicoen do Gate mite 9 Nance Sema $n PO eos 3 El cert ensue sen Ses om, oe i 8 divisdes interes por molivos idenidgicos. eee eee —— Fd sso mamaria demoarte a4 micana scl © exumens AE de um projet potitien; sane gf EEE «rn osm #2 ctasces rurais dominantes e dominadas, GE Sommandnr'e Senso tesa ssutats Bo Stlutas sous "nstoaete 40 Embore ndo sendo possivel aflorar aqui toda a riquez da reall- dade exposta nos itens selecionados para 0 quadro, é de valla comen- tar os topicos que ensejaram, com varingbes de grau e importincia, moditicagoes nas préticas da Tgreja e do governo, permitinda 8 cria- do MEB. Para facilitar a leitura, delimitel quatro dimensbes da fealidade brasileira, consciente de que elas deviam ser compreendi- Gas de modo integrado, mesmo apresentando assincronias de ritmo e sentido, Enfocando a conjuntura vivida pelo Movimento, fiz um corte na periodizacio histérica para 1960 a 1964, geradora do cantesto mais rico na andlise, ainda que esta avance até 1965. Nos anos do governo Juscelino Kubitschok tinbase impulstonado. a expansao capitalista no pafs com 0 favorecimento & penetragdo do capi- tal estrangeiro e accleragio da acumulagéo, concentrada na regio Cen- tro-Sul e estendencio-se 20 Nordeste. Nos anos 60 a 64 as dificuldades Goondmicas acentuaramse; escassenvam 08 recursos externos; pelo te mor quanto aos rumos da politica populista governamental, tentouse- uma racionalizag&o do processo-a nivel do planejamento com a elabora- Go do Plano Trienai e da Reforma Administrativa. O populismo dos. setores dominantes gerara seu antidoto, isto é, 0 fortalecimento pro- gressivo de sctores populares com intensa mobilizagdo politica de variop Segmentos da Sociedade Civil. Os setores populares reivindi- eevam maior participagsio na politica econémica e salarial, na luta elas reformas de base. O campo foi sacudido pela ago das Ligas Gamponesas ¢ dos Sindicatos Rurais, os Sindicatos Urbanos organi- zavam groves constantes, 0 Movimento Estudantil se politizara na disoussio dos temas nacfonais e se organizava com ressonancias amplas no cendrio politico, a campanha antiimperialista encontrava yespaido numa politica externa independente. Essa emergéncia das ‘lasses populares através dos movimentos operério e camponés pres- Slopava as outras classes sociais no sentido de uma tomada de posi- io. Profissionais liberais, politicos, estudantes, professores, técnicos Polarizavam-se contra ou a favor. Os partidos politicos, sem bases ideoldgicas definidas claramente, dividiam-se em alas e frentes, bus cando um consenso em bandefras comuns por cima dos programas de seus partidos. Grupos empresariais e militares reagiram a esta mobilizagio, inicialmente preparando o terreno através da articula- io promovida cm amplos setores da sociedade pelo IPES e IBAD, © em seguida conspirando para a derrubada do governo e contengao a aco dos grupos de esquerda. Esta dinamizacio da vida politica nacional extrapolava para outros campos, sendo marcante os impactos na esfera cultural. A eampantia pela democratizagio do ensino, também polarizada em posigdes con- flitantes, encontrou seu estudrio na Lei de Dirctrizes ¢ Bases da Eéucagio, com a Igreja empenhando-se frontaimente na campanha, €m defesa do ensino particular. # refletinds sobre 0 significado desta Srrupgio das classes populares na cena politica, sobre as perspedti- aL vas do processo de desenvolvimento no Brasil, sobre a necessidade sentida de que os setores populares assumissem o processo de sua participagdo no desenvolvimento como sujeitos criticos e responsdveis, sobre a necessidade basica de alfabetizagio da maioria da populagio e Ge valorizagao da cultura popular, que se estrituraram os movimentos de cultura popular e de educaco ponular. Mesmo considerando os limites pequenos de seu rajo de aggo, no clima sensivel da époce cles se constitufram em um reforgo indispensdvel na conscientizagio e na ‘organizagdo dos setores poptllares, tornando mais explicitas as. rel: vindieagdes pela partteipagéo social. A conquista do Estatuto do Tra- balhador Rural, sem entrar no mérito de algumas medidas propostas, trouxe modificagdes de vulto nas relages de trabalho no campo com conseqiléneias graves Nos processos migratério ¢ de urbanizacdo. Todo este quadro apontava tendencialmente para a modornizagao do sistema capitalista nacional, consolidando a internacionalizacao do mercado interno pela dependéncia crescente com as multinacionais © 0s conglomerados. Esta tendéneia na esfera. econdmica nfo se com: patibilizava com 0 quadro de inconformismo politico existent. AS Press6es internacionais aumentavam e, no plano interno, so esboge: vam rachaduras no bloco histérico, podendo-se mesmo falar em uma crise de dominagio do bloco dominante e crise de hegemonia do loco dirigente, Contudo, os setores populares ndo encontravam um conduto politico canalizador de sua ado, dada a fragitidade dos partidos legais e as divisdes dos grupos de esquerda. A atuagao dos movimentos educativos e de cultura popular, apesar de orientagdes préticas dliscrepantes, mostrava @ possibilidade conereta de as clas- ses populares irem alcancando patamares progressivos de hegemonia cultural, Em tal conjuntura, os conflitos se acirravam, Exemplifi- cando com alguns cendrios de confronto, surgiam: a) entre 0 Estado, Gividido na velha politica populista de'manipulngio e controle por cima e na busca de um planejamento que exigia um consenso impos- sivel naguele contexto, ¢ a Sociedade Civil, mobilizada e reivindica- dora; b) entre o Estado © os empresirios, separados entre si pelos mais ou menos nacionalistas; c) ontre o Estado e setores militares, Gescontentes com a indiscipiina de certos grupos internos e temero- sos com a politica sindicalista © social adotada pelo governo, bem como com @ atuacdo das esquerdas; d) entre o Estado e as forcas ‘econdmicas internacionais (FMI principalmente) que desejavam maior controle monetério © mais segurange. pura os investimentos; e) ontre © Estado © os setores populares, que reivindicavam maior distribui io de renda, reformas estruturais, pauta de reivindicagées incom- pativels com os objetivos pretendidos © medidas adotadas pelos exocutivos estaduals ¢ federal; 1) entre 0 Estado e os partidos poli eos, divididos © subdivididos, sem condigées de implementar os projetos que se esvaiam em discussdes interminaveis ¢ cujo destino eram as gavetas (um exemplo gritante se centrava nos projetos de 42 yeforma agritia). Estes confrontos eram maximizados por conftitos movidos por posigdes e orientagdes divergentes entre as forgas sociais da Sociedade Civil: a) alguns setores internacionais pressionavam a favor © outros contra a agdo das Ligas Camponesas ¢ dos Sindicatos Urbanos ¢ seus Orglos do cipula (CGT, PUA, etc.); b) havia objetivos distintos nas lutas de setores da classe trabalhadora: camponeses Jutando pela terra, contra o arrendamento e 0 grilo, pela extinco do cambio © diminuigao do foro, pequenos proprietérios e produtores auténomos lutando por crédito, transporte, ete., assalariados. sindi- ccalizados Iutando por garantir 0 salério minimo e a legislagio tra- Tbalhista; ©) existiam objetivos dissonantes entre tragdes de classe da burguesia — proprietarios de terra e industrials (por exemplo, entre emprestrios do Centro-Sul ¢ fazendeiros do algodao e da pects in do Nordeste), setores da burguesia internacional e da burguesia nacional; d) setores populares realizavam greves e pressionavam 0 governo, via sindicato, e setores dominantes articulavam-se contra 0 populismo eo sindicalismo; e) grupos de direite e de esquerda atacavam-se pela imprensa, nos partidos, no Legislative, nos sindica- tos, nas universidades; 1) fins @ amagaio contrérios entre Ligas Cam- ponesas € Sindicates Rurais. Estes antagonismos se reproduriam sob formas variadas no campo cultural: nos debates produzidos para saber qual a educacto neces- sdria a0 tipo de desenvolvimento pretendido para o pais, como alfabe- tizar us massas analfabetas, qual 0 contetido da ideologia nacional- desenvolvimentista. Assim é que tiveram répido ascenso os movimen- tos da cultura popular (MCP, CPCs) e movimentos de alfabetizacdo que também trabalhavam com a cultura popular (Sistema Paulo Freire, MEB e Campanha “De pé no cho também se aprende a ler”). A Igreja Catética também era atingida pelos efeitos das transtor- magées sociais, a nivel mundial. Da vigéncla de uma teologia tradi- ional dicotémica entre temporal e espiritual, as préticas de grupos eristaos em alguns paises reacendeu a reflexio teoldgica da fé com- prometida com a transformagio do mundo. As condig6es interna. cionais mmarcadas por desigualdades crescentes entre pases desenvol- vidos ¢ subdesenvolvidos, a redefinicio do papel do Estado nos paises capitalistas, 0 didlogo entre eristios e marxistes na Europa, a mor géneia dos’ pases do Terceiro Mundo com seus gravissimos proble- mas, encontraram expressio na introdugio de n0vos temas nas eneiclicas papais Mater et Magistra e Pacem in Terris (o novo enfo- que dado & questéo do pluralismo e da socializacdo, a distingdo entre © erro e a pessoa que erza, a distingdo entre a doutrina formulada © 0s movimentos historicos que se organizam a partir dela, foram alguns dos temas de maior repercussio). E 0 Coneilio Vaticano II trouxe um vento impetuoso de “aggiornamento” da Inreja, redefinin- do 0 scu refacionamento com o mundo moderno. Neste periodo, n0 Brasil, hi uma intonsa movimentagio da Tgreja Catdliea (alguns 43 grupos protestantes também iniciavam um proceso de reorientagao na Tinha do compromisso social). Esbocou-se uma pritica de maior racionalizagio ¢ planejamento da agio da Igreja, com o Plano de Emergéncia e 0 Plano de Pastoral de Conjunto. Sob o impacto da dura realidade, as Mensagens da Comissio Central da CNBB tornarant. se mais incisivas, efetuando eriticas ao sistema como um todo e exigin do as reformas de base. Néo obstante, nfo estava claro o caminho & seguir na pastoral. Ao mesmo tempo que os bispos valorizavam a Presenga do leigo nos movimentos de Agio Catdlica, no MEB e no sindicalismo rural, temiam @ sua emancipacio, principaimente na esfera da politica (o que se traduziu no conflito crescente com a JUC). Ao mesmo tempo que desejavam preparar militantes cristéos maduros para uma atuagdo social e politica no desenvolvimento nacional, se amedrontavam com o surgimento da Acio Poplar. A Perspectiva do trabalho popular oscilava entre a caridade tradicional, @ aco social patemalista, e uma promogio humana responsivel, una ‘conscientizagéio critica, uma participagéo ativa. O trabalho com o Povo era realizado através de militantes e liderancas, maiormente Tepresentativos da classe média, sem uma efetiva participacéo popu. lar nas instituigdes e nos programas de ago. Sob o influxo das idéias debatidas ni época pelos varios grupos sociais, sob a pressdo das priticas da Aco Catdlica, assimilando as reflexdes teologicas do exterior, internaligando e tedefinindo temas do humanismo integral © do personalismo, respiranda algumas proposiges do socialismo, segmentos gradativos de leigos e representantes do clero 0 dos ell gidsos passaram a exigit mais do testemunho cristio, da atuagdo da Igreja, do compromisso com a mudanga social, Estruturaram-se, entio, divergentes vis0es de mundo e perspectivas de ago, divergentes con. cepedes sobre a missdo da Igreja no temporal, no seio das institui- Ges, dos grupos e movimentos catdlicos (PDC, Acao Catdlica, sin dicalismo rural e no proprio MEB), nas relagdes entre clero e laicato, nas relacOes entre clero e hierarquia. Toda esta constelagio de ele. mentos tendia para o nascimento da chamada “Igreja popular”, na qual 0 povo irrompe com presonea mais efetiva dentro da institui- ao (cujos modelos