Você está na página 1de 15

FÍSICA MATEMÁTICA 1

Séries de Fourier

No tópico anterior, propôs-se a representação de funções através de séries de po-


tências e satisteitas as condições de convergência, mostrou-se uma forma eficiente de
representação de funções. Nestes próximos tópicos será estudado um método de repre-
sentação de funções através de séries, porém agora através de séries trigonométricas.
O fato dos termos das sérires serem periódicas induz a idéia de que as funções a serem
representadas devam ser também periódicas como será visto a partir de agora.

1 Definição
Considere uma função genérica f (x), e que se queira representá-la pela série trigono-
métrica

a0 X
f (x) = + (an cos nx + bn sen nx) .
2 n=1

Para que isso possa ser efetivado, é preciso de algum modo conhecer os coeficientes a0 ,
an e bn e que a série seja convergente no intervalo −π ≤ x ≤ π.
Isto pode ser feito explorando as propriedades das funções cos nx e sen nx. Logo
de início, é fácil verificar que
Z +π +∞
X Z +π Z +π
f (x)dx = πa0 + (an cos nx dx + bn sen x dx)
−π n=1 −π −π

Z +π
1
a0 = f (x)dx
π −π

já que as integrais de cos x e sen x se anulam.


Além do mais, se f (x) for multiplicada por cos mx e integrada no intervalo −π ≤
x ≤ π resulta em uma propriedade interessante:
Z π Z +π ∞ Z +π
a0 X
cos mx f (x)dx = cos mxdx + (an cos mx cos nxdx +
−π 2 −∞ 1 −π
Z +π
+ bn cos mx sen nxdx)
−π

Como
1
cos mx cos nx = [cos(m + n)x + cos(m − n)x]
2
FÍSICA MATEMÁTICA 2

e
1
cos mx sen nx = [ sen (n + m)x + sen (n − m)x]
2
então 
Z +π  π se n = m
cos mx cos nxdx = (1)
−π  0 se n 6= m
e Z +π
cos mx sen nxdx = 0 .
−π

Portanto Z +π
1
an = f (x) cos nx dx .
π −π

De maneira semelhante, se f (x) for multilicada por sen mx e integrada,


Z +π
a0 +π
Z
f (x) sen mx dx = sen mx dx+
−π 2 pi
X∞ Z +π Z +π
+ (an sen mx cos nxdx + bn sen mx sen nxdx .)
1 −π −π

Se
1
sen mx sen nx = [cos(m − n)x − cos(m + n)x]
2
então 
Z +π  π se n = m
sen mx sen nxdx = (2)
−π  0 se n 6= m
que permite chegar a Z +π
1
bn = f (x) sen nx dx .
π −π

Resumindo, f (x) pode ser representada pela série



a0 X
f (x) = + (an cos nx + bn sen nx) .
2 n=1

onde
1 +π
Z
a0 = f (x)dx .
π −π
1 +π
Z
an = f (x) cos nx dx ,
π −π
1 +π
Z
bn = f (x) sen nx dx .
π −π
Esta série é conhecida como a série de Fourier da função f (x).
FÍSICA MATEMÁTICA 3

2 Exemplos

2.1 exemplo 1

Seja f (x) = x2 . Calcule a série de Fourier desta função. Os coeficientes:


1 +π 2 2π 3
Z
a0 = x dx =
π −π 3
Z +π
1 4
an = x2 cos nx dx = (−1)n 2 , n > 0
π −π n
Z +π
1
bn = x2 sen nx dx = 0, integrando ímpar
π −π
A série de Fourier é então dada por

π3 X 4
g(x) = + (−1)n 2 cos nx
3 n=1
n
e é uma função periódica em termos de x.

Figura 1: A série de Fourier g(x) é periódica, com período 2π. A função x2 é reprodu-
zida a cada T = 2π, isto é g(x) = g(x + 2π).

2.2 exemplo 2

Consdere a função 
 1 se x ≥ 0
f (x) =
 −1 se x < 0
FÍSICA MATEMÁTICA 4

cuja característica principal é a descontinuidade em x = 0. A idéia é verificar se ela é


representável em séries de Fourier.
Os coeficientes: Z +π
1
a0 = f (x)dx = 0
π −π
0
1 +π
Z Z
1
an = (−1) cos nx dx + cos nx dx = 0
π −π π 0

Z 0 Z +π  4/(nπ) sen = ímpar
1 1
bn = (−1) sen nx dx + sen nx dx =
π −π π 0  0 se n = par
de modo que a série será

4 X 1
g(x) = sen nx .
π n=ímpar n
Na figura 2 fica ilustrado o comportamento da série quanto ao número de termos
da série e a tendência de convergência da série apesar da descontinuidade em x = 0.

