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A nossa prática catequética à luz do Ritual da Iniciação Cristã de Adultos

Descobertas, desafios e dúvidas.


1
Marcelo Gomes de Barros

“A vida cristã é um novo projeto de vida. Para nós, “o projeto”. E, por isso, ela requer um processo de passos
de aproximação, mediante os quais a pessoa aprende e se deixa envolver pelo mistério amoroso do Pai, pelo
Filho, no Santo Espírito... E isso é realizado por meio de símbolos, ritos, celebrações, tempos e etapas. O
Ritual da Iniciação Cristã de Adultos (RICA) condensa todos estes elementos.” (CNBB, Doc 107, n. 5)

O texto acima é parte do número cinco do novo documento da CNBB “Iniciação à vida cristã:
itinerário para formar discípulos missionários”, número 107. Resolvemos fazer uso desse texto para
abrir a nossa conversa sobre o RICA, tanto para demonstrar a nossa sintonia com a Igreja do Brasil que
ora se preocupa com essa questão fundamental na catequese, como também para termos ciência da
urgência que nossos catequistas tem de formação sobre este tema.
O documento 107 é um novo ardor na vida catequética da Igreja, especialmente por tratar o tema
da Iniciação Cristã a partir de suas bases neotestamentárias, além de motivar-nos a um reencontro com os
ritos que celebram a entrada na vida em Cristo, e de apontar para o RICA como uma fonte perene da
relação litúrgico-catequética . Podemos dizer que o documento é um convite e um desafio, pois para
muitos é uma descoberta maravilhosa, mas para outros, trata-se de uma oportunidade de atualização e
aprofundamento.
Mas o que é mesmo o RICA? Quais as suas raízes bíblicas, apostólicas, litúrgicas e patrísticas? É
interessante nos perguntarmos por isso, pois quem estuda a Liturgia deve buscar respostas sobre o
verdadeiro sentido que está por trás dos ritos celebrados, mergulhando nos seus gestos plenos de
sacramentalidade2 e espiritualidade que dão o verdadeiro caráter à ação celebrada.
Aquele que se depara com o RICA pela primeira vez perceberá que está diante de um antigo
conjunto desses gestos, orações, símbolos e etapas celebrativas. Encontrará um genuíno ritual, ou seja, um
livro destinado à celebração de todo o processo catecumenal, e não um livro catequético. Seus “ritos e
preces” (SC n. 48), guardam a forma e as palavras que se devem expressar quando da “primeira
participação sacramental na morte e ressurreição de Cristo” (RICA, n. 8).
Assim como a Constituição Sacrosanctum Concilium3 apontou para a restauração de vários
aspectos da Liturgia da Igreja, tendo como inspiração a experiência dos Santos Padres, também o RICA
foi buscar na tradição patrística a verdadeira fonte da Liturgia e da Catequese, que foi muito valorizada
nos tempos primevos da Igreja Cristã e que pelas intempéries das mudanças de épocas e mentalidades,
inclusive teológicas, foi sendo relegada a um lugar apenas de doutrinação e transmissão da fé, mas sem a
verdadeira vivência sacramental que os ritos contem.
Nomes como Hipólito de Roma (séc III), Ambrósio de Milão (séc IV), Santo Agostinho (séc. IV),
entre outros, celebraram estes ritos com seus catecúmenos4, realizando suas etapas litúrgico-formativas,
através do método da Mistagogia5, especialmente por meio de suas catequeses que tinham como base o
próprio rito da Iniciação Cristã. A Catequese, portanto, nascia da Liturgia, a ela servia e dela se nutria
sempre.

