Você está na página 1de 14

UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA

CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES


DEPARTAMENTO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL - JORNALISMO

DÉBORAH DE FÁTIMA MARTINS - 85567


DIANA BURAK - 95916
LETÍCIA DO NASCIMENTO PASSOS – 92826

As redes sociais e o filtro bolha: como a internet se tornou um espaço público poderoso para os
movimentos sociais e políticos.

VIÇOSA- MG
2021
Introdução

Escolheu-se tratar sobre este tema a partir do reconhecimento do uso das redes sociais
como veículo de disseminação de pensamentos, ideologias e manifestações culturais. Através
das redes sociais as pessoas dialogam acerca de suas vivências, enunciando e trocando
experiências através de curtidas, comentários e compartilhamentos. Em paralelo, os sites se
encarregam de analisar interesses e comportamentos dos usuários, e a partir disso, seleciona o
que deve, ou não, aparecer na sua linha do tempo – seguindo a lógica da teoria do filtro bolha.
Para a consumação do projeto será realizada uma pesquisa documental acerca de autores
como Néstor García Canclini, Manuel Castells, Eli Pariser, Hannah Arendt; entre outros
autores referenciados na bibliografia, a partir de suas obras publicadas.
Canclini (2005), em sua obra “Diferentes, Desiguais e Desconectados” discute sobre a
globalização e as consequências da mudança de um mundo multicultural para um intercultural
e como ele se configura nas relações e trocas de grupos que se entrelaçam e se confrontam. As
redes sociais são espaços de autonomia, pois elas estão fora do controle do governo e de
empresas privadas, que refletem a indignação do povo quanto a certas questões sociais.
Segundo Castells (2013), “[...] o poder é exercido por meio da coerção [...] e/ou pela
construção de significado na mente das pessoas, mediante mecanismos de manipulação
simbólica.”. E como em toda relação hegemônica há a contra hegemonia, indivíduos
formaram redes de interação para expressar sua aversão a esse poder. Os novos algoritmos do
Facebook, Instagram, Twitter e diversas outras redes, apesar de atualmente utilizarem
recursos para limitar esta autonomia, são as plataformas mais usadas para as manifestações de
revolta contra os processos sociais, governos e empresas privadas.
Por outro lado, as timelines das redes sociais que anteriormente exibia todas as
atualizações dos amigos e páginas curtidas do usuário têm passado por mudanças desde 2013
devido a modificações no algoritmo das redes sociais, agora nem todas as publicações chegam
ao usuário. Para quem usa, existe a vantagem em perceber somente aquilo que provavelmente
o interessa, baseado em suas curtidas, comentários e compartilhamentos anteriores.
Entretanto, o usuário se inscreve para receber diversos materiais e não tem acesso a eles por
mais interesse que tenha sobre os mesmos. A mudança no algoritmo é legitimada pelas
empresas alegando que essa medida é para maior conforto do usuário, porém ao mesmo
tempo que proporciona isso uma facilidade de acessar os conteúdos de sempre, também
reproduz a teoria do filtro bolha, deixando o usuário ilhado e sem algumas informações
necessárias.
A teoria do filtro bolha, proposta por Eli Pariser (2011), objetiva explicar como as
redes sociais e empresas de busca tendem a selecionar, através dos principais cliques do
usuário, os conteúdos futuros que aparecerão na linha do tempo e resultados de pesquisa.
Assim, o usuário só tem acesso àquilo que condiz com seus pensamentos e ideologias, ficando
de certa forma limitado, não podendo adquirir outras visões de mundo e opiniões

Culturas Juvenis

A pergunta principal levantada por Canclini é o que significa ser jovem no contexto
contemporâneo e a resposta a essa pergunta nos leva a discutir o tipo de globalização que é
proposto às novas gerações. Essa nova globalização proposta aos jovens os limita a serem
trabalhadores e consumidores:

Como trabalhadores, oferece-se a elas [novas gerações] que se integrem a um


mercado liberal mais exigente em qualificação técnica, flexível, e, portanto, instável,
cada vez menos protegido por direitos trabalhistas e de saúde, sem negociações
coletivas nem sindicatos, no qual devem buscar mais educação para, no fim, achar
menos oportunidade. No consumo, as promessas do cosmopolitismo são
frequentemente impossíveis de cumprir, dado que ao mesmo tempo se encarecem os
espetáculos de qualidade e se empobrecem – devido à crescente evasão escolar – os
recursos materiais e simbólicos da maioria. (CANCLINI, 2005)