mats tipicos sio as atuais pastorais populares ¢ as comunidades eclesiais de base). Iam germinando as primeiras elaboragdes da teologia da Iihertacdo. A voz e as acbes do sotores significativos da Igreja pendiam para o lado dos pobros, dos domi. mados, desiegitimando paulatinamente a influencia da Igreja vis-a-vis a0 Estado depois de 1964, Nesta realidade originouse 9 MEB. Os motives que sustentaram a decisio do Governo Federal e da Igreja de celebrar um Convénio, com a naturesa com que foi pensado, serfio oxpostos logo a seguir, Ro proximo capitulo. Sucede que a dindmica social antes referida transpassa todo 0 MEB. De um movimento inicialmente “paroguial”, bastante confessional, ole fol se secularizando e criando conflitos entre 44 a atuago dada pelos lelgos ¢ as finalidades pretendidas pelos bispos. Dos objetivos amplos ¢ vagos de romper 0 stibclesensolvimento foi assumido um projeto de desenvolvimento nacionalista, com éntase nas reformas estruturais, no desenvolvimento social, no desenvolvi- mento de comunidades quto-sustentadas. Da finalidade basicamente aifabetizadora passa para uma educagSo de base que compreencia conscientizacgho e politizacto, valorizacao da cultura popular, instru- mentagdo de comunidades, organizagio do povo, animnacso popular. Des pratioas modernizadoras. — téenicas agricolas, defesa da satide, hhigiene, desenvolvimento de comunidades — foi além na concretiza. Glo de experiéncias de auioajuda e ajuda matua, que iam desreificando as relagbes de classe exisientes no local. Das alividades usuais de uma escola radiofOnica, de educacio sindicalista, de treinamento de Hiderancas convergiu para a edificacio de um poder local © popular, de uma real democracia de base, da incorporagio de um projeto politico de transformacio. De uma postura paternalista e idilica da uteza do camponés fol-se tomando consciéncla de como o capita. lismo 1a destruindo 9 seu mundo; da necessidade da alianca do campesinato com a classe operdria e as demais forgas socials. progres: sistas. A pessoa do campones fol valorizada, dentro de seus condi Gionamentos, 20 descobrir sett universo lingiiistico, seus valores, suas residéncias ¢ necessicdades, suas préticas sociais. 0 MEB, colocando- se decisivamente em prol de sua libertagio © com esta orientagio, teria, por forca das circunstancias, como efetivamente aconteceu, que entrar em conflito com os proprietarios agrarlos, com o clero con. servador, com os donos das radios, com os politicos, com as autori- dades, com grupos de direita, e mesmo com grupos de esquerda principalmente pela divergéncia quanto & sua pedagogia, ao defender @ ndodiretividade, ‘Se valida minha intongéio de situar 0 MER neste contexto amplo, a hipétese central que preside a anslise neste ponto pode ser oxpres- sa da soguinte maneira: determinados elementos do MEB — agentes, conteido programético, priticas, sentido da agao — constituiramse nna negagdo de clomentos estruturais e conjunturais basico da reali- dade brasileira naquele momento histdrico, contrapondo-se &s ten- déncias assinaladas. Determinados elementos, digo, porque nem todos convergiam na mesma diregio, jf que nfo sé pod falar de um MEB homogeneo, corso, pois, como se verd, havia assincronias entre as equipes o certas diretrizes e praticas ganhavam um minimo de con- senso interno através de um parto doloroso e de uma espécie de acto final, 0 que fazia o trabalho avangar. E no so 0 MEIB, mas lum conjunto heterogéneo de forgas socials, que podem ser configu: Tadas no que vem sendo denomindo de movimento poptlar, tam: em surgitl como negacdo ao sistema, em seu modelo do desenvol- vimento adotado, em sua ideologia, em suas concretizagoes. Obviamente que tudo isto teria de redundar em artigos, tensoes, conflitos de toda 45 ordem. Tentar mostrar 0 movimento historico que ai se gestou, usan- do como mediagio 0 MEB no contexto da Igreja Catolica, apontancdo © aclrramento das contradigoes existentes e 2 geracio de novas con- tradiges ¢ 9 que procuro fazer nos capitulos seguintes. Vou dar alguns exemplos de como essa negacao estava tomando eorpo em fungio das priticas e elaboracio do MEB. No plano econémico, prevalecia a 16gica do trobalho negando a J6gica do capital: 0 trabalhador visto como pessoa e no como mer eadoria, formas comunitérias de solidarfedade om contraposicao A racionalidade contratual capitalista etc No plano politico, a democracla popular esbogada no poder local, que tendia a0 poder popular, negando a democracia liberal expres: sa pelo poder dos que 1ém propriedade, pelo pacto populista mani- pulador vigorante: através da proposta do voto consciente, de sin- ieatos auténticos, de reformas estruturais, etc. No plano cultural, dando primazia & hegemonia cultural dos grupos € classes populares, indicando uma nova condepgao de homem ¢ de mundo, negando a'cuitura dominante em muitos de seus aspectos: ‘na relagio educadoreducando, valorizando o saber popular em face do saber académico, na iuta pela elevacio cultural das massas etc. No plano social, propiciando condig6es para a implantagho de uma demoeracia de base, valorizando a pessoa do camponts e desenvol- vendo as comunidades: ao combater a democracia formal e propor ‘uma real, a0 acreditar no campoués contra as opiniGes vigentes de desprezo ¢ ignordncia sobre ele, ¢ an conttapar comuniciades criticas € afivas & expropriagio e exploragdo das relagdes sociais capitalistas. Por fim, negando também elementos da atuagio da Tgreja na- quilo em que ela estava mais comprometida com a situagdo de injus- tiga © a servigo dos setores dominantes, ¢ naquilo que the parecia incompativel na estrutura interna da instituicao e na visio religiosa da maioria dos fiéis; a0 @iscordar do carter confessional do Movi- mento pretendido por setores do episcopado, ao optar pelo povo, a0 combater 0 testemunho negative dado — no discurso e nas pré. Uicas — por eclesissticos em face da mensagem evangélica, na ligagzio do engajamenta conereto com base aa {6 etc. E ao mesmo tempo que negava, afirmava um mundo mais humano © justo, uma sociedade igualitéria, um desenvolvimento dos homens em sua plenitude, formando sujeitos livres, ativos © responsaveis, que conduzissem das classes populares. 46 CAPETULO 2 MEB: origem, estrutura e aspectos da dinfimica imterna Grae a ta sida que me he dato santo Dee tae snidn y t eceros Gon a tas, pattbros gte plenso 9 declar tnatre. amigo, hermano, y tes anmbrando Teta Get sia dat que estoy arsendo" (Violeta Perr, “Gracias @ 18 vide"? “0 MEB que sto trés letras B mais neo podia Yer ik Que ¢ smodimento Do progresso © do saber 0 & que também ¢ forte Reprotenta edueacdo re fogs zona do. norte C"namem tem precisto © B quer dizer dase 8 mesmo gue supiemento Tera 0 canponts do. utraso Bg vielo «do. afobamento” (yesconceloe, Albertine, © MEB, poesia Eepirto Santo, MEB/Garanhuns, FE), A Escola ¢ tus para 0 pov Porgis the encima a verdade $6.0 no%0 orgontzato ‘Fem fustica ¢ tberdade Com srojersores «alunos, ue stam ber eawcados Giezaré, Maria, Versos, MEB/Garanhuns), a1 ORIGEM © MEB constliuiuse na seqiiencia das atividades de educagio pelo radio, promovidas pelo episcopado nas arquidioceses de Natal © Aracaju. * Com apoio nestas experiénoias, a Conferéneia Nacional dos Bispos do Brasil (CNB) elaborou um plano de um movimento educativo em plano nacional, que ganhow caréter oficial pelo Decreto 50370 de 21 de marco de 1961, mediante 0 qual 0 Governo Federal fornecoria recursos — através de convénios com drgios da adminis- tragaio federal — para serem aplicados no programa da CNBB, atra- vés do MEB e utilizando a rede de emissoras catélicas, para as areas do Norte, Nordeste e Centro-Oeste do Pais. Posteriormente, ampliou. $e a drea de ago para as areas subdesenvolvidas do Pais como um todo, e 0 Governo Federal comprometiase a conceder canals radio- tonicos aos bispos para finalidades de educagio de base, além de autorizar a requisiggo de funciondrios federais e autarquicos para Prestar servigos no Movimento, Uma primeira interrogacio, nio suficientemente aclarada, diz respeito aos objetivos ultimos buscados pelo Governo e pela Igreja, 20 resolverem patrocinar tal tipo de atividade educativa. Os dados ¢ alguns indicios autorizam a admitir as interpretacSes expostas a seguir: ede HS de" Raden uty “SAS fe sees, alin fg teat oe ES Spied Toei, 2 0 “Aiweal, bm convttte com 8 SIRENA’ ¢ calfes teates ava alma sont ee ee eee ee EI Sec pan et tere nar, a ad Se cee ere nee a Sree ue ein 2 Ge Soh ria as sean cee renee Anite ae aa edie Sats Gotemate tones socal de a ea ane 48 1 parte do Governo Janio Quadros parece que ele desejava ter ‘cuidado especial com o setor educagio. “Os entendimentos do presidente com os governadores dos Estados, aos quais 0 mmo Central prometia financiamento federal a planos de desen- jento de grande envergadura que abrangiam o setor educacdo, vos estudos realizados por sua ascessoria em matéria educativa, ‘Supor que a educagio estivesse sendo considerada uma dres de grande importancia”." Durante sua campanha presidencial, Jénio wisitou Sergive; parece ter ficado impressionado com 0 trabalho radloeducativo da diocese de Aracaju e manteve contato com 0 arce- 0 Dom Tévore, dialogando com ele sobre @ possibilidude de tal tipo de educacéo pelo rédio extensive a outras regides. Antes mesmo de sua posse, em carta datada de 11 de novembro de 1960, D. Tévora propos formalmente a idéia de a CNHB organizar e executar um tra- Ypalho de semelhante natureza, que logo depois se concretizou no Decreto citado. ‘Sobre os motives que teriam levado o governo a aceitar a proposta "da Igreja, hé virias interpretagdes. Uma primeira giraria em torno da estratigia tipica da politica populista, visando fortalecer 0 novo governo que nfo dispunha de uma maquina eleitoral propria — ou Seje, ampliar 0 contingente eleitoral.* ‘Uma segunda suporia o jé mencionado cuidado particular com o setor de educacio, acrescido do desejo de responder a apelos da UNESCO para campanhas de alfabetizacio e a apelos de educadores nacionsis. 4 terceira procura restringir_o poder politico das oligarquias murais: “...0 convénio com a CNBB limitava a atuagio do MEB a0s Estados do Nordeste, Norte e CentroOeste (quando a maior parte das emissoras concentrava-se no Sul), regides nas quais o catolicis- mo era mais difundido e onde, também, eram mais fortes e contro- Jadoras as oligarquias rurais. Tal como no pés-guerra, parecia neces: sitio combater o poder eleitoral das oligarquias agrarias — cuja Super-tepresentacio no Congresso poderia criar dificuldades ao novo @stilo de governo inaugurado pelo presidente recém-eleito — e o melhor instrumento para tal combate poderia ser um amplo programa de edueacso destinado especialmente ao homem do campo, sob a dire- Go da Tereja”.* E a quarta, também dentro da estratégia populista, suporia a in- tengio de controlar ideoidgica e organizacionaimente as massas rurais, que estavam sob 0 assédio de grupos de esquerda e que tentavam Mobilizar © organizar © campo. © controle farse-ia em alianga com @ Igreja Catdlica, tida como conservadora e moderada, e capa de Tefred-los bem como de fornecer uma educacdo conveniente. 