1
Bacharel em Ciências das Religiões pela UFPB e Pós-graduando em Liturgia pela UNISAL e Centro de Liturgia de São
Paulo. Atua como assessor de cursos de formação litúrgico-catequética em diversas paróquias da Arquidiocese da Paraíba e é
membro da Rede Celebra de Animação Litúrgica. Compõe a Equipe de Pastoral do Colégio Marista Pio X de João Pessoa, PB,
no qual é Agente de Pastoral.
2
Termo utilizado nos estudos litúrgicos, referente não apenas aos Sacramentos e Sacramentais, mas também sobre a relação
que estes possuem com o mistério, o que implica considerar que toda a liturgia é por sua natureza uma realidade sacramental.
3
Constituição para a Sagrada Liturgia, aprovada na III Sessão pública, celebrada no dia 4 de Dezembro de 1963, do Concílio
Ecuménico do Vaticano.
4
São os que se preparam para receber o sacramento do Batismo.
5
Nome dado ao método de aprofundamento catequético que os Santos Padres usavam par explicar aos catecúmenos os ritos
celebrados nos sacramentos da Iniciação Cristã.
Segue um quadro geral da Iniciação à Vida Cristã conforme o RICA (Doc 107, n. 117) para
termos uma noção daquilo que é celebrado no decorrer do seu itinerário.

Quadro Geral da Iniciação à Vida Cristã


Catecumenato Pré-Batismal conforme o RICA
1º Tempo 2º Tempo 3º Tempo 4º Tempo

2ª Etapa – Preparação para os Sacramentos (eleição) – Presidente:


1ª Etapa – Rito de Admissão dos Candidatos ao Catecumenato
Pré- Catecumenato Purificação e Mistagogia

3ª Etapa – Celebração dos Sacramentos de Iniciação (Vigília


Catecumenato (tempo mais longo de iluminação (Tempo pascal)
Ou Primeiro todos) (quaresma)
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(querigma)
(entrada) – Presidente: Pároco

Pascal) – Presidente: Pároco


Tempo de Tempo suficiente longo Preparação próxima - Aprofundamento e
acolhimento para: para Sacramentos: maior mergulho no

Pároco
na comunidade - Catequese, reflexão, - Escrutínios. mistério cristão, no
cristã: aprofundamento. mistério pascal, na
-Primeira - Vivência Cristã, Entrega do Símbolo e vida nova.
Evangelização conversão. da Oração do Senhor.
- Inscrição e - Entrosamento com a - Vivência na
colóquio com Igreja. Práticas quaresmais comunidade cristã.
o catequista (CF, etc)
-Ritos Ritos catequistas -Ritos
catequistas + + equipes litúrgicas catequistas + equipes
equipes litúrgicas
litúrgicas.

Mas como utilizar este ritual que em sua origem é destinado à Iniciação dos adultos, com crianças
e adolescentes? Como celebrar algo parecido entre esses catequizandos? O referido documento aponta
também para essa questão de adaptação e utilização do RICA como um inspirador ao demonstrar que:

“A Igreja propõe que também para os jovens, adolescentes e crianças sejam oferecidos processos de Iniciação
à Vida Cristã com inspiração catecumenal. Para isso, já existem alguns itinerários catequéticos adaptados às
várias idades, inspirados no RICA, com tempos, objetivos, passos, eixos temáticos, celebrações e outras
indicações práticas. Tal inspiração no RICA levará o processo catequético a: integrar a comunidade;
relacionar-se ao mistério pascal e ao ano litúrgico; unir fé, liturgia, vida e oração; incluir etapas definidas,
ritos, símbolos e sinais, especialmente bíblicos e litúrgicos; relacionar melhor os sacramentos do Batismo, da
Crisma e da Eucaristia; e dialogar com a cultura local. De tal maneira que seja uma verdadeira ‘escola de
fé’.” (Doc. 107 n. 121)

Portanto, somos convidados a conhecer mais a fundo o RICA, experimentá-lo em nossa prática
pastoral paroquial, e nos capacitarmos para, inspirados por ele, ajudar nossos catequizandos a celebrarem
o itinerário catequético, celebrando a sua pertença a Jesus Cristo por meio da Liturgia, fonte de toda a
vida eclesial.

Referências:
CNBB. Diretório Nacional da Catequese. Documento 84. Texto aprovado pela 43ª Assembléia Geral. São Paulo: Paulinas,
2011.
_________. Iniciação à vida cristã: itinerário para formar discípulos missionários. Documento 107. Texto aprovado pela 55ª
Assembléia Geral. Brasília: Edições CNBB, 2017. (Documentos da CNBB, 107).

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