Devido a grande desigualdade encontrada no mundo, como um todo, somente uma


parte dos jovens tem acesso a conhecimentos de informática; por mais que grande parte dos
jovens tenham acesso ao entretenimento, a informação e ao conhecimento que circunda a
internet, uma parcela considerável, cerca de 4,8 milhões de jovens de 9 a 17 anos, ainda não
tem acesso a internet¹. Percebendo isso, torna-se evidente a desigualdade de acesso dos jovens
aos meios comunicacionais e como essa desigualdade causa uma enorme diferença no capital
cultural dos jovens, que deixam de participar de redes que são múltiplas culturalmente.
O presente e futuro das novas gerações se dá de forma desencantada, mas não
exatamente igual para todos, segundo Canclini. O que torna isso diferente de caso para caso é
a forma como os jovens vão expor suas perguntas e exigências de modo correto em cada novo
cenário. Essa acumulação de desencantos - má qualidade de vida, desemprego ou dificuldades
de sobreviver - acaba gerando não somente o ceticismo, mas um mundo fragmentado que não
tem uma continuidade histórica, que pode ser observado principalmente nas culturas jovens.
Os jovens foram a primeira geração a crescer com TV a cores, vídeo games,
computadores e a internet. Com isso busca-se entender a mistura de midiatização e
interconectividade, já que uma afasta e a outra proporciona sensações de proximidade. Outros
dois contrapontos que se busca entender são a abundância de informação e entretenimento e a
como essas informações são adquiridas de forma fragmentada, ou seja, existe muita
informação disponível que muitas das vezes é acessada de forma descontínua. Percebe-se isso
não apenas nos jovens de classe baixa, mas também nos jovens de classe média e classe média
alta, devido à grande quantidade de informação e aos recursos que sempre se interligam.

Em estudos sobre a cultura dos estudantes secundaristas e universitários, aparece a


dificuldade que têm para situar épocas do próprio país, presidentes, guerras e
revoluções, em períodos históricos precisos. À visão desconectada entre
acontecimentos soma-se a fragmentação com que se relacionam com os saberes.
(CANCLINI, 2005)

Ou seja, os jovens acreditam que por ter acesso a grandes saberes através da internet
estão realmente se informando, o que nem sempre acontece, já que eles acabam recebendo
informações superficialmente e de forma fragmentada. Consequências dessa fragmentação,
foram descobertas em estudos onde a maioria dos jovens preferem filmes de ação a filmes que
abordam planos da subjetividade ou processos íntimos - procurar o que é mais fácil, o que está
ao alcance rápido, são alternativas superiores ao tédio que é “ter que pensar”.
O imediatismo também é outra característica da cultura jovem: passado e futuro
fundem-se no agora, vivendo o hiper-presente. As conversas nas redes sociais são respondidas
instantaneamente, escutar uma música não demora mais que dois segundos até encontrá-la em
meio a outras mil no smartphone, as informações estão ao alcance de um clique. Canclini,
entretanto, afirma que a velocidade da informação e a comunicação barata propiciam o
esquecimento, “se você quer viver o hiper-presente não lhe restará tempo para a memória nem
para a utopia.”.
Outras políticas também refletem tal presentismo: a obsolescência programada dos
produtos, que designa a cada um tempo mínimo de funcionamento e a moda, que é relançada
de seis em seis meses, deixando “old” aquilo que há pouco tempo era “tendência”, são apenas
exemplos da necessidade de manter o capitalismo na ativa.
Discordâncias ou indignações com a política também são manifestadas a todo
momento, conforme Rossana Reguillo: “os jovens estão mais propensos a participar de
causas do que de organizações”. Mesmo que estejam propensos ao fracasso, como os
estudantes chineses que desafiaram os tanques na praça de Tiananmen, a luta é por
significação. Muitas vezes antes mesmo de um resultado concreto de suas ações, querem ser
vistos, ouvidos e compreendidos, e conforme conclui Canclini,

Ao valorizar a dimensão afetiva nestas práticas culturais e sociais - dimensão que


muitas vezes mostra baixa eficácia mas que importa a solidariedade e a coesão
grupal -, torna-se visível o peculiar sentido político de ações que não buscam a
satisfação literal de demandas nem ganhos mercantis, mas reivindicam o sentido de
certos modos de vida. (CANCLINI, 2005)