49 , 7 Da parte da Igreja Catslica, considerando as afirmagies de mem- bros do episcopado e alguns leigos mais proximos da instituigdo, certas interpretagées so verificaveis em documentos oficiais e outras se inferem do contexto, Sabe-se das preocupagées de muitos bispos, principalmente na regido nordestina na qual tinha havido contatos Oficiais com o Governo Federal & época de Juscelino, de dirigir a forca do trabalho da Igreja em apoio de programas de cunho social. Foi como resultado de uma dessas reunides oficlais que o govemno efetuou um convénio com a Igreja de Sergipe para atividades de educagao de base. Por outro lado, é conhecida @ tradicional preoeupacso da Igreja com a area da educacio e com trabalhos de ago social e pro- mogo humana de populagGes desassistidas. A primeira interpretacio esta contida na carta-proposta remetida antes da posse do presidente. Nela se comentava a recomendaglio do programas privados com financiamento piblico (felta na Carta Ge Principios de 1958, na reuniao dos bispos com representantes do governo), € se sugeria a possibilidade de uma educagiio popular ampla, alicergada nas experiéncias radioeducativas em andamento. Partia da constatagao de que a maioria da populagio, nas éreas subdesenvolvi- das do Pais, vivia na ignordineia que é “uma forma terrivel de escu- ridio”. Os propésitos iam além da alfabetizaglio: “O nosso drama... ndo € s6 alfabetizar. Junto a isto ha urgéncia de muito mais; urgén- cla gritante de se abrirem aos nossos camponeses, operdrios e suas familias, as riquezas da educaeéo de base, fundamental, educagso que chamariamos de cultura popular, a qual tende a fazer ‘0 homem des- pertar para seus proprios problemas, encontrar suas solugdes, apren- der a comer hem, a defender sua saude, a manter boas relagdes com seus semethantes, a andar com seus préprios pés, a decidir dos seus destinos, buscar sua elevagao civica, moral, econémica, social e esp!- ritual. # esta a escola que temos de jogar no seio das populacdes camponesas e operdrias, através de seus meétodos préprios j4 expe: rimentados e vitoriosos”, Enfatizava, entéo, a necessidade de escolas radiofonicas, 0 contetido da educagio de base e a importancia do radio e as facilidades que ele cria para os alunos. Uma segunda interpretagdo esté demonstrads no conjunto da Declaragio da Comissio Central da CNBB sobre “A Igreja e a situa- géo no meio rural brasileiro”, de 5/10/1961, apés a publicagdo da Mater et Magistra. A declaracéo desce a sugestoes bem concretas do que devia estar presente numa politica econdmica adequada ao meio yural e em sua integragio no desenvolvimento nacional. No capitulo das Recomendagdes espsciais, ha referéncias explieitas aos Movimen- tos de Acio Catolica Rural, Sindicalizagio Rural, Frentes Agrérias ¢ MEB, todos devendo ser estimulados. Mas hd um capitulo especial, sob 6 subtitulo “Em face da expansto comunista no meio rural”, que registro em segulda e que da rasio a um dos motivos para @ agdo da Igreja: oporse & expansio do comunismo no caipo. 50 “Os comunistas, n0 campo como na cidade, niio. se interessam realmente pelas solug6es. Ao contrdrio: para eles, quanto pior melhor. Mas 0 fato grave que denunclamos 6 que os agitadores vermelhos, em varias frentes, preparamse para a tética de guerrilhas, de acor- go com os melhores exemplos cubanos ou chineses. Assim como nfo podemos parar no mero anticomunismo simplis- ta e contraproducente, nfo podemos ser ingémuos a ponto de entre- garnos @ grandiosos planos de recuperagéo econdmico-social dos melos rurais, esquecidos da retaguarda © dos flancos, invadidos pelos guerrilheiros. Em cada Diocese, caberé a perspicécia do Pastor descobrir os metos priticos de defender o rebanho”. Uma terceira € exposta por de Kadt', segundo o qual o projet assegurou prestigio ¢ influénoia para muitos bispos através da posse de uma estacéo de rddio, e que um bom mimero deles esperava utili zar 0S programas de educagio de base para evangelizacao ¢ instru: ao religiosa. © que realmente aconteceu em alguns Sistemas. Uma quarle, bem proxima & anterior, ligase & possibilidade vishum- ‘rada por certos. bispos de beneficiarse das facilidades do Estado, para a concessdo de canais radiofonicos para as emissoras, ¢ de ‘ajuda financeira para zquisieso de equipamentos de transmisséo, Se tomarmos como refeséacia deciaragdes posteriores, quando o Movimento jd tinha uma histéria a contar, séo interessantes as aflr- magées do presidente do MEB — D. Tavora — no texto apresentado a0 episcopado reunido em Roma, em novemiro de 1963, por ocasiiio do Concilio. Citando varias frases: “B a idéia de Igreja a servigo dos ‘obres inspira, totalmente, a linha de pensamento e agio do MEB (....) © MEB nfo nasceu para ser uma campanha contra 0 analfabetismo. Chegaremos 16, para destruir essa contingéncia de nossa histéria, ou a fim de contribuir, fortemente, para isto... Andamos abrindo ca- minhos para Iibertacéo de milhares de homens ¢ mulheres, jovens © adolescentes, pela Educacéo de Base... A sua validade esté om que cada homem a quem ele ajudou a abrir os olhos descubra os seus Problemas, usando sua iniciativa e andando com os préprios pés conscientemente (...) Evidentemente, 0 MEB nfo foi organizado como um movimento catequético catéliea,.. Todos sabemos que 0 ‘MEE nasceu da visio humana ¢ apostdlica do Episcopado Brasileiro, através da CNBB (...) Quando, ha pouco mais de dois anos, a Con- feréncia Nacional dos Bispos ‘do Brasil langou o Movimento de Educagao de Base, que obteve apoio do Governo Federal, houve quem Julgasse tratar-se ‘de mais uma tentativa indcua, mais ‘um paliativo para um trabalho de amaciamento do povo, em face da injusta situagao sécio-econdmica de nosso Pais”.” 51 ‘Uma ultima interpretac8a deriva da opeao dos leigos convidados e treinados para trebalhar no MEB. Ainda que as pesquisas no tenham coletado esta informacio, sabese que, para aqueles originé- tios da Ac&o Catélica, o trabalho confinuava a manter como antes © suporte institucional da Igreja e aparecia como uma oportunidede de uma acao em grande escala que concretizaria 0 tipo de engaja- mento social pregado em seus meios especializados. E interessante citar que nas suas motivacdes, apesar de reconhecerem que a Igreja eriou 0 MEB e que a educagao se devia pautar por principios cristios, ela ndo podia ser confessional. ESTRUTURA im termos bastante resumidos, 0 MEB era assim estruturado: Em nfvel nacional, havia um Conselho Diretor Nacional (CDN), composto de 9 bispos e arcebispos, e dois leigos, sendo um repre- sentante do Presidente da Republica. Em cada Estado, havia um Conselho Diretor Estadual (CDE), con- gregando os bispos das dreas onde funcionava 0 MEB em ambito estadual, Para cada Sistema Local, 9 responsabilidade da orlentacdo cabia a0 bispo diocesano, Os leigos contavam com a Comissio Executiva Nacional (CEN), dependents do EDN, que orientava e coordenava as atividades das Equipes Estaduais (BED, das quais dependiam as Equipes Locais (EL). A directo do MEB se exercia pela Diretoria Executiva, constituida pelos presidente © vice-presidente do CDN e por um secretdrio, Papel importante teve 0 Seoretariado Central, com sede na Guanabara, a quem competia erlar © organizar os Sistemas novos, treinar e sele cionar 0 pessoal para as EL, organizar as KE e coordenar, técnica e administrativamente, 0 trabalho em todo pais. Com destague na estruturagio nacional funcionava « Equipe Nacional, constituida pela CEN, suas assossorias e departamentos, técnicos ¢ administrativos. A unidade nuclear do Movimento era o Sistema de Educagio de Base, o Sistema Radiceducativo, que atingia uma area determinada. Competia a cada Sistema, por melo de uma Equipe Local, planojar, executar e coordenar 0 programa local de educacio de base. Essa equipe selecionava e treinava, nas comunidades de seu raio de acao, animadores voluntérios (principalmente monitores) que participavam ativamente do trabalho do Sistema. O conjunto dos Sistemas locais de um mesmo Bstado eram coordenados por uma Equipe Estadual que, com as EL, claborava um programa para o Fstado, O bispo da 52 rea local exercia sua autoridade em todas as atividades: autorizar o MBB em seu territorio, apresentar os candidatos & selegdio, aprova- jos, aprovar o plano de trabalho local, ¢ responder pela linha dou- trindrla Ga FIL perante 0 CDN. Para as atividades educativas, 0 episcopado colocou 8 disposigiio ‘a redo de emissoras que transmitiam os programas. educativos. ssa estruturagéo organicamente vinculada ao episcopado, em face da dinamica externa do Movimento e das questées internas quanto ‘A autonomia do laicato, gerou tensdes e conflitos impeditivos de uma melhor racionalidade no funcionamento e na acio. © Sistema Radiceducativo tinha caracteristicas gerais similares em todo o pais, em que pese o fato de que cada Sistema o cada Equipe Zocal possuiam sua originalidade e caracteristicas especiticas. Cito alguns excertos de publicagdes do MEB, para uma visio de conjunto, ¢ informagées amplas sobre algumas das praticas efetuadas, © Sistema Radiceducativo 6 constitufdo por uma rede de micleos com recepcdo organizada de programas educativos especialmente elaborados, com supervisio periédiea, com trabalho de comunidade @ escola. Para o funcionamento desses Sistemas sio necessérios: —um estudo prévio da drea em que se vai atuar, — a escolha e © treinamento de pessoal das préprias comunidades para a direcio das atividades, — a realizagio de uma supervisio periédica que acompanhe 0 desenvolvimento das escolas e comunidades e a ef- cdcia da programacéo... Teoricamente, cada Sistema deveria reo- izar o trabalho de produgdio e emissio de programas, mas ha Siste- mas em que as equipes utilizam a programacao de um Sistema proximo por nao disporem de emissora... Para elnborar seu programa de atuacio, a Equipe Local empreende um levantamento da drea & ser atingida, usando técnicas de estudo de drea. Durante este trabalho, as comunidades so, ag mesmo tempo, motivadas para participarem da aco educativa do MEB, enquanto a equipe colhe dados para a selegdo de futuros animadores voluntérios das co- munidades. Delimitada 2 area de atuacio, 8 Equipe Local troina os futuros animadores e plangja, com eles, 0 trabalho a ser executado. Iniciada a acdo, a Equipe mantém contatos constantes com as comu- Bidacles em que se desenvolve o programa, supervisionando @ coor- denando todo o trabalho”. * Com © objetivo de adequar o trabalho & realidade e acompanhar Tealmente as comunidades, efetuava-se um levantamento da situagio local e regional de uma dada drea geogréfica (estudo da drea), em sua multidimensjonalidade, ao mesmo tempo em que se buscava mo- tivar as comunidades e descobrir as liderancas impulsionadoras das futuras atividades. Esse conhecimento concreto da situagio, dos valo- res, recursos, problemas, quando bem realizado, servia de base para f@ integragao organica das Equipes com as populagdes das comunt- dades, 0 que favorecia sobremaneira o rendimento do trabalho. Esse ponto de partida, junto com os demais elementos educativos, foi basico no estreitamento da relagéo dos intelectuais com as comu- nidades. A PROGRAMAGAO DAS AULAS RADIOFONICAS 1, A alfabetizgao ¢ linguagem dirigiam-se aos adultos camponeses (mas a composicao dos alunos era muito heterogénea, por exemplo, tomando os dados de 1963 a 1964, anos de pico, 65% dos alunos tinham entre 15 a 30 anos, 20% tinham menos de 15, ¢ 15% mais de 30 anos}, depois estendidas para operdrios de dreas urbanas suburbanos. Elas requeriam mstodos e meios ajustados aquele contexto: transmissio por radio, realidade camponesa, alunos adul- tos, procurando se adaptar a sua estrutura de pensamento des- critivo —conereto, com seu universo vocabular e para a sua estrutura motivacional. Pretendia-se uma liberacio. do pensamento camponés, estimulando a criacio e expressio espontineas, atra- vés de téenicas e de stividades, criadas pelo Movimento ou adapta- das de outras experiéncias de educacao de adultos no mundo, 2. A alfabetizagéo foi compreendida desde logo no Movimento como integrada & conselentizacio, “...procurando dar uma visto trans- cendental do homem e despertando-o para engajamentos concretos fem organizagies profissionais, organizgies de classes e grupos ‘que visem a desenvolvimento das comunidades”. O programa era