Um detalhe a ser obervado é que a curva começa em x = −π em g(−π) = 0. Em


x = 0 observa-se g(0) = 0 e em x = π, g(π) = 0. Em todos esses pontos, esperava-se
uma descontinuidade. No entanto, é uma característica das séries de Fourier que, em
pontos de descontinuidade, por exemplo em x = x0 , a série convirja para um valor
médio
1
g(x0 ) = [f (x0 − ε) + f (x0 + ε)]
2
FÍSICA MATEMÁTICA 5

onde ε → 0. Na figura 3 abaixo, é apresentada a série g(x) calculada levando em


consideração 104 termos da série. Verifica-se que em x = 0 a série assume valor
g(x = 0) = 0. Na figura, ε equivale a sepqração entre dois pontos x, isto é, xj+1 −xj = ε.

3 Conclusões
Pode-se ter como conclusões:

1. Se uma série trigonométrica congerge uniformemente para uma certa função f (x)
(necessariamente periódica), então os oeficientes a0 , an e bn são necessariamente
dados pelas fórmulas
1 +π
Z
a0 = f (x)dx
π −π
1 +π
Z
an = f (x) cos nx dx
π −π
1 +π
Z
bn = f (x) sen nx dx
π −π
e a série trigonométrica dada é uma série de Fourier para a função f (x).

2. Se é dada uma função f (x) e seus coeficientes de Fourier existem, então espera-se
que a série de Fourier reproduzirá a extensão periódica de f (x).
FÍSICA MATEMÁTICA 6


Mais ainda, se o período da série for T , então a substituição de x por T
x fornece
uma s érie
∞  
a0 X 2πnx 2πnx
f (x) = + an cos + bn sen .
2 n=1
T T
Se f (x) for dada, então os coeficientes de Fourier são
Z T /2
2 2πnx
an = f (x) cos dx
T −T /2 T
Z T /2
2 2πnx
bn = f (x) sen dx
T −T /2 T
e a série deverá reproduzir a função f (x) no intervalo −T /2 ≤ x ≤ T /2.
Na área de Física, é comum esse tipo de expansão para representar funcões depen-
tendtes do tempo, onde x é substituída por t e 2π/T pela frequência ω. Neste contexto,
as séries são escritas envolvendo amplitudes e fases. Para isso, propoẽ-se que
p
An = a2n + b2n

e
bn
φn = arc tg , n>0
an
e a série de Fourier é escrita como
∞  
a0 X 2πnx
f (x) = + An cos − φn .
2 n=1
T

Finalizando, a função f (x) pode ser dada em um intervalo −L ≤ x ≤ L onde agora a


variável x representa distância e 2L o comprimento do intervalo. Nestas circunstâncias
a série de Fourier é dada por

a0 X nπx nπx
f (x) = + [an cos + bn sen ]
2 n=1
L L

e os coeficientes por
1 +L
Z
an = f (x) cos(nπx/L)dx
L −L
1 +L
Z
bn = f (x) sen (nπx/L)dx .
L −L
FÍSICA MATEMÁTICA 7

4 Séries em seno e cosseno e propriedades de paridade


Uma função f (x) par no intervalo −L ≤ x ≤ L, quando representada pela série de
Fourier, tem os coeficientes bn nulos já que o integrando de
Z +L
nπx
f (x) sen ( )dx
−L L

é ímpar e a integral é nula. Assim, a função f (x) pode ser considerada apenas na região
0 ≤ x ≤ L e os coeficiente an dadas pela integral

2 L
Z
nπx
an = f (x) cos( dx
L 0 L

e a série de Fourier dada por



a0 X nπx
f (x) = + an cos( ).
2 n=1
L

Para −L ≤ x < 0, basta considerar f = f (−x).


Se f (x) for ímpar no intervalo −L ≤ x ≤ L, basta considerá-la apenas no intervalo
[0, L] e obter Z L
2 nπx
bn = f (x) sen ( ) dx
L 0 L
e sua representação em série de Fourier é dada por

X nπx
f (x) = bn sen ( ).
n=1
L

Para −L ≤ x < 0, basta considerar f = −f (x)


Estas propriedades dão origem a dois outros tipos de representação em séries de
Fourier. A série de Fourier em senos e a série de Fourier em cossenos. Considere-se
uma função f (x) arbitrária, não necessariamente par ou ímpar. A série de Fourier
construída de f (x) definida na metade da região de validade 0 ≤ x ≤ L com os
coeficientes Z L
2 nπx
an = f (x) cos( ) dx
L 0 L
e dada por

a0 X nπx
+ an cos( )
2 n=1
L
FÍSICA MATEMÁTICA 8

reproduzirá a função

 f (x), 0 < x < L,
g(x) =
 f (−x), −L < x < 0.