Articular mentes, criar significado, contestar o poder

Nunca as autoridades, figuras públicas e a mídia estiveram tão expostas e se


tornaram tão suspeitas quanto na era digital. O povo, que no início se demonstrava tímido e
até mesmo desinteressado, se juntou e está cada dia mais presente na luta por direitos e saem
em defesa daquilo que acreditam. Movimentos sociais são organizados, disseminados e postos
em prática, apenas pelas redes sociais. Já não se tem mais a figura explícita do líder formador
de opinião e que tem seguidores de seus discursos, mas sim há uma autoria coletiva e anônima
na luta por uma causa. Os movimentos sociais começaram a emergir no cenário das redes
sociais por serem espaços livres de controle, como diz Castells (2003): “[...] estas são espaços
de autonomia, muito além do controle de governos e empresas, que, ao longo da história,
haviam monopolizado os canais de comunicação como alicerces de seu poder.”
Estes movimentos se espalharam pelo mundo inteiro rapidamente graças à
instantaneidade da repercussão de ideias pela web, dada de uma maneira viral, a
transformaram em uma arma tática para juntar multidões. Torna-se, assim, uma
potencializadora da democracia, pois abre novas possibilidades de participação da população
em atos de extrema importância para a construção da história de várias partes do globo, como
é o caso da Primavera Árabe, uma série de protestos que aconteceram a partir do final do ano
de 2010 nos países árabes.
Foi basicamente a humilhação provocada pelo cinismo e pela arrogância das pessoas
no poder, seja ele financeiro, político ou cultural, que uniram aqueles que
transformaram medo em indignação, e indignação em esperança de uma
humanidade melhor. (CASTELLS, 2003, p. 11)

A Primavera Árabe teve início justamente com a internet, quando o vendedor de frutas
Mohamed Bouazizi, foi até a sede do governo Tunisino em busca de recuperar seus pertences,
apreendidos pela polícia, e sem sucesso adquiriu um galão de gasolina e em frente ao prédio
do governo ateou fogo contra si mesmo.
O ato de Bouazizi foi gravado e com a ajuda das redes sociais o vídeo se espalhou e
causou uma revolta geral. Os grupos passaram a se articular de forma forte e presente nas
redes sociais organizando protestos por todos os países do Oriente Médio em busca de
melhores condições de vida, formas de governos mais justas e menos autoritárias e votações
mais eficientes.
Durante os atos da Primavera Árabe o Facebook e a internet foram grandes aliados,
mostrando diariamente para todo o mundo o que estava acontecendo e dando uma dimensão
do quão forte os movimentos sociais podem se tornar nas mídias sociais.
Dizer que a internet contribui com a democratização da sociedade e na busca de
melhores direitos é plausível e aceitável. No entanto, o filtro bolha pode ser prejudicial e a
intervenção das grandes empresas pode ser constatada. “Na bolha [...] nem chegamos a
enxergar as coisas que não nos interessam. Não estamos cientes, nem mesmo de forma
latente, de que existam grandes eventos e ideais dos quais não ficamos sabendo” (Pariser, p.
97). Diante disso, vale ressaltar a importância do Facebook e de outras redes sociais no filtro
bolha; eles conseguem manipular as notícias que estão presentes na rede e na timeline do
usuário através da sua política de privacidade.