distribuido em dois cielos de cerea de § meses, cada um com seu hordrio, seu livro de leitura, sua programagdo prdpria, cons- tando de faixas etdrias heterogéness am cada um deles, Prepararamse livros de leitura tendo em vista uma globaliza- ho das matérias e uma mensagem de valorizacao do homem e da comunidade, de sua cultura, de seu papel diante da realidade brasileira. Esses livros procuraram evitar a regressao da apren- dizagem e da conscientizagao, “despertando o adulto para 0 neces- sario engajamenta em grupos de trabalho na comunidade: clubes, sindieatos, eooperativas, artesanato. ete.” * Com a finalidade de conseguir que cada comunidade partici. passe da criagio e da manutencio da escola radiofénica, foram empreendidos vérios meios. Elas é que resolviam os problemas de local e mobilidrio, no inicio, e do funcionamento posterior, muifas vezes suprindo os recursos com rifas, leilées, trabalhos NEB Masia, 0 Confrlo Diatico “Vier € Kater’, 54 coletivos ete. Considerando a caréncia quase total de recursos nas comunidades rurais, 0 MEB forneceu os receptores transistoriaa Gos, com freqliéncia cativa, a primeira carga de pilhas, fichas de matricula e de freatiéneia e, depois, 03 quadrosnegros e lampi- Ses, Colaborava ainda na instalagéo do receptor de antenas, flos e pessoal especializado, As escolas radiof6nicas eram instaladas nas Tesidéncias dos monitores, localizadas em zonas rurais e atingindo jpequenos agrupamentos demogréficos, onde nunca houvera antes juma iniciativa educacional. As escolas radiofOnicas pertenciam as comunidades e nfo ao MEB. O movimento estimulou ¢ orientou Clubes de Vendas, criados para ajudar a manutengdo das escolas, situados nas sedes dos Sistemas, e que distribufam material esco- Jar ©- outros equipamentos para o funcionamento, a precos aces- siveis, como etapa de um aprendizado cooperativista, 3, As aulas de aritmética eram aplicadas as operagdes @ aos proble- mas enfrentados pelos lavradotes, dentro da Tealidade concreta do camponés, procurando desenvolver habilidades de céleulo, i& existontes de forma assistemstica, e fornecer os primeiros Tudt tmentos de uma aritmetica simboldgica, grafica. Os problemas por resolver giravam em torno das situacGes coneretas e dos desafios do adulio rural no seu diaadia, Buscavase uma “formagio gra dativa de um pensamento matemdtico elementar, desde a percepcao @ organizacio dos dados, a comparagdo ¢ compreensiio das rela Ges entre estes dados, até a compreensio operacional dos re- ‘Saltados”.* 4. Transmitiam-se também nogées de sadde, procurando formar “uma atitude diante do mundo, em que o homem rural, mais do que evitar uma doenca, saiba'o que a satide significa para ele, como trabalhador, e para a comunidade em que vive. O MEB procura Motivar uma visio do mundo, onde nao tém lugar as solugdes magicas ¢ supersticiosas, a que, tradicionalmente, 0 homem do ¢ampo esté preso; uma visio do mundo, onde tudo tem sua causa real, néo mistica, onde ele pode, concreta e positivamente, con- trolar estas causas, com agdes concretas, Doencas e Sade fazem Parte desta visio de mundo, sem a gual nenhuma solugtio é dura- doura”. Motivavase para a utilizagio dos proprios recursos e para evitar solugées diretivistas, orientando na solugao preventiva © no curativa. 5. Outro campo da programagio referiase ao trabalho agricola, que, no geral, era estudado em trés aspectos: a) as téenicas de trabalho agricola proprias da regiao (mudangas nos costumes tradicionais Bor técnicas adequadas e ao alcance das comunidades); b) as Bh MEE Nacional, Hot sobre iaeeenoinets em ZOE mst rations, seus ote, sue propromaeto € 55 7 relages no trabalho agrieals; e ¢) a organizagéo da comunidade para a produgio e 0 trabalho em cooperacao. Valorizava-se o tra- balho coletivo da comunidade e nfo do individuo, e integrar a comunidade, ccondmica © culturalmente, na sociedade maior atra- vés da participagso no desenvolvimento e Iibertacio, cuja respon sabilidade era comum a todas as comunidades subdesenvolvidas e pobres da nacio num esforga coletivo pelas solucdes. 6, Hlaboravam-se, ademais, programas especiais, dedicados aos mont. tores e 8s comunidades, que abrangiam desde instruco religiosa, atividades leves para as férias, solicitagdes do momento, até entrevistas, respostas & correspondéncia, arte popular etc, Apro- veltavamse as festas cfvioas e religiosas, muitas como motivo de politizagéo. As programagdes para os monitores ganharam sistematizagao crescente e varias se faziam acompanhar de material escrito, para melhor capacitacso, Os objetivos explicitos tradu- alare-se em: “uma integragio do monitor no espirito e sentido da educagao de Base e do Movimento; formagio geral quanto ao comportamento e papel do monitor na aula e na conunidade, métodos simples de animagio de grupos, discussao em sala, meto- Gologia especial das escolas radiofénicas, e, finalmente, uma capa- itagtio mais especifica do contetido das matérias do programa” .* 7, As programagoes emitidas pelas emissoras eram produzidas pelas equipes, segundo as téenicas e com os recursos usuais de radio. transmisséo, em fungdo das especializag6es de cada um. Em certos casos se conseguiu que membros das comunidades, monitores alunos participassem dos programas e mesmo da sua produgio. TREINAMENTOS Lugar fundamental no Movimento cabia aos ireinamentos, nos quais, © método cumpriti uma fungdo de homogeneizaetio no ambito nacional. Havia um treinamento basico preparado para o inicio da implantacéo nos Estados, contando com representantes da EN, e membros das EE e das BL, nos quais se assegurava uma dinmi¢a especial ¢ mes- ‘mo uma corta mistica, além da integrago na estrutura nacional. Consistia basicamente 0 método “em situar os educandos em situa- Oes-problema, andlogas &s situagdes que se apresentam no trabalho, @ serem resolvidas em grupo”."" O misiodo expressava as experién cias pedagégicas de alguns elementos da EN, obtidas na Agao Catdlica, em Grgfos ligados a educagio e em determinadas contribuigées tes tadas em préticas educativas de grupos franceses no Sonogal. Des. tacavase a exigéncla da participagéo ativa dos educandos HE EE atacical, Retterio ae 10 56 Os tremamentos objetivavam elevar o nivel dos Ifderes das comu- nidades, dos monitores e das equipes, com uma seqtiéncia que depen- Gia das avaliagées feitas sobro todo o processo nos Sistemas, e na ‘pusea de respostas aos problemas da realidade, bem como gerando condig6es para que os participantes assumissem os miultiplos traba- Thos. Com a Animagio Popular, eles foram forgados a propiciar ati tudes critiens, desejo de mudanca numa hiersrquia de valores, cons- cientes da realidade brasileira e da necessétla transformagso desta ealidade. ¥sses treinamentos, organizados sistematicamente em maior ou menor grau, serviam de fontes de abastecimento para impulsionar a ‘aco, porém o treinamento resultante da convergéncia das virias pra- fieas, cotidianamente, € que produzia os efeitos mais efetivos ¢ de @ificl] mensuragio. SUPERVISAO ‘A fim de conseguir uma comunicagio direta com os alunos @ as comunidades, as equipes desenvolviam um trabalho de superviséo periddica as comunidades, verificando assim o funcionarmento real da programagio educativa e adequandoa & situacio local. Realizava-se essa tarefa durante 0 perfodo das aulas, ocupando dias seguidos para redusir os custos ¢ empregando todos os meios de transportes: Yefeulos, lanchas, motonetas, cavalos e burros, em dreas de dificil acesso. ADs poucos, 0 MEB adquiriu yeiculos de diversos tipos em atendimento das nevessidades dos Sistemas. Em varios municipios, Selecionaramsse supervisores municipais mais integrados nas comu- nidades, ‘Sem dhivida, @ supervise, com todas as dificuldades de monta, constituiu-se num particular fator de participagio e de integragio dos membros das equipes com a base. Esse fator, adicionado da mistica criada pelo Movimento, de um compromisso bastante depurado de recompensas materiais e imediatas, de um relacionamento despojado de interesses outros que uma ajuda concreta e sensivel, fax parte do eonjunto de elementos-chave que abriram enormes potencialidades fa articulagio dos “intelectuais organicos" do Movimento com os camponeses. DA ALFABRTIZAGAO A ANIMAGAO POPULAR As equipes locais recebiam apoio das equipes estaduais ¢ da equt pe nacional, através dos treinamentos, dias de estudos, encontros, textos de estudo © material didatico. Seus membros também parti- cipavam de reunides em outros Estados, trocando experiéncias, No 81 ano de 1962 {4 se fazia sentir a necessidade de uma explicitagto de objetivos © homogeneizacdo do Movimento como um todo. Realizou- se, entio, 0 I Encontro de Coordenadores, em Recife (dezembro/62), um marco na histéria do MEB. Todos os depoimentos ¢ andlises sobre © MEB confirmam 0 dado de que este I Encontro fol um ponto de inflexao positivo na trajetéria do Movimento, no qual se aclararam 08 objetivos e se comecou um trabalho global mals planejado (uma colocacdo sobre alguns dos textos ali debatidos sera feita em alguns dos capitulos deste trabalho). Com a opcdo ali tomada pelo povo, foram-se sedimentando o processo conscientizador-politizador, a escola como cen- tro da comunidade, a formagio de liderancas locais nas comunidades, a capacitagao dos monitores. As equipes reivindicavam mais estudo, entra- Tam em contato com os outros movimentos de alfabetizacio e de cultu- ra popular, sofreram influéncia dos debates travados na Acao Catélica, particularmente na JUC, das idéias de desenvolvimento e reformas de ‘base que polarizavam o pais, e das idéias do movimento da Agio Papular que o influenciavam precominantemente pela presenga de membros com dupla militancia, As caréneias do processo de alfabetizagso foram per cebidas ¢ os limites da programagSo radiofdnica foram sentidos de modo agudo, O Sistema Radiveducativo previa a integracdo da escola, com a comunidade. Era preciso entrar nas comunidades, fazer da escola um centro de irradiagio. Surgiram as infciativas de coopera- tivismo e de artesanato. Com as atividades da equipe do Maranhio, onde nfo havia emissora, se introduziram novos metos de trabalho diretamente ligados as populagdes dos povoados. Por infiuéncia de tra- yalhos no exterior (Senegal ¢ México), elaboraram-se tentativas das ‘Caravanas Populares de Cultura” e de aprofundamento da cultura popular. Surgiram necessidades de mais estudos e planejamento nas equipes que foram alimentadns por assessorias locais e das equipes estaduais e nacional, Um salto qualitativo foi dado com a “educagio sindiealista”, ou seja, a presenca do MEB no processo de sindicali- zagio rural, que foi sobrepondo-se, As vezes, ao trabalho simplesmente educativo. Tudo isto alterou @ propria programacéo radiofonica que mndou o conteiido das aulas e dos programas, buscando respon- der 2 altura as novas exigéncias postas pelos movimentos. Os trel- mamentos ¢ estudos foram crescendo om consisténcia e aprofunda- mento, avultando 0s temas sobre educagdo, subdesenvolvimento, cons- clentizagéo, cultura, conseléneia histérica, sentido das transformagées, pore como sujeito das mudangas, Tudo isto foi exigindo uma redeti nigao dos contetidos dos treinamentos e do material didético, Assim se produziram 0s livros de leitura “Viver 6 Lutar” que procuraram responder & restidade do campo, as necessidades das oquipes, a peda- gogia das emissdes radiofOnicas e & filosofia geral do Movimento, Um conjunto didatico de textos de apoio aos livros de leitura foram formulados pela equipe nacional. As primeiras tenses internas e cot flitos externos aconteceram. O MEB comecava a esbogar um novo sentido as suas atividades com a animacao popular. Vern a ruptura 58 Ge 64, 0 Movimento foi seriamente atingido com abalos na rutura ¢ na dinamica, havendo uma redefinigio de propdsitos Sfuncionainento, Os Sistemas foram reduzindo progressivamente ‘atividadles, apesar do enorme esfoco para manter os objetivos Seundamentacg0 anterior om muitos deles. Apés uma paralisagao ‘a meses, com o trabalho de sindicalisagéo rural desapare- indo quase completamente, as atividades forum reiniciadas com maior Zo e amputacdes. Algumas reunides importantes se sucede 7a de Julho de 1964, onde os coordenadores debateram a situagio ' fe do MEB e Torfleceram subsfdios para um Documento do BB, que redigido posteriormente pela equipe nacional foi accito ‘agosto do 1964 pelo CDN e enviado para os Sistemas opinarem. As pes manifestaram sua firmeza de posigio, mas as diretrizes firma- pelo CDN indicaram outros rumos. Outta reunigo importante Mo 1° Seminario de Animagio Popular, om feveretro de 1965, no Ge Janeiro, que detiniu as linhas de sua fundamentagio e sua agiio no MEB. Em margo de 1965, realizou-se 0 IT Encontro de Coordenadores, no qual se apresentaram os livros de Jeitura “Mutirdo", que substituiam o “Viver & Lutar", as conclusdes ‘sobre 0 Semingrio de Animacéo Popular, um projeto de avaliagdo ‘e-controle das atividades do MB, o plano de trabalho para 1965, © Documento do MEB, corrigido pelas sugestes das bases € novamen- “retificado no Encontro, Durante este ano ainda se tentow colocar ‘MEB em pé, com as restricdes da situagio e cortes de verbas. Paw amente, 0s Sistemas foram reduzindo as suas atividades, alguns chando em 66.67, outros continuando com alguma ligagéo com a ‘orientacdo do periddo anterior a 64, e outros modificando a orienta- ‘Gio, com alguns regredindo a uma “forma tardia de educacdo de adultos”. A avaliagao do MEB atual escapame por desconhecto. ALGUNS DADOS NUMERICOS 1, No inicio de 1964, 0 MEB atingia 14 Estados (Amazonas, Pard, Maranbio, Piaui, Ceara, Rio Grande do Norte, Paraiba, Pernam: buco, Alagoas, Sergipe, Bahia, Minas Gerais, Golds, Mato Grosso) € 0 ferritério de Rondonia. 2. O MEB manteve 11 Sistemas em 1961, 31 em 1962, 59 em 1963, reduzindo seu numero para 55 em 1964 e 51 em 1965, funda- mentalmente pelas restrigSes politico-financeiras. 3. As emissoras que transmitiam programas de educagio Ge base eram 25, 4, Entre pessoal téenico e administrativo, incluindo supervisores municipais, as equipes reuniam, em marco de 1964, 500 pessoas nos Estados e 42 no Secretariado Nacional (Rio de Janeiro). 58 5. De um total de escolas radiofonicas em 1961, que chegou a 2.687, © maximo foi atingido em setembro de 1963 com 7.353 escolas, com uma redugéo. brusca para 5.573 em dezembro de 1963, em virtude da ampliagéo da “A Vou do Brasil” de 20 para 60 minutos. Contudo novas escolas foram radieadas, contando com 6.218 em margo de 1964, com nova queda motivada pela crise politica, chegando a 4.554 em dezembro de 1964, niimero que so manteve mais ou menos inalterado até fins de 1965, 6. © ntimero de alunos concluintes no periodo de 1961-1965 foi de cerca de 380.000, com um pico de 146.310 em setembro de 1963. Os alunos concentravam-se entre os 15 ¢ 30 anos, mas com atimero aprecitivel de menores de 15 anos. A evasio ficava por volta de 25%, segundo dados aproximados de setembro de 1963 a marco de 1964. 7. © mimero de receptores distribuidas atingiu a cifra de 15.210. 8. Nestes 5 anos, 0 MEB realizou 35 treinamentos, capacitando 905 pessoas entre professores e supervisores (duragio média de 10 dias), @ 518 treinamentos para lideres e animadores populares e monitores (duragao média de 4 dias), eapacitande 13.770 pessoas. 9. Informagées de outubro de 1963 dao conta da existéncia de 7.500 monitores voluntérios. * 10. Um dos pontos de estrangulamento do Movimenta foi o de recebi- mento de verbas, havendo cartes e atrasos que oxigiam medidas de economia 8 contencdo de despesas com repercussdes Obylas no trabalho (ver quadro a seguir), odbnSGt Males, Incormncae tre 0 Movimento de EAvatio de Base”, in Bolen EB/Inlorms 1 60 in “25,000,000 1000.00.00 1.000.000.000 200.000-000 90, 00.000, ” 100 Ex 22s 22, a TOTAL 4257.00.00 sls 100.0m _Z9602m.000 "168.050 2300 Oa. * 10 967 az 36 738 * Despesss ‘Bancarias — Sogunde Parte él CAPITULO 3 A caminhada por uma igreja popular "0 processo politica de ruptura entre Igreja @ classes dominantes ¢ 0 contezto Ristdrico onde se dé 0 processo eclesioligioo de ruptura entre Igreja e Cristandade. De maneira semetbante, ‘0 processa polition de identifioagto da Igrese comm as classes explovadas tem sido ¢ contexto historico onde se dé 0 processo eclesioigico de reencontro da tarejacom sua identidade propre etpetiict 0 tao ‘manor En enedos te aerco tating vera estima Séeaaa fot 0° devia profuia fare 0 proceso, politica de idenicaso Toreja. com 0. Thal ‘pobres 20 processo eelestaldgico de reencontro a tgreja com sua identideds propria © especifica... 4 gro da Tarja pelos pobres ndo ¢ ume opeto privilegiada, mas ‘actdentat, preferencial ow ‘opeao eonsttwien, estrutural essehcial Eta ‘mudanga profurda se expressc, na América Latina, nas jormuias’ ‘laren dos pobres’, ‘Igreja. que nasce 0 Povo, ‘Igreja Popular’, ¢ outras” (Renard, Pablo, La Iglesia Latinoamerteuna entre et temor y la esperanea, San Jose AM Costa Rica, DET, 1680). Julguei conveniente explicitar certos componentes. tedrico-priticos da presenca da Igreja Catdlica na realidade brasileira, como reforgo indispensdvel na interpretagao pretendida para o MEB, por uma série de razdes. O MEB foi uma inslituicko que teve o patrocinio da Igreja em sua Tepresentatividade oficial — a CNBB — como parte eonveniada. Seu Conselho Diretor, drgio maximo normativa e respoth svel dentro do organograma estrutuzal, tinha uma composi¢io majo- ritdria de bispos. No médulo de base, onde atuavam as equipes ovals, 98 bispos diocesanos eram os responsdveis diretos em éreas afetas & sua jurisdic. O Movimento constitufe-se, em grande maioria, de membros advindos da Aoa0 Catdlica e com mtmero expressive de egressos da Juventude Universitaria Catdlica — JUC, setor importan- te dentro do cima politico. reinante nas hostes eciesiais da época e no movimento universitirio, O contetido do pensamento ¢ as prd- ticas do Movimento tinham suas raizes e desenvolvimento. marcados decisivamente por reflexbes mediadas por leituras crist3s © por pré ticas consideradas como resultantes de um compromisso cristo. Todos estes fatores foram determinantes de eventos positives de sua dind- mica interna e externa, do crises ¢ conflitos que ‘mpediram, quando nao estancaram, um melhor desempenho de suas linkas programsticas e de aco, A luz destes propdsitos, caberia também explicitar certas relagdes que se estabelecem entre 0 campo religioso e uma sociedade divi dida em classes, numa conjuntura de acirramento dos conflitos sociais como foi a do perfodo em tela. Em outros termos, em que medida as mudanges na visio religiosa de setores da Tgreja, de membros do MEB, © as que ocorreram na educagio ¢ nas préticas sociais do Movimento, contribuirain ou para manter as fungdes conservadores da religiio, preservadas e estimuladas pelas classes dominantes, ou contribuirain para suscitar fungSes transformadoras de reforgo & estratégia hegeménica das classes subslternas. Mesmo considerando nfo serem estas Telagdes objeto dirsto desta investigacao, alguma coisa serd dita sobre clas no decorret deste t6pico e em alguns mo- mentos do trabalho como todo, em fungio das suas possiveis impli- 64 na dinimica e nos resultados do Movimento. Invoco neste ponto determinados pressupostos que fuadamentam as relagdes reli- . iade. Um dos aspectos é que uma religiio é uma Tealidade falmente sivuada © 9 campo religioso deve ser visto como condicio- fbado pelos conflitos socinis, 0 que significa que religio sempre opera muma sociedade concreta © determinada. O segundo ¢ que 0 campo Feligioso possui uma autonomia relativa, no sentido de que “as influ- @neias das estruturas, dos conflites e transformagées que se dio a pivel de uma sociedade global, ndo produzem efeito direto, mecinico fnem automitica a0 nivel das praticas e dos discursos religiosos rea- Yimios no sefo dessas mesmas sociedades".* Hd conflitos internos Ga religiao © da Tereja, que toda superestrutura manifesta, que néo So teflexos mecanicistas de elementos estruturais, “Se se pretendes- se encontrar, para todas as lutas ideolégicas no interior da Tereja, @ explicagio fmediata, priméria, na estrutura, se estaria perdido. evidente, ac contrério, que a maior parte dessas discussdes slo Yigadas a necessidades sectarias de organizacdo”.“ Eo tercelro é que © campo religioso pode operar como fator ative na sociedade ¢ nas Tutas entre as classes socials. Desde logo 6 preciso esclarecer que o termo Igreja significa reali- @ades distintas. Encarandoa aqui como realidade sosioldgica, ela ‘aparece como uma instituicho social que exerce certas fungdes na sociedade, fungées variadas que Ihe advém de sua fé e de suas con eepgtes teoldgicas. Apesar de seu campo especifico se situar na ins: tAncia ideoldgica, ela pervade os demais planos da realidade social. Hi uma articulagéo dialética entre estes planos, carregada de com- Plexidades e de contradigdes. “Entendemos por ‘Igreja’, em sentido estritamente sociolégico — por opasigio tanto a ‘selta’ como a ‘movi- mento retigioso’ — aquele tipo de sistema religioso com as caracte- ristieas seguintes: a) um piiblico relativamente estdvel, de massa, composto por fragdes das diferentes classes sociais — tanto dominan- tes como subalternas — da sociedade onde tal sistema religioso opera; b) uma trajetdria de varias goragdes no selo dessa mesma sociedade; ©) um corpo de crengas monoteistas e de normas morals codificado em wna doutrina de longa tradigio; d) um corpo de funcionérios hierarquizado, estabilizado ¢ centralizado om uma organizagho tam ‘vem subsistente por diversas geragbes; ¢ e) uma posigao predomi ante — tinica ou compartiihada com outras ‘Igrejas’ — no campo Tellgioso da respectiva sociedede”.* ‘A expressio “Igreja Popular”, constante do titulo deste capitulo, 6 bastante polémica nas anélises que se fazem sobre a Tgreja atual- mente, Enquanto uns combater @ exprossio por julgéla conteéria 4 Yeawo, Oko, Rupr,» Zale de Clase, Petopali, Vos, Herat, n°" Bierce eee Gs Huda “Gb don a Stiadio. Geen. et. p. 1 hago Brae, 70, 65 A Tgreja oficial, tinlca legitima aos olhos da hierarquie, outros a defendem: a) argumentando com a necessidade de recuperar a iden- tidade da Tgreja dos primeiros cristéos, constituida de pobres: b) es- srimindo em seu favor com as diretrizes pdsconeiliares © com as gue foram ultimamente emanadas de Puebla, oportunidade em que se privilegiou a “opeSo preferencial pelos pobres”; ¢) e finalmente apelando para os prineipios biblicos e evangélicos que atestam uma. exigéncis de salvacao que passa necessariamente pelo amor aos pobres. Pobres passa 8 ser entendido, em certos setores, como sinénimo de poro. Além disso, alguns grupos aduzem ainda motivos mais estrel- tamente ligados a Hbertagdo em regimes capitalistas, propondo que a identidade propria da Igreja converge com a sua identificago com 6s explorados ¢ oprimidos deste sistema, ou seja, os grupos e classes ‘populares. Na concepgio proposta por Gutiérres *, 0 continente latino. americano é formado de um povo crente e oprimido e sua libertacéo vai se dando simultaneamente nestas duas dimensdes. Consoante sua opiniéo, os pobres (novo) irrompem na cena da Sociedade © da Igroja. Por que sles so temidos? Primeiro, porque Pobre 6 coletivo, perience a grupos e classes sociais, a ragas, a cul- turas, extrapola @ consciéncia individual da pobreza para a solidarie- dade de raga, de classe. Segundo, porque pobre ¢ algo conjlitivo, que uta por seus direitos, questiona s Sociedade © a Igreja desde baixo. ‘Um esquema bastante simplificado resume a busca da identidade do ovo pobre, enquanto crente e explorado. et ae ae ect dogs eee 2 SN eee ‘A resposta & condicio de crente ¢ de explorado pode ser a saida individual, que 6 alionante, mas pode ser a vitalizucao da potenciali- dade revolucionsria coletiva que existe nas duas dimens6es. Esta potencialidade requer um desenvolvimento, que a conscientize, orga- nize e the dé identidade. Isto ¢ realizado pelas organizacdes populares © pelas comunidades cristas populares (comunidades eclesiais de base). No caso das organizagGes populares, 0 movimento aponta para a obiencio de um poder popular; no caso das comunidades cristas populares, 0 movimento aponta para a criagio de uma Igreja popular. 