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Mikhail Bakhtin Notas sobre literatura, cultura e ciéncias humanas Organzasio,wadosio,posficioenotas Paulo Berea Notas da ego russa Serguei Botcharov editorall—i34 EDITORA3+ divora 34 Lid, Ra Hungria, $92 Jandim Europa CEP 0145.00 So aslo“ SP Beal Teas (13) 3811-6777 weredioesS4com by spony © Eaitora 34 Leda, (digi brasileira), 2017 ‘advo @ Paulo Bezera, 2017 Copyright © Mikhail Bakfein raped by arrangement with Bena ViadinirovnaExmilova sand Serucy Geonsevich Bochaoy. Al sights soerng Caps projet grific editorago eletréicn Bracher & Mala Produsio Gnifes Revio Danilo Hora, Bests de Freitas Moria 1 iio 2017 CIP Brasil. Caalogaio-ne Fonte (Stmaicsto Naconal doe Eitores de Lives, RJ, ea) abn, ata 5175) icy MO eee I noc So Ta Notas sobre literatura, cultura e ciéncias humanas Nota a edigdo brasileira ‘A cigncia da literatura hoje es (Resposta a uma pergunta da revista Ne ‘Hragmentos dos anos 1970-1971. or uma metodologia das ciéncias humanas... ‘akbtin: remate final, Paulo Bezerra Sobre o autor Sobre 0 tradutor.. a1 Fragmentos dos anos 1970-1971" ‘Aironiaentrou em todas as linguas dla Ktade Moderna (particularmente na francesa), entrou em todas as palavras € formas (sobretudo as sintéticas; por exemplo, 2 ironia des- ta a periodcidade desmedida e “empolada” do dscurso). 1 ironia existe em toda parte — da ionia minima, impercep- vel, &estridente, que confina com o so. O homem da kda~ tle Moderna nao proclama, mas fala, isto é, fala por rssal- vas, Tados os géneros proclamadores se conservam princi yalmente como partes parédicas ou semiparédicas da cons- teagio do romance. A linguagem de Pichkin € precisamente nna Kinguagem traspassada de ironia (em diferentes graus), + linguagem por ressalvas da Idade Moderna Os sujeitos do discurso dos generos elevados ¢ procla- ndores — os sacerdotes, os profeta, os pregadores, 05 ui * Fragmeatos das anotages fits plo ator ene mai de 1970 « “iesembro de 1971, quando morou na cidade de Kimévsk nos arredores se Moscou. Algumas anotages so esoyos de trabalhosproetados (0 Inco discuss do outo como objeto das ciéscias humanas, sabre a bu ‘sd “préprio discutso” pelos aris, sobre Gogol). As vee a anot {se efee apenas a0 tal do eventual trabalho: “Dostiéski eo sen Tnentalsmo, Una tentaciva de andls police otto de “Eshogos sua antopologafilossica” fo escrito também a pari de reflxdes ‘vetestemunham o deseo do autor de volt em uma novs capa, a8 te tas de ea trabalho iniial sobre o autor ea pervonagem.(N. da.) [abe obseeva que apacem no texto mut frases isola, alg ns até descomtstualizada sem desdobramento Tat-se de esbogs Toratorias de ideas que Baki preteadiadesenvelver em faturos en sais aso of. (N- do) eagentos dos anos 1970-1971 a 12es, 08 chefes, os pais patrarcais, etc. sairam da vida. Foram. todos substituidos pelo escritor, simplesmente pelo eseritor, que se tornou herdeito dos seus estilos. Ele ow os estiliza (is: 10. assume a pose de profeta, de pregador etc.) ou os paro- dia (em diferentes graus). Ele ainda precisa elaborar 0 seu estilo, o estilo de eseritor. Esse problema ainda nao existia para 0 aedo, 0 rapsodo, o tragico (0 sacerdote de Dioniso) nem para o poeta cortesio da Idade Moderna. Ele dispunha até de ocasido: dos festejos de diferentes modalidades, dos caultos, dos banguetes. Até 0 discusso pré-romanesco tinha ‘uma situag2o — festejos de tipo carnavalesco. JA 0 escritor carece de estilo e situagdo. Ocorreu a plena secularizagio da literatura. O romance, desprovido de estilo e situagao, no fundo no é género; ele deve imitar (representar) quaisquer _gbneros extraliterdrios: a narrativa de costumes, cartas, did Flos, ete. (© meando especifico da sobriedade, da simplicidade, do espirito democratico, da iberdade franca, inerente a todas as novas linguas. Com certas restigBes pode-se dizer que to- das clas (particularmente a francesa) derivaram dos géneros populares e profanadores, que todas elas foram determinadas em certa medida pelo longo e complexo processo de expul- sio da palavra sagrada do outro e, em geral, da palavra sa- sgrada e autoritéria com sua indubitabilidade, incondiciona- lidade, ircestrtividade. A palavra com as suas fronteiras inex- ugndveis, sagradas, e por isso uma palavra inerte, com pos- sibilidades limitadas de contatos e combinagies. A palavra «que inibe e bloqueia 0 pensamento. A palavea que exige re- petigio reverente e no um desenvolvimento sucessivo, cor- recGes e complementos. A palavra retirada do dislogo: ela pode ser apenas citada no interior das réplicas, mas ela m ‘ma ndo pode se tornar uma réplica entre outeas réplicas is6- ‘nomas. Fssa palavra se difundiu por toda part, limitando, guiando e inibindo o pensamento ea experiéncia viva. Foi no ‘rocesso de luta com essa palavra e de sua expulsio (pot in- 2 ‘Mikhail akin \esndio dos anticorpos parédicos) que se formaram as no- ‘as linguas. Cicatrizes das frontcias da palavra do outro. Yenigos na estrarara sinttica indole do discurso sagrado (autoritirio); as peculiar Jules do seu comportamento no contexto da comunicagio iscutsiva, bem como no contexto dos generos folliricos {ovis} eliterdrios (sua inérca, sua exclusao do dislogo, sua “peidadeextremanente imitada para combinag@es em ge- {ale sobretudo com os discursos profanos, nao sagrados, } ndo sho, evidentemente, determinagSes linguisticasdes- (lscurso.Sio metalinguisticas. Também pertencem ao cam- po da meralinguistica os diferentes tipos e graus de alterida- ile da palayra alheia.e as diferentes formas de relago com sla (estilizagéo, pari polémica, ct.) 0s diversos meios de ust exclusio da vida do discurso. Entretanto, todos esses fe- tomenos e processos, particularmente o processo multsse- ilar de exclusio do dscurso sagrado do outro, tém seus re- Hexos (residuos) também no aspecto linguistico da lingua, em ‘special na estrutura sintéica e léxico-semantica das novas Innguas. A esiistica deve ser orientada no estudo metain stico dos grandes acontecimentos(acontecimentos multis- ‘culares) da vida do discurso dos povos. Os tipos de discu wo levando-se em conta as mudangas por culturase épocas {por exemplo, dos nomes e apelidos, et.) O siléncio e © som. A percepcio do som (no campo do silencio). O siléncio e 0 muttismo (a auséncia de palavras). A pausa eo comeso da palavra. A violagio do siléncio pelo som {de modo mecinico e fsiolégico (como condigio da percep- ‘ios a violagdo do mutismo pela palavra de modo pessoal e Consciente: esse é um mundo inteiramente outro. No silencio nada ecoa (ou algo néo ecoa), no mutismo ninguém fala. (Ou alguém néo fala.) © mutismo s6 ¢ possivel no mundo huma- ro (e 86 para o homem). Fragmentos dos nos 1970-1971 2 relativos As condigies de percepcio do som, reensio-inteiragao? do sx : assimiladora da palavea, © mutismo — 9 senti ausa constituem uma log 4una e continua, uma total as condigées de com- 'gn0, as condicdes da compreensio ido consciente (a palavra) — ¢ a ‘osfera especifica, uma estrutura se idade aberta (inacabével). Sompreensio-inteiracdo dos elementos repetiveis do dliscurso (sto &, dali a sis § da lingua) ea compreensdo assimiladors de ve wncado singular. Gada elemento do dscurso¢ por