A internet como espaço público e de emergências

A internet é um conjunto de espaços abertos, para a busca e muitas vezes para a


participação, embora o acesso a rede seja limitado, uma vez que para se conectar e navegar é
necessário dispor de instrumentos, de algum conhecimento técnico e de conexão.
Fato é que conteúdos difundidos por indivíduos ou pequenos grupos, que em outro
contexto, permaneceriam isolados ou em silêncio, têm ganhado destaque frequentemente,
graças à abertura da Internet que possibilita o acesso a divulgação de ideias na rede, não sendo
necessário ser especialista em um conhecimento ou opinião específica, basta ser um usuário.
Essa abertura possibilitou, e autorizou até então, que se disseminasse uma série de
cidadanias no ciberespaço, além de promover e facilitar inclusões políticas, nacionais e
institucionais, por exemplo. Os indivíduos que se conectam circulam por esses espaços
virtuais, divagam, conversam e muitas vezes se engajam em debates, compartilham e
socializam com tanta frequência que a internet já é tida como sendo parte do espaço público
contemporâneo.
Segundo Hannah Arendt, a esfera pública, seria o lugar que desponta quando as
pessoas se reúnem na companhia um dos outros e que, não obstante, “evita que colidamos uns
com os outros”, por assim dizer (ARENDT, 2007, p. 62). O termo “público” é um espaço
cerceado e próximo à atividade humana, significa o próprio mundo em que vivemos, pode ser
considerado um “artefato humano” que facilita e viabiliza a intercomunicação entre as
pessoas, a discordância, o debate, ou ouvir e apresentar opiniões que configuram ações
práticas necessárias a boa convivência humana (ARENDT, 2007, p. 62).
Para compreender o pensamento arendtiano acerca da esfera pública, faz-se necessário
assimilar e depreender a ideia de política para a autora. Nesse sentido, a política é o âmbito da
igualdade, da liberdade e da pluralidade, onde o poder pode ser produzido em conjunto pelos
indivíduos, através da ação e da palavra. É, portanto, a ação humana que proporciona a
possibilidade de um espaço coletivo a partir do qual a política pode ser exercida. O espaço
público é, portanto, considerado a fonte geradora da vida política da sociedade.
Arendt considera a liberdade e a ação política como sinônimas, haja vista que não é
enclausurando-se em si mesmo, utilizando-se unicamente da capacidade de pensar ou de
querer, que um indivíduo passa a ser livre, a liberdade existe onde a condição plural do
homem não seja desconsiderada, sendo nada mais que ação, em outras palavras, o indivíduo
só é livre enquanto está agindo, nem antes, nem depois. Ressalte-se, todavia, que a ação
política só pode ser entendida como liberdade se a mesma não sofre qualquer forma de
funcionalização, de instrumentalização, como a presente nas atividades do labor e do trabalho,
cujo valor não estaria, ao contrário da ação política, no desempenho em si mesmo, mas sim
em algum resultado, um fim a ser alcançado quando termina o processo produtivo (TORRES,
2007, p. 238).
Faz-se imprescindível, pois, ressalvar que o espaço público não é apenas um espaço
territorial ou físico no qual os indivíduos se engajam e debatem aberta e livremente sobre
assuntos políticos. Ele dispõe de outras dimensões no mundo contemporâneo, onde a
dimensão tecnológica permitiu que, dadas as novas ferramentas de mediação intersubjetiva
que surgiram nos últimos tempos e que ganham cada vez mais força e espaço, a esfera de
opinião fosse ampliada (rádio, televisão, imprensa, computador (internet), redes sociais).

Movimentos sociais em rede: um padrão emergente?


Os movimentos sociais ao longo do mundo possuem uma série de características
semelhantes, sendo uma delas a conexão em rede. Quando se fala em rede, engloba tanto as
redes online quanto offline, essa conexão existente permite uma proteção interna e externa dos
movimentos, na medida em que cria laços de acordo com interesses comuns que irão sempre
manter pessoas interessadas a continuar no movimento.
Embora os movimentos sociais tenham tido uma característica urbana muito forte em
sua criação, hoje em dia percebe-se a grande presença que eles estão adquirindo no meio
online. Ainda assim, eles ganham força e reconhecimento ao ocupar o espaço urbano.
Embora os movimentos tenham em geral sua base no espaço urbano, mediante
ocupações e manifestações de rua, sua existência contínua tem lugar no espaço livre
da internet. Por serem uma rede de redes, eles podem dar-se ao luxo de não ter um
centro identificável, mas ainda assim garantir as funções de coordenação, e também
de deliberação, pelo inter-relacionamento de múltiplos núcleos. Desse modo, não
precisam de uma liderança formal, de um centro de comando ou de controle, nem de
uma organização vertical, para passar informações ou instruções. (CASTELLS,
2013)
Ao mesmo tempo em que um movimento pode ser caracterizado como local, ele se
torna também global. O seu surgimento tem definições e interesses específicos, porém, ao e
para tomar força, eles se unem a diversos semelhantes, quebrando essa barreira de espaço,
graças a essa conexão feita em redes online. Isso ajuda com que os movimentos tenham uma
característica viral.
O caráter horizontal da rede, assim como a descoberta de interesses em comum, cria
um companheirismo dentro dos movimentos. Segundo Castells (2013) essa ausência de
liderança formal faz com que “o movimento produza seus próprios antídotos contra a
disseminação dos valores sociais que deseja combater.”
A autorreflexão também se encontra presente nos movimentos e contribui para o
diálogo e manutenção dos mesmos, que sempre buscam uma autonomia dos sujeitos perante
às instituições.
Quando as sociedades falham na administração de suas crises estruturais pelas
instituições existentes, a mudança só pode ocorrer fora do sistema, mediante a
transformação das relações de poder, que começa na mente das pessoas e se
desenvolve em forma de redes construídas pelos projetos dos novos atores que
constituem a si mesmos como sujeitos da nova história em processo. A internet, que,
como todas as tecnologias, encarna a cultura material, contribui para a construção
social da autonomia. (CASTELLS, 2013)