4.9, Pids2 Gusimo uses ¢ um dee emoinies do tcotesa, do Wertasho ote texblnado ee oe oak lds de Baa cnn stad crus no extol promass Contraco fntratioal Sacedaice do Recces cl Felauas! con Slo Palo, fer set Wan, Bl AE Saeuaae 66 possibilidades convergem para 0 Movimento popular, sintese ‘povo, crente e explorado, em luta por uma sodiedade justa, ‘venga @ exploragio, que respeite a Iiberdade religiosa eto. “Feria a TereJa Catélica do Brasil caminhado nesta diregio? Par. ndo da hipotese afirmativa, qual fol a contribuigto peculiar do MER este process? "Se qualquer instituicao social dentro de uma Nac&o é determinada, ‘em graus varidveis, pela sociedade nacional inclusive, e reciproca, mente a influéncia também sob medidas varidveis, no caso da Teres (Gatdlics © nas Nagdes onde ela existe (iu), isto ¢ verdadetro. No ‘Brasil a proposicio ¢ mais afirmativa se considerarmos todo o pro- ‘cess do colonizagSo, no qual sua presenga fol decisiva, chegando-se mesmo a afirmar que “evangelizar significava aportuguesar”.’ AS yelagGes entre a Igreja na Sociedade Civil e o Estado sio. complexas ¢ aumentam, de certa forina, esta complexidade, por pelo menos dois tragos de sua naturera a nivel mundial, quais sejam, a) o de que ela ao mesmo tempo uma instituicao civil dentro de um Estado nacio- nal e uma Igreja nacional estruturalmento vineulada ao Estado do ‘Vaticano, 0 que tra dificuldades sérias de encaminhamento dessas relagSes © de sua resolue%o em assuntos conflituosos ¢ b) a sua persis: tOncia histérica.* Um estudo que aspire a apreendéla na totalidade dessas relag6es, além das dificuldades decorrentes, foge a0 objetivo de estudo ora em curso. Desenvolverei cinco delas relacionadas dire- tamente a existéncia do MEB, ainda que aqui e acold se possa des- pordar para incursées ns problemdtica mals inclusive. Trés dizem tespelio ts relacées externas da Igreja com a Sociedade e duas as telagies inlernas na Igreja-institulcso, lembrando-se que externas © fnfernas esto intimamente interconectadas. J, RELAGOES EXTERNAS 1.1. Igreja e Sociedade de Classes Parto do pressuposto de que a Igreja é um microcosmo da Nagio contendo dentro de si, numa sociedade de classes, membros perten- centes a todos os grupos ¢ classes sociais fundamentals © secundé- Tias, tanto no sentido amplo do conjunto de todos 9s fidis que se dizem catdlicos, quanto no sentido restrito do aparelho eclesidstico (ispos, padres, religiosos(as)). Apesar de esta situagao ser conhecida, EMcce Uae apts Se tee ie Tee ee Se ESSA Gas wc cue mane OL ee ee ee Reedld? SEE. Pastel Bathoste ene, ee I, es aT = no se extraem cerins consegtiéncias, por exemplo, a de que ela reflete a realidade exterior permanentemente, acrescida da que 6 originada pelas mutagdes que se engendram nas relagdes com & Igreja univer sal, Em outros termos, os efeitos produzidos por divergentes situa: bes vividas pelos individuos, grupos e classes socials, quanto & origem de classe, situacdo de classe, consciéncia de classe e posigio de classe, constantemente esto determinando as ages, opinides posigdes da comunidade de Igreja: na selecéo, formagio, nomeacéo, organizacio, pastoral ete. sta colocagtio ndo quer significar um “redu clonismo de classe”, na medida em que, a0 se definir o lugar da Igreja predominantemente na superestrutura, como produtora ¢ re produtora de bens simbdlicos, porém condicionando © sendo condicio- nada pelas priticas econdmicas e politicas, ela como religido apre~ senta uma “concepeao ativa do mundo” * e uma autonomia especifica no plano nacional, reforcada ademais pela influéncia de fatores exter- nos, tais como, ajuda financeira de agéncias internacionais, controle normativo e juridico por Roma, imigragio de eclestisticos de toda a parte do mundo, fatores estes de relalivo grau de independéncia de dificil controle pelos Estados nacionals," Qualquer cidadio, se for um catdiico praticante, om tose encontrard enormes dificuldades para coneiliar as razdes de Estado ott as razGes elvis com as razdes da Igreja, em coisas muito prétieas, por exemplo: controle de natalidade, aboli¢éo da propriedade privada, defesa do racismo, uso do marxismo etc. Como hipétese radical, no rigor do termo, pode-se pensar em Beabar com a religiso, o que neste periodo da histéria da humanidade no parece possivel, on acabar com a Igreja, 0 que se conseguiu parcial ou quase totalmente em certos Estados, mas que ressurge como realizagéo problematica dentro d¢ proprio socialismo, como nos casos dos paises do Ieste europe e nos quais a Poldnia surge como caso exemplar. Aproveltando dos estudos de Madtiro concernentes as relagSes que qualquer sistema religioso mantém com as estrutaras, conflitos © transformagées sociais, que the propicia certa autonomia e continui- dade, tornando-o refratdrio a transformagées bruscas e repetidas & eonsolidando a tendéncia de sua propria reprodugao, ¢ triplice o tun- damento desta autonomia (relativa): 3, Ui site do sno, Pobemas tedlns dap rues eee @ lela oo, Bua. et que de eles Scena ho iW Encooce cago "cleat Nucor Se Pastanduaie"e Seglh er cheat Eica Ban"ae nets suse des iM ina aa eaae pene iinet, goe Saint gin dps ade" abei Evan, Seamitagae a “Canc Ce ences Maree na gusto" Ja [tei ciestce op Tapas te leisy amatlhiar ae "eels suse EELS tetas AE Gace mts’ ale ce Hest ease’, OT its lige ‘cme “eancersi ‘ave “do Tino" tapes ce wnat se hee” Soca ‘ua sltien Ser se Se ceeiae SS. bein ie Betis aa a ine aa ae Jad, “cilgto 68 2) “por um lado, todo sistema religioso tem uma dimensio subjetiva, ® enquanto viséo do mundo capaz de orientar satisfatoriamente uma comunidade — ou um grupo social — em seu meio ambiente _ s6elo-cultural; ( >») por outro lado, todo sistema religioso possul uma dinensko _ ™ ddjetiva, enquanto conjunto de prdticas ¢ discursos socialmente compartithados; (...) c) por fim, como jé vimos acims, certos sistemas religiosos tem ‘uma dimensio propriamente institucional, enquanto produzidos, __reproduzidos, conservados ¢ difundidos por um corpo estével de | __faneionrios organizados”,* "_glém disso, a0 tratar do campo religioso como produto dos conflt tos sociais © da situacdo da religifo no contexto especifico das sacle ‘gades de classes, das sociedades com um modo assimétrico de pro “duglio, 0 mesmo autor comenta: Squalquet religido situada numa sociedade de classes atta nio 36 no seio de ‘uma’ sociedade ou no interior de ‘um’ modo de produ. cdo. Uma religio opera, primeiramente, no meio de classes sociais Com diversos graus de poder, relagées ‘de dominacao entre elas ¢ " nteresses objetivamente contrapostos, A estrutura central, funda: mental, de uma sociedade com um modo assimétrico de produgio Ema estrutura objetioamente conflitiea, de dominagdo social. Tal estrutura das sociedades de classes atravessa, limita e orienta todas "as atividades que desenvolvem os individuos e grupos que a inte- gram, independentemente das intengSes conscientes dos grupos. Assim, a atividade religiosa de qualquer grupo de erentes no seio de uma sociedade de classes é uma atividade objetivamente situada “no interior de uma estrutura objetivamente conflitiva, de domina: " Gfio social. Hsta situacio objetiva de qualquer religiio’ numa sovie- "Gade de classes — e que nao depende nem da conscléncia nem da “ vontade dos agentes religiosos — atravessard, timitard e orientard ago das instituigdes religiosas (e dos crentes que as integram) hho solo dessa sociedade. Em outras palavras, uma estrutura objetivamente conflitiva, de dominagao social, — que ¢ a que presitie as sociedades de classes — Condicionaré, de maneira peculiar, quais agdes religiosas so, nela, impossiveis, quais possiveis mas indesejaveis, quais sio toleradas @ Soleradas até certo ponto, quais admissiveis, mas em plano subor- dinado, quais convenientes e quais agées religiosas sio primordials e/ou urgentes (independentemente da consciéncia ¢ da vontade dos agentes Teligiosos). Quer dizer, a estrutura conilitiva, de domina- $80 de qualquer soviedade de ‘classes, ostabelece de uma maneira 8 dur, 0, 07, ely p. HIME 69 especifica — ligada A diferenciagio de classes em seu seio © as Telagdes assimeiricas de poder ontre elas — os limites dentro dos quais uma religiso pode operar em seu selo € as tendénciads que atravessaro e orientario a atividade de tal religifo nessa socie- dade. Assim, estardo condicionadas por tal estrutura de classes as possibilidades e impossibilidades, a importancis, 0 significada, o discurso, as priticas, a organizagio, o desenvolvimento, a difusto fe as transformagées provaveis que uma religiio possa objetiva: mente esperar (© alesngar) no interior de uma tal sociedade”. Wo Brasil, historieamente falando, 03 historiadores tém demons. trado que, como Igreja oficial, ela s¢ pds frontalmente = servico dos grupos e classes dominantes ¢ do Estado: colocando-se inicialmente como religiio oficial e, depois da soparacio, na Republica, reivind- cando privilégios e pressionando politicamente, mantendo posses ¢ Propriedades de vulto, ¢ principalmente alimentando e sustentando a ideologia dominante com valores, idéias, principios, simbolos e dis- arses. claro que a dialética das relacdes com os grupos ¢ classes dominsdas esteve sempre presente, ¢ setores da Igroja estiveram do ado destes ditimos na luta em favor dos {adios e negros, nos movi- mentos de emaneipacio nacional, ajudando-as com obras de caridade. E ainda esteve presente nos conflitos internos do bioco do poder, nas dlisputas com a magonarla, nas polémicas dentro dos Grgios de representa¢3o politica, nas dissidénelas do Império, da Reptiblica vyelha € nova. ‘Uma conjugagio de elementos novos convergentes — Iiderancas in- dividuais, influéneias doutrindrias liberais, novos ventos teoldgicos priiticas socials renovadioras dos cristaos —- vinha acentuando a preo- cupaco social com os destinos do Pais. A nivel maior, registremse 95 dois Enconttos dos Bispos do Nordeste (Campina Grande, 1955, Natal, 1959) que contaram com a ajuda e assessoria de autoridades federais, estaduais, muniofpais ¢ autirquieas, propieiando um elenco de medidas tomadas pela Presidéncia da Republica, e a atuag’o de Dom Hélder Camara & frente do Secretariado Nacional da CNRB no Rio de Janeiro, Mais aptoximadamente do perfodo em foco, 6 reconhe: elda a contribuigio da Agio Catélica Hspecializada, principalmente dos setores de juventide, com destaque para 2 JUC. No plano do discurso, sem dtivida as manifestagdes oficiais de gru- pos colegiados de discos (CNB ¢ grupos regionals), bem como a Tepercussio das enciclicas do Papa Jota XXIII e das idéids ventiladas no Concilio Vaticano TI, eriaram o caldo de cultura favardvel a uma finflexfio na orientagdo geral seguida pela Tgreja quanto ao social, Nao deve ser minimizada, também, a agéio planejadora da Igreja como um todo que, por meio do Plano de Emergéneia e do Plano de 70 de Conjunto, com a attiagio dos vérios Secretariados Nacio- ‘criou um clima propiclo em todas as regides do tersitério Sowal e estimulou a que outros Setores