nc da repetitivi " ide da lingua e sai a cn en total dalogosters, vl ° acoso ‘como meio (lingua) e 0 discurso como assi- cdo. O discurso assimilador pertence 0 reino dos fir Apsara como fim in oaeemoy 12” os 7 2 “ateiragio" design o proceso de sine a singe eo ra de algo; conan 4 Mikhail Bakiin ‘A inadmissibilidade da monoconalidade (séris). A col- ‘wa da pluritonalidade. Os campos do tom sério, A iconia ‘omo forma de sléncio. A ironia (e 0 riso) como superacéo \Jeuma situago, como elevagao sobre ela. $6 as culeuras dog- Initicas e autortérias s4o unilateralmente sérias. A violéncia sksconhece 0 riso. A andlise de uma pessoa séria (medo ow uineaga). A andlise de uma pessoa que ti. © lugar do patéti- «oA passage do patético para o esganicado. A entonagio vlc uma ameaga anénima no tom do locator que transmite ‘omunicados importantes. A seriedade amontoa as situagdes tle impasse, 0 tiso se coloca sobre elas, liberta delas. O riso 1nio cofbe o homem,liberta-o. AA indole sociale coral do riso, sua aspiragio ao nacio- ‘nal eao universal As portas do riso estio abertas para todos reada um. A indignacio, aia, a revolta sio sempre unilate- ‘ais: excluem aquele contra quem se indignam, etc. provo- ‘cam uma ira responsiva. Flas se dividem, a0 passo que 0 riso 0 unifica, no pode dividir. O riso pode combinar-se com ‘uma emotividade profundamente intima (Sterne, Jean Paul e ‘nutros). Riso e festvidade. A cultura do corriqueito. O riso. «© reino dos fins (jf 0s meios sio sempre sérios). Tudo av ‘eaticamente grande deve incorporar o elemento do ris. 10 contririo, torna-se ameacador, errificante ou empolados fm todo caso, torna-se limitado. O riso abre cancelas, faz 0 caminko livre, © riso alegre, aberto, festivo. O riso fechado da sétira, ‘neramente negativo. Nao é um riso ridente, O riso de Gogol ‘alegre. Riso e liberdade. Riso e igualdade. O riso aproxima © familiariza. Nao se pode implantat o riso, os festejos, A fes- 1a sempre é primordial ou sem primérdios. ‘Na cultura de miliplos tons até os tons sérios soam de ‘outro modo: sobre eles recaem os reflexos dos tons cBmicos; les no perdem a sua exclusividade e sua singularidade, si0 ‘completados pelo aspecto do ris. eagmentos dos anos 1970-1971 as onside um dade eta cea made da nem previamenteresolvid, capaz de mort © renovasio, ‘Seamed a maa nt tal além de seus imi) (chem Lotman)? acarreta a supressio do ‘elemento alse onder tl en tras do estilo est um ponto de vista integral de ‘uma pei i Comoe et © enunciado (peodusio de discurso) como um toderen {ta em um campo inteiramente novo da. comunicagio. : From loc epr mts eres em absoluro, do enunciado integral. Niopod nunciado isolado, Ele sempre press Sado pote sero rier cas dsr ey cadeia e fora dessa cadeia nai ‘enunciados existem relagSes que nao STE Sinus na nts “or uma metodo das ens hn 26 Mikbai Bok “tegorias nem mecinieas nem linguistcas. Nao ha analogias som ces. A abstracio em relagdo aos elementos extratextuais, mas so de outros textos vinculados a um texto dado ma cadeia «la comunicagio discursiva. A socialidade interior. O encon- tuo de duas consciéncias no processo de interpretagio est todo enunciado. A fadole personalsta das relagBes entre os, tmunciados. A defnigio de enunciado e de suas fronteiras, Segunda conscigneia ¢ metalinguagem. A metalinguagem iio apenas um c6digo, sempre se refere dialogicamente & nagem que descreve e analisa. A posicdo do experimentador «do observadr na teria quanta. presen dessa pongo auiva muda a sua situagdo ¢, por conseguinte, os resultados ‘lo experimento. Ja & de todo diferente 6 acontecimento