Filtro Bolha

Com as mudanças mais recentes nos algoritmos das redes sociais, Facebook,
Instagram, Twitter e várias outras, criou-se uma nova forma de se acessar os conteúdos. Os
sites selecionam os conteúdos que aparecerão para o usuário conforme seu acesso, assim as
páginas que o respectivo usuário mais curtir, os amigos com quem mantiver mais contatos,
aquilo que mais compartilhar serão os conteúdos com a visualização mais rápida e fácil para
ele.
Nessa nova perspectiva se encontra o filtro bolha que serve como uma espécie de
peneira para selecionar o que é supostamente útil ou não para determinada pessoa. Nesse
sentido o pesquisador Eli Pariser (2011) chegou a um conceito para representar o que ele
acredita ser uma consequência dessa seleção de informações, os filtros bolha
O código básico no coração da nova Internet é muito simples. A nova geração de
filtros na Internet olha para as coisas que você parece gostar - as coisas reais que você
fez, ou as coisas que as pessoas como você gosta - e tenta extrapolar. Eles são os
motores de previsão, constantemente criando e aperfeiçoando uma teoria de quem
você é e o que você vai fazer e querer no futuro. Juntos, estes motores criam um
universo único de informação para cada um de nós – o que denomino de filtro bolha -
que fundamentalmente altera a maneira com a qual nós encontramos ideias e
informações. (PARISER, 2011)

Pariser (2011) também contextualiza esses filtros como sufocantes na medida em que
manipulam a informação direta a que cada um terá acesso. Outro ponto é que esses filtros nos
fecham em uma bolha, na qual cada usuário tem contato com informações muito semelhantes
às suas opiniões, o que dificulta e diminui o potencial de desenvolver seu conhecimento.
Entregues a si próprios, os filtros de personalização servem-nos com uma espécie
invisível de autopropaganda, doutrinando-nos com nossas próprias ideias, ampliando
o nosso desejo de coisas que são familiares e nos deixando alheios aos perigos que
espreitam no escuro território do desconhecido. (PARISER, 2011)

O usuário julga estar no comando, porém, não é como escolher um canal de TV, o
usuário não escolhe sua bolha, ele vive sob efeito dela. Em sua bolha, que é construída por
informações baseadas no que algoritmos julgam ser suas preferências, ele se limita somente a
determinadas informações que refletem sua própria opinião, gerando baixa diversidade de
informações. Criando assim uma rede cada vez maior e mais forte ao redor de apenas um
assunto.
O próprio Google, o maior mecanismo de busca do mundo, também está sob a ação
dos filtros. Esses filtros escondem informações, sem ao menos dar a chance de dados fora do
padrão chegarem, e os usuários não se dão conta que por trás desses filtros estão grandes
empresas escolhendo seus dados de acesso, podendo assim gerar uma “alienação” sobre quem
utiliza a rede.