eclesifsticos e lelgos acel- com e participassem do uma Tgreja renovada com forte presenga al. bee Jano das praticas coneretas de grupos catdlicos que se Mas volaito, qualilativo, operado de forma organizada e racional, “predominantemente em. dois campos de atuagto: MEB e sindicatos Firais, analisados nesta pesquisa, mio obstante as consideragdes {bre 0 iiltimo somente se relacionarem com a problemAtica do nré- prio MEB. © Com base numa teologia marcada pelo compromisso da {6 @ ext- ja de transformacéo do mundo, reforgada pelas direttizes da Gaudhum et Spes emanadas 10 Concilio Vaticano 1 ¢ pelas onciclicas ‘sociais Mater ct Magiatra e Pacem in Terris; com base nas reflexées Eobre as funcdes do leigo na Igroja, propleladas predominantemente fpela JUG; com base na interpretagtio dos problemas sociais brasilet fos © sua insergio no contexto da expansao do capitalismo na Amé- ‘oa Latina e no mundo que incluiam necessariamente — a partir das exigéncias do amor cristio — a andlise de seus aspectos econdmicos, fpoliticas, culturais e sociais, a constatacdo das suas contradicées, 0 estudo das causas e como superélas; um conjunto de catdlicos, maior mente no laicato mas com presenca ntiva de alguns sacerdotes, passow @ exercer fungées condutoras de mudancas sociais. Contudo, © catoli cismo tradicional da imensa maforia dos catdticas, o uso ideologice Gesse catoticismo por parte dos setores dominantes da sociedade, atre- vyessados pela dindmica critica da conjuntura, polarizavam confilitiva- mente 0 diagadstico e as solugdes para 0 desenvolvimento do pais e a concepgio da misao da Igreja no processo. Houve, entio, uma radicalizagio de posiobes que vscilava entre 0s grupos “integristas”, grupos conservadores de direita, grupos Hiberais (mas também bastan- te conservadores quanto & religiao), todos estes ou temendo ov corm: Dbatencio, com maior ou menor forga, os grupos progressistas e de esquerda, também divididos em reformistas e revolucionarios. Os ataques se acirraram e seus efeitos incidirdo sobre a vida dos agentes do MEB 0 sobre a orientagiio do Movimento. De que maneira a relacio Igreja e Sociedade de classes se refletiu nO MEB? Predominantemente, cla se traduziu nas seguintes questoes que sertio retomadas nos capitulos subseatientes: a} na politica, na medida om que ela reproduziu om grau_ mais agudo os problemas causados pola atuacéo politica da JUC, que se Tadicalizara no discurso e na acio do movimento estudantil, Epo wensarenl ma Lat eas lan Serearador Nacionad fom. freango. Tass n grandemente motivada por sua origem pequeno-burguesa, 14 ‘que a imensa maioria das seus militantes vinha da classe média urbana, No MEB, a grande matoria era também de classe média, 6 que, diferentemente da JUC, dentro de um movimento que se envolveu diretamente com uma classe subalterna — o campest- mato — e que foi assumindo os interesses das classes popula- res como um todo; b) na sua identificago com 0 povo, tide como “pélo dominado”, (© que fez com que patilatinamerte 0 MER, se envalvesse com a8 préticas séciopoiiticas das classes populares naquela con- juntura, mesmo enfrentando resisténcias internas de alguns técnicos, membros da administracio ¢ de eclesiasticos que pre- tendiam outros objetivos e orientagio para 0 Movimento ¢ geran- do conflitos externos com os setores dominantes; ©) na sua ajuda ao processo de sindicalizagao rural, que nascia como uma forca ativa dos trabaladores rurais e caracterizado por uma dingmica acelerada no periodo, a qusl extrapolava os desejos de uma mera “educagio sindicalista” declarada como um dos objetivos do MEB e levou a uma maior politizagio do Movimento, 1.2, Doutrina Social da Igreja, Politica e Mudanga Social ‘A primeira relacio — Igreja e Sociedade de classes — incide direta- mente sobre esta. Iniclalmente, quero situar se © pensamento social dos catélicos tem eficdcia na ordem econdmico-social, Do lado critica 46 se disse tudo, desde a afirmaco de que a Izreja esgrime como The convém, oscilando conforme a musica, até que as enciclicas socials de maior repercussao encontram suas raizes basicamente no neocapita- lismo, nfo tendo por exemplo ressonancia para toda a parte do mundo socialista." Uma critica radical foi elaborade por Gramsci" que, entre outras palavras, disse que 0 pensamento social dos catélicos nio constital um programa politico obrigatéria, mas um “conjunto de argumentagSes polémicas”, positivas e negatives, sem concre- 80 politica, que tem apenas valor académico. & um elemento de Teseroa mas que nao pode ser refeitado, e deve ser analisado como elemento ideoldgico opiaceo. No caso do MEB, ainda que a doutrina fosse conheclda diferencial mente pelas equipes e as comprometesse mais ou menos, € s¢ a pra tica precedia a teoria, muito do que se pensou e realizou de positivo encontrou suas fontes no pensamento social catdlico renovador, nas Idéias chogades das Semanas Sociais ¢ das elaboracSes de autores 12 Un pogvng onion ge Ginna €e Sowa, 1. A. O CrS> © 0 mango. Teterli, Vests, NE Gtumed As Moqulowe, Potitice e 0 Estado Moderm, p. 2e202 2 europeus. E nas tradugdes concretas sugeridas como vidveis para a fealidade do mundo subdesenvolvido ¢ do Brasil, expostas nas obras Ge varias personalidades. © problema de fundo nesta relagéo se concentra na maneira de ententler @ politica, Se as confusdes e equivocos surgem jé no con- fronto com a politica em sentido amplo, no entendimento de qual seja a naturoza do temporal e espiritual e das soberanias da Tgreja € do Estado em suas esteras proprias, das opedes por tal ou qual ‘moxisio de desenvolvimento ou pela estratégia de promocio humana fa ser executada, a confusio aumenta no confronto com a politica em sentido estrito, Da consigna conventente, firmada e reafirmada diutarnamente, de que a Igreja no interfere na esfera do projeto poli- fico concreto, na politica partidéria, na estrutura eleitoral ete., a confu- so se estabelece em dois niveis. O primeiro € histérico e deriva da pre- senca da Igreja ativa e estreitamente vinculada & politica no sentido res- trito, quando ela apoio ostensivamente candidates ¢ partidos. poli- feos, criou partidos ou os amparou (democracia crista), favorece sindicatos cristaos e sustenta organizagdes sociais que ostentem o solo explicito de cristis. Ainda que histrica ¢ teologicamente esta posicéo nfo encontre mais suporte, ela no foi desprezivel no passado e per- manoce com femanescentes em varias resides do mundo, O segun Go, mais matizado mas nfo menos complicado, refere-se a0 imbro- gito que se arma quando se trata de analisar a agio dos catdlicos Ielgos, que por direito expresso na doutrina devem atuar na politica, € as implicagSes dai originadas na prética. O seu equacionamento vai desde distingdes sutis, como a celebremente feita por Maritain entre agir “en chrétien” é “en tant que chrétien” ", até malentendidos que Surgem da afirmac&o de que 0 laicato deve atuar na politica, pois ow ele d Igreja e entéo a empenha de alguma forma, ou ma hora da politica ele ¢ apenas um cldadéo remotamente dirigido nor seus prin- Ciplos cristéos e a Igreja nada tem a ver com isto. Se no plano analitico 6 perfeitamente possivel distinguir entre afirmagées doutringrias, prin- Cipios, apelos, dentincias verbais e @ prética conereta, uma corteta interpretacdo da relagio teoria e pritica torna muito dificil este tipo de separagies. Uma disting’o normalmente proposta se dé quando se tenta separar a Igroja que se manifesta oficialmente pela voz das autoridades tidas como legitimamente constituidas no plano dos prin- cipios gerais, e quando ela age na pastoral cotidiana, momento em que Se confunde a atuacio de todos 0s fitis, seja eclesidsticos ou lelgos. Mas isto nao resolve 0 problema e as dtividas perduram, A hipotese que defendo aqui § que © temor da Igreja. pela politica, em termos mais amplos, se liga com o problema da relagio dalética entre profetismo e buroeratizacéo, ou entre espiritualizacio e insti- tuclonalizacdo. Historicamente, 0 peso da burocracia e da instituigao 6 MA. ch Marien, 2, Mumanine Inldnat Pits, subir, 1nk, #32 3 de tal ordem que se permite tudo para defendéla. “* Resumidamente, a questo da politica é a da politica para quem. Se se trata de uma politica a favor da situacio, tudo bem, Se se trata de urna politica de oposigao, ¢ mais, de uma politica revoluciondria de transformacao, nada bem, De certa maneira, a historia da Igreja no Brasil reflete esta prowle- matics. Se as conclusGes politicas no pasado ganharam notoriedade com 2 Questo Religiosa, a expulsio dos Jesuftas, participacso de padres om movimentos contestadores, nas décadas que precederam o periodo em anélise elas se destacaram nas polémicas em torno do Centro Dom Vital, na criagdo da Liga Eleitoral Catdlica, nas listas de eandidatos, publicadas em dioceses, que poderiam receber 0 voto dos catslicas. Porm é com a JUC que o problema cresceu. A dinamica da JUC foi abordada em poucos trabalhos."* Simplift- cando aqui alguns tépicos onde a temdtica politica mais se manifesto a) em express6es verbais consideradas como de “teor marxista” — Socializagio, propriedade social, evangelho como fonte da revolucéo brasileira ote; b) em atividades da JUC na politica estudantil — casos de eleigdes de candidatos jucistas & diregio da UNE junto com comu- nistas, ou de colaboragao em “frentes amplas” com grupos de esquer- a; c) om casos concretos de oposicdo & orientagiio da Igreja — por exemplo, na campanha em defesa do ensino particular, Dela aprova- Go da lei de diretrizes © bases da educagio, na quél parte do clero € bispos se empenhou pessoalmente; e a nfvel nacional, a JUC apofou mocao da UNE em defesa do ensino piiblico e gratuito, no Congreso de democratizagio do ensino realizado em Salvador. Ora, esta dindmica velo culminar no MEB de forma aguda ¢ numa diregao mais concreta. © que na JUC ficava maiormente nas disputas seménticas do mundo académico e em escaramucas das lutas con- cretas estudantis, no MEB ganhou uma dimensio inusitada. Isto 6 explicavel: 1) 0 MEB introduziuse nas relag6es de proprietarios rurais © camponeses; 2) atingitt municipios de varios Estados; 3) trabalhou com © radio, cujo poder miultipticador eta considerdvel; 4) atuou numa conjuntura de inconformismo social e politico de grandes con- tingentes das cumadas populares © de radicalizagio de grupos ¢ mo- vimentos politicos © ideoligicns, a direita e a esquerda. Assim sendo, @ questo politica irrompen aguda nos seguintes pontos: ¢ na sustentagdio dada ao processo de sindicalizagio rural ¢ nos programas de politizagiio; ee Sele ARSE as, Ee Sate ace ee Seated eda eid eset am Masts Cpe hein ea Oa, SEE Se ie PES kas Rare Saks Ge Ba 2 el a Ea Grate pr rong an cot ea ng, ot ee a ee i m ajfaire do livro do leitura “Viver é Lutar”, que teve exempla- npreendides pela policia de Lacerda, e hos acontecimentos posteriores a abril de 1964; yas orientscGes e publicagdes da equipe nacional e sua aplica- ‘gio om dioceses provincianas; as relagdes de membros do MEB com a Acso Populer. hipotese de trabalho neste t6pico ¢ que com 0 MEB ¢ o sindica- lismo rural se criaram as condigées para mudangas nas bases sociais, mmganizacéo interna, e na. ideologia da Igteja, que vio deitar raizes nestes ltimos anos, nos quais as questdes politicas voltam ‘liza a opiniao pitblica, em fungao da caminhada das comu- s eclesiais de base, das posigdes de alguns bispos ¢ da agdo Grgos especificos (CPT, CIMT, CPO ete.). .3. Confessionalidade e Especificidade Educativa, Religiio Popular Ainda que as duas relagdes anteriores teuham aparecido como as 8 explosivas no Ambito externo ¢ propiciado atritos graves no 0. em certos momentos foi neste que os conflitos se maximiza- Tam, reproduzindo um debate que if vinha da Aco