que {em um observador, por mais distante, oculto e passivo que seja (Veja-seo “visitante misterioso” de Zossima.t) A ques- tio da segunda conscigncia nas eiéncias humanas. As pergun- tas (enquctes) que madam a consciéncia do interrogado. “A inesgotabilidade da segunda consciéncia, isto & da «onsciénsia do que compreende e responds nele reside a in- finitude potencial das respostas, das linguagens, dos cbdigos. ‘\infinicude contra a ininitude, bl A delimitagio benevolente e depois a coopera¢io. Em) vez de descobrie a veracidade (positiva) relativa (parcial) das| suas tees e do seu ponto de vista, os individuos procuram —e com isso perdem todas as suas forgas — refutar ¢ des- truieinteiramente o seu adversécio, tendem para a destruigdo| total do ponto de vista do outro. Lol "Nenbuma costente cientifica (nem charlatona) é total, ¢ rnenhuma corrente se manteve em sua forma original ¢ imu- 4+ © stiveteZossins, cefeespiitual do mesteco no romance de Dosis Os mos Karamdzov.(N- do.) ragmentos do anos 1970-1971 u ‘vel. No houve uma inica époce na cigncia em que renha cexistido apenas uma tinica corrente (embora quase sempre tena existido uma corrente dominante). Nao se pode nem falar de ecletismo: a fusdo de todas as correntes em uma «a seria mortal para a cincia (se a ciéncia fosse mortal) Quanto mais delimitagao, melhor, desde que sejam delimita. ses benevolentes. Sem brigas na linha de delimitagio. Coo Peragao, Existencia de zonas fronteirigas (nestas costumam surgit noyas correntes e disciplinas). ‘A testemunha eo juiz. Com o surgimento da conseién- ‘iano mundo (na existéncia) e,talvez, com o surgimento da vida biol6gica (€ possivel que nio s6 08 animais como tam bém as arvores e a relva testemunhem ejulguem), o mundo (a existéncia) muda radicalmente, A pedra continua pétrca, © 80}, solar, mas o acontecimento da existéncia no seu todo (inacabavel) se torna inteiramente distinto porque pela. pi ‘meira vez aparecem na cena da existéncia terrestre as petso~ ‘nagens novas e principais do acontecimento — a testemmunha 0 juiz, Até 0 sol, que mesmo permanecendo fisicamente o ‘mesmo, tornou-se outro porque passou a ser conscientizado Pela testemunka e pelo juz. Ele deixou de apenas exis, por ‘que passou a existir em sie para si (essas categorias surgiram ai pela primeira vez) © para o outro, porque se refleti na cconsciéncia do outro (da testemunha ¢ do juz): com isso cle ‘mudou radicalmente, enriqueceu e transformou-s. (Nao se trata do “ser no outro”.5) Nio se pode interpretar isso como o ser (a natureza) passando a tomar consciéneia de si no homem, passando a se autorrefleti. Neste caso o ser continuaria consigo mesmo, passaria apenas a dublar a si mesmo (ficaria sozinho tal qual ‘Trad rss do alessio Andersen categoria da dalesca hee lina, gue em sso aparece oea como "ser no eto", ven como "ser ay ‘ute forma”, ora como “ser no diferent”, «comma ual Baki sven #3 uma polémie vlads quando torn a eligi eautro,(N.doT) 28 Mikal akin fora o mando antes do surgimento da consciéncia — da tes- ‘emunha ¢ do juiz). Nao, surgiu algo absolutamente novo, siugiu 0 supra-ser. Nesse supra-ser jé no existe nenhuma laceta do ser, mas o ser existe nelee paca ele Isso é analogo a questio da autoconsciéncia do homem, {Quem conscientiza coincide com 0 conscientizavel? Noutros ‘ermos,ficaria o homem apenas consigo, ow sea, a 6? Sera \queai nao muda radicalmente todo 0 acontecimento da exis- 'encia do homem? E 0 que realmente acontece. Aqui surge 40 absolutamente novo: o supra-homem, o supra-ety, isto testemunha ¢ 0 juiz do homem total (do ex total); logo, |i. ndo € 0 homem, jé ndo é 0 eu, mas o outro, O reflexo de ‘nim mesmo no outro empirico, através do qual preciso pas- Ss para sair na diregio do eu-para-mine (poderia esse en-pa~ uri ser 862). 