Eleição para Prefeitura de São Paulo 2020: Contextualizando a bolha em tempos mais
contemporâneos
As redes sociais no mundo inteiro têm sido utilizadas como plataformas para
expressão política, organização de diversos movimentos sociais e debates sobre os mais
diferentes tópicos conversacionais. Seguindo essas características, não é difícil que se se
encontre incessantemente, mas em especial durante as épocas de eleição, diferentes contas em
diferentes plataformas, declarando e defendendo seus respectivos posicionamentos políticos.
Não é de se surpreender que com a constante passagem do tempo, os avanços
tecnológicos tenham continuado a acontecer de maneira igualmente proporcional. De tal
maneira, os algoritmos utilizados para a construção e manutenção das redes sociais como as
conhecemos, evoluem de forma acelerada.
Tornou-se conhecimento popular no universo da web o fato de que os algoritmos das
mais famosas e utilizadas plataformas, funcionam de maneira a fornecer aos seus usuários,
mais do conteúdo que estes consomem frequentemente. De acordo com uma matéria
publicada em 27 de março de 2016 pelo Estado de São Paulo, a cada compartilhamento ou
vídeo assistido, plataformas como o Twitter, Facebook ou YouTube usam essas informações
para entregar aos usuários mais do que estes já demonstraram interesse.
Segundo o Professor de ciência da informação da Universidade de Michigan Christian
Sandvig, entrevistado para a matéria previamente mencionada, os feeds das redes sociais são
produzidos em conjunto pelo usuário e pelo algoritmo.
"O computador te observa e aprende com o que você clica. Ao mesmo
tempo, você decide como responder ao que ele mostra a você."... - Veja
mais em https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/agencia-
estado/2016/03/27/redes-sociais-usam-algoritmos-e-ajudam-a-formar-
bolhas-politicas.htm?cmpid=copiaecola
Se o computador restringe o tipo de conteúdo que vai ser entregue para os utilizadores,
então é de se esperar que haja um afunilamento de opiniões políticas publicadas nessas
plataformas que chegam a atingir de forma efetiva esse usuário, limitando sua vivência na
web à própria bolha.
Um caso recente a ser analisado é o da performance do candidato à Prefeitura de São
Paulo Guilherme Boulos nas eleições municipais de 2020. A eleição que definitivamente
levou o até então Vice-prefeito de João Dória e candidato filiado ao PSDB Bruno Covas à
prefeitura, teve uma comoção de proporções gigantescas nas redes sociais.
As eleições de 2020 nas maiores capitais do Brasil, movimentaram mais de 5 milhões
de menções na Plataforma Twitter, como notado por Daniela Braun para o jornal de economia
Valor Econômico, em uma matéria de 27 de novembro de 2020, que fez o balanço final dos
candidatos no Twitter. Significamente, à frente no ranking de menções, estava Guilherme
Boulos do PSOL, deixando para trás o seu principal rival nas eleições, Bruno Covas.
Em uma chapa formada juntamente com Sônia Guajajara, líder indígena, a estratégia
eleitoral de Guilherme Boulos, consistia em “furar a bolha” criada pela esquerda em torno de
si mesmo e de sua candidatura. Boulos pretendia atingir os eleitores que não votariam nele
tradicionalmente, não o conheciam por completo e consideravam o candidato apenas mais um
“radical de esquerda”.
A fórmula parecia funcionar; com milhões de citações e resultados no Twitter,
milhares de visualizações nos vídeos de campanha e inúmeras pesquisas apontando uma
possível virada de Boulos nas urnas, a chapa do PSOL se tornava quase onipresente nas redes
sociais, mostrando seus avanços políticos na web constantemente e deixando os eleitores de
esquerda, usuários da rede social, muito confiantes na possível eleição de Guilherme Boulos.
Entretanto, as menções e presença marcante em redes sociais dos candidatos do PSOL,
provaram ser apenas mais um exemplo do filtro bolha que acomete a política em tempos
contemporâneos. Boulos foi o candidato mais mencionado em 2020, mas seu aparecimento
astronômico nas redes sociais não foi o suficiente. No segundo turno das eleições para a
Prefeitura de São Paulo, Bruno Covas é eleito com 32,85% dos votos, contra 20,24% de
Guilherme Boulos.
É preciso lembrar-se constantemente, que embora inúmeras matérias estejam sendo
feitas sobre o assunto e os usuários da internet estejam cada vez mais conscientes dos
algoritmos das redes sociais e seus efeitos na construção de um filtro bolha, isto não os
impede de cair nas mesmas “armadilhas digitais”. A bolha acreditou na eleição de Boulos em
2020, mas isso não foi o bastante.

Governo e Movimentos: Um Amor Possível?

Para que um movimento social seja politicamente influente não basta que ele esteja
organizado, com pautas bem definidas e uma agenda bem feita. É preciso haja uma aprovação
externa e para isso:
atores do Estado precisam vê-lo como potencialmente capaz de facilitar ou prejudicar
seus próprios objetivos - ampliar ou solidificar novas coalizões eleitorais, ganhar a
opinião pública, aumentar o apoio às missões das agências governamentais.
(CASTELLS, 2013).