Catdlica e fora izado na JUC. Esta é uma questéo de fundo que continua insola- eionada até hoje na atuacao pastoral da Igroja, Aqui, ela sera encarada gob dois pontos de vista. © primeiro envolve a concepoiio que a Igreja tem de sua missio ho munclo, sintetizad na Constititigho Pastoral do Vaticano IZ sobre A Igreja ¢ 0 Mundo Moderno, retomada nos documentos de Medellin © Pucbla ¢ em varios documentos atuais da CNBB. No limite da agio individual do laicato, a solucéo do problema nao é tao polémica. Ela ainda hoje o ¢ e motivo de intimeras interrogagdes, quando se rela- clona com a atuacdo coletiva de grupos e organizaces declaradamente Rertencentes 4 Igreja © cujos objetivos séo ce um trabalho especifica- Mente temporal. Vejase toda a discussio nos dias que correm sobre Saber se uma CPT, ou o CIMI, ou se as comunidades eclesiais de ‘base sao pastorais ou politicas, condicionadas pela politica, tem efei- tos na politica, sio infiltradas por politicos ete. © segundo se concentra no problema de se aceitar ou nfo que a Feligiao popular é um clemento estrutural da realidade do povo bra- Sileiro. Partindo da bipdtese que sim", discute.se em que ela 6 coeren- te, verdadeira, tradicional, allenante, iibertadora, e em que aspectos ela se conflita com as religides oficials, Neste sentido, mio se pode ignordla e ela passa a fazer parte como componente essencial em Af Dore ce tabatie ois stl, cgnauitar de Yale, B. das R.. Beanie, ¢. Re, Bale Confira Shel eck 0, Gade Po Teal 15 qualquer Iuta sécio-politico-educativa, quer quando, reconhecendo a sua importancia vital, se trata de combaté-la, como o faz Gramsci, quer de valorizéln ¢ compreendéa, estimulsla e aprovelté-le, para 0 seu proprio desenvolvimento religioso, como o fazem varios grupos de agentes de pastoral na atualidade da América Latina e do Brasil de hoje. Para a situaco do campo, Camargo, na obra citada, apresenta slguns tracos caracteristicos do catolicismo tradicional rural. Registo apenas dois itens que situam o contoxto religioso pars o MEB. “1, Identificagio entre Catolicismo e Sociedade 1.1. Identifieagao entre os valores religiosos e sua expressiio normativa e os da sociedade inclusive. Tendéncia & legiti- maco religiosa dos valores, normas e papéis predominan- tes na sociedade inclusive; 1,2. A coletividade catdlica espelha a estrutura social da socle- dade e € um dos principais meios de explicitagao da posi. G40 Social dos individuos em termos de status ou classe; 1,3. Toda vida social 6 permeada por valores religiosos, inclusi. ve as atividades ligadas ao lazer e & diversao. 2. Ideclogia 2.1, A vida religiosa se expressa pelo contetida da disposigéo moral e pela ié; 2.2. A dimensio magica das oragées e dos Santos néo é desli- gada da dimensio religiosa. Enfase nas promessas, enten- didas como processos de garantir a obtencao de favores; 2.3. A concepofio fundamental da vida envolve, a um tempo, atitude fatalista e esperanga providencialista”. © MEB valorizou 0 catolicismo popular? Ao explicitar a razio de ser do Movimento, constante das Instru- des Gerais, om 1961, a educagio de base era vista como alfabetiza- Go em massa, iniciagéo agricola e democrética, informacdo protissto: nal, organizagao de comunidade preparandoa para as indispensdveis reformas de base, e “velar pelo desenvolvimento espiritual do povo. ajudando-o a defenderse de ideotogias incompativeis com o espirito cristdo da nacionalidade”. Simultaneamente, no primeiro Regulamento oficial, 0 MEB se propunha, em seus objetivos: alfabetizagao, educa- go sanitéria, inielag&o protissional, especialmente agricola, promo &G0 social e “formagdo moral c civica”. A se aceitar as colocagées de Yap Comatso, Cindido 2 veri do, Luria # Deenoivimenta. sho fmio, CHAE, Wn 1. S2Vacriger” Gora apace So! Watt! staal"GeAN"S. Bad Moan Eanes ME, 6 Kadt na obra citada, na primeira minuta das Instrugdes Gerats constava a expresso “educacdo crista” © a presséo inicial contréria ‘partin do proprio governo, que teria achado dificil conciliar a natu: em laical do Estado com o financiemento para uma entidade com carater especificamente religloso. Assim, aquele desiderato original fe transformou nos termos acima citados. Segundo ele, ainda, a ten- a0 continicu nas divergentes intencSes de alguns bispos locais, para quem 0 sntusiasmo pelo Movimento fol motivado pelo “prestigio (e poder) visdois a classe alta local, e a esperanca de uma catequiza- foio da masse, aberta para eles pola chance de possuir e operar uma estagio de radio”, e nas intengdes dos leigos dirigentes, para quem, mesmo nas formulagdes primitivas, munea houve as finalidades de planejar ou cumprir qualquer funcao especificamente confessional. Se considerarmos os documentos produaidos pela Equipe Técnica Nacional até os acontecimentos de 1964, podese concordar com de ‘adt, jé que 0 desenvolvimento do Movimento mostrou uma enorme pradéncia neste particular. Uma listagem dos argumentos prineipais dos representantes das equipes do MEB, em oposicao confessiona- Yidade no MEB, ressaltaria que: a) era um trabalho educativo feito por leigos; 'b) o Convénio era financiado pelo governo federal para a popula- eGo © nao apenas para os catélicos; ce) a educagko de base pretendida dirigia-se a todos sem qualquer tipo de diseriminagdo; @) alguns agentes das equipes nfo eram catdlicas, ou néo 0 eram de forma militante; e) 5 resultados do trabalho engendravam tens6es e conflitos exter. nos que nfo deveriam envolver a imagem da Tgreja em seu conjunto, Em novembre de 1963, 0 episcopado brasileiro reuniuse em Roma, Gurante a realizaco do Concilio, para uma avaliagdo da atuagio do MEB. Dos documentos all analisados, vale a pena referir o de autoria de Dom José Tivora, presidente do Movimento. Depois de fundar a Necessidade do MEB nas exigéncias da realidade ¢ nas répidas mudan- is da conjuntura social, explica que a concepgdo de educacéo de base no ¢ ume campanha contra o analfabetismo, superando-o porém € indo além. Defende a linha do Movimento e @ orientago imprimida pelos Ieigos, Na parte referente 2 relaclo MEBReligido, diz que ‘0 MEB ni foi organizado como um movimento catequético catd- lico”, apesar de ele ter nascido da visio humana e apostolica do episcopado brasileiro, com 2 convocag&o de elementos do laicato do ais, Afirmando que 0 MEB se dirige especialmente aos camponeses, uma proporeio de 90%, “,..isto é, a uma parte da populago do Be Matt. Bo gp op. an 7 Brasil, secularmente fiel 8 Igreja, profundamente religiosa”, d4 quando se pense que ele tinha a pretensio de um certo 2 movimentos incompativels, Mas 0 trecho final deste item faz voltar a ambigiiidade: “assim, respeltando a consciéncla de quantos, nll sendo catdli procuram a educagdo fundamental nas nossas atividades, nao po mos deixar de dar ur lugar de relevo & formagio religiosa de nos nossos programas globais e promover, além disso, esp mente nos domingos, a abertura de nossa rede radiofonica para Missa irradiada e para o catecismo que 0 MEB, com a colaboragia so evangelizadora, embora ligada a ela. Evangelizagio batho que, 80 mesmo tempo, procura promover o Homem the 0 Cristo. Desta forma, nosso trabalho educativo se nas flo se separa do que compreendemos por evange ge, na verdade, de uma missio que seja puramente Por outro lado, a evangelizacdo no se constitui nunca Ge intbieho para o trabalho do MEB, embora nfo seja ‘préximo imediato... Nosso trabalho edueacional, por- ‘a uma populagso que, na sua maioria, é catdlica, mas Fem sua totalidade, nem o ¢ em toda a sua autenticidade, f set colocada nessa linha de rospeito profundo aos passes Warios que, necessariamente, levam ao fim wltimo: o reconhe da RENEC, elaborou tendo em vista essas ocasiées”."* do MEB é vivido conscientemente, em face de um povo mntra diante de varias opgdes. Ndo nos cabe impor nenhu- BS, como n&o nos cabe forcar 0 povo a fé cristd vinoulada: ‘Gatdliea, embora devamos proporcionar-Ihe oportunidade © documento mais expressivo, contudo, 6 © que foi publicacio co: MEB: sua origem, sua aco e seu conteddo, por ter sido resultado Ge uma reflexdo eoletiva num instante eritico da conjuntura, imedia: tamente apds marco de 1964, e pela necessidade dos redatores, em explicitar claramente seus pressupostos. A primeira redacio, formu: Jada por coordenadores estaduais do MEB, reunidos no Rio de Janeixo em maio de 1904, fol apresentada @ consideragao do CDN em agosto fo do MEB, documento no qual a questéo da de 1964. Logo na introdugio, ao destacar os dois tdpieos concerentes alidadle sofre uma inflexio de 180°. Nele se estabelecia como a0 tema em epigrafe, o documento ressalta “que 0 MEIB é criagao da Pessencial do MEB “...cooperar na formagio do homem (adulto CNBB © que se deve pautar dentro de principios cristaos; que a ente), nas dreas em desenvolvimento do Pais, no sentido sua aco apostdlica se fard através da acto educativa,.. que o MEB, loa tomar consciéncia de sua dignidade como eriatura humana, enquanto se disige @ uma determinada populagio, pretende promover imagem de Deus redimida por Cristo, Salvador do Mundo, ‘© homem em fungio de sua dignidade de filho de Deus, membro da conseqiléncia, transformié-lo em agente de criagio original Tgreja e n&o pode eprovar, por Jsso mesmo, a presente estrutura fra de um povo”. Complementando, dizia que esta conscienti- social, que ebrange todo 0 contexto do Brasil”. © documento vai Jmportava, entre outras afirmagdes, na conscientizagéo “de um apareser om forma final em margo de 1965, apds sua discussio no eriador, de quem tudo depende e @ quem todos esto subordi- II Encontro Nacional de Coordenadores. @ “de ser o homem um valor em si mesmo, superior a toda temporal ¢ subordinado a Deus”. 2 entre os fins seeunds: do MEB estabelecia “a catequese e a formacdo religiosa, sem 8S is 0 homom nfo possui as condig6es bésicas de um conhecimento Suma vivéncia compativeis com a sua condigao de cristio”. Partes ocumento mantém certas proposicdes sempre doferididas pelos Telg0s no periodo anterior; mas salientese que nao consta referéncia ‘im Tugar para 9 povo na estrutura formsl do Movimento ¢ nenbw 4 mencSo 20 sindicalismo, pontos estes essenciais no passado Dro “Xitno © que prudentemente foram rotirados dado a suspeigao de "sub- “Weis” que pesava sobre 0 MEB. Tudo leva a presumir que a5 Modificacdes sobre a confessionalidade resultaram em imposig&o do "DN, 38 que poucos membros leigos, dos quadros em sua totalidade, Suibsereveriam a catequese como finalidade explicita. No entanto su Blinhese que em algumas localidades, por imposicao do bispo local, ® parte religiosa explicita esteve sempre presente nos programas. 2 gue na Mensagem, texto complementar do livro de leitwa “Viver 6 gbstante, posteriormente a 64 0 CDN aprovou as Diretrizes Nesta importante versio, 0 1° capitulo sobre MEB ¢ Igreja, susten: tando-se em argumentes teolégicos tradicionais ¢ em outros mais Tenovados do pensamento social cristio (so transeritos trechos da. Pacem in Terris, Ecclesiam Suam e do projeto do osquoma coneiliar sobre A Igreja ¢ 0 Mundo Moderno), tusca defender a relagio text poral ¢ fim sobrenatural ta homem numa perspectiva de romper com. © dualismo. No entanto, no que tange no MEB e suas finalidades edt: cativas, perduram as dificuldades, considerandose 0 fato de que se trata de um documento oficial e com vistas a respondor Bs interro- gacbes e criticas de alguns bispos e do CDN em espectal “A inspiragio do MEB ¢ inegavelmente erist e, numa atitude cris: 8, pretende que os homens cheguem a uma fé adulta, assumida livre e conscientemente, Mas a agi educativa do MEB é distinta 22. cl, nivora, pom to “PIER — Movinenios de Raysanlo do Base” tm MED, Documentos ae in, "Sed Go es 18 9

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