8 liberdade absoluta desse ex. Mas essa li, ‘verdade nao pode modificar um ser, por assim dizer, em ter- ‘mos materiis(aliés, nem pode querer tal coisa) — ela pode tnudar apenas o sentido do ser (reconhecer, justificas, ete); & «liberdade da testemunha e do juiz. Ela se teaduz na palavra. A verdade, o veraz ndo sio inerentes a0 proprio ser, mas ape- ‘uss a0 ser conbecido ¢ proclamado, A questio da liberdade relativa, isto & de uma liberdade ue permanece no ser e muda a composigéo do ser, mas ndo ‘eu sentido, Essa liberdade muda a existéncia material e po- sle se tornar violéncia quando separada do sentido e conver ‘id em uma forga material grosseiza e pobre. A criagao esta \wmpre vinculada a mudanga do sentido e nio pode se tornar orga material pobre. Admitamos que a testemunha possa ver e conhecer ape- us um eantinho insignificante do ser — todo 0 se nfo co- ‘hecido e nao visto por ela muda de qualidade (sentido) 20 lommar-se um ser néo conhecido e no visto, e néo simples- mente o ser como ele era sem relacio com a testemuinha. Tudo 0 que me diz respeito, a comecar pelo meu nome, sega do mundo exterior @ minha consciéncia pela boca dos opments dos anos 1970-1971 2» ‘outros (da minha mae, etc), com a sua entonagio, em sua tonalidade valorativo-emocional. A principio eu tomo cons- cigncia de mim através dos outros: deles eu recebo as pal “yras, a8 formas e a tonalida rmagio da prime nogio de mim mesmo. Os elementos de infantilism d toconscincia (“Sera que um tipo assim mame amaria...")° AS vezes permanecem até o fim da vida (a concepgio e a no- lo de mim mesmo, do meu corpo, do meu rosto ¢ do pas- ‘mente no ssi (corpo) mater, assim. consciéncia do ho: ‘mam despecta envolvida pela conscincia do outro, Mais tar de ele comeca a adequar a si mesmo as palavras ecategorias gz an defi. smeamo cone homer indepen ‘Tres tipos de enters agen 1) Relagdes entre os objetos: entre coisas, entre fen 1nos fisicos, fendmenos quimicos; relages causais, rel: matemiticas,logicas, elagées linguistics, ete; 2) RelagGes entre o sujeito e o objeto: 3) Relagé citos —as relagdes pessoais, as re- {agGes personalistas relacoes dialgicas entre enunciados, re- lagdes eticas, ete. Aise stam quaisquer vinculos semantics ppersonificados. As relagdes entre consciéncias, verdades, in- fluéncias mituas, a aprendizagem, o amor, 0 6dio, a mentira, a amizade, o respeito, a reveréncia, a confianga, a desconfian- ay etc ‘Mas seas relagies si despersonificadas (entre enunci dose estilos no enfoque linguistico, etc), passam para 0 pri- meiro tipo. Por outro lado, & possivel a personificagio de "Do poema “Diane do espetho" (1942), de Vladiay F Khodassié- ‘teh (1886-1939) “Ba, eo, en Que terre palaval Sel eu meso i $e Seri que um tipo assim mame amaval Amatelo~iza, mio eave! E sabichio como asepente?”.(N. da E) 30 Mikal akbin muitas relagdes objetificadas ea sua passagem para o tere 10 tipo. Coisifcacao e personificacio. Definigio de sueito (pessoa) nas relagbes entre sujetos: concretude (nome), integridade, responsividade, ec, inesgo- tabilidade, inconclusbilidade, abertura. Transigoes e confusio dos tréstipos de relagBes. Por exemplo, um estudioso da literatura diseute(polemiza) com © autor ou o herdi e 20 mesmo tempo explica-o como inte- ramente determinado em termos causais (socais, psicol6gi- 0s, biolégicos). Ambos os pontos de vista se justifcam, mas em determinados limites metodol6gicos