A série construída com os coeficientes

2 L
Z
nπx
bn = f (x) sen ( )dx
L 0 L

e dada por

X nπx
bn sen ( )
n=1
L
reproduzirá a função

 f (x), 0 < x < L,
g(x) =
 −f (−x), −L < x < 0.

4.1 exemplo 1

Considere-se a função
x 1
f (x) = + .
2L 2
Calcule as séries de Fourier g(x), a série de Fourier em seno g1 (x) e a série de Fourier
em cosseno g2 (x).
No primeiro caso, os coeficientes são

1 L 1 +L x
Z Z
1
a0 = f (x)dx = ( + )dx = 1
L −L L −L 2L 2

1 +L x
Z
1 nπx
an = ( + ) cos dx = 0
L −L 2L 2 L
1 +L x (−1)n+1
Z
1 nπx
bn = ( + ) sen dx =
L −L 2L 2 L nπ
e a série de Fourier é dada por

1 X (−1)n+1 nπx
g(x) = + sen .
2 n=1 nπ L

Já a série de Fourier em seno e obtida através do coeficiente

2 L x 1 − 2 cos nπ
Z
1 nπx
bn = ( + ) sen dx =
L 0 2L 2 L nπ
FÍSICA MATEMÁTICA 9

e a série de Fourier em seno é


∞ ∞
3 X 1 nπx 1 X 1 nπx
g1 (x) = sen − sen .
π n=ímpar n L π n=par n L

Finalmente, os coeficientes da série em cossenos são

3
a0 =
2
L
cos nπ − 1
Z
2 x 1 nπx
an = ( + ) cos dx =
L 0 2L 2 L n2 π 2
e a série em cossenos será

3 2 X 1 nπx
g2 (x) = − 2 cos .
4 π n=ímpar n2 L

A seguir, mostra-se os comportamentos das séries g(x), g1 (x) e g2 (x).


FÍSICA MATEMÁTICA 10

Nos três casos, tomou-se L = 1 para a confecção dos gráficos.

5 Forma complexa das Séries de Fourier


A série

a0 X  nπx nπx 
f (x) = + an cos + bn sen
2 n=1
L L
FÍSICA MATEMÁTICA 11

pode ser colocada na forma complexa visto que


nπx 1h nπx nπx i
cos = exp(i ) + exp(−i )
L 2 L L
nπx 1 h nπx nπx i
sen = exp(i ) − exp(−i ) .
L 2i L L
Levando na expressão da série, ela se torna
∞  
a0 X an − ibn nπx an + ibn nπx
f (x) = + ( ) exp(i )+( ) exp(−i )
2 n=1
2 L 2 L

e definindo novos coeficientes como



1
 (a − ibn ), n > 0,
 2 n


cn = 1
(a + ibn ),
2 n
n < 0,


 a0

2
n = 0.

então

X nπx
f (x) = cn exp(i )
n=−∞
L
que é a forma complexa da série de Fourier. Os coeficientes cn podem ser extraídos
através do procedimento de multiplicar a série por exp(−i mπx
L
) e integrar no intervalo
[−L, L]. Por exemplo
Z +L ∞ Z +L
mπx X πx
f (x) exp(−i )dx = cn exp[i(n − m) ]dx .
−L L −∞ −L L

Porém, esta integral deve ser avaliada da seguinte forma:


Z +L
πx exp[i(n − m)π] − exp[−i(n − m)π]
exp[i(n − m) ]dx = L
−L L i(n − m)π
sen (n − m)π
= 2L .
(n − m)π
O argumento do seno é sempre um inteiro multiplicado por π. Logo, se n 6= m, a
integral é sempre nula. Por outro lado, quando n = m, a integral é 2L, isto é, a
exponencial se torna unidade que leva ao resultado 2L. Portanto

Z +L  2Lc ,
πx n m=n
exp[i(n − m) ]dx =
−L L  0 n 6= m,

Portanto os coeficientes da séries são


Z +L
1 nπx
cn = f (x) exp(−i ) dx .
2L −L L
FÍSICA MATEMÁTICA 12

6 Sobre a convergência das séries de Fourier


Em exemplos anteriores, observou-se que g(x), obtida pela série trigonométrica, era
uma função mais parecida com f (x) quando se amenta o número de termos da série
trigonométrica. A função g(x) oscila em torno de f (x). A amplitude de oscilação
diminui a medida que o número de termos era aumentado.Estes exemplos davam uma
idéia de como a série trigonométrica g(x) convergia para a função f (x).
Para uma visualização disso, veja a figura reproduzida novamente:

A função f (x) era 


 1 se x ≥ 0
f (x) =
 −1 se x < 0

É possível agora estabelecer critérios para convergência das séries trigonométricas


através de cálculos de quantidades como o desvio do quadrado (variancia, variance,
etc). A integral Z b
[f (x) − g(x)]2 dx
a

para duas funções f (x) e g(x) definidas sobre o intervalo a ≤ x ≤ b é chamada de


desvio do quadrado de f (x) e g(x).
FÍSICA MATEMÁTICA 13

Considere-se que f (x) seja dado no intervalo −π ≤ x ≤ π e que g(x) seja aproxi-
mado por uma série trigonométrica
n
A0 X
gn (x) = + (Ak cos kx + Bk sen kx)
2 k=1

onde os coeficientes A0 , Ak e Bk são desconhecidos. Porém, se for tomado


Z +π
Dn = [f (x) − gn (x)]2 dx
−π

ou Z +π
[f (x)]2 − 2f (x)gn (x) + [gn (x)]2 dx .

Dn =
−π

Verifica-se rapidamente que, caso necessário,


Z +π
gn (x)dx = A0 π
−π

já que as integrais de senos e cossenos se anulam. Já a integral de [gn (x)]2 deve ser
conferida. Por exemplo
n
2 A20 X
[gn (x)] = + A0 (Ak cos kx + Bk sen kx)+
4 k=1
n X
X n
+ {Ak0 Ak cos k 0 x cos kx + 2Ak0 Bk cos k 0 x sen kx + Bk0 Bk sen k 0 x sen kx} .
k0 =1 k

Lembrando que

1
cos k 0 x cos kx = [cos(k 0 + k)x + cos(k 0 − k)x]
2
1
cos k 0 x sen kx = [ sen (k 0 + k)x + sen (k 0 − k)x]
2
1
sen k 0 x sen kx = [cos(k 0 − k)x − cos(k 0 + k)x]
2
e consequentemente que

+π  π se k 0 = k
Z
0
cos k x cos kxdx =
−π  0 se k 0 6= k

+π  π se k 0 = k
Z
0
sen k x sen kxdx =
−π  0 se k 0 6= k
FÍSICA MATEMÁTICA 14

Z +π
cos k 0 x sen kxdx = 0
−π

então
+π n
A20 π
Z X
2
[gn (x)] dx = +π (A2k + Bk2 )
−π 2 k=1

O desvio é dado por


Z +π Z +π n
X Z π
2
Dn = [f (x)] dx − A0 f (x)dx − 2 Ak f (x) cos kx dx−
−π −π k −π
n +π n
A20 π
X Z X
−2 Bk f (x) sen kx dx + +π (A2k + Bk2 )
k=1 −π 2 k=1

ou ainda Z +π Z +π 
2 A0 π
Dn = [f (x)] dx − A0 f (x)dx − −
−π −π 2
n
X  Z +π 
− Ak 2 f (x) cos kx dx − πAk −
k=1 −π
n
X  Z +π 
− Bk 2 f (x) sen kx dx − πBk
k=1 −π

Minimizando Dn com o intuito de verificar as consições sobre os coeficientes Ak e


Bk , deve-se começar a minimizar
 Z +π 
∆k = Ak 2 f (x) cos kx dx − πAk .
−π

Desta forma  Z +π 
d∆k
= 2 f (x) cos kx dx − πAk − πAk = 0
dAk −π

ou Z +π
1
Ak = f (x) cos kx dx, k = 1, 2, 3, ......
π −π

Da mesma forma obtem-se


Z +π
1
Bk = f (x) sen kx dx, k = 1, 2, 3, ......
π −π

e Z +π
1
A0 = f (x)dx, k = 1, 2, 3, ......
π −π

Portanto o desvio é minimizado quando Ak e Bk assumem os valores dos coeficientes


da série de Fourier ak e bk .
FÍSICA MATEMÁTICA 15

Voltando para o desvio, o menor valor de Dn deve ser


Z +π " n
#
π X
Dn = [f (x)]2 dx − a2 + π (a2k + b2k )
−π 2 0 k=1

e como Dn não pode ser negativo, então


n
1 +π
Z
1 2 X 2 2
a0 + (ak + bk ) ≤ [f (x)]2 dx
2 k=1
π −π

conecida como desigualdade de Bessel. No limite em que n → ∞, Dn = 0.


Se a série de Fourier de uma certa função f (x) convergir para f (x), então

1 +π
Z
1 2 X 2 2
a + (a + bk ) = [f (x)]2 dx
2 0 k=1 k π −π

e é denominada equação de Parseval.

Você também pode gostar