Ou seja, os movimentos só conseguem atingir os objetivos e promover mudanças


quando tem seus pensamentos alinhados com as instituições governamentais atuais ou caso
ganhem uma força notória da população, que passará a lutar pelos seus direitos junto a esse
movimento. Estar alinhado ao interesse do governo contradiz a maior parte destes
movimentos e suas críticas, no que se refere a falta de representatividade da classe política,
“já que as eleições são condicionadas pelo poder do dinheiro e da mídia, e limitadas por leis
eleitorais tendenciosas, elaboradas pela classe política em benefício próprio” (CASTELLS,
2013). Os próprios movimentos sociais não reconhecem e não enxergam a legitimidade do
sistema atual – não acreditam numa comunicação direta e eficiente entre eles e os políticos.
O que costuma acontecer, segundo Castells (2013), é somente o levantamento dos
temas, pautas e propostas dos movimentos sociais na época em que as manifestações
acontecem. As demandas passam a ser vistas e, às vezes, incorporadas aos discursos dos
líderes políticos e de partidos. A mudança efetiva nos planos de governo é limitada, mas é
plena na mente das pessoas.
O verdadeiro objetivo desses movimentos é aumentar a consciência dos cidadãos em
geral, qualificá-los pela participação nos próprios movimentos e num amplo
processo de deliberação sobre suas vidas e seu país, e confiar em sua capacidade de
tomar suas próprias decisões em relação à classe política. (CASTELLS, 2013)

O grande feito dos movimentos sociais nos meios de comunicação é a criação de


cidadãos mais conscientes e aptos para questionar, provocar e reconhecer seu espaço e seus
deveres. Desta forma, políticos se sentem mais inibidos a entregar promessas e discursos
meramente cosméticos (CASTELLS, 2013).

Conclusão
Torna-se possível concluir a partir do presente trabalho que, contemporaneamente a
internet, assim como as redes sociais, servem como palco para as mais diversas manifestações
políticas, sociais e culturais. Enquanto discutem gostos, opiniões e crenças online, os usuários
da internet alimentam algoritmos que sustentam as plataformas mais populares do mundo da
Web, como Twitter e Facebook. Estes, por sua vez, são responsáveis por levar até os
utilizadores conteúdos por quais eles já procuraram ou nos quais já demonstraram interesse.
Com esses algoritmos, os sites selecionam conteúdos específicos que possam
interessar seus usuários, prática que é corroborada por patrocinadores e anunciantes, que
desejam ter seu material exposto para possíveis compradores. É a partir destas ações que cria-
se o fenômeno que norteou este texto: o filtro bolha.
Considerando a internet como um espaço público e de emergências, aberto para novos
diferentes diálogos, tornou-se importante compreender de que formas o filtro bolha, como
visto neste trabalho, é capaz de incitar movimentos e manifestações e iniciar importantes
discussões, enquanto paradoxalmente, cega e limita internautas para tópicos que divergem dos
seus tradicionais posicionamentos.
Desta maneira, entende-se que o surgimento extraordinário de movimentos sociais
derivados da Internet muito se deve ao filtro bolha, que suporta as declarações político-sociais
previamente feitas pelos os usuários e os incita a continuar em concordância com as mesmas.
Entretanto, é preciso recordar-se com frequência do quão limitante este filtro torna o
conhecimento e visão de realidade desses usuários, o que acaba por invalidar algumas pautas
ou torná-las datadas como pautas a serem discutidas apenas em épocas eleitorais.
Compreendemos que a internet e suas facetas político-sociais são complexas e podem
tanto começar discussões, como perder eleições.
ARENDT, Hannah. A condição humana. Tradução de Roberto Raposo, posfácio de Celso
Lafer. – 10. Ed – Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007.
TORRES, Ana Paula Repolês. O sentido da política em Hannah Arendt.Trans/Form/Ação
[online]. 2007, vol.30, n.2, pp.235-246. ISSN 0101-3173. http://dx.doi.org/10.1590/S0101-
31732007000200015 . Acessado em 08 de maio de 2021.

CANCLINI, Nestor Garcia. Diferentes, desiguais e desconectados. 3. ed. Rio de Janeiro: Ufrj,
2005.

CASTELLS, Manuel; MEDEIROS, Carlos Alberto. Redes de indignação e esperança:


Movimentos sociais na era da internet. Rio de Janeiro: Zahar, 2013.

PARISER, Eli. The filter bubble. Nova York: Penguin Books, 2011. Tradução por: Diego
Alfaro.

Você também pode gostar