conscientes e livres dle confusio. Nao se pode proibir um médico de trabalhar com eadaveres sob o mesmo fundamento de que ele deve curar nao os mortos, mas os vivos. A anlise moreicante € totalmente justificada em seus limites. Quanto melhor o ho- ‘mem compreende a sua determinidade (a sua materalidade), tanto mais se aproxima da compreensio e da realizagio de sua verdadeira iberdade. ‘A despeito de toda a sua complexidade e toda a sua in Uiole contraditéria em comparagio com Stavr6guin, Pietché- Fin” parece intero e ingénuo. Ele nao provou da devore do conhecimento, Antes de Dostoiévski, nenuma personagem da literatura russa havia provado da éevore do bem e do mal. Por iss0, no ambito do romance eram possiveis uma poesia ingénua e integral, uma lirica, uma paisagem poética. Elas (as personagens antes de Dostoiévski) ainda tinham acesso a fragmentos(cantinhos) do paraiso terestre, do qual as perso- nnagens de Dostoiévski foram expulsas de uma ver por todas. * Stavrguin€personagem central do romance Os demos de Dos ‘ose Petchérn¢ protagonists do romance de Mikal Liermontoy O ert do nosso tempo. At certo pont, Pietcorin pode ser consderado uma espe de prosstipo de tavrguin.(N. do) rapmentos dos anos 1970-1971 at BT Hee etek. A estreiteza dos horizontes histérie ura. O fechamento na época mais prOxima. A inde- finigdo (metodolégica) da propria categoria de epoca. Nos explicamos o fendmeno a partir de sua atualidade e do pas- sado imediato (no ambito de uma “época”). No primeito plano temos 0 pronto eo acabado. Até na Antiguidade des- tacamos © pronto € o acabado, mas nio o que germinou, © {que esta em desenvolvimento. Nao estudamos os embrides pré-literdrios da literatura (na linguagem e no ritual). A con- cepvio estreita(*especializada”) do especitico, Possibilidade e necessidade, Dificilmente se poderia falar de necessidade ‘em cigneias humanas. Em termos cientificos, aqui $6 se po- ddem descobrit as possibilidades ea realizacao de uma delas. © repetivel e 0 nao repetivel. Viernadski® sobre a lenta formagio histérica das cate Borias fundamentais (tanto cientificas quanto artisticas). A literatura, em sua etapa historica, jé encontrou tudo pronto: pprontas estavam as linguas, prontas estavam as formas basi- lares de visio e pensamento. Contudo, elas continuam a se desenvolver ainda que lentamente (no ambito de uma época ‘ndo € possivel acompanhé-Ias). A relagdo da eiéncia da lte- ratura com a hist6ria da cultura (a cultura como integridade eno como somas de fendmenos). A literatura é parte inalie- navel da integridade da cultura, ela nao pode ser estudada fora do contexto integral da cultura. Nio pode ser separada do restante da cultura e correlacionada imediatamente (pas- ssando por cima da cultura) com fatores socioecondmieos € ‘Outros. Esses fatores agem sobre a cultura em sua integrida~ de, es6 através dela, ¢com ela sobre a literatura, O processo literério ¢ parte inaliendvel do processo cultural. Do infinito mundo da literatura, a ciéncia (e a conscién- cia cultural) do século XIX destacou apenas um pequeno * Vlaimit Viens (1863-1945), minerloyisae geoguimic rus +0, pioniro no estado das cicias ambiental. (No) 2 Mikhail akin ‘mundinho (e nds oestreitamos ainda mais). © Oriente quase no esteve representado nesse mundinho, O mundo da cul- tura e da literatura é, em esséncia, to ilimitado quanto 0 luniverso. Nao estamos falando de sua amplitude geogréfica {aqui ela ¢ limitada) mas das profundas idades dos seus sen tidos, as quais sio tio insondéveis quanto as profundezas da matéria, A infinita diversidade de interpretagdes, ima- ‘Rens, combinagdes figuradas dos sentidos, de materiais e de suas interpretagdes, ete, NOs 0 restringimos terrivelmente por meio de selogao e modernizacio do material seleciona- ‘mos sufocados na prisio das interpretagies estrcitas © do mesmo tipo. ‘As linhas mestras do desenvolvimento da literatura, que Preparam esse ou aquele escritor, essa ou aquela obra nos séculos (¢ entre diferentes povos). Conhecemos apenas 0 ‘seriton, a sua visio de mundo e a sua atualidade. levguéni Onin foi escrito no decorrer de sete anos. Foi assim que swonteceu. Entretanto, foram os séculos (e talvez até milé- hios) que o prepararam e o tornaram possivel. Subestimam- se completamente realidades tao grandes da literatura, co- smo 0$ géneros. Lal ‘A questio do fom na literatura (o riso ¢ as ligrimas ¢ seus derivados). A questo da tipologia (a unidade limitada ‘Jos motivos e imagens). A questio do realismo sentimental (liferentemente do romantismo sentimental; Vessel6vski)? (significado das ligrimas e da tristeza como visio de mun- «lo, O aspecto lacrimal do mundo. A compaixio. A revelagio "Ch. A.N. Veselvsh, WA, Juke: poesia do sentiment e da simaxinao ofeiea”, Sao Petersburg, 1904, Juke intrpetado no horn como poeta predominantemente sentimental, “odnico pota de ‘ena ma paca da nossa sesthlidade” (p46, que fi aetad apenas lay “tendénis do romantina").(N- da) Fragmenton dos anos 1970-1971 dese aspect em Shakespeare (um conjuno de mots). Os ancicanosexpicinais. Sterne, © cated herrea oe {esamparo, da bondade, etc. — animas,criangas ath racas, os imbecis ¢ idiotas, uma florzinha, tudo 0 que é 7 ‘eno. Aviso de mundo natural, o praymoat taro e o postvsmo era un seeedade vans todos tons na literatura vena Sensualista. Compaixo, pena, enternecimento, Farsa, Os Garesscos sentimentais. As complexas combinag®es da carne, Tar Gi com o sentimentalsmo (Steme, Jean Paul c outros © mundo, torneo pesuenseolads, Onn € solo, O paths do pequens ¢ do prinad,O carter inino do senineataans ene ¥ Seauidores mais eas de So Franco 0 Franco de Asis também co- esos ono fatal Toni gue Baca ce $Botassligov aopon da Tek, cul cs ae rea {iano popular tradazem com uma Peespiccia inédica o motive da com i 240 pelos tormentos de Cristo e da ‘Virgem Maria, (N. da E.) = Py ‘Mikhail Bain se Daudet. O tema do “funcionsrio pobre” na literatura ras- os A remtincia as grandes abrangéncias espaco-temporais his ‘orieas. A fuga para o micromundo das simples vivencias hu- ‘numas. Viagem sem viagem (Sterne). Reacio ao heroismo rncocldssico e ao racionalismo iluminista. © culto do senti- inento. Reagdo a0 realismo eritco de grandes proporgies. Rousseau e 0 werterismo na literatura russe A falsa tendéncia a reduzir tudo a uma tinica consign: via, a dissolver nela a consciéncia do outro (do intérprete) ‘As vantagens essenciais da distancia (espacial, eemporal, na- ional). Nao se pode entender a interpretagao como empatia r-colocagao de si mesmo no lugar do outro (a perda do pré- prio lugar). sto s6 € exigido para os elementos periféricos da 'mterpretagdo. Nao se pode entender a interpretagio como ppassagem da linguagem do outro para a minha linguagem. ‘Compreender 0 texto tal qual o pr6prio autor 0 com- preendia. Mas a interpretagio" pode e deve ser melhor. A ‘riagdo poderosa e profunda é, em muitos aspectos, incons- ‘iemtee polissémica. Na interpreracio ela é completada pela ‘onscigncia e descobre-se a diversidade dos seus sentidos. As- ‘im, a interpretacio completa o texto: ela é ativa e criadora, "Como nest pardgrafo Bakhtin define sua concep de interpre ‘aco como aividade elral criador,ectadorseaxolgic, opt! pe- lo temo intepeetagi por sera mis corte e adequade 2 um melhor en ‘enlimento do itor de lingua portugues, anda que Bakhtin empregue 3 esa palaea poninani ara esses dois conceit profundament mb ‘los. Tradaz ponimns por compreensio quando contexte sete set ‘mpeg stricto sensu ou quando Ballin tata de seu uso por Dilthey © os hemeneutas, Ver nota Sem "A eéncia da ertura hoje” emt faci. (N-doT) agmentos dos anos 1970-1971 as coca mest ei sosmenu ome nee lingdo: elas sac di nico inte eral. O intérprete enfoca a obra com sua visio de mu formada, as Imeslida, essas posigSes determinam a su ‘$6.caso elas mesmas ujeitam-se a 7 tru lgo novo. So sob uma indicia dogmatica da posisio nfo se descobre nada de never obra (ai, dogmatco continua como mesmo conkee anteris no pode se entiqueces).O interprets aoe shies posbidade de mudanca et nei Pontos de visa © posiées js prontos, No atoda compres sie slescavolve:se uma luta cujo resultado é a mudane £0 entiguecimento "2 ui sMCOnto com os grandes como algo que determina obriga ¢ vineula € 0 momento supremo da compreencie, G encontro © a comunicagdo em Kal Jaspers (Poko vols., Berlim, 1932),!3 uss Mleriti2 A concondinciadiscordanciaativa (quando nd a ativa (quando nao resol- vida dogmaticamente de antemao) estinula e aprofunde 4 compreensao, torna a palavra do outro mais elistic cae mais comreensio, torna a palavra ‘Ressoal, ndo admite dissolucao miitua e mescla. Separagio slemio Karl Jaspers (1883-1963). Comunicacio éum tring eet {rerdade flosétfica: o pensamento é verdade sida em gute, Code maa ‘tribui para a comunicagio. (N. da E.) “ 36 Mikhail Badin wecisa de duas consciéncias, da sua contraposicao e da sua interrelagao. Acompreensio dos elementos repetves e no repetives «lo todo. Inteiragdo e encontro com o novo, o desconhecid. {ses dois momentos (ainteiragio do repetivel ea descober- 11 do novo) devem estar fundidos indissolwelmente no ato ‘vo da compreensio: porque a nao repettividade do todo «std refletida também em cada elemento repetivel, copatii- ‘ante do todo (por assim dizer, é repetiveLnao repetivl).A sretriz exclusiva na inteiragao, na busca apenas do conbeci- «lo (do que exstu) no permite descobrir 0 novo (isto é, 0 incipal, a totalidade nao repetive). A metodologia da ex- ‘cago da interpreta se reduz com muita frequéncia a essa descoberta do repetivel,&interacao do ja conhecido, ¢ se pereebe © novo o faz apenas em forma extremamente em ppobrecidae abstraa. Neste caso, evidentemente, desaparece por completo a personalidad individual do criador(falante). ‘odo o repetvele reconbecido se dissolve completamente e < assimilado pela consciéncia de 1m intérprete:na conscén- cia do outro ele €capaz de vere interpretar apenas a sua pré- ria consciéncia. Por palavra do outro" (enunciado, produco de discur- so) eu entendo qualquer palavra de qualquer outra pessoa, dita ou escrita na minha prépria lingua ou em qualquer ou tra lingua, ou sea, € qualquer outra palavra no minha, Nes- As observages sobre a “palava do outo” se eelerem a um arti ‘0 que o autor projara para a revista Quests de Filosofia; no sponta ‘mentos de 1970-1971 fram esbogadas dus varintes para 0s tao “A palara do outro como ober especico de pesquisa das citcias hu smanas” €0 problema dapalavea do out (do diseurso do outro) a3 ca fara-em ltersara”- Nos ensios sobre metalingustic, a epigrafe sobre Fausto provavelmente foi escrita de mem: “Was hr den Gest de Ze ven neat.” ("Eagulo que chara explrito do temp. "| (N. da E.) Fragments dos